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Não informar preço, por si só, não caracteriza propaganda enganosa

A falta de informação sobre preço, por si só, não caracteriza propaganda enganosa. A condenação de uma empresa pela prática de propaganda enganosa por omissão exige a comprovação de que foi sonegada informação essencial sobre a qualidade do produto ou serviço, ou sobre suas reais condições de contratação — análise que deve levar em conta o público-alvo do anúncio publicitário.

Segundo o ministro Antonio Carlos, o CDC não exige a veiculação de todas as informações de um produto STJ

Com esse entendimento, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça determinou que o Tribunal de Justiça do Maranhão analise novamente ação contra a Vivo, que não informou em um panfleto os preços de aparelhos celulares anunciados. O TJ-MA havia condenado a empresa alegando genericamente que a ausência do preço seria capaz de configurar a propaganda enganosa.

No recurso ao STJ, a Vivo alegou que não se exige no anúncio publicitário o esgotamento de todas as informações sobre o produto, como origem e prazo de validade.

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso, lembrou que o conceito de publicidade enganosa está intimamente ligado à falta de veracidade da peça publicitária, que pode decorrer tanto da informação falsa quanto da omissão de dado essencial.

Ele destacou que a informação tem por finalidade garantir o exercício da escolha consciente pelo consumidor, diminuindo riscos e permitindo que ele alcance suas legítimas expectativas. A preocupação do CDC é com o dever de informação e o princípio da veracidade.

Citando o jurista Sérgio Cavalieri Filho, o ministro disse que a informação é um dever do contrato, calcada na adequação, suficiência e veracidade das informações para formar o consentimento informado do consumidor.

“No entanto, o artigo 31 do CDC não traz uma relação exaustiva nem determinante a todos os tipos de publicidade, mas meramente exemplificativa; portanto, pode ser necessário, no caso concreto, inserir outra informação não constante do dispositivo legal, assim como não há obrigação de que, no anúncio publicitário, estejam inclusos todos os dados informativos descritos no rol do citado artigo”, declarou o relator.

Segundo o ministro Antonio Carlos, o CDC não exige a veiculação de todas as informações de um produto, até porque isso seria impossível, devido à limitação de tempo e espaço das peças publicitárias.

“Não é qualquer omissão informativa que configura o ilícito. Para a caracterização da ilegalidade, a ocultação necessita ser de uma qualidade essencial do produto, do serviço ou de suas reais condições de contratação, de forma a impedir o consentimento esclarecido do consumidor”, concluiu.

Apenas a análise do caso concreto, segundo o ministro, permite determinar os dados essenciais que deveriam constar da publicidade e foram levianamente omitidos. Ele ressaltou que o preço pode ou não ser uma informação essencial, “a depender de diversos elementos para exame do potencial enganoso, especificamente o uso ou a finalidade a que se destina o produto ou serviço e qual é seu público-alvo”.

Para o relator, o provimento do recurso se justifica porque o TJ-MA, no julgamento da apelação, restringiu-se a afirmar, de forma genérica e abstrata, que o preço é um dado imprescindível na publicidade, sem aprofundar o exame das circunstâncias do caso concreto. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 1.705.278

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Notcias STF :: STF – Supremo Tribunal Federal

Suspenso pagamento de parcelas do Municpio do Rio de Janeiro em contratos com BNDES


O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o pagamento das parcelas mensais relativas aos contratos de financiamento firmados entre o Municpio do Rio de Janeiro e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) e determinou que os valores respectivos sejam aplicados no custeio de aes de combate pandemia do novo coronavrus. A deciso se deu nos autos da Petio (PET) 8743.

Com a deciso, Unio e BNDES devem se abster de proceder s medidas decorrentes do descumprimento dos contratos. As medidas permanecem em vigor at a realizao do juzo de admissibilidade de recurso extraordinrio interposto pelo municpio no Tribunal Regional Federal da 2ª Regio (TRF-2) contra deciso que negou pedido semelhante.

Segundo o ministro Luiz Fux, a Prefeitura do Rio de Janeiro relatou uma srie de realocaes oramentrias realizadas emergencialmente para despesas extraordinrias destinadas s aes de combate pandemia, que contrastam com a reduo drstica da arrecadao fiscal, no apenas em relao aos tributos de competncia prpria, como tambm em relao s transferncias constitucionais e dos royalties de petrleo.

O relator verificou a plausibilidade jurdica do pedido (fumus boni iuris), pois a continuidade do pagamento das parcelas de emprstimos de financiamento contrados com o BNDES, sob garantia da Unio, compromete os esforos do municpio no combate Covid-19.

O ministro Luiz Fux afirmou que o risco de dano de difcil reparao (periculum in mora) tambm se encontra demonstrado, porque eventual inadimplemento do municpio, por absoluta falta de recursos financeiros, pode ocasionar aplicao da mora (atraso) contratual, inscrio nos cadastros de inadimplentes e restrio de repasses de verbas federais indispensveis no momento.

