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Presunção de influência do júri não basta para mudança de foro

A hipótese excepcional de desaforamento do júri popular para outra comarca, prevista nos artigos 427 e 428 do Código de Processo Penal, não pode ser autorizada pela mera suposição de que a imparcialidade dos jurados tenha sido afetada por comentários sobre o processo, feitos por membro do Ministério Público na imprensa da região.

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Com base nesse entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou seguimento a habeas corpus no qual a defesa alegava que, em virtude de comentários negativos feitos pelo promotor sobre o réu e seus advogados na imprensa local, seria necessária a mudança da comarca para a realização do júri.

Para a defesa, as palavras no promotor tiveram o objetivo de contaminar as pessoas da cidade, de forma que fosse criado um sentimento negativo contra o réu e seus advogados, com potencial para interferir no novo julgamento pelo tribunal do júri. Por isso, a defesa entendia ser necessário o julgamento da ação em outra comarca.

O ministro Ribeiro Dantas, relator do pedido de habeas corpus no STJ, explicou que, nos termos dos artigos 69 e 70 do Código de Processo Penal, a competência será, como regra, determinada pelo lugar em que se consumou a infração ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que foi praticado o último ato de execução.

Entretanto, em relação aos crimes de competência do tribunal do júri, o ministro observou que pode haver a alteração da competência inicialmente fixada. Como previsto pelos artigos 427 e 428 do CPP, esse deslocamento do julgamento para comarca da mesma região pode ocorrer se, entre outros casos, houver dúvida sobre a imparcialidade do júri, risco à segurança pessoal do acusado ou, ainda, comprovado excesso de serviço.

Na hipótese em discussão, porém, Ribeiro Dantas ressaltou que o TJ-MS, ao manter a competência do júri em Três Lagoas (MS), entendeu que as notícias foram publicadas pela mídia na época do primeiro julgamento, em 2016, sendo que as matérias jornalísticas mais recentes informaram apenas sobre a prisão do réu.

Além disso, o TJ-MS levou em conta a avaliação do juiz de primeira instância, segundo o qual o crime aconteceu 11 anos antes, teve a gravidade comum aos casos de homicídio e não envolveu pessoas famosas, razão pela qual não haveria especial comoção social na cidade, de mais de 120 mil habitantes.

“No caso dos autos, não se faz presente a comprovação acerca do comprometimento da imparcialidade dos jurados, como defende o impetrante, não merecendo respaldo, ainda, a alegação de que o desaforamento se justifica pela veiculação de novas matérias na imprensa local”, concluiu o ministro ao não conhecer do pedido de habeas corpus. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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HC 492964

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Ricetti: Créditos de precatórios e débitos com poder público

Um dos instrumentos previstos para a redução da dívida de precatórios dos entes públicos é a compensação entre créditos de precatórios e débitos existentes com o poder público devedor, conforme atualmente prevê o artigo 105 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, acrescido pela Emenda Constitucional nº 94, de 15 de dezembro de 2016.

A questão envolvendo a compensação de débitos com créditos de precatório não é novidade no Direito brasileiro. O § 2.º do artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, acrescentado pela Emenda Constitucional nº 30, de 13 de setembro de 2000, emenda esta que instituiu o pagamento parcelado da dívida de precatórios em dez anos, previa o poder liberatório conferido ao credor do precatório que, em caso de não liquidação pelo ente devedor da parcela anual do precatório até o final do exercício, poderia deixar de pagar tributos devidos à entidade devedora, respeitado, por certo, o limite de seu crédito.

A figura do poder liberatório foi objeto de discussões e contendas judiciais, principalmente no tocante à necessidade de lei editada pelo ente devedor que regulamentasse a forma e os requisitos como se daria a dita compensação, à luz do que prevê o artigo 170 do Código Tributário Nacional, que cuida da compensação tributária. A intensa judicialização da questão, que resultou em decisões favoráveis e contra a autoaplicação do poder liberatório, acabou por prejudicar a eficiência de tal mecanismo, como instrumento de conciliação dos interesses dos credores e devedores de precatório.

A compensação envolvendo precatórios voltou ser objeto de previsão constitucional com a Emenda nº 62, de 9 de dezembro de 2009, que alterou o artigo 100 da Constituição Federal e instituiu o Regime Especial de Pagamento de Precatórios, no qual ficou estabelecido o prazo de até 15 anos para que os entes devedores quitassem seus estoques. A nova redação contida nos §§ 9º e 10º do artigo 100 da Carta Federal permitia, não propriamente uma compensação, mas o direito de abatimento unilateral, pelo ente devedor, dos débitos do credor do precatório no momento da expedição do ofício requisitório. A “compensação unilateral”, todavia, foi julgada inconstitucional pelo STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4425 e 4456, restando validados, contudo, os abatimentos realizados até 25/03/2015.

