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Leonardo Carvalho: Riscos trabalhistas na volta das atividades

Com base nos preceitos legais da Constituição Federal do Brasil, do Código Civil e da CLT, temos que o empregador responde por danos que causar aos seus trabalhadores e a terceiros, os quais podem ser classificados como decorrentes de responsabilidade objetiva ou responsabilidade subjetiva.

Diferencia-se a responsabilidade subjetiva da responsabilidade objetiva em razão de que esta última dispensa a demonstração de culpa pelo causador do dano. Em outras palavras, na responsabilidade objetiva, se foi comprovado o dano e o nexo entre a conduta e o acometimento da Covid-19, pouco importa se houve culpa exclusiva do trabalhador, culpa concorrente ou culpa exclusiva da empresa para a configuração de sua responsabilidade civil. Essa discussão inclusive já foi pacificada pelo Superior Tribunal Federal por meio do Tema 932.

Portanto, indaga-se: ocorrendo o acometimento da Covid-19 pelos empregados que estejam laborando no estabelecimento, quais são as implicações trabalhistas?

Após a declaração de pandemia pelo Decreto Legislativo nº 6 de 20 de março de 2020, diversas normas jurídicas foram publicadas, entre elas a Medida Provisória 927/2020. Ela dispôs em seu artigo 29 que não se consideram como doença ocupacional os casos de contaminação de trabalhadores pela Covid-19.

Ao se caracterizar como doença ocupacional equiparada a acidente de trabalho, o empregado, quando afastado por mais de 15 dias pela Previdência Social, adquire estabilidade de 12 meses e, na hipótese de permanecer com alguma sequela ou vir à óbito, poderá ensejar responsabilidade civil do empregador.

Através de inúmeras ações de inconstitucionalidade ajuizadas no STF, o plenário suspendeu a eficácia do artigo 29 da MP 927/2020. Portanto, prevalecem os preceitos legais anteriores à MP 927/2020.

Dito isso, caso um empregado que labore em uma empresa cuja natureza da atividade implica na exposição ao risco de contrair a Covid-19, isto é, responsabilidade objetiva, como ocorre com empregados de hospitais, presume-se que houve doença ocupacional decorrente de acidente de trabalho, caso demonstrado apenas o nexo causal.

Em atividades cuja responsabilidade é subjetiva, permanece a necessidade de demonstrar, além do nexo causal, se houve ou não culpabilidade.

Diante do que foi mencionado, vejamos sugestões de práticas a serem adotadas para mitigar os riscos de caracterização de doença ocupacional, equiparada a acidente de trabalho, sob o argumento de que inexistiu nexo causal, culpa exclusiva do empregador ou culpa concorrente: I) documentar por meio de políticas, comunicados ou memorandos, todos os processos adotados pelo empregador, com ampla divulgação no ambiente laboral; II) treinar os empregados sobre as medidas adotadas, com registro de presença na participação do treinamento; III) revezar o teletrabalho entre equipes, para que nem todas as equipes permaneçam juntas no local de trabalho; IV) instalar proteções e reposicionar os empregados em linhas de produção, ambiente de vendas, balcões, posto de atendimento; V) remanejar filas, salas de espera, recepção, entre outras hipóteses que possam resultar em agrupamento de pessoas; VI) estimular o uso de videoconferências, em contraponto às reuniões presenciais; VII) distribuir os novos equipamentos de proteção individual e coletiva, como pontos de utilização do álcool em gel, máscaras faciais como parte do uniforme, proteção para os pés e produtos para a higiene de equipamentos do dia a dia; VIII) divulgar regulamentos para o uso das áreas comuns como copa, lounge, salas de reuniões, provadores, banheiros e elevadores; IX) acelerar processos de automação face o momento de maior aceitação pelos clientes; X) criar protocolos de higienização de insumos e produtos manuseados pelos empregados; XI) agendar atendimento aos clientes e segmentar, na medida do possível, grupos de risco; e XII) medir temperatura dos trabalhadores para orientar o afastamento.