RP/CR//EH

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Toffoli, Anastasia, Tebet: Uma lei emergencial para o Direito Privado

A pandemia de Covid-19 tem levado diversos países a editar leis de emergência para atenuar as inexoráveis consequências dessa nova realidade na vida das pessoas e na própria estrutura do Estado e da sociedade.

Dois caminhos têm sido trilhados, isolada ou paralelamente, pelos parlamentos. O primeiro é da legislação destinada à proteção das relações de trabalho, da economia das famílias e do setor produtivo. Ele se perfaz com aportes bilionários de recursos públicos, renúncias ou moratórias fiscais e de manutenção coativa de contratos de trabalho. Esse caminho depende fundamentalmente de iniciativas do Poder Executivo e de uma colaboração permanente dos parlamentos nacionais.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, ajusta a sua máscara durante entrevista coletiva à imprensa, em Brasília – Adriano Machado – 18.mar.20/Reuters

O segundo caminho é da elaboração de normas emergenciais para controlar a onda avassaladora de descumprimento de contratos. A perturbação das relações econômicas gera um efeito cascata: a inadimplência em um contrato provoca uma reação em cadeia em vários outros negócios. Nesse aspecto, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário assumem um papel de preponderância na busca por soluções que evitem uma judicialização maciça do ambiente econômico.

O projeto de lei 1.179/2020 insere-se nesse segundo caminho. A partir de uma proposta elaborada por juristas de diferentes universidades, o Senado Federal apresentou à sociedade um conjunto de regras para suspender prazos prescricionais; impedir condutas oportunistas de quem deseja usar a pandemia para não honrar compromissos anteriormente assumidos; vedar o despejo de locatários em situação de fragilidade econômica; diferenciar os contratos de consumo e os contratos empresariais, permitindo que se dê maior proteção aos primeiros; flexibilização de assembleias e reuniões de empresas e condomínios para que possam ocorrer em meios virtuais; maior controle do acesso aos condomínios, com eventual prorrogação de mandatos de síndicos; conversão da prisão do devedor de alimentos na modalidade domiciliar; restrições à contagem de tempo por usucapião; flexibilização de algumas condutas anticoncorrenciais durante a pandemia e um regime especial de responsabilidade para pesquisadores de novos equipamentos para fazer frente à emergência.

Essas medidas não alterarão leis em vigor. Serão temporárias, emergenciais e atuarão com a finalidade de permitir que o país atravesse este difícil momento com segurança jurídica e previsibilidade.

A estrutura jurídica nacional já possui mecanismos sólidos e testados ao longo das crises econômicas do século 20. A solidez do sistema de proteção ao consumidor e à longevidade da Lei do Inquilinato demonstram o amadurecimento de nosso sistema de direito privado. Não faz sentido alterar essas leis de modo definitivo. Seria, contudo, igualmente equivocado não produzir uma legislação emergencial para controlar o fluxo de ações que advirão da crise e para evitar o perecimento de direitos e pretensões diante óbices impostos à mobilidade das pessoas.

O projeto não ingressou em áreas como serviços públicos, dependentes da atuação das agências reguladoras, e em questões trabalhistas e sanitárias. Esses temas devem ser examinados por normas regulatórias ou projetos específicos. De modo idêntico, em relação às falências e à recuperação judicial, cujas nuances recomendam sejam apreciadas em projetos específicos, alguns deles em tramitação no Congresso Nacional.

O essencial é que o enfrentamento da crise gerada pela pandemia não será exitoso enquanto não percorridos os dois caminhos de atuação estatal. O projeto de lei emergencial busca resolver os conflitos no âmbito jurídico. Nada disso será suficiente, todavia, sem uma ação efetiva de recuperação econômica das pessoas, das empresas e dos entes estatais. Essa lição foi apreendida desde a crise da bolsa de 1929 e não pode ser esquecida no século 21.

Neste momento tão dramático e difícil, manter parâmetros de objetividade e segurança jurídica é algo fundamental para viabilizar uma travessia segura. A união do povo brasileiro tornará possível a recuperação rápida e sustentável do sistema produtivo, da geração de empregos e do ambiente de negócios.

O Brasil é um gigante maior do que as piores crises.

José Antônio Dias Toffoli é presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça

Simone Tebet é senadora da República (MDB-MS) desde 2015 e presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

Antonio Anastasia é vice-presidente do Senado Federal (PSD-MG) e proponente do projeto de lei 1.179/2020.

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Quais os reflexos do estado de calamidade pública para o processo?

A Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente de surto pandêmico iniciado no ano de 2019. Tal lei estabelece medidas que visam à proteção da coletividade.

Posteriormente, a pandemia do Covid-19 acarretou, por meio do Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020, o reconhecimento oficial do estado de calamidade pública no Brasil. Além de flexibilizar limites orçamentários e permitir a destinação excepcional de mais recursos à saúde sem cometimento de crime de responsabilidade fiscal, a medida também legitima a instauração de regimes jurídicos urgentes e provisórios, com a finalidade de conter os impactos da situação calamitosa.

