Opinião: Telemedicina vai mudar a maneira de pensar a saúde

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A sociedade informacional na qual estamos inseridos é cada vez mais ligada às tecnologias. As profissões utilizam novas tecnologias para conseguir maior eficiência e celeridade. O exemplo mais próximo diz respeito aos profissionais de Direito, com a utilização crescente de plataformas digitais e a migração de processos físicos para “processos judiciais eletrônicos”.

Na medicina, obviamente, não seria diferente. São cada vez mais usuais consultas online pelo sistema de telemedicina, o que fez o Conselho Federal de Medicina regulamentar a prática por meio da Resolução nº 1.643 de 2002.

O Congresso Nacional, no mesmo sentido, sancionou a Lei nº 13.989/20, que dispõe sobre o uso da telemedicina durante a crise causada pela pandemia da Covid-19. Perceba que tal lei tem eficácia somente enquanto perdurar a situação de crise em questão, mas será um excelente laboratório para a ampliação de ferramentas tecnológicas para consultas e tratamentos.

Da resolução do Conselho Federal de Medicina, extrai-se o conceito de telemedicina. O artigo 1º define-a como “o exercício da Medicina através da utilização de metodologias interativas de comunicação audiovisual e de dados, com o objetivo de assistência, educação e pesquisa em Saúde”. A Lei n. 13.989/20 trouxe definição semelhante no artigo 3º, expondo que telemedicina é o “exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde”.

Obviamente, esse tipo de consulta deve seguir padrões técnicos que garantam a segurança tanto do médico como do paciente atendido, tendo uma infraestrutura tecnológica apropriada e pertinente, obedecendo as normas técnicas do Conselho Federal de Medicina quanto a guarda, manuseio, transmissão de dados, confidencialidade, privacidade e garantia do sigilo profissional (artigo 2º da Resolução nº 1.643/02 do CFM).

Por sua vez, a Lei nº 13.989/20 deixa expresso no artigo 4º o dever de o médico informar o paciente sobre as limitações inerentes ao uso da telemedicina, tendo em vista a impossibilidade de realização de exame físico durante a consulta.

Percebe-se que a telemedicina pode representar um avanço, visto que ela pode ter inúmeros benefícios, como reduzir a distância, mesmo que de forma telepresencial, entre especialistas de grandes centros e regiões distantes. Em um território continental e diversificado como é o brasileiro, a falta do acesso a centros médicos especializados pode afastar os pacientes de novas técnicas e tratamentos. Ademais, em algumas áreas, existe dificuldade de preenchimento de vagas de profissionais de saúde e a telemedicina pode ser uma alternativa imediata viável.

Além disso, a evolução tecnológica pode trazer benefícios quando aliada a questões de saúde pública, pois evita aglomerações e filas desnecessárias nos hospitais e traz maior agilidade nas consultas. Inegável que a telemedicina é uma evolução natural da nossa sociedade, que está cada vez mais inserida no mundo digital.

O ordenamento brasileiro não é o primeiro a permitir o uso das novas tecnologias no âmbito médico. A telemedicina já é utilizada, por exemplo, nos Estados Unidos da América, estando presente em muitos hospitais e centros médicos. Naquele país, inclusive, existe um órgão regulador dessa prática, o ATA (American Telemedicine Association — Associação Americana de Telemedicina). A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) tem editado recomendações para o uso da telemedicina, com a ouvida de especialistas de diversas localidades para buscar uma visão plural sobre o tema [1].

Em relação às questões éticas sobre a prestação do serviço médico por meio da telemedicina, a Lei n. 13.989/20 menciona que “a prestação de serviço de telemedicina seguirá os padrões normativos e éticos usuais do atendimento presencial, inclusive em relação à contraprestação financeira pelo serviço prestado” (artigo 5º). Tais padrões deverão ser definidos pelo Conselho Federal de Medicina.

Por mais que a resolução do Conselho Federal de Medicina sobre o tema versasse sobre o uso de telemedicina, ele ainda não era utilizado de forma tão usual no Sistema Único de Saúde (SUS). Com a crise ocasionada pela pandemia da Covid-19 e o risco de colapso do sistema de saúde com muitos pacientes se dirigindo aos hospitais, buscou-se trazer maior celeridade e menos riscos de agravamento decorrentes da aglomeração de doentes em um mesmo ambiente, razão pela qual foi editada a Lei n. 13.989/20.

A própria lei menciona que não caberá ao poder público custear ou pagar pelos serviços de telemedicina quando não for exclusivamente serviço prestado ao SUS (artigo 5º). A contrario sensu, se o serviço de telemedicina for prestado exclusivamente ao SUS, caberá ao poder público custeá-lo. Percebe-se, portanto, uma clara permissão da utilização do serviço de telemedicina no sistema de saúde público.

A questão que surge é se seria possível ou não o uso da telemedicina após a situação de pandemia, uma vez que a lei tem caráter temporário.

O presidente da República vetou o artigo 6º da Lei nº 13.989/20, que mencionava competir ao Conselho Federal de Medicina a regulamentação da telemedicina após o período de crise ocasionada pela Covid-19. O argumento de veto foi o de que a matéria deveria ser regulada em lei, com base no artigo 5º, II e XIII, da Constituição Federal [2].

Ocorre que não parece haver empecilho legal para que o Conselho Federal de Medicina regulamente a matéria. Trata-se de uma autarquia federal que, entre as suas atividades, tem competência regulamentar e já se posicionou sobre vários temas de relevância, como o testamento vital e ortotanásia, que são temas, inclusive, mais sensíveis que a regulamentação da telemedicina. Assim, o dispositivo legal vetado era não só possível, como algo bastante razoável.

A telemedicina será testada em caráter ampliado em época de pandemia. Os resultados alcançados mudarão a forma de regulamentação da matéria. Ainda que a Lei n. 13.989/20 tenha vigência temporária e tenha sido vetado o dispositivo que delegava ao Conselho Federal de Medicina a autorização pós-pandemia, a experiência de utilização ampla e disseminada não será esquecida. Ela pode representar uma alternativa de baixo custo para atendimento em locais remotos e distantes de grandes centros. Certamente, representará uma mudança na maneira de pensar a saúde pública e privada, não havendo óbice para que o Conselho Federal de Medicina regulamente a matéria.

 é procurador do estado de Pernambuco e advogado, professor adjunto da Universidade de Pernambuco (UPE), doutor e mestre em Direito pela USP.

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