Eduardo Caetano: Covid-19 e os direitos fundamentais

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Hodiernamente muito utilizado, mas pouco compreendido, o termo “Estado Democrático de Direito”, encerra diversas peculiaridades, o que dificulta ainda mais sua conceituação, sobretudo quando estamos diante de uma pandemia denominada Covid-19.

A Carta Constituinte trata desse termo logo em seu primeiro artigo, adjetivando a República Federativa do Brasil, bem como consagra os princípios fundamentais como a soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

O Estado Democrático de Direito, portanto, exige, sobretudo em tempos de Covid-19, que seja regido pelo Direito e por normas democráticas, haja vista que o povo escolhe os seus representantes, os quais agem como mandatários daquele, porém esse poder delegado não é absoluto.

Nesse sentido leciona José Afonso da Silva, “a tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social”.[1]

Portanto, o Estado Democrático de Direito deve garantir a dignidade e cidadania. Ou seja, a dignidade da pessoa humana e a cidadania foram colocadas na esfera de fundamentos da República justamente para validar a existência do Estado Democrático de Direito. A idéia central de dignidade da pessoa humana, como uma proposição formada por vários conteúdos, dentre os quais estão os chamados direitos individuais e os políticos, além dos direitos sociais, culturais e econômicos.

Ora, nesse mesmo contexto precisamos entender com certa reserva as decisões que são adotadas pelos Governantes, pois geralmente essas mesmas pessoas, eleitas pelo povo, passam a legislar sem a devida competência para o referido cargo, agindo de maneira proeminente, deixando de lado o Princípio Constitucional que é o pilar-base da nossa conceituação jurídica.

Na situação pandêmica causada pela Covid-19, anote-se, muitas vezes, sem a devida lógica jurídica, percebemos a obstrução desastrosa da “liberdade de ir e vir”, ocasionando uma insegurança à população, pois não respeita a competência.

II – CIDADANIA, DIREITOS CIVIS E SOCIAIS
O termo cidadania foi forjado ao longo das lutas do povo marcadas na história, trazendo em sua concepção um conjunto de valores construídos a partir do surgimento da cultura de cada nação.

Certamente esse conceito está em processo de constante evolução, tendo como base uma participação ativa da sociedade em seus diversos formatos. Desta forma, cidadania é a ocorrência da conscientização de que o Estado Democrático de Direito só existirá caso tenha como arrimo a Dignidade da Pessoa Humana e os Direitos Humanos amplamente garantidos.

Os direitos civis referem-se às liberdades individuais, como o direito de ir e vir, de dispor do próprio corpo, o direito à vida, à liberdade de expressão, à propriedade, à igualdade perante a lei, a não ser julgado fora de um processo regular, a não ter o lar violado.

Esse grupo de direitos tem por objetivo garantir que o relacionamento entre as pessoas seja baseado na liberdade de escolha dos rumos de sua própria vida — por exemplo, definir a profissão, o local de moradia, a religião, a escola dos filhos, as viagens – e de ser respeitado. É preciso ressaltar que liberdade de cada um não pode comprometer a liberdade do outro.

Ter os direitos civis garantidos, portanto, deveria significar que todos fossem tratados em igualdade de condições perante as leis, o Estado e em qualquer situação social, independentemente de raça, condição econômica, religião, filiação, origem cultural, sexo, ou de opiniões e escolhas relativas à vida privada.

Dessa forma, o exercício e a garantia dos direitos civis não existem sem a tolerância e o convívio com os diferentes modos de ser, sentir e agir. Se reivindicamos o direito às nossas liberdades individuais, assumimos ao mesmo tempo o compromisso e a responsabilidade de zelar para que essas liberdades existam para todos. Preocupar-se com a garantia dos direitos significa tanto exercitá-los em nossa vida quanto construir no cotidiano condições que permitam a sua ampla realização.

A condição fundamental para a garantia dos direitos civis é de natureza social. Logo, se em uma sociedade determinados grupos ficam excluídos desses direitos, essa desigualdade atinge não apenas as pessoas que sofrem as violações, mas a todos, inclusive aqueles que têm seus direitos garantidos. O nosso cotidiano está repleto de exemplos: cidadãos negros são quase sempre considerados mais “suspeitos” do que os brancos no caso de roubos.

Para que os direitos sociais sejam estendidos a todas as pessoas, é preciso, em primeiro lugar, que todos já tenham o direito à vida assegurado. Todas as coisas que possuímos, perdem valor quando a nossa vida está ameaçada. Nenhum bem humano é superior à vida, que é o bem maior de qualquer pessoa. Ao valorizar a minha vida e a do outro, estou valorizando a humanidade. Mas, além de garantir a vida, há ainda que se viver com dignidade, o que requer a satisfação das necessidades fundamentais.

Quando estamos diante de uma situação pandêmica como a Covid-19, certamente passamos pelo enfrentamento de situações que colocam em risco a própria situação do direito ao trabalho, pois precisamos, em alguns casos, reinventar a maneira como o ser social irá desenvolver o seu labor e, não longe disso temos as denominadas condições de trabalho adaptadas, como é o caso do trabalho em casa, mais conhecida como “home office”.