Os impactos da pandemia são amplos, destacando-se, entre outros, a imposição de máximo confinamento das pessoas, que devem evitar circulação pública, sendo estimuladas a trabalharem e a desenvolverem suas atividades profissionais em casa.

Diante do reconhecimento oficial do estado de calamidade pública, a referida Lei 13.979 foi alterada, sendo, entre outras mudanças, incluído em seu texto um artigo 6º-C, segundo o qual “[n]ão correrão os prazos processuais em desfavor dos acusados e entes privados processados em processos administrativos enquanto perdurar o estado de calamidade de que trata o Decreto Legislativo nº 6, de 2020”. E, nos termos de seu parágrafo único, “[f]ica suspenso o transcurso dos prazos prescricionais para aplicação de sanções administrativas previstas na Lei nº 8.112, de 1990, na Lei nº 9.873, de 1999, na Lei nº 12.846, de 2013, e nas demais normas aplicáveis a empregados públicos”.

O estado de calamidade pública, oficialmente reconhecido, produz também reflexos em processos judiciais de natureza não penal. Em outras palavras, há reflexos no processo civil, a serem a seguir destacados.

A calamidade pública é um acontecimento natural que acarreta a incidência de normas jurídicas, com produção de efeitos jurídicos nos processos judiciais em curso. A pandemia do Covid-19 é, enfim, um fato jurídico processual em sentido estrito, pois é um acontecimento da natureza que, juridicizado pela incidência de norma processual, é apto a produzir efeitos dentro do processo.

O primeiro efeito é a possibilidade de suspensão de processos. Uma calamidade pública caracteriza um estado de força maior transindividual, sendo capaz de suspender o processo judicial (CPC, art. 313, VI). A suspensão, porém, não é automática. É preciso que o juiz determine, em cada caso, a suspensão do processo. A pandemia do Covid-19 não acarreta a suspensão automática de todos os processos; só serão suspensos aqueles que, diante de suas próprias peculiaridades, o juiz assim o ordene expressamente. A depender das circunstâncias do caso, sendo, por exemplo, o processo eletrônico, é possível não haver inviabilidade da prática de atos ou necessidade de sobrestamento do processo. O juiz deve, enfim, examinar, em cada caso, a necessidade ou não de suspensão dos processos. Se o processo for suspenso, os seus prazos estarão, então, igualmente suspensos (CPC, art. 221).

Atento à situação e com a finalidade de reduzir o risco de contágio pela Covid-19, o CNJ editou a Resolução 313, de 19 de março de 2020, por meio da qual estabeleceu o regime de plantão extraordinário no âmbito do Poder Judiciário, com exceção do STF e da Justiça Eleitoral. Ao tempo em que determinou a suspensão do trabalho presencial de magistrados, servidores, estagiários e colaboradores (art. 2º), manteve o funcionamento em idêntico horário ao do expediente forense regular e garantiu os serviços essenciais em cada tribunal: distribuição, publicações, atendimento prioritariamente de forma remota, atividades jurisdicionais de urgência etc. (arts. 2º, § 1º, e 4º).

A Resolução 313 do CNJ determina, ainda, a suspensão dos prazos processuais até 30 de abril de 2020 (art. 5º), não obstando a prática de ato processual necessário à preservação de direitos e de natureza urgente (parágrafo único). Os tribunais podem, evidentemente, estender o período de suspensão, a depender das condições locais ou regionais da propagação do vírus.

A suspensão dos prazos, até o dia 30 de abril, é uma medida de âmbito nacional, determinada pelo CNJ. A edição da resolução do CNJ resguarda a segurança jurídica dos jurisdicionados. A tutela da confiança garante tranquilidade ao jurisdicionado que observou, fiel e corretamente, a previsão de suspensão dos prazos processuais. Aliás, o art. 30 da LINDB dispõe que “As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas”. O seu parágrafo único dispõe que “Os instrumentos previstos no caput deste artigo terão caráter vinculante em relação ao órgão ou entidade a que se destinam, até ulterior revisão”.

O dispositivo apenas adensa a necessidade de a Administração Pública – aí inserida a Administração da Justiça – reforçar a segurança jurídica, garantindo previsibilidade dos seus atos, decisões e condutas, inclusive em relação aos prazos.

O reconhecimento oficial de um estado de calamidade pública configura um motivo de força maior. O evento de força maior caracteriza-se como justa causa, a justificar a fixação de um novo prazo pelo juiz para a prática do ato (CPC, art. 223, § 2º), sendo motivo para interromper o prazo recursal (CPC, art. 1.004), podendo ainda acarretar sua prorrogação por período superior a dois meses (CPC, art. 222, § 2º).

Realmente, o motivo de força maior pode justificar a prorrogação do prazo por período superior a dois meses (CPC, art. 222, § 2º), a fixação de um novo prazo para a prática do ato (CPC, art. 223, § 2º) ou a restituição do prazo recursal (CPC, art. 1.004). Isso tudo, como visto, depende de cada caso concreto, não ocorrendo automaticamente; o juiz, em cada processo, deve examinar as particularidades da causa para prorrogar o prazo, fixar um novo prazo ou restituí-lo à parte. O que houve, concretamente, foi uma suspensão nacional dos prazos até 30 de abril de 2020. Nada impede, porém, que, concluída a suspensão dos prazos, haja, em processos específicos, a necessidade de prorrogação ou restituição de prazos ou, até mesmo, de fixação de um novo prazo.

A pandemia pode repercutir em situações jurídicas anteriores, constituindo, modificando ou extinguindo direitos. O juiz, a teor do art. 493 do CPC, deve levar em conta, ao proferir sua sentença, os fatos supervenientes que constituam, modifiquem ou extingam situações jurídicas discutidas no caso submetido ao seu crivo. Se a pandemia do Covid-19 interfere na discussão, constituindo, modificando ou extinguindo, à luz do direito material, a situação jurídica em disputa, o juiz deve levar tal fato superveniente em consideração e julgar com base em tal situação. É preciso, porém, instaurar antes o contraditório a esse respeito (CPC, art. 10).

O estado de fato de muitas situações jurídicas pode alterar-se em razão da pandemia do Covid-19. Diante da modificação no estado de fato, é possível que, em casos de relação jurídica de trato sucessivo, a parte peça a revisão do que foi decidido em sentenças já proferidas (CPC, art. 505, I). A hipótese não é de ação rescisória, nem de revisão da sentença proferida. Em virtude da mudança no estado de fato, o juiz pode reanalisar o caso. A decisão proferida não é modificada: ela foi proferida em observância a um específico estado de fato, que agora não é mais o mesmo. O estado de fato, que se modificou, permite que o juiz profira nova decisão. Sendo a relação de trato sucessivo e sobrevindo novo estado de fato, há uma nova causa de pedir, a permitir uma nova demanda sobre a questão. Depois da decisão, sobreveio uma mudança no estado de fato, autorizando a propositura de uma nova demanda que pretenda uma decisão que contenha uma contraordem relativamente ao que fora decidido a partir de um estado de fato que não existe mais ou que foi alterado. É, enfim, admissível aí uma ação de modificação, semelhante ao que ocorre com a ação revisional de alimentos: a superveniência de um novo estado de fato não mais justifica o comando contido na sentença, cabendo à parte postular uma nova decisão, que retrate esse novo estado de fato. Isso, evidentemente, ocorre apenas nas relações de trato sucessivo.

Esses são alguns dos reflexos que a pandemia do Covid-19 pode produzir em processos judiciais em curso.

*Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Porto, Roma II-TorVergata, Girona, UFMG, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC, UFMT, UFBA,UFRJ e UFAM).


Calamidade (do latim: calamias, tatis) era o flagelo que atingia os calamos, prejudicando as colheitas: geadas, fungos, parasitas, chuvas torrenciais etc. O termo generalizou-se e passou a significar acontecimento causador de grande prejuízo. Catástrofe (do grego: καταστροφή) era o fim, a morte, a destruição, o aniquilamento. Cataclismo (do grego: κατακλυσμός) era a inundação, a submersão. Em português, as três palavras exprimem a mesma ideia.

“Calamidade é o infortúnio, a catástrofe, o acontecimento infausto que assume grandes proporções. Calamidade pública é o cataclismo, o fato sinistro que atinge número indeterminado de pessoas: enchentes, furacões, terremotos… Pelas dimensões a que pode chegar, a calamidade pública não permite uma delimitação apriorística dos prazos.” (TORNAGHI, Hélio. Comentários ao Código de Processo Ciivl. São Paulo: RT, 1975, v. II, p. 70).

Para Pontes de Miranda, existem a força maior transindividual, a individual e a pluriindividual. A transindividual é a que influi na vida de todas as partes, ou mesmo das partes e dos juízes, como em casos de suspensão do tráfego devido a calamidade pública de ordem sanitária, guerra ou revolução (Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1974, t. III, p. 406).

Leonardo Carneiro da Cunha é professor associado da Faculdade Direito do Recife (UFPE), nos cursos de graduação, mestrado e doutorado; e advogado, sócio de Carneiro da Cunha Advogados.

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Repositório virtual recebe decisões sobre coronavírus

Apoio aos juízes

Repositório virtual recebe decisões sobre pandemia do coronavírus

O repositório de decisões e sentenças do Centro de Apoio à Magistratura Brasileira – Covid-19 já está aberto para o envio de material por magistrados federais e estaduais.

Repositório virtual de decisões servirá de apoio a magistrados Jarun Ontakrai

O espaço é um dos quatro ambientes criados para a capacitação de juízes para lidarem com os desafios decorrentes da judicialização relacionada à pandemia do novo coronavírus. A previsão é que ele esteja disponível para consulta a partir da próxima segunda-feira (6/4).

Além do repositório, a plataforma digital de suporte criada pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) contará com fóruns de discussão, cursos EaD e material produzido pelos Centros de Inteligência Judiciários. A intenção é promover a construção coletiva de conhecimento, em que todos participem como colaboradores.

Na página do repositório, os magistrados também terão acesso a tutoriais para consulta de decisões e links de acesso, banco de legislação, manifestações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pareceres dos Núcleos de Apoio Técnico ao Judiciário (Natjus) e estatísticas referentes à Covid-19.

O objetivo é fazer uma compilação de assuntos relacionados ao coronavírus, de forma a subsidiar os magistrados na solução de demandas. Os documentos disponibilizados não representam o posicionamento da Enfam, nem são indicativos do entendimento a ser adotado. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

Revista Consultor Jurídico, 3 de abril de 2020, 9h01

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Médico idoso consegue liminar para se afastar do trabalho

Grupo de risco

Vara trabalhista gaúcha dá liminar para afastar idoso do ambiente de trabalho

Um médico que pertence ao grupo de risco para coronavírus obteve na Justiça do Trabalho de Porto Alegre o direito de se afastar das suas atividades no Hospital Conceição em decorrência da pandemia de Covid-19. Ele tem 70 anos, é hipertenso (pressão alta) e apresenta outros problemas de saúde que o tornam mais propenso a ter complicações decorrentes da infecção pelo vírus, aumentando o risco de morte.

A liminar foi concedida em caráter de urgência pelo juiz do trabalho substituto Jefferson Luiz Gaya de Goes, da 15ª Vara do Trabalho de Porto Alegre. Ele levou em conta, ainda, a escassez de materiais de proteção individual no hospital, como máscaras, e o fato de a esposa do médico também ser idosa e apresentar comorbidades (outras doenças simultâneas).

Ao justificar sua decisão, o magistrado ponderou o impacto do afastamento do profissional do atendimento aos pacientes da instituição, mas sustentou que o risco pessoal a que o médico estava exposto se antepõe a qualquer outra situação. “Não se olvida que a atividade do autor é essencial, especialmente no presente momento, para toda a coletividade. Assim, é evidente que o pedido do autor acarretará, caso acolhido, em prejuízo ao atendimento médico neste momento peculiar, especialmente em razão do caráter público do atendimento do réu. Todavia, o interesse público, no presente caso, cede espaço à garantia do direito à vida, que em ponderação de direitos se sobrepõe inequivocamente”, considerou o juiz.

A decisão afasta o médico do trabalho imediatamente, sem prejuízo da sua remuneração, pelo prazo inicial de 30 dias, sujeito a revisão. (Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-RS)

Revista Consultor Jurídico, 3 de abril de 2020, 8h32

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PL 1.179 para tempos que requerem medidas atípicas

*Os autores previamente agradecem o espaço aberto pela coluna Direito Civil Atual para a disponibilização de textos e ideias propositivas  a fim de que se possa contribuir para  a adoção de medidas jurídicas que ajudem no combate aos efeitos sociais deletérios causados a todos nós, cidadãos em geral, por força da pandemia causada pelo novo coronavírus. 

COVID-19, Lockdown e a Beira do Colapso Econômico
São de diversas ordens as preocupações que assolam, atualmente, grande parte da sociedade não só brasileira, mas também mundial durante a pandemia do Coronavírus. A economia brasileira, em especial, que se pensava finalmente estar saindo de um período deveras castigado, vai novamente atravessar um momento de enormes incertezas e, mais grave, sem perspectivas de melhoras a curto prazo.

É que os reflexos da crise sanitária da Covid-19 serão extremamente dolorosos notadamente sob o ponto de vista econômico e financeiro e mais ainda num país com reduzida capacidade de investimento e no qual a grande parte da população não dispõe muitas vezes do “pão de cada dia”.

Não é para menos, a adoção das penosas medidas de lockdown[1] mundo afora, embora não desejadas, mas sim porque se mostram verdadeiramente necessárias, dadas as inúmeras incertezas médico-científicas geradas pelo Coronavírus, compromete em alto grau a relações comerciais em todos os níveis, levando empresas à bancarrota, com demissões em massa, e ao inchaço do número de desempregados.

Não é, portanto, novidade que o regime de quarentena implantado em praticamente todos os Estados do país, com fechamento de shoppings centers, comércios e serviços em geral, impedimento de exercício de atividades individuais (autônomos), isolamento social, tem gerado um descompasso em cadeia que põe em sério risco a própria estabilidade econômica brasileira.

Felizmente, tais medidas, adotadas em praticamente todos os níveis de governo (federal, estadual e municipal), não estão sendo implementadas sem uma contrapartida do setor público, mesmo porque não haveria como se manter corrente pelo Poder Público as obrigações financeiras (v.g., trabalhistas, previdenciárias, tributárias) e mesmo as empresariais com o setor privado em geral (e.g., contratos com fornecedores e clientes), sob pena de colapso não apenas do pequeno e médio empresário, mas também dos grandes empreendedores do país.