Caberá principalmente ao empregador evitar a demonstração de culpa exclusiva ou concorrente. Caso inexista exame laboratorial, a demonstração do dano é fragilizada, podendo-se caracterizar por inúmeras doenças similares, reforçando tese de defesa. No mesmo sentido, fica prejudicada a configuração de nexo causal daqueles que não estão comparecendo ao local de trabalho.

Por fim, adotadas as referidas medidas, face ao cenário atual de contaminação comunitária, haverá robusta documentação para eximir o empregador de culpa ou mesmo nexo causal, vez que se demonstraria terem sido adotadas as medidas preventivas. Embora não tenhamos posicionamento jurisprudencial sobre casos concretos, as medidas preventivas serão fundamentais para a mitigação dos riscos de configuração de doença ocupacional, equiparada a acidente de trabalho, com a consequente responsabilização civil no caso de óbito ou sequelas pelo empregado.

Leonardo da Costa Carvalho é sócio das áreas trabalhista e previdenciária do escritório BVA Advogados.

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Atividade não exclusiva de advogados deve ser tributada?

À primeira vista o caso pode parecer pequeno e isolado, pois se refere apenas à atividade de arbitragem, mas tem tudo para se tornar explosivo no âmbito da advocacia como um todo. O ponto central é saber se atividades não privativas de advogados podem ser tributadas através da sociedade de advogados ou se devem ser tributadas diretamente na pessoa física do advogado prestador de serviços.

O leading case no âmbito federal foi julgado em 3 de março de 2020, Acórdão nº 2402-008.171, pelo Carf, por voto de qualidade. Foi decidido que os serviços de árbitro seriam prestados de forma personalíssima por uma pessoa física, de forma que a tributação não poderia se dar no âmbito da pessoa jurídica.

O caso em tela envolvia uma sociedade simples pura constituída por advogados e inscrita perante a Ordem dos Advogados do Brasil. A sociedade recebeu honorários decorrentes da prestação de serviços jurídicos no processo arbitral, o que se deu por meio da atuação como árbitro por um de seus sócios.

O relatório de fiscalização que acompanhou o auto de infração partiu do pressuposto de que as atividades de natureza civil ou comercial praticadas com o fim especulativo de lucro deveriam ser tributadas por contribuintes pessoas jurídicas, ao passo que os rendimentos do trabalho pessoal, como salários, honorários do livre exercício de profissões, proventos de ocupações ou prestação de serviços não comerciais e royalties, deveriam ser tributados como rendimentos de pessoas físicas.

No voto vencedor e nas declarações de voto dos conselheiros que acompanharam o voto vencedor, preponderou o entendimento de que seria impossível a tributação dos honorários obtidos pelo exercício da arbitragem seja feita na pessoa jurídica.

De fato, a lei de arbitragem estabelece que o árbitro pode ser qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes [1]. Tal dispositivo normativo é utilizado como fundamento para a inferência de que o serviço de arbitragem é exclusivo de pessoa física, não sendo passível de exercício e tributação por uma pessoa jurídica.

Como se observa, trata-se de argumento falacioso, pois, levado tal argumento ao extremo, não poderia haver incidência tributária pelas sociedades de advogados, uma vez que apenas advogados podem advogar. Sabe-se que, ainda que as atividades dos advogados sejam exercidas individualmente, os honorários serão revertidos para a sociedade nos termos do artigo 37 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB [2].

Nessa linha, o Código de Ética e Disciplina da OAB menciona que a prestação de serviços profissionais por advogado, individualmente ou integrado em sociedades, será contratada, preferentemente, por escrito, sendo que tal prestação individual ou pela sociedade pode se dar igualmente na mediação, conciliação ou arbitragem [3].

Ademais, a regra de sigilo profissional presente no Código de Ética e Disciplina da OAB menciona expressamente que o advogado pode exercer a função de mediador, conciliador e árbitro, devendo sempre se submeter a tal regra [4].