III – UNIVERSALIZAÇÃO E POSITIVAÇÃO PELAS DECLARAÇÕES DE DIREITOS
Com a promulgação da DUDH — Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) em razão do período pós segunda guerra, situação que deu margem ao surgimento de correntes que tratam da promoção do DIDH (Direito Internacional dos Direitos Humanos), sendo essas correntes a universalista e a relativista.

Para Humberto Lima de Lucena Filho, a idéia da corrente universalista se debruça na incumbência de desafiar problemas locais ou em escala regional sob a perspectiva da norma, que leva em conta a especificidade de certos direitos como para elevá-los ao patamar de inerentes, indivisíveis e interdependentes, irrenunciáveis, imprescritíveis e etc.

Não obstante, Norberto Bobbio aponta que a afirmação de direitos do homem se seu em três fases, sendo que a última delas é a universalidade, assinalando em que momento e qual o meio em que se iniciou o processo de universalização.

Somente depois da Declaração Universal é que podemos ter a certeza histórica de que a humanidade — toda a humanidade — partilha alguns valores comuns; e podemos, finalmente, crer na universalidade dos valores, no único sentido em que tal crença é historicamente legítima, ou seja, no sentido em que universal significa não algo dado objetivamente, mas algo subjetivamente acolhido pelo universo dos homens.

Quando a comunidade internacional reconhece a importância da DUDH   para o estabelecimento de um mínimo de proteção a todo ser humano, através de cada Estado que a ratificou, este não foi senão o primeiro passo do processo de sua universalização.

Assim, a universalização de direitos é o aspecto mais complexo no que tange à outras questões que são discutidas sobre o tema.

A questão central pulsante diz respeito, dentre outras de menor complexidade, à possibilidade de se estabelecer um padrão mínimo de direitos aplicáveis a uma universalidade de sociedades marcadas por sensíveis diferenças de ordem histórico-cultural, sob a alegação de que é necessária a manutenção de um nível básico de respeito.

É a partir do idealismo da universalização trazido no bojo da DUDH  que surge a teoria do relativismo cultural, abrindo um leque para discutir a necessidade da relativização dos direitos humanos em contrapartida das facetas culturais que problematizam a possibilidade de universalização dos direitos humanos.

O florescimento da teoria do relativismo cultural se dá em meio á críticas pelas quais foi exposta a teoria universalista, tendo em vista o questionamento suscitado pela doutrina internacional no sentido de serem ou não os direitos trazidos pela DUDH realmente universais, em razão de os países que votaram e participaram de sua redação serem em maioria, ocidentais.

Desta forma, o raciocínio dos relativistas baseia-se na ideia de que os mandamentos da DUDH não são impostos, não sendo, portanto, obrigatórios, em função do número pequeno de Estados que participaram da elaboração do texto do citado documento.

Isto porque, a importância de entendimentos diversos como que para agregar valor à corrente universalista, ou mesmo para mostrar pontos em que esta teoria necessita de melhoria, a teoria relativista permite de forma direta, a relativização de direitos básicos — que embora já sedimentados no ocidente — sofrem as consequências da ingerência de uma teoria pouco possível na prática, levando a graves violações de direitos que causam incontáveis traumas àqueles que estão desprotegidos pela ordem internacional.

REFERÊNCIAS:
1) AGRA. Walber de Moura. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

2) ALVIM, J. E. Carreira Alvim; CABRAL, Luciana G. Carreira Alvim Cabral. Nova execução de Título Extrajudicial. Comentários à Lei 11.382/06. 3ªed. Curitiba:Juruá, 2007.

3) ALVIM NETTO, José Manuel de Arruda. Tratado de direito processual civil. 2ª ed., Vol 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.

4) BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18ª Ed. Brasil: Malheiros, 2006.

5) CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6ª Ed. Coimbra: Almedina, 1995.

6) DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 20a ed. São Paulo: Saraiva, 1998.

7) BRASIL,Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988.

8) CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

9) MARSHALL, Thomas Humphrey. Cidadania, classe social e status. Rio de Janeiro.  Zahar Editores, 1967.

10) GUERRA, Sidney. Direitos humanos: curso elementar. São Paulo: Saraiva, 2013, p.286

11) BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico – Lições de Filosofia do Direito, São Paulo, 1996, Ícone Editora.

 é diretor do Departamento Jurídico do Ipem (Inmetro em SP), advogado, sócio fundador da Caetano Advogados Associados. Mestre em Filosofia do Direito — Unimes/Universidade Metropolitana de Santos, mestrando em Direito Constitucional Processual Tributário (PUC-SP), pós- graduado em Direito Internacional (University of Pennsylvania), pós-graduado em Direito Internacional Europeu (Universidade de Coimbra), pós-graduado em Direito Tributário (Ibet), especialista em Direito Urbanístico e o Meio Ambiente Urbano (Instituto de Filosofia e Teologia Paulo 6º – Mogi das Cruzes-SP) e especialista em Direito Tributário Internacional para o Mercosul (Universidade Austral/Buenos).

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