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STJ proferiu mais de 170 mil decisões desde o início da quarenta

Direto da Corte

STJ proferiu mais de 170 mil decisões desde o início do trabalho remoto

De 16 de março — início do regime de trabalho remoto no Superior Tribunal de Justiça, adotado para a prevenção do contágio da Covid-19 — até a última segunda-feira (8/6), já foram proferidas 170.174 decisões e realizadas 62 sessões virtuais.

Christophe Scianni/TSE

Além das sessões virtuais, destinadas à análise dos chamados recursos incidentais ou recursos internos — embargos de declaração, agravos internos e agravos regimentais —, em maio o tribunal passou a realizar sessões por videoconferência, com possibilidade de sustentação oral dos advogados, para julgamento das demais classes processuais.

As sessões por videoconferência devem continuar, pelo menos, até 1º de julho, como estabelece a Instrução Normativa STJ/GP 9.

Estatística

Das mais de 170 mil decisões, 133.287 são terminativas e 36.887, interlocutórias. Entre as terminativas, 109.163 são monocráticas e 24.124, colegiadas.

Considerando as classes processuais, a que teve maior número de decisões foi a do agravo em recurso especial (53.950), seguida do Habeas Corpus (33.412), do recurso especial (24.239) e do recurso em Habeas Corpus (6.280). As outras classes somaram 52.293 decisões. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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Revista Consultor Jurídico, 11 de junho de 2020, 9h47

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Luísa Netto: O direito à ciência e a ADI 6.341

A atual situação de nosso país levanta sérias preocupações. Presenciamos uma crise política e econômica, testemunhamos ataques persistentes às instituições democráticas e enfrentamos uma pandemia sem precedentes. Não obstante essas circunstâncias, diante da urgência imposta pela pandemia, seria razoável esperar a implementação de uma estratégia nacional, articuladora da colaboração e adaptações regionais e locais necessárias, equilibrando as demandas relativas à saúde pública e à economia. Infelizmente, o que vemos é o Brasil se tornar uma das maiores vítimas mundiais da Covid-19, enquanto o presidente minimiza a gravidade da situação, negando evidências científicas e desconsiderando o aconselhamento de experts.

Em face da ausência de resposta nacional articulada, respaldados pela decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 6.341, governadores e prefeitos têm assumido o protagonismo na luta contra o coronavírus, editando diversas medidas normativas e as implementando nos variados quadrantes do país.

O objetivo deste breve artigo, sem desconhecer a importância de analisar as atuais ameaças à democracia brasileira, centra-se em perquirir e expor as possíveis implicações jurídicas advindas do direito à ciência para enfrentar a situação vivenciada no Brasil.

Coronavírus no Brasil breve panorama

Desde que o Brasil registrou o primeiro caso de Covid-19, o país tem assistido a um rápido e letal alastramento da doença.

Em termos legislativos, diferentemente de diversos países em que se prescinde de embasamento legal para as medidas de combate à pandemia, houve a edição, entre uma série de outros diplomas normativos, da Lei federal nº 13.979/2020, destinada a disciplinar a situação de emergência de saúde pública causada pela disseminação do coronavírus. A lei cobre uma vasta gama de matérias, desde a previsão de medidas como quarentena, isolamento, realização compulsória de exames e restrições a atividades públicas, até a criação de exceções à regra da licitação e do dever de fornecimento de informação administrativa. A lei, no âmbito federal, foi seguida por decretos (10.282/2020 e 10.329/2020) que trazem a definição das atividades e serviços essenciais. Houve também a edição do Decreto Legislativo nº 6/2020, levantando restrições orçamentárias e possibilitando a alocação de recursos financeiros contra a pandemia. Editou-se, ainda, a Medida Provisória nº 936, autorizando a suspensão temporária de contratos de trabalho, a redução da jornada com consequente redução salarial e prevendo o pagamento de um auxílio emergencial.

Diante deste quadro normativo, poder-se-ia pensar que o Brasil tem os instrumentos necessários para enfrentar a caleidoscópica crise atual. No entanto, não há, até o momento, a implementação de estratégia que coordene, com base em opções cientificamente defensáveis, as ações nos planos nacional, regionais e locais para conjugar esforços voltados a objetivos comuns no enfrentamento do coronavírus. Essa ausência de ação federal articulada agrava-se pela sistemática negação à ciência e atuação contrária às evidências científicas, assim como pela ausência de divulgação de informações coerentes para a população.