Com o advento da Emenda Constitucional nº 94, de 15 de dezembro de 2016, a compensação, como faculdade para o credor de precatório, passou a ser prevista no artigo 105 do ADCT, que dispõe: “Enquanto viger o regime de pagamento de precatórios previsto no artigo 101 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é facultada aos credores de precatórios, próprios ou de terceiros, a compensação com débitos de natureza tributária ou de outra natureza que até 25 de março de 2015 tenham sido inscritos na dívida ativa dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observados os requisitos definidos em lei própria do ente federado”.

Segundo previsto no referido artigo 105, a compensação ficou condicionada à edição de lei própria pelos entes federativos, que deveriam prever seus requisitos. Ocorre que a exigência de legislação própria pelo ente devedor acabou por não conferir a eficiência esperada à compensação.

Atento aos reclamos de credores interessados em compensar seus créditos e diante da inércia das entidades devedoras em regulamentar a questão, o Congresso Nacional editou a Emenda Constitucional nº 99, de 17 de dezembro de 2017, que ao alterar e aperfeiçoar o Regime Especial de Pagamentos de Precatórios, acrescentou os §§ 2ºe 3º ao artigo 105 do ADCT e concedeu o prazo de 120 dias, a partir de 1º de janeiro de 2018, para que os entes devedores editassem a lei própria regulamentadora da compensação, sendo que após decorrido o referido prazo e constatada a inércia legislativa, os credores ficaram autorizados a optar pela compensação de seus créditos de precatórios com débitos existentes com o ente devedor, desde que inscritos até 25 de março de 2015.

Disso resulta, portanto, que a compensação de crédito de precatórios com débitos inscritos pelo poder público passou a ser, atualmente, um direito subjetivo do credor, independentemente da existência de lei regulamentadora editada pelo ente público devedor.

E quais seriam os requisitos para que o direito à compensação fosse exercido?

Sobre esse ponto, o primeiro passo é verificar se há ou não regulamentação da questão pelo ente devedor. Havendo legislação regulamentadora, deverão ser observados os seus requisitos, somados aos requisitos trazidos pelo artigo 105 do ADCT e aos pressupostos que se aplicam à compensação como modo de extinção de obrigações.

Nesse contexto, infere-se da redação do artigo 105 a existência dos seguintes requisitos básicos da compensação: 1) que o regime especial de pagamento tenha sido adotado pelo ente devedor e esteja em vigência, já que não são todos os entes que optaram ou que se enquadram nessa sistemática de pagamento; 2) manifestação expressa e escrita do credor do precatório sobre a intenção de compensar, que contenha os dados como a sua identificação, sua legitimidade e dados suficientes para identificação do crédito de precatório e da dívida a ser compensada, já que se trata de uma faculdade e um direito seu; e 3) que os débitos, tributários ou não, estejam inscritos em dívida ativa até 25 de março de 2015.

Atendidos os requisitos acima, deverão ainda ser observados os requisitos da compensação como meio de extinção de obrigações, com suas devidas conformações. Nessa linha é possível afirmar que as dívidas a serem compensadas devem ser certas quanto à sua existência e determinadas quanto ao seu valor, vencidas e exigíveis.

Logo, quanto ao crédito de precatório, não pode haver discussão quanto a sua titularidade e validade, sendo que eventual discussão sobre o seu valor, já que não são raros os questionamentos sobre a incidência de juros sobre precatórios, a princípio pode ser um óbice à realização da compensação até que a questão seja definitivamente pacificada. Contudo, nada obsta a concordância das partes ou a renúncia à discussão pelo próprio credor, que pode anuir com os cálculos do ente devedor, de modo a viabilizar a pretensão de compensar seus crédito.

Nos casos de cessão convencional de precatório, deverão ainda ser observados os requisitos quanto à validade da cessão de crédito, quais sejam: 1) capacidade e legitimidade para ceder; 2) celebração da cessão mediante instrumento público ou instrumento particular que conste a indicação do lugar onde foi celebrado, a qualificação do cedente e do cessionário, a data e o objetivo da cessão com a designação e a extensão dos direitos cedidos (artigos 288 e 654, §1º, do Código Civil); 3) comunicação ao juízo em que foi expedido o crédito do precatório; 4) comunicação a entidade devedora; e 5) homologação da cessão pelo juízo competente.

Quanto à exigibilidade, certeza e liquidez da dívida tributária ou não tributária, tais requisitos acabam sendo preenchidos com a regular inscrição pelo ente devedor, observado o marco temporal de até 25 de março de 2015. Todavia, ao optar pela compensação, o interessado deverá renunciar a eventual discussão administrativa ou judicial envolvendo o débito a ser compensado.

Cabe sublinhar que, à luz do artigo 46 da Resolução nº 303/2019 do Conselho Nacional de Justiça, a compensação independe da ordem cronológica do precatório e de sua natureza, devendo ser considerado como o valor líquido disponível para fins de compensação, o valor “obtido após reserva para pagamento dos tributos incidentes e demais valores já registrados junto ao precatório, como a cessão parcial de crédito, compensação anterior, penhora e honorários advocatícios contratuais”.