Remédios Legais contra a Crise: a opção brasileira e as medidas adotadas na Alemanha, França e EUA
Diante desses fatos, é que se tem acompanhado, diariamente, uma série de medidas no âmbito legislativo que têm sido adotadas pelo Governo Federal, em conjunto com o Congresso Nacional, com o intuito de minimizar os impactos da crise do COVID-19.

A mais recente, que se encontra sob a condução do Senado Federal, é o PL 1.179/2020, do senador Antonio Anastasia, com perspectiva de que seja votado ainda esta semana no Congresso Nacional. Referido projeto de lei, num texto único, porém bem enxuto e direto, propõe-se a fixar normas de caráter emergencial e transitório e relacionadas ao direito privado em geral (v.g., direito do consumidor, direito civil, direito empresarial, direito concorrencial, direito de família e sucessões e lei do inquilinato)

Nesse aspecto, inspirou-se claramente nas regras também transitórias do direito alemão, que lá foram batizadas Ein Schutzschild für Beschäftigte und Unternehmen: Maßnahmenpaket zur Abfederung der Auswirkungen des Corona-Virus[2] [3], isto é, um pacote de medidas legais (com mudanças em regras de direito civil, empresarial, falimentar e processual penal) que busca proteger as empresas e trabalhadores da crise do Corona Vírus e que veio a ter força de lei no dia 27.03.2020. Não foi essa, todavia, a opção tomada, pelos menos até o momento, e especialmente no que diz respeito à seculares regras de direito privado, por outros países como a França e os Estados Unidos da América, os quais tem forte tradição de respeito aos contratos e preservação da autonomia das partes.

Sob o ponto de vista francês, o governo local, após a promulgação da Lei 2020-290, de 23 de março de 2020, tem se limitado a emitir Ordonnances, como as de n.º 2020-304[4] e 2020-306[5], disciplinando regras de direito processual e judiciário apenas, tais como, (i) prevendo a prorrogação de prazos processuais, recursais, decadenciais, prescricionais; (ii) fixando procedimentos de audiências por meio de videoconferência, (iii) suspendendo os efeitos de astreintes e cláusulas penais etc., tudo isso durante o período de urgência sanitária, com lá se tem denominado.

Não houve, portanto, pelo Estado francês, revisão de regras de direito privado propriamente ditas, tanto que no âmbito do direito contratual, por exemplo, as discussões a respeito dos efeitos jurídicos da Covid-19 vão se balizando pelas regras já existentes de force majeure, consagrada no art. 1218 do Code.

No caso dos Estados Unidos, o tão anunciado pacote de US$ 2.2 trilhões de estímulo à economia veio consolidado no Coronavirus Aid, Relief and Economic Security Act[6] e é muito mais um conjunto de estímulos financeiros ao mercado (tais como a prorrogação de empréstimos hipotecários; a redefinição de regras de direito fiscal e bancário; a assistência financeira a companhias aéreas; o seguro-desemprego para trabalhadores dispensados durante a pandemia etc.) do que um realinhamento de regras entre particulares.

Essas considerações iniciais parecem necessárias para que possamos avançar no estudo dos temas trazidos no PL 1.179/2020 e para que a doutrina e jurisprudência fiquem absolutamente atentas ao caráter restritivo e emergencial das regras nele previstas, sob pena de o colapso ganhar contornos também jurídicos.

O Projeto de Lei 1.179/20: extremis malis extrema remedia
A expressão é atribuída a ninguém menos que ao pai da medicina, Hipócrates: se extrema é a doença, extremo deve ser o remédio. E é essa, com efeito, a tônica impressa ao PL 1.179/20. Num contexto mundial de estremecimento de nossas vidas ordinárias por algo que, na Common Law, é denominado de act of God, no sentido de que se trata de algo não criado por ser humano e fora de seu controle, é necessário agir preventivamente para, pelo menos, tentar ordenar o caos. O tal remédio excepcional, ou a medida desesperada (na forma inglesa, desperate times call for desperate measures), não significa todavia deixar as coisas ainda mais instáveis pela introdução de regras jurídicas inconsequentes ou que se afastem demasiadamente do ordenamento positivo.

Na verdade, toda a situação parece lembrar a conhecida frase de Tancredi, no Il Gattopardo: “se queremos que tudo permaneça como está, é preciso que tudo mude”. Claro, a frase aqui está utilizada em um sentido diverso da que fora empregada no belíssimo romance de Tomasi di Lampedusa, porém o que se quer destacar é que, em casos como o presente, a estabilidade das relações sociais, pela própria magnitude e pelo caráter abrupto da mudança fenomênica que se experimenta, a qual torna impraticável a aplicação do modelo normativo existente, reivindica a urgente introdução, de maneira transitória em princípio, de ferramentas que até parecem contrárias às coisas existentes, mas cujo objetivo, ao fim e ao cabo, não é outro senão  o  de mantê-las.