Além disso, tem-se assistido ao discurso oficial do presidente de República de frontal negação da gravidade da doença causada pelo coronavírus, bem como da pandemia, somado a comportamentos refratários ao distanciamento social e a um mau uso das redes sociais. Contrariando as evidências médicas e o aconselhamento técnico da Organização Mundial da Saúde (OMS), o presidente determinou o aumento da produção de cloroquina, afirmando sua eficácia contra a Covid-19. Curiosamente, após dois ministros da Saúde deixarem o cargo em menos de dois meses em virtude de desentendimentos sobre o combate ao vírus e serem substituídos por militares interinos, o protocolo do Ministério da Saúde para o tratamento da Covid-19 foi alterado para incluir o uso de cloroquina e hidroxicloroquina.

Diante desse cenário desolador, governadores e prefeitos têm assumido o protagonismo no combate ao coronavírus, editando uma multiplicidade de instrumentos normativos e adotando diversas medidas concretas. Sem desconhecer a necessidade de medidas de enfrentamento da pandemia, é preciso anotar que, para além de eventuais questionamentos quanto à sua constitucionalidade em termos de conteúdo, as atuações estaduais e municipais suscitaram debate acerca da repartição constitucional de competências no arranjo federativo brasileiro.

O direito à ciência, a ADI 6.341 e a competência dos entes federados

A Constituição da República de 1988 não consagrou um direito à ciência de forma expressa, circunstância que não impede de reconhecer esse direito como pertencente à ordem jurídica brasileira por força das cláusulas de abertura previstas nos parágrafos 2 e 3 do seu artigo 5. O direito à ciência foi estabelecido no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (artigo 15) e na Convenção Americana de Direitos Humanos; sem olvidar a Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigo 27). Soma-se a esta consagração explícita de um direito humano à ciência em instrumentos internacionais a circunstância de a Constituição da República se referir inúmeras vezes à ciência, impondo consequentes obrigações ao Estado (especialmente nos artigos 23, V, 200, V, e 218), como tem sido afirmado em várias ocasiões pelo Supremo Tribunal Federal (aborto, células-tronco, homeschooling).

Malgrado as inegáveis dificuldades da aplicação de normas internacionais, mormente normas de direitos humanos em contextos de crise econômica e crescimento do populismo, o recurso ao Direito Internacional é fecundo. Em primeiro lugar, os instrumentos citados trazem a consagração explícita de um direito à ciência como direito humano autônomo, capaz de ingressar na ordem jurídica brasileira, nesta qualidade, por meio das cláusulas de abertura estabelecidas constitucionalmente. Em segundo lugar, o plano internacional oferece um fundamento normativo complementar para enfrentar a situação em face de eventuais falhas domésticas, buscando respostas globais como a pandemia exige. O direito humano à ciência, aliado ao princípio de due diligence, oferece parâmetros legais para o que se pode exigir dos Estados, fortalecendo suas obrigações na luta contra o coronavirus.

Os instrumentos do Direito Internacional e a dogmática jusinternacional possibilitam uma aproximação ao conteúdo normativo do direito à ciência, que engloba, entre outras facetas, o direito dos indivíduos de desfrutar dos benefícios do progresso científico e tecnológico e o direito dos cientistas de desenvolver livremente a pesquisa científica, com proteção para os seus resultados. O primeiro aspecto vinculante deste direito que vem à luz no contexto da pandemia é a obrigação do Estado de ativamente proteger a vida e a saúde de acordo com a ciência, tomar as medidas necessárias para enfrentar a pandemia baseadas nas evidências científicas, controlando o alastramento da doença e tratando as pessoas infectadas. Maiores desenvolvimentos devem levar a apoiar a pesquisa científica e a colaboração internacional visando a criar e produzir vacinas e estruturar estratégias para conter outras pandemias. Esses aspectos positivos do direito à ciência não afastam a imposição de uma proibição para o Estado de agir ou se negar a agir em dissonância com o conhecimento científico disponível.

O direito à ciência fornece o necessário embasamento jurídico para afirmar que o conhecimento científico, a ciência e suas evidências, têm que ser a razão fundante das escolhas políticas de enfrentamento da pandemia, sem desconsiderar os processos democráticos. O apetite contramajoritário dos direitos humanos e fundamentais não se confunde com qualquer ameaça à democracia ou às instituições políticas do Estado de Direito. Pelo contrário, direitos e democracia mantêm uma relação necessária e dialética.

