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Giovanna Ferrari: Acordo de não persecução penal e crimes tributários

O famoso Pacote Anticrime, sancionado no dia 24 de dezembro de 2019, trouxe inúmeras alterações para a sistemática da Justiça criminal, entre elas a possibilidade de não oferecimento de denúncia nos casos em que o delito investigado não envolver violência ou grave ameaça e que tenha pena mínima inferior a quatro anos, desde que seja recomendado à prevenção e reprovação do delito.

O acordo de não persecução penal, assim, acabou abrindo novas portas para que houvesse uma certa punição antes mesmo de haver um devido processo penal, sob a roupagem de uma nova forma alternativa de resolução de conflitos. Não obstante as diversas críticas que são feitas a essa questão e que não serão tema do presente artigo, os crimes tributários se encaixam nas condições necessárias à possibilidade de oferecimento do famoso acordo de não persecução penal.

Ocorre, porém, que no Direito Penal brasileiro os crimes contra a ordem tributária apresentam especial condição, qual seja, extingue-se a punibilidade do agente com o pagamento do tributo, independentemente da fase do processo. Isto é, o agente que está sendo acusado de praticar sonegação fiscal, por exemplo, pode realizar o pagamento do tributo devido e, com isso, ver extinta sua punibilidade, segundo o artigo 9º, §2º, da Lei 10.684/03.

O acordo de não persecução penal, por sua vez, requer que, além das condições expostas anteriormente (pena mínima menor que quatro anos, crime sem violência ou grave ameaça, suficiente para reprovação e prevenção do delito), efetive-se o ressarcimento do dano. E, assim, questiona-se: para o agente que supostamente praticou um delito tributário, essa condição também se aplica, vez que o pagamento do tributo sequer vai lhe impor qualquer condição e já extingue sua punibilidade?

O que se pode argumentar é que, no caso dos crimes tributários, é possível a realização do referido acordo sem o pagamento do tributo pela aplicação do inciso I do artigo 28-A do Código Penal, especificamente na sua parte final, qual seja “exceto na impossibilidade de fazê-lo”. Isto é, em caso de não possibilidade de pagamento do tributo supostamente devido pelo acusado, pode e deve o órgão acusatório oferecer o acordo de não persecução penal sem a exigência da “reparação do dano”, o que vai na direção do espírito da criação do referido instituto.

É certo que não faria sentido algum que, nos crimes tributários, fosse exigida a reparação do suposto dano para que o acordo fosse homologado e ainda impusesse determinadas condições para que, somente assim, a punibilidade do agente fosse extinta.

Os tribunais ainda não se manifestaram amplamente sobre essa questão, que, certamente, será provocada pelos advogados e todos os aplicadores da lei que conseguem vislumbrar a presente incongruência.

O acordo de não persecução penal possibilitará diversas discussões sobre sua aplicação, execução e sua real efetividade no cotidiano do sistema de justiça criminal.

 é advogada criminal, membro efetivo da Comissão da Jovem Advocacia e Execução Penal da Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Santo André e pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e em Direito Penal Econômico pela Universidade de São Paulo — Largo São Francisco (parceria USP-IASP).

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Ministra afasta novamente desembargador de SC que se filmou nu

A reintegração de um magistrado não pode ocorrer por liminar, pois causa insegurança jurídica. Isso porque eventuais decisões desse julgador durante a vigência da cautelar podem vir a ser anuladas em futura decisão de mérito.

Ministra entendeu que reintegração de magistrado antes de referendo do CNJ poderia causar nulidades 
Nelson Jr. / SCO / STF

Com esse entendimento, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, determinou novamente o afastamento do desembargador Eduardo Mattos Gallo Júnior, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. A decisão é desta quarta-feira (6/5).

Ele foi afastado em 2017 depois de ser acusado de corrupção e de agredir a ex-esposa. Para se defender de uma das denúncias, fez um vídeo em que aparecia nu, em frente a um espelho. O objetivo era mostrar que ele é quem havia sido agredido pela mulher. 

As imagens foram divulgadas nas redes sociais por terceiros e serviram para basear o pedido de afastamento, concretizado em 2017, pelo Órgão Especial do TJ-SC.

Em dezembro, o conselheiro Henrique Ávila, do Conselho Nacional de