Nesse sentido, o comentário de Otavio Luiz Rodrigues Junior, sabidamente um dos melhores especialistas do país na matéria, à Lei Faillot, que é, por sinal, expressamente mencionada na justificativa do Projeto dada a profunda similitude de contextos que une uma à outra: “introduzir um elemento de insegurança jurídica na cidadela aparentemente inviolável do pacta sunt servanda foi o único meio de que se pôde servir o Liberalismo para manter a estabilidade das relações jurídicas”.[7] É dentro de tal perspectiva que se deve pensar o Projeto. Sua virtude fundamental é, considerando a excepcionalidade do momento, buscar implementar instrumentos que assegurem  com justa medida e dentro de limites razoáveis uma momentânea mudança nas regras existentes a fim de preservar em definitivo o sentimento maior de segurança e constância que imantam o Direito  como um todo.

O Projeto de Lei 1.179/20: alguns comentários pontuais
Feitas as considerações acima destacadas, passa-se a uma rápida análise, muito mais informativa que com detalhes técnicos das principais alterações propostas pelo PL 1.179/20. Busca-se aqui realizar uma rápida compilação dos aspectos gerais e contratuais, deixando-se de lado pontos como o direito concorrencial e o de família e sucessões.

De partida, diga-se que o caráter provisório da medida, como informam os arts. 1º e 2º. O Projeto cuida inicialmente da prescrição e da decadência, estabelecendo o impedimento ou a suspensão da fluência dos respectivos prazos, conforme o caso, até 30/10/20 (art. 3º). A regra é de justiça porque, neste momento excepcional, aquele a quem não favoreça a contagem do prazo fatal o veria consumado contra si, embora estando fisicamente impedido de tomar alguma das medidas do art. 202 do CC para interrompe-lo.

Por outro lado, pela dimensão da crise não é mais o caso de sujeitar tal impedimento a uma comprovação individualizada. Ela deve, sim, salvaguardar a todos indistintamente. Por fim, é de se registrar que, como não poderia ser diferente, vale a mesma regra para a usucapião (art. 14).

Uma nítida preocupação do Projeto é flexibilizar as exigências no relativo às assembleias gerais e reuniões obrigatórias por determinação da legislação civil e empresarial para sociedades e pessoas jurídicas em geral, assim como em condomínio edifícios. Não se precisa enfatizar o quão correta é a preocupação, já que o isolamento social vem sendo considerado a medida primeira, dentre as recomendações sanitárias dadas pela OMS na batalha de contenção ao vírus. Isso, nada obstante irá afetar, por exemplo, uma sociedade anônima com marco para sua assembléia geral ordinária anual no meio da pandemia, ou de uma sociedade limitada que necessite alterar alguma disposição do contrato social para qual se requeria quórum qualificado.

A solução do Projeto é tão simples como eficiente: ficam igualmente tais prazos prorrogados até o dia 30/10/20. Isso, contudo, resolveria só parcialmente a vida das empresas, pois, como apontado acima, há situações onde é do interesse empresário um mudança interna e isso somente pode se fazer por deliberação societária em reunião ou assembléia. Para tanto, o Projeto, também seguindo o que já está sendo feito inclusive outros órgãos do Poder Público, permite a realização de tais atos de maneira virtual ou telepresencial, vale dizer, à distância ou de forma remota (art. 19).

Se a “necessidade é a mãe da invenção”, então aqui tem-se um efeito positivo do Coronavírus, pois parece que a pandemia acelerou a tomada de posição da burocracia estatal em favor do uso de  meios eletrônicos, o que até então era, em termos práticos, evitado, embora já fornecesse a legislação várias possibilidades para seu implemento. Aqui, acreditamos que não seria o caso nem de se falar em provisoriedade da medida, pois trata-se, em um mundo já tão virtual quanto físico, de algo destinado a tornar-se regra geral e não apenas pontual.

Na mesma linha, o Projeto dá poderes adicionais aos síndicos de condomínios edifícios pra restringir a utilização das áreas comuns a fim de evitar a contaminação do Coronavírus, bem como proibir a realização de reuniões, festividades, uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, se tais medidas se fizerem eventualmente necessárias para impedir sua propagação.

Importante aspecto do Projeto é o que se destina aos contratos. O Projeto andou muito bem ao estabelecer dois núcleos bem definidos para a aplicação da teoria da imprevisão: um, em relação aos contratos paritários, e o outro para situações negociais assimétricas, como a consumerista e a locatícia. No primeiro caso, não se consideram como imprevisíveis, o aumento da inflação, a variação cambial, a desvalorização ou substituição do padrão monetário. Contrariamente, no segundo caso, sim, poderia ocorrer a revisão. Na verdade, e aqui não se pretende, descer ao estudo detalhado de questões doutrinárias, o que parece é que se está fazendo prevalecer a teoria da onerosidade excessiva, tanto que, para as relações simétricas, onde, portanto, as partes envolvidas podem suportar um pouco mais o peso da alea, o que se estipula é que tais situações, em essência imprevisíveis, não se considerariam como onerosas.

Uma curiosa regra se refere aos produtos ou serviços adquiridos por entrega domiciliar (delivery), aos quais a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor fica mitigada também até 30 de outubro de 2020. Trata-se do prazo para arrependimento (desistência) do contrato que é, como se sabe, de sete dias do recebimento da mercadoria ou do produto. Os motivos do Projeto para a inclusão da excepcionalidade são quase autoexplicativos.