Certamente a questão merece cautela. Não se trata de defender a epistocracia ou a tecnocracia, nem tampouco de advogar a substituição de agentes políticos democraticamente eleitos por experts no processo de tomada das decisões públicas. A ciência, como se sabe, está sujeita a vieses, falsificações e erros, exige desenvolvimento constante e não é apta a oferecer respostas nem soluções incontestáveis para os complexos desafios societais.

No momento, há diversos aspectos relativos à pandemia, à doença e ao vírus que são discutíveis e desconhecidos. Ademais, os impactos econômicos de uma pandemia também precisam ser levados em conta; diversos direitos dependem da economia. Não se deve, ainda, desconhecer que contextos diferentes podem demandar estratégias específicas.

Uma coisa é suficientemente clara: a pandemia exige ação estatal e global urgente. O vírus e a doença não são uma questão de opinião política ou posicionamento ideológico, são uma matéria científica. Ainda assim, a pandemia exige ação política.

As autoridades democraticamente legitimadas devem se valer do aconselhamento de experts para tomar suas decisões e implementar as ações necessárias. As estratégias estatais de combate à pandemia devem ser públicas e transparentes, sujeitando-se ao controle por meio das instituições políticas e da opinião pública informada, com a garantia da liberdade de imprensa e de expressão. Por óbvio, é vital manter o debate político-institucional como elemento fundacional integrante da democracia, o que exige que as medidas urgentes sejam talhadas de acordo com o arcabouço constitucional.

Por um lado, deve haver espaço para escolhas políticas de acordo com o que é, no momento, cientificamente defensável. Por outro lado, o direito à ciência autoriza afirmar que não há espaço legítimo para simplesmente ignorar ou negar o conhecimento e as evidências científicas.

Essa breve aproximação ao direito à ciência permite verificar que a situação atualmente vivenciada no Brasil não está de acordo com a proteção comandada por esse direito. No plano nacional, evidências científicas têm sido desconsideradas, não têm servido, malgrado a existência de legislação federal, de base para a implementação de uma estratégia consistente e articulada de combate à pandemia da Covid-19.

Considerando que o direito à ciência é vinculante no plano doméstico, seu conteúdo normativo, brevemente exposto, mostra-se extremamente relevante para avaliar juridicamente a atuação dos governos federal, estaduais e municipais durante a pandemia.

Em primeiro lugar, o Direito oferece desde já ao Supremo Tribunal Federal uma âncora normativa para acessar os resultados empíricos de outros campos científicos e desenvolver o controle constitucional das respostas à pandemia. Mesmo que esse aspecto se centre na análise das respostas normativas e não seja suficiente para enfrentar a ausência de ação nacional articulada de combate ao vírus nem as ações governamentais tomadas em frontal desacordo com as evidências científicas, parece-nos um relevantíssimo elemento para a atuação do STF e das demais instâncias do Poder Judiciário.

Em um cenário de instabilidade política, avulta a importância do nosso mais alto tribunal no zelo pela Constituição, buscando manter a necessária coexistência de direitos humanos e democracia. O argumento fornecido pelo direito à ciência parece-nos essencial no desempenho dessa missão institucional pelo STF, permitindo acessar a situação por um prisma jurídico, afastando-se na certa medida da crescente polarização política.

Para fornecer um exemplo concreto, poderíamos pensar em somar, à argumentação desenvolvida no julgamento da ADI 6.341, o direito à ciência como embasamento constitucional sólido a outorgar competência para a atuação regional e local. A sucinta argumentação desenvolvida na decisão — e justificada em face da fase crítica vivenciada — girou em torno da questão formal da exigência de lei complementar e da presença dos requisitos constitucionais para a edição de medida provisória. Para além disso, estendeu-se para considerar a competência concorrente e comum conferida pela Constituição aos entes federados em matéria de saúde. Não por acaso, na decisão são citados os artigos 198 e 200 da Constituição, preceitos que tratam da saúde e tangenciam o desenvolvimento científico e tecnológico a ela referenciado. A atuação de governadores e prefeitos no combate à pandemia certamente tem que se amoldar às demais balizas constitucionais do nosso Estado democrático de Direito. Respeitadas essas balizas, tal atuação encontra fundamento constitucional no direito à ciência, que socorre o direito à saúde.