A partir da leitura do voto vencedor e das declarações de voto no mesmo sentido, é possível observar o argumento de que, como a atividade de arbitragem não é exclusiva de advogados, havendo inclusive item diverso da advocacia na lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03, ela deveria ser prestada e tributada na esfera da pessoa física que a efetua. Ora, isso não faz com que tais rendimentos devam ser necessariamente auferidos pela pessoa física.

Ainda que tal argumento tivesse alguma importância, nota-se que a Resolução CNJ nº 75/09 determina que o exercício de atividade de arbitragem é considerado atividade jurídica [5].

Em igual sentido, conforme a Ementa nº 24/13 do Conselho Federal da OAB, a arbitragem faz parte da natureza da advocacia, sendo que as receitas de tal atividade podem ser tratadas como receitas da sociedade de advogados [6].

Diferentemente do exposto no acórdão do Carf, não há que se falar que a OAB está determinando a sujeição passiva ou a forma de tributação dos serviços de árbitro ao prescrever que tais receitas podem ser tratadas como da sociedade de advogados. Muito pelo contrário, o tratamento contábil e tributário de tais receitas no campo da pessoa jurídica tem fundamento na lei tributária.

Tendo em vista que o caso envolve a prestação de serviços profissionais de profissão regulamentada por sociedades civis, isto é, a advocacia, o artigo 55 da Lei nº 9.430/96 prevê que essas sociedades são tributadas pelo Imposto de Renda de acordo com as normas aplicáveis às demais pessoas jurídicas [7].

Logo, há fundamento legal para a tributação na pessoa jurídica da prestação de serviços profissionais de profissão regulamentada e, considerando que a atividade de arbitragem é modalidade de atividade jurídica, não há óbice para que tal tributação se dê na pessoa jurídica.

Ainda que descartássemos o referido dispositivo legal, vale lembrar que o artigo 129 da Lei nº 11.196/05 estabelece que a prestação de serviços intelectuais, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, sujeita-se tão somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas para fins fiscais e previdenciários [8].

No voto vencedor, entendeu-se que o artigo 129 da Lei nº 11.196/05 apenas seria aplicável quando há um vínculo entre o tomador dos serviços e a empresa prestadora de serviços, sendo que na arbitragem o árbitro não possui vínculos com as partes contratantes.

Tal interpretação nos parece forçosa, visto que inexiste tal restrição no texto do referido dispositivo normativo. O afastamento do artigo somente seria possível caso houvesse comprovação de que não se tratava de serviço intelectual, o que não acontece no caso em tela.

Em uma das declarações de voto de conselheiro que acompanhou o voto vencedor, consta que o artigo 129 da Lei nº 11.196/05 exige que o serviço deva ser realizado pela sociedade prestadora de serviços, o que não ocorre no caso de atividade de árbitro, que é feita por pessoa natural.

Mais uma vez, resta notória uma confusão no que tange ao próprio conceito de pessoa jurídica. No caso de qualquer prestação de serviço por pessoa jurídica, há uma atividade laboral realizada por uma pessoa natural, visto que a pessoa jurídica é uma abstração.

A título de ilustração, quando um mecânico constitui uma pessoa jurídica para exercer as suas atividades de reparos automotivos, ele possivelmente fará os reparos (com auxílio ou não de empregados) em nome da pessoa jurídica por ele detida.

Não é diferente do caso em que há a contratação de uma pessoa jurídica constituída por um intérprete de música brasileira para a realização de um sarau com duração de uma hora. Por mais incrível que pareça, quem irá efetivamente cantar será aquele intérprete musical, e não a pessoa jurídica.

Projetemos isso para outros casos em que a atividade prestada por advogados não é exclusiva da profissão, tal como nos casos de Habeas Corpus, defesas perante tribunais administrativos fiscais, pareceres, entre vários outros. Constatar-se-á a explosividade do tema em debate.

A decisão do Carf acertou nos árbitros, mas muitas outras atividades não privativas da advocacia estão na mira. É necessário ter cautela muita cautela. A OAB deveria se atentar a isso e acompanhar de perto a necessária judicialização do tema.

 é advogado e sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Melo, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados; é professor da Universidade de São Paulo e doutor em Direito pela mesma Universidade.

 é conselheiro titular da 1ª Seção do Carf, ex-conselheiro titular da 2ª Seção do Carf, doutorando em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Direito Comercial pela USP e bacharel em Direito pelo Mackenzie e em Contabilidade pela USP. Professor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT), coordenador do MBA IFRS da Fipecafi e professor do mestrado profissional em Controladoria e Finanças da Fipecafi.

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Escritório Bidino & Tórtima Advogados abre filial em São Paulo

Novos ares

Escritório Bidino & Tórtima Advogados abre filial em São Paulo

O escritório carioca Bidino & Tórtima Advogados, fruto da fusão das bancas Claudio Bidino Advogados e Tórtima, Tavares & Borges no Rio de Janeiro, abriu filia no bairro de Pinheiros, em São Paulo.

Comandada pelos advogados Claudio Bidino e Fernanda Tórtima, a banca tem atuação exclusiva na área jurídico-penal, de forma consultiva ou contenciosa.

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Revista Consultor Jurídico, 20 de maio de 2020, 9h14

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Acidente de motofretista autoriza responsabilização objetiva

Atividades profissionais desempenhadas por meio do uso de motocicletas colocam o trabalhador em permanente situação de vulnerabilidade. Sendo assim, caso haja acidente, há responsabilização objetiva do empregador. 

Para TRT-18, não ficou comprovada culpa exclusiva do entregador
Reprodução

Foi com base nesse entendimento que a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região reverteu decisão que reconhecia culpa exclusiva da vítima em acidente de trabalho. A decisão foi proferida no último dia 6. 

“Conforme jurisprudência dominante, em se tratando de atividade que, pela sua natureza, pressupõe a utilização de motocicleta, aplica-se a teoria da responsabilidade objetiva, prevista no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil”, afirma o relator do caso, desembargador Platon Teixeira de Azevedo Filho. 

O magistrado também considerou ser “plenamente aplicável a responsabilidade objetiva, cumprindo esclarecer que mesmo sendo possível excluir o nexo de causalidade, a partir da constatação de culpa exclusiva da vítima, é necessário prova cabal desse fato”, o que a ré não forneceu. 

O caso concreto envolve um entregador que se acidentou em 2017. Realizada perícia médica, foi constatado que o homem perdeu parcialmente sua capacidade laborativa, ficando com danos estéticos no quadril e na coxa esquerda, em razão da perda de tecidos moles e atrofia muscular. 

Para o TRT-18, também não restou comprovada a culpa exclusiva do trabalhador, já que o único depoimento colhido em juízo não demonstra que o entregador agiu de forma negligente com relação às leis de trânsito.  

“Acrescento, por oportuno, que malgrado a baixa qualidade da digitação do depoimento prestado pela única testemunha levada a juízo pela ré, por vezes até dificultando a compreensão da narrativa, certo é que algumas informações devem ser vistas com reserva, não servindo como determinante à culpa exclusiva do reclamante”, afirma Azevedo Filho. 

Desta forma, o tribunal deferiu pedido de pensão mensal, a partir do acidente, até o dia em que o trabalhador completar 78 anos de idade, no montante de 45% da média da remuneração por ele recebida, com pagamento dobrado em dezembro de cada ano, correspondente ao 13º salário. Além disso, condenou a empresa a indenizar o autor em R$ 10 mil por danos morais e R$ 4 mil por danos estéticos. 

A advogada trabalhista Juliana Mendonça foi responsável por defender o reclamante. “O Tribunal Superior do Trabalho firmou entendimento de que o simples fato de o empregador não ter contribuído diretamente para a ocorrência do acidente não torna o trabalhador exclusivamente responsável pelo infortúnio, principalmente em atividade de risco como a de motociclistas entregadores”, diz. 

Clique aqui para ler a decisão

0010616-05.2019.5.18.0111