O aumento excessivo na procura de tais serviços aliado ao fato de que tais empresas sequer tiveram tempo de se estruturar para  fazer frente a essa demanda, pode ocasionar uma série de defeitos na prestação do serviço. Porém, nesses tempos de pandemia, o delivery desenvolve um serviço de utilidade social indiscutível, parecendo ser temerário deixar que em relação a tais empresas o consumidor possa simplesmente exercer seu direito de resistência. Isso não quer dizer, contudo, que ao consumidor se assegure as compensações previstas nos arts. 18 e 20 do CDC, cuja aplicação, observe-se, não é infirmada nos termos do Projeto.

Por fim, seria o caso de falar dos arts. 9º e 10º do Projeto, que tratam do contrato de locação. Este falando da suspensão do pagamento dos aluguéis em decorrência de situações que importem alteração econômico-financeira do locatário. O artigo, imbuído de claro sentimento de solidariedade social, contudo, parece não ter atingido um grau de consenso politico que viabilize sua aprovação no Senado, já havendo notícia de que teria sido retirado do texto para fins de votação. De toda sorte, a manutenção do art. 9º, que veda a concessão de liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo (art. 59 da Lei no 8.245/91) até 31 de dezembro de 2020, pelas mesmíssimas razões, constitui considerável alento para os milhões de brasileiros que sofrerão o baque econômico decorrentes da crise, sem, de todo modo, onerar demasiadamente os proprietários de bens imóveis.

Ponderações finais
Vivenciamos uma crise severa, a qual, diz Yuval Harari[8], é provavelmente a maior de nossa geração. Seria ingênuo, diante desse cenário, pretender que qualquer esforço legislativo para adequar o padrão normativo vigente à emergência que decorre da pandemia resultasse perfeito e imune a críticas. O Projeto de Lei 1.179/20 deve ser submetido a uma reflexão ampla por parte de juristas e demais profissionais que laboram no campo do Direito Privado a fim de que possa ser aperfeiçoado e atingir níveis de excelência ainda maiores do que os que já lhe são próprios. É de se parabenizar o esforço do senador Anastasia, que preside provisoriamente o Senado da República, bem como da comissão de juristas que lhe deu corpo, em especial o ministro Dias Toffoli (STF), o Ministro Antônio Carlos Ferreira (STJ) e o Conselheiro e Professor Otavio Luiz Rodrigues Jr. (CNMP/USP) pela iniciativa que, para além do sentimento de Justiça que traz consigo, implementa segurança jurídica e solidariedade social em tempos tão medonhos.

[1] Essas medidas de quarentena ou de isolamento, que têm sido aplicadas na grande maioria dos países, durante a atual pandemia, não se tratam de nenhuma novidade na história recente da humanidade. Basta lembrar que foi adotada, embora em proporções menores, quando das epidemias da peste negra e a peste bulbônica, ainda no século XIV, ou mesmo quando a epidemia de febre amarela desembarcou na Filadélfia durante o final do século XVIII, ou ainda quando a cólera chegou na Itália, no século XIX. Mais recentemente, vale lembrar o caso da gripe espanhola, que teve seu ápice após a 1ª Guerra Mundial, que infectou ¼ da população mundial da época, demandando a implantação de regimes de quarentena em diversos países.

[2] Em https://www.bundesfinanzministerium.de/Content/DE/Pressemitteilungen/Finanzpolitik/2020/03/2020-03-13-download-de.pdf?__blob=publicationFile&v=4.

[3] Essas alterações no direito alemão foram perfeitamente exploradas pelo Prof. Otávio Luis Rodrigues Jr. em recente artigo no Conjur: https://www.conjur.com.br/2020-mar-25/direito-comparado-alemanha-prepara-legislacao-controlar-efeitos-covid-19.

[4] Em https://www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte=JORFTEXT000041755577&dateTexte=&categorieLien=id.

[5] Em https://www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte=JORFTEXT000041755644&dateTexte=&categorieLien=id.

[6] Em https://www.congress.gov/bill/116th-congress/senate-bill/3548/text.

[7] RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Revisão Judicial dos Contratos. autonomia da vontade e teoria da imprevisão. São Paulo: Atlas, 2002. p. 33.

[8] Em: https://www.ft.com/content/19d90308-6858-11ea-a3c9-1fe6fedcca75.

 é sócio de Rocha, Marinho & Sales Advogados; doutor em direito processual (USP); presidente do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados, Seccional do Ceará; foi Visiting Scholar na Columbia Law School/New York e Juiz do TRE-CE.

Bruno Leonardo Câmara Carrá é juiz federal; doutor em direito civil (USP); professor nos cursos de graduação e pós-graduação em sentido estrito (mestrado acadêmico) da UNI-7; foi pesquisador visitante nas Universidade de Bolonha, Paris V e Oxford.