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Ex-presidente do Palmeiras é condenado por atuação como cambista

Nenhum direito fundamental, tampouco a liberdade econômica, é absoluto, encontrando, isso sim, limites frente a outros direitos fundamentais, tal como ocorre diante do direito fundamental à regularidade das relações de consumo.

Mustafá Contursi foi presidente da Sociedade Esportiva Palmeiras entre 1993 e 2004
Reprodução

Com base nesse entendimento, o juiz Ulisses Augusto Pascolati Junior, do Juizado do Torcedor do Tribunal de Justiça de São Paulo, condenou por cambismo o ex-presidente do Palmeiras Mustafá Contursi, uma sócia do clube e um integrante de torcida organizada.

Consta nos autos que Contursi repassava para os outros dois réus ingressos que recebia gratuitamente da Crefisa, patrocinadora do clube. A ideia da empresa era que Contursi distribuísse as entradas entre conselheiros, sócios e torcedores do Palmeiras, a fim de popularizar o time e estreitar relações com a patrocinadora. No entanto, o réu, segundo a denúncia, repassava os bilhetes para que fossem vendidos por preço superior ao estampado.

O esquema se encerrou quando a atual presidente da Crefisa, Leila Mejdalani Pereira, passou a suspeitar da destinação que era dada aos ingressos de cortesia, pois não recebia nenhuma ligação em agradecimento das pessoas supostamente beneficiadas, além do fato de que o departamento de marketing passou a receber ligações de terceiros interessados em “comprar ingressos”.

De acordo com o juiz, ficou comprovada a infração aos artigos 41-F e 41-G do Estatuto de Defesa do Torcedor. “Tais normas penais incriminadoras tutelam a regularidade das relações jurídicas que circundam o torcedor-consumidor, especialmente no que toca ao preço dos ingressos de eventos esportivos e ao acesso isonômico aos estádios de futebol”, disse.

Além disso, afirmou o magistrado, o estatuto garante ao torcedor-consumidor, e por isso o reforço das normas penais, um sistema de vendas de ingressos ágil, transparente, seguro e com amplo acesso às informações, “bem como um sistema que garanta ao espectador torcedor um lugar determinado no estádio, direitos estes que ficam prejudicados pela venda ilegal de ingressos”.

Junior também destacou “inúmeros elementos de prova angariados nos autos” que, segundo ele, são “mais do que suficientes” para embasar a condenação. Contursi foi punido com três anos e dez meses de reclusão. Ele teve a pena privativa de liberdade convertida em duas restritivas de direitos: pagamento de 25 salários mínimos em favor de uma instituição social e de 34 dias-multa pelo valor unitário de 1/2 do salário mínimo vigente na data dos fatos.

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Kfouri e Knoerr: Monitoramento por celular é ofensa à intimidade

Não se pode negar que o avanço tecnológico multiplica desmedidamente a capacidade humana de conhecer dados e informações. E, assim, embora a tecnologia possibilite o monitoramento do aparelho celular para a localização de seu usuário por parte da companhia telefônica, esse uso é ilícito. E é ilícito para qualquer fim. Deve-se abandonar a justificação despótica dos fins pelos meios.

Há, nesse caso, uma violação ao direito de intimidade. Mas de que forma alguém pode sofrer uma violação de sua intimidade sendo monitorado em plena via pública?

Quem faz uso de um telefone celular emprega o aparelho para, quando e onde quiser, fazer chamadas telefônicas e até mesmo para outros variados fins, todos, no entanto, dependentes da vontade do próprio usuário, que, em qualquer hipótese, estará protegido pelo sigilo telefônico previsto pelo artigo 5º, XII, da Constituição Federal, pois “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e  das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

É claro, portanto, que o uso do telefone celular, para qualquer finalidade, depende do consentimento de seu usuário, exceto nos casos em que a interceptação for autorizada pelo Poder Judiciário.

Por isso, não importa o fato de o usuário estar ou não em via pública. Fato é que a interceptação de dados oriundos do telefone celular, sem autorização do usuário e sem enquadramento na hipótese constitucional de interceptação excepcionalmente permitida pela Constituição Federal, atinge o seu direito de ser dono de sua própria individualidade.

Acordos feitos para esse fim por entes do poder público com as companhias exploradoras do serviço de telefonia celular não podem ter esse alcance, por mais que a tecnologia o permita, pois, como ensinou Paulo José de Costa Júnior no livro “O Direito de Estar Só”, “o mais desconcertante não é a verificação objetiva do fenômeno, não é observar que a tecnologia acoberta, estimula e facilita o devassamento da vida privada; é tomar conhecimento de que as pessoas condicionadas pelos meios de divulgação da era tecnológica (a serviço, portanto, de seus desígnios, em termos estritamente apologéticos), sentem-se com intimidade”. (Editora RT, 4ª edição, p. 15).

Os direitos fundamentais são definidos pelo caput do artigo 5º da Constituição Federal, essencialmente da liberdade e da segurança jurídicas, proclamadas como direitos fundamentais e direitos subjetivos do indivíduo em face do Estado, aqueles oponíveis em razão da sanção estatal, por sua vez, no caso de repressão submissíveis ao Poder Judiciário.

Note-se o inciso décimo desse mesmo artigo quando define a inviolabilidade da intimidade da vida privada das pessoas, na mesma medida, complementa o inciso XII quanto à inviolabilidade das telecomunicações, salvo na parte final, quando excepciona para investigação criminal ou para produção probatória, no curso das instruções penais, que são limitadas e definíveis quanto ao rito, quanto ao procedimento e à justificação pelo artigo primeiro da Lei 9.296 de 96, inclusive o artigo 2º confere expressas redações para a quebra de sigilos.

Pois bem, quando se trata da intervenção do estado na vida privada do cidadão, tem-se de questionar, ou seja, quais são os limites da competência? A partir do momento em que os estados e os entes públicos devem agir de forma adstrita na juridicidade.

O artigo 25 da Constituição Federal define que são competências dos estados e membros aquelas não vedadas pela Constituição Federal, note o parágrafo 1º, e daí nos remetemos à leitura do artigo 21, inciso XVII, quanto à competência da União, quer seja de planejar e de promover a defesa permanente quanto as calamidades públicas. E daí que numa leitura conjugada no artigo 21, inciso 5º, nota-se que não estamos no âmbito do estado de defesa, no estado do sítio ou no âmbito de uma intervenção federal dos estados ou dos municípios, enfim.

Aí há de se questionar as ações invasivas dos estados em razão da intimidade do cidadão, que são submissíveis ao Poder Judiciário pois parecem patentemente inconstitucionais e ilegais.

Gustavo Swain Kfouri é advogado, mestre em Direito Constitucional pela UNIBRASIL, professor visitante da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), membro fundador da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDCONST) e doutor em Direito do Estado pela Universidade Federal de Santa Catarina.

Fernando Gustavo Knoerr é advogado, professor do programa de Mestrado e Doutorado em Direito do UNICURITIBA, pós-doutor em Direitos Humanos pelo Ius Gentium Conimbrigae da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal) e doutor e mestre em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná.