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Escavador não indeniza por publicação de processo público

É lícita a divulgação por provedor de aplicações de internet de conteúdos de processos judiciais, em andamento ou findos, que não tramitem em segredo de justiça, e nem exista obrigação jurídica de removê-los da rede mundial de computadores, bem como a atividade realizada por provedor de buscas que remeta aquele.”

Reprodução

Esta é a tese, ipsis literis, aprovada pelos integrantes do 3º Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao acolher incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) proposto pelo site de buscas Escavador, no desfecho de uma ação por responsabilidade civil ajuizada por um reclamante em ação trabalhista.

O relator do acórdão no 3º Grupo Cível e voto vencedor, desembargador Jorge Luiz Lopes do Canto, considerou lícitas as consultas a dados judiciais por parte do site, exceção feita aos processos submetidos a segredo de justiça — o que não era o caso dos autos, mas que deu motivo para uma ação indenizatória por danos morais.

Assim, cumpre destacar a licitude da atividade exercida pela proponente, a qual apenas reproduz as informações disponibilizadas pelo Diário Eletrônico da Justiça, sendo, portanto, hipótese de exercício regular de direito, não havendo que se falar na prática de ato que ateste direito de indenização”, resumiu o desembargador-relator, acolhendo a tese da parte ré e negando, por consequência, apelação da parte autora

Indenizatória por danos morais
A controvérsia teve início quando o autor de uma reclamatória trabalhista, que tramitou Comarca de Pelotas (RS), viu os dados do seu processo expostos na internet. Sentindo-se prejudicado, moveu ação indenizatória cível contra o Google e o Escavador, que faz a compilação de decisões judiciais disponibilizadas na internet. Os pedidos: indenização por danos morais e ordem para retirada dos dados da página.

A 5ª Vara Cível da Comarca de Pelotas julgou totalmente improcedente a ação indenizatória, isentando os réus de responsabilidade. O Google, por tratar-se de mero mecanismo de busca de informações já existentes disponibilizadas por terceiros na rede mundial de computadores. Ou seja, não produz informações nem tem ingerência sobre os conteúdos veiculados pelos sites.

E o Escavador, por não ter incorrido em qualquer ilícito cível, já que apenas disponibilizou a pesquisa de conteúdo na internet. Em suma, localizou na web as páginas virtuais contendo os termos pesquisados, provenientes dos sites dos próprios tribunais. E ainda: o processo trabalhista em que a parte autora figurou como parte não tramitou sob segredo de justiça.

A juíza Rita de Cássia Müller destacou que a Resolução 139/2014, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), publicada para impedir ou dificultar a busca de nome de empregados com o fim de elaboração de “listas sujas”, não alcança provedores de pesquisas. Em suma, estes, apenas, pesquisam, coletam e armazenam os dados publicados pelos próprios tribunais.

Apelações ao TJ-RS
Da sentença, apelaram à 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça o autor da indenizatória cível e o Escavador. Este último sustentou que, em todo país, se discute a mesma questão de direito: é lícito, ou não, divulgar dados de processos judiciais, que não tramitem sob segredo de justiça, por provedores de aplicações de internet? É que a ausência de precedente com força normativa tem gerado julgamentos divergentes, que violam a segurança jurídica e a isonomia.

Para pacificar o entendimento, o advogado do Escavador, Marcus Seixas, da banca Susart Sturdart Seixas, propôs a fixação da seguinte tese: “É lícita a divulgação por provedor de aplicações de internet de conteúdos de processos judiciais (em andamento ou findos) que não tramitem em segredo de justiça, e não existe obrigação jurídica de removê-los”.

Em função do pedido, a 9ª Câmara Cível “afetou” o caso à 3ª Turma Cível do 3º Grupo Cível — o colegiado uniformiza a jurisprudência nos litígios que envolvem Direito Privado —, que admitiu o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR).

Com efeito, nos termos do artigo 976 do novo Código de Processo Civil, é cabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente: I — efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; II — risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica”, registrou o acórdão que admitiu o IRDR, lavrado em 4 de dezembro.

Novo parâmetro
Na sessão de julgamento de mérito do IRDR, realizada no dia 22 de maio, a maioria dos desembargadores integrantes do 3º Grupo aprovou a tese, com um pequeno acréscimo na redação final. A jurisprudência cria um parâmetro para os demais processos que versam sobre o mesmo litígio nas demais Câmaras do TJ-RS, conferindo segurança jurídica.

O advogado do Marcus Seixas disse que o precedente vinculante é uma a importante vitória do Escavador. Informou que, agora, vai levar a tese para discussão no Supremo Tribunal Federal, para que ganhe abrangência nacional.

Clique aqui para ler a sentença de improcedência
Clique aqui para ler o acórdão que admitiu o IRDR
Clique aqui para ler o acórdão que fixou a tese
Processo 022/1.16.0001333-1 (Comarca de Pelotas)

 

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.

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Conselheira do CNJ alerta para o impacto de fake news na Justiça

A ampla mobilização para combater a circulação de notícias falsas na internet é o caminho para garantir a integridade da sociedade e a credibilidade da instituição jurídica diante de distorções, inclusive, de decisões judiciais e sobre as atividades do Poder Judiciário.

Conselheira Tânia Reckziegel é presidente da Comissão Permanente de Comunicação do Poder Judiciário do CNJ Agência CNJ

Para a presidente da Comissão Permanente de Comunicação do Poder Judiciário do Conselho Nacional de Justiça, conselheira Tânia Reckziegel, a atuação do CNJ por meio do Painel de Checagem de Fake News contribui no sentido da transformação paulatina da consciência social em relação à divulgação de falsas notícias.

“Todos os segmentos, inclusive o dos meios de comunicação, devem criar mecanismos de controle interno que, aliados às normas jurídico-administrativas, sejam mais eficientes no combate a esse mal”, afirmou a conselheira.

O Painel de Checagem foi criado há um ano pelo CNJ com o apoio e parceria de entidades, instituições e veículos de comunicação com atuação em checagem de fake news — a ConJur é um dos veículos que colaboram.

As ações estão voltadas ao esclarecimento sobre publicações suspeitas disseminadas pela internet nas redes sociais. Uma das iniciativas do Painel foi a campanha #FakeNewsNão, que divulgou no último dia 1º de abril chamado Dia da Mentira posts, vídeos, textos e artes no Twitter para esclarecer sobre os danos provocados por informações falsas.

“É necessário, tanto para a população quanto para o magistrado, desenvolver um espírito crítico em relação a toda e qualquer informação ou conteúdo que se receba, analisando o contexto e verificando se o texto apresenta qualidade de redação, quem é o autor, se foi reproduzido na imprensa tradicional”, destacou Tânia em entrevista à Agência CNJ de Notícias.

Leia a entrevista:

Qual a importância do Painel de Checagem de Fake News, que conta com o trabalho e participação de diversas entidades, instituições e veículos de comunicação?

A crescente desinformação e a propagação de falsas notícias em mídias e redes sociais vêm acarretando à sociedade uma alienação preocupante. A evolução da tecnologia e das ferramentas de comunicação conferiu também uma celeridade à disseminação de conteúdo. A conscientização da população e a educação da sociedade acerca dos prejuízos trazidos pela desinformação e propagação de notícias falsas é o escopo maior do Painel Multissetorial. Ele amplia a mobilização para combater as falsas notícias, buscando garantir a integridade da sociedade e a credibilidade da instituição jurídica, a partir do enfrentamento das distorções das decisões judiciais e a duplicação dessas deturpações. Com a iniciativa deste Painel, cria-se uma corrente com diversas entidades que trabalham em conjunto para enfrentar a desinformação e a disseminação de falsos relatos.

Depois de um ano de painel, é possível perceber diferença na quantidade de disparos de notícias mentirosas na Internet ou serviços de telefonia?

As práticas de informação hoje constituem uma atividade cada vez mais organizada, sofisticada, e que vêm contando com mais recursos, tanto financeiros como tecnológicos. O resultado é o aumento do desafio para quem queira combater as fake news, porque não só aumentam em termos de quantidade, mas em novos formatos que são utilizados. É possível perceber uma preocupação na população como um todo relativamente às notícias que se espalham. Nos grupos de aplicativos de comunicação, já se percebe uma maior conscientização em analisar a veracidade de determinado relato para seu compartilhamento. Mas é de conhecimento que esse ato de transformação da consciência social em relação à divulgação de falsas notícias é tarefa paulatina, de modo que essas diferenças também serão percebidas gradativamente.

Muitas vezes, uma das consequências das fake news é transformar uma minoria “falante” em uma suposta maioria. Os representantes do sistema de Justiça, como parte da sociedade, muitas vezes recebem esses conteúdos digitais e até podem vir a ser influenciados por eles. Qual o impacto das notícias falsas no trabalho dos magistrados?

Como já ressaltou o ministro Aloysio Corrêa da Veiga (ex-conselheiro do CNJ), pela incorporação e repercussão na sociedade, as redes sociais começam a ser classificadas como um novo poder. As falsas notícias têm grande poder de serem espalhadas rapidamente e em grande massa, acarretando uma penetração do material inverídico na sociedade. E esse poder viral dos falsos relatos pode vir a influenciar na tomada de decisões. Com efeito, essa consciência coletiva que se pretende alcançar acerca da busca pela informação e veracidade deve, sobretudo, abarcar os magistrados. Cabe ao juiz, portanto, como autoridade representativa da Justiça, buscar o aclaramento de questões distorcidas, fortalecendo a credibilidade da instituição judiciária.

Como os juízes, desembargadores, conseguem se blindar dessa pressão? E, se não conseguem, qual o efeito negativo disso na sociedade?

Algo que deve ser sempre lembrado é que não existe neutralidade na população, na qual se inserem juízes e desembargadores. Ser neutro é ser indiferente e isso não se confunde, em um campo hermenêutico, com imparcialidade. Aquele que convive em sociedade não está atingido pela neutralidade, pois está inserido em um sistema cultural próprio, com ideologias inerentes ao convívio social. Assim, como dito anteriormente, as falsas notícias têm grande poder de penetração na sociedade, pelo modo e celeridade com que são disseminadas, de modo que os magistrados também são suscetíveis de sofrer com os efeitos da propagação dos falsos relatos. Cumpre aos juízes e desembargadores filtrarem as informações que lhes chegam, buscando a fonte da informação, debatendo com assessorias de comunicação social, procedendo, enfim, à checagem da notícia.

É necessário, tanto para a população quanto para o magistrado, desenvolver um espírito crítico em relação a toda e qualquer informação ou conteúdo que se receba, analisando o contexto e verificando se o texto apresenta qualidade de redação, quem é o autor, se foi reproduzido na imprensa tradicional, enfim, o que chamei de checagem.

Na sua opinião, a Justiça fica vulnerável com essa disseminação de mensagens falsas por internet, aplicativos e telefonia celular? 

Acredito que sim. É fato que a disseminação de falsas notícias pode atingir de algum modo os pilares da democracia, trazendo riscos e insegurança para o cidadão, acarretando na sociedade uma descrença do sistema.

É possível para a Justiça minimizar ou reduzir o envio de informação inverídica?

O Poder Judiciário tem enfrentado a disseminação de fake news em todos os seus aspectos, para que o cidadão comum possa distinguir quais meios de comunicação merecem maior credibilidade, assim como para impedir ou minimizar, tanto quanto for possível, as consequências nefastas das notícias falsas. Daí a importância dos mecanismos e grupos de checagem. O Direito se amolda à proporção em que mudam os fatos sociais e, no caso da disseminação de falsas notícias, não é diferente.

O CNJ, assim como outros órgãos da Justiça, pode fazer ainda mais para combater a disseminação de mensagens falsas?

Os avanços tecnológicos se dão numa velocidade absurdamente maior do que a capacidade de adequação do Poder Judiciário em coibir os abusos. Como a desinformação é multissetorial, transversal e afeta todos os setores da sociedade, enfrentá-la é responsabilidade de todos. Assumir essa responsabilidade, como fez o CNJ e outros tribunais vêm fazendo, é o primeiro passo. Todos os segmentos, inclusive o dos meios de comunicação, devem criar mecanismos de controle interno que, aliados às normas jurídico-administrativas, sejam mais eficientes no combate a esse mal.

O CNJ e o STF, principalmente, têm se debruçado incessantemente sobre esse problema por meio da campanha #FakeNewsNão e do Painel de Checagem de Fake News, principais medidas hoje disponíveis a quem se propõe a enfrentar a desinformação, qual seja, a educação midiática da população, para que ela se conscientize sobre a existência do problema e conheça maneiras de não se tornar meio de sua propagação e de não ser prejudicada por ela. Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.