Além de tais exigências, que decorrem do artigo 105 do ADCT ou de normas relativas à compensação e aos créditos e débitos que serão objeto do “encontro de contas”, vários entes federativos editaram leis próprias para prever outros requisitos específicos.

O município de São Paulo, por exemplo, além das exigências constitucionais acima referidas, regulamentou a compensação de precatórios por meio da Lei Municipal nº 16.953/2018, que em seu artigo 2º, inciso I, prevê um requisito bem específico ao definir que o crédito de precatório pode ser utilizado para compensar até 92% do montante atualizado do débito, de natureza tributária ou não tributária, inscrito em dívida ativa até 25 de março de 2015, sendo que tais débitos não podem ter sido objeto de parcelamentos incentivados anteriormente pactuados, tais como PPI (Programa de Parcelamento Incentivado) e PRD (Programa de Regularização de Débitos).

No caso do estado do Rio Grande do Sul, que regulamentou a compensação por meio da Lei Estadual nº 15.038/2017, alguns requisitos específicos são exigidos: 1) o débito inscrito em dívida ativa poderá ser objeto de compensação até o limite de 85%; 2) o débito a ser compensado com o crédito de precatório tenha o valor correspondente a 10% do respectivo montante, devidamente atualizado, pago em até três parcelas, devendo a primeira ser adimplida juntamente com o pedido de compensação, a segunda no prazo de 30 dias e a terceira no prazo de 60 dias contados do protocolo do pedido de compensação; e 3) o devedor deverá manter em dia parcelamentos por ele realizados.

Nota-se dos casos acima citados que houve uma restrição à compensação e os entes federativos optaram por regulamentar o tema e promover uma iniciativa de arrecadação de ao menos partes dos débitos a serem compensados.

Não obstante as restrições impostas pelas leis próprias dos entes federativos, é certo que a compensação, de um lado, mostra-se como importante mecanismo de redução da dívida dos entes públicos em mora com seus precatórios e, de outro, uma vantagem aos credores de precatórios que poderão utilizar o crédito para abatimento de suas dívidas ou mesmo ceder seus créditos a outros devedores do poder público para que estes se utilizem do direito de compensar suas dívidas, possibilidade esta que acaba aquecendo o mercado de cessão de precatórios.

Embora a compensação envolvendo precatórios ainda seja objeto de discussões e dúvidas entre credores e interessados, não se pode menosprezar o avançado trazido pelas Emendas Constitucionais 94/2016 e 99/2017 no sentido de conferir maior incentivo e segurança jurídica para que este mecanismo seja utilizado por credores e devedores, amenizando, nesse contexto, as consequências negativas trazidas pelo histórico de inadimplência e morosidade no pagamento de precatórios por grande parte dos entes públicos devedores.

 é procurador do município de Guarujá e especialista em Direito Público pela Escola Paulista da Magistratura.

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CNJ apura ofensas de magistrado a Lewandowski e a outros juízes

Comentários depreciativos

CNJ apura ofensas de magistrado a ministro do STF e a outros juízes

O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, instaurou, na tarde desta segunda-feira (20/4), reclamação disciplinar contra o juiz do Trabalho Gustavo Cisneiros Barbosa, do Tribunal Regional do Trabalho de Pernambuco (TRT-6). Os comentários tratariam de resultado do julgamento da medida cautelar interposta na ADI 6.363, pelo STF, no último dia 17 de abril.

O magistrado deve prestar esclarecimentos à Corregedoria Nacional de Justiça sobre a reprodução de mensagem, veiculada em vídeos pelas redes sociais e, em especial, no Youtube, em que teceu críticas e fez comentários depreciativos em relação ao ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski e aos juízes do Trabalho Leandro Fernandez Teixeira, Roberta Corrêa de Araújo Monteiro e Hugo Cavalcanti Melo Filho.

Segundo a decisão, caso, realmente, o referido vídeo seja de autoria do juiz do Trabalho, em tese, pode estar caracterizada conduta vedada a magistrados, porque foi utilizada linguagem incompatível com o decoro e juízo depreciativo a decisões judiciais de outros membros da magistratura, com potencial para expor negativamente a imagem do Poder Judiciário (Loman, Código de Ética da Magistratura e Resolução 305/2019 do CNJ).

O corregedor nacional determinou à Presidência do TRT-6 que, no prazo de cinco dias, intime o juiz do Trabalho Gustavo Cisneiros a apresentar defesa prévia, de acordo com os artigos 69 e 70 do Regimento Interno do CNJ, devolvendo-a à Corregedoria Nacional acompanhada de cópia da ficha funcional do referido magistrado. Com informações da assessoria de imprensa do Conselho Nacional de Justiça.

Revista Consultor Jurídico, 20 de abril de 2020, 17h26