O direito à ciência se associa frequentemente a outros direitos humanos, com destaque para o direito à saúde. Essa associação fortalece a competência concorrente e comum dos entes federados para proteger e promover a saúde com base nas evidências científicas disponíveis, seja no plano de fruição individual, seja pelo prisma da saúde pública. A força do argumento normativo torna-se patente; a proteção e promoção da saúde apenas se pode fazer de forma efetiva respeitando as evidências científicas e aplicando os resultados do desenvolvimento científico e tecnológico pertinente.

Nesse ponto, interessante invocar a decisão da ADPF 672, na qual houve expressa menção pelo requerente a “ações irresponsáveis e contrárias aos protocolos de saúde aprovados pela comunidade científica e aplicados pelos Chefes de Estado em todo mundo”, solicitando-se ao STF que determinasse ao presidente se abster “de praticar atos contrários às políticas de isolamento social adotadas pelos Estados e municípios”. Com fundamento nos artigos 23, II, IX, 24, XII, e 30, II, da Constituição, reafirmou-se a competência legislativa e administrativa de Estados e municípios para adotar medidas de enfrentamento da pandemia. O direito à ciência poderia participar desta acertada decisão emprestando-lhe vigor normativo, elemento de que carecem as recomendações da OMS referidas ao final.

Não se desconhece que o recurso pulverizado por autoridades regionais e locais ao que é cientificamente defensável pode levar a inconsistências e dilemas. O ideal é a atuação nacional articulada, como convém ao federalismo, ao sistema constitucional de repartição de competências e de distribuição de função entre os poderes, fazendo-se escolhas políticas afinadas com a ciência e as traduzindo institucionalmente em normas.

A ciência não pode nem deve substituir o debate e a ação política democraticamente legitimada. Ela pode, no entanto, emprestar ao nosso Supremo Tribunal Federal, na confluência necessária entre direitos e democracia, importante argumento normativo não para governar, mas para impedir o desgoverno.

 é procuradora do Estado de Minas Gerais, professora de Direito Público na PUC-Minas, Post-doc visting fellow na Universidade de Leiden, doutora em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade Clássica de Lisboa e mestre em Direito Administrativo pela UFMG.

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Advogado que usou “meme” em petição manifesta-se sobre o caso

O advogado Caio Martins Cabeleira impetrou na segunda-feira da semana passada (11/5) um mandado de segurança contra o rodízio especial que havia sido adotado na cidade de São Paulo. 

O impetrante, em sua inicial, utilizou-se de “meme” e, segundo o juiz que apreciou a peça — Luis Manuel Fonseca Pires, da 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo —, fez “referências jocosas ao prefeito” (Bruno Covas).

Por isso, o magistrado criticou o advogado, além de determinar o envio da petição ao Tribunal de Ética e Disciplina da OAB para “adoção das medidas que se entender adequadas”. No mérito, houve desistência e, portanto, o juiz julgou extinto o feito.

Após a repercussão da notícia, Cabeleira divulgou nota de repúdio ao magistrado. Em suma, alega que não cabe ao Judiciário “avaliar a utilidade ou adequação dos recursos argumentativos empregados no exercício da advocacia”. Confira a íntegra:

Uma resposta ao juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública

Na última semana viralizou na internet um mandado de segurança impetrado por mim (processo 1023383-30.2020.8.26.0053), em causa própria, na qual o magistrado da 3ª Vara da Fazenda Pública da Capital, ao invés de simplesmente homologar um pedido de desistência da ação feito por mim, julgando-a extinta, decidiu dar uma bronca pública neste que vos fala.

O crime? Ter ousado usar humor sarcástico e expressão jocosa contra um ato ilegal e abusivo, que violava direitos fundamentais, perpetrado pelo Prefeito de São Paulo. 

Nenhum magistrado pode se avocar a condição de fiscal da argumentação dos advogados. Não cabe ao Poder Judiciário avaliar a utilidade ou adequação dos recursos argumentativos empregados no exercício da advocacia. Ao apontar que o modo de agir deste advogado “apequena a justiça” e “não serve a demonstrar direito algum”, o juiz viola as prerrogativas e o livre exercício da advocacia mediante uma análise absolutamente equivocada e inapropriada.

O rodízio era um ato administrativo não só eivado de diversas nulidades, como ausência de fundamentação legal e violação do direito de livre locomoção e do direito à vida, mas era nitidamente uma medida ineficaz para o fim de combater a pandemia. Ao contrário, ele aumentou o número de pessoas utilizando o transporte público e, consequentemente, a possibilidade de contaminação.  

Tamanho era o desacerto e ineficácia da medida que o próprio prefeito a revogou, o que apenas demonstra o acerto do que foi exposto na petição. 

Todavia, diante de todas essas arbitrariedades devidamente relatadas na petição inicial na típica linguagem forense, apontando-se fontes legais e precedentes do e. Tribunal de Justiça paulista, a que se voltou o horror e desprezo do magistrado sorteado para julgar a causa? 

Ao fato de eu ter me referido ao Prefeito como “Sua Majestade, o Prefeito” (título de um livro de Jose Alvarenga, aliás) de forma jocosa e ao fato de eu ter colado na petição uma foto do Prefeito e logo abaixo, o título de abertura da petição com os dizeres “Bom dia, como posso atrapalhar seu dia?”, designado pelo magistrado como sendo um “meme”. 

A decisão segue criando um verdadeiro espantalho da petição inicial, como se ela não tivesse nenhuma base jurídica e fosse limitada a fazer um meme do Prefeito, para “viralizar na internet”. 

Ao d. magistrado bastava extinguir o processo, diante de meu pedido de desistência, no qual informei que estava desistindo da ação para ajuizá-la no Tribunal de Justiça (onde o processo tramitava até hoje, quando pedi nova desistência por perda de objeto), pois só me atentei ao fato do prefeito da capital do estado ter foro privilegiado depois de ter distribuído o processo às varas da fazenda pública. Repito: o pedido de desistência foi protocolado ANTES DA DECISÃO. 

Diz a sabedoria popular que “quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro que de Paulo”. Quando o magistrado declara que a argumentação do advogado “apenas se presta para viralizar na internet”, fica a dúvida: a que se presta uma decisão dessa natureza, num processo em que se advogava em causa própria e já havia desistência da ação para ajuizá-la no foro competente? Os dias que se seguiram, com a divulgação dessa decisão em grupos de whatsapp e portais da internet, talvez revelem quem buscou “viralizar na internet” se valendo da atividade jurisdicional.

Diante dessas circunstâncias, sem dúvida alguma, a decisão é um flagrante ataque à liberdade profissional, à dignidade da justiça e aos preceitos éticos, exatamente o que ela hipocritamente alega proteger. 

O advogado deve ter plena liberdade no exercício de sua profissão, tal como garantido na Constituição Federal e no Estatuto da OAB. Só a ele cabe o discernimento sobre qual é a melhor estratégia a seguir para obtenção do resultado que se almeja. 

O uso do humor e da ironia na retórica, a arte da argumentação, são mecanismos importantes e milenarmente reconhecidos como meios eficazes de convencimento, principalmente como meio de denúncia de algo inapropriado (cf. Perelman e Olbrechts-Tyteca, Tratado da Argumentação, Martins Fontes, São Paulo, §49; Ana Cristina Carmelino, Humor: uma abordagem retórica e argumentativa, in Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade de Passo Fundo – v. 8 – n. 2 – p. 40-56 – jul./dez. 2012; além das clássicas obras de Cícero, Quintiliano, e Aristóteles sobre o uso retórico do humor). A retórica nos ensina que o humor é o meio mais eficaz para expor um absurdo cometido pelo adversário. O termo jocoso e a imagem utilizada têm, assim, objetivos claros: ressaltar o absurdo e a teratologia do decreto impugnado.  

Ressalto ainda que em momento algum fui ofensivo com a pessoa do prefeito. Fui combativo, e assim serei, enquanto Deus permitir, na defesa de minhas causas quando a situação exigir, mas sem cometer qualquer tipo de ilicitude ou mesmo conduta antiética. Meu sarcasmo não foi dirigido à justiça, ao juiz ou serventuários, mas aos atos do Prefeito, enquanto no exercício de seu cargo. O prefeito, pessoalmente, sequer é parte no processo e consta no polo passivo apenas uma exigência formal da Lei de Mandado de Segurança. 

Quanto ao ato temerário e abusivo do mm. Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública, medidas legais e administrativas serão tomadas para resguardar a liberdade profissional da advocacia.

São Paulo, 18 de maio de 2020.

Caio Martins Cabeleira

OAB/SP 316.658

Graduado e Doutor em Direito Civil pela USP. 

Foi pesquisador bolsista no Max-Planck Institut de Hamburgo, Alemanha.

Advogado

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STF nega pedido de Cunha e mantém investigações em Curitiba

Cunha é investigado por desvios na diretoria internacional da Petrobras
Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Foi negado nesta terça-feira (19/3) o pedido da defesa do ex-deputado Eduardo Cunha de arquivamento ou de remessa à Justiça Eleitoral das investigações relativas ao repasse de vantagens indevidas pela Odebrecht. A decisão é da 2ª Turma do Supremo Tribunal, por unanimidade.

Com isso, foi mantida a decisão do ministro Edson Fachin, relator do Inquérito 4.383, de remessa do caso à 13ª Vara Federal de Curitiba.

Cunha é investigado pelo suposto recebimento de repasses como contrapartida à adjudicação de contrato administrativo associado ao Plano de Ação de Certificação em Segurança, Meio Ambiente e Saúde (PAC-SMS). O contrato envolvia a prestação de serviços de reabilitação, construção e montagem, diagnóstico e remediação ambiental, elaboração de estudo e levantamentos nas áreas de segurança, meio ambiente e saúde em nove países, além do Brasil.

“Lava jato”

A defesa de Cunha apresentou agravo regimental contra a decisão do ministro Fachin, de março de 2019, de remeter os autos a Curitiba — pois, para o ministro, os fatos apurados no inquérito têm relação com a “lava jato”. A remessa foi determinada depois que a Procuradoria-Geral da República pediu o arquivamento das investigações em relação ao senador Humberto Costa (PT-PE), único investigado com prerrogativa de foro no STF, por ausência de provas suficientes de prática delitiva em relação a ele. Mas, segundo a PGR, a investigação deveria prosseguir em relação aos demais investigados, entre eles Eduardo Cunha. A decisão de Fachin foi confirmada pela Turma.

Valores indevidos

São apuradas as supostas práticas de corrupção ativa e passiva e de lavagem de capitais. Segundo a PGR, Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves, então integrantes da bancada do PMDB (atual MDB), fariam parte do esquema criminoso montado na diretoria internacional da Petrobras e, em 2010, teriam solicitado a executivos da Odebrecht o repasse de valores indevidos em contrapartida ao apoio político na celebração de contrato administrativo associado ao PAC-SMS. 

Ainda de acordo com a denúncia, as tratativas sobre o projeto SMS na área internacional da Petrobras começaram em junho de 2009, quando se teria ajustado o direcionamento da licitação à Odebrecht. Nesse mesmo contexto, também foram noticiadas reuniões entre representantes da empreiteira e da Petrobras, em que teria sido ajustado percentual de 3% sobre o valor dos contratos em repasses a políticos, caso o grupo ganhasse a licitação.

Prevenção

Na decisão mantida hoje pela 2ª Turma, o ministro Fachin afirmou que não há dúvidas em relação à prevenção da 13ª Vara Federal de Curitiba. “Os fatos apurados inserem-se no mesmo contexto de um vultoso esquema implicando agentes políticos, executivos e lobistas, com práticas delituosas precipuamente vinculadas à sociedade de economia mista Petrobras”, afirmou. Com informações da assessoria de imprensa do Supremo Tribunal Federal.

Inquérito 4.383

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Primeiro presidente do STJ, ministro Gueiros Leite morre aos 99

Luto no judiciário

Primeiro presidente do STJ, ministro Gueiros Leite morre aos 99 anos

O ministro aposentado Evandro Gueiros Leite, eternizado na história como o primeiro presidente do Superior Tribunal de Justiça, morreu nesta terça-feira (19/5), aos 99 anos, em Brasília. A causa da morte não foi divulgada.

Ministro Gueiros Leite (à esq.) ao lado

do ministro Francisco Falcão
Sergio Amaral/STJ

Gueiros Leite foi ministro do extinto Tribunal Federal de Recursos de 1977 a 1989, ano de instalação do recém-criado STJ. Participou ativamente, na Constituinte, do processo para a criação do Tribunal da Cidadania e coordenou a transição do TFR para a nova corte, da qual se aposentou em 1990.

O ministro concedeu entrevista à ConJur em 2016, momento no qual relembrou grandes histórias e contou das “agruras” e desventuras por que passou para instalar seis tribunais sem dinheiro e sem boa vontade dos ocupantes de cargos poderosos da época.

Revista Consultor Jurídico, 19 de maio de 2020, 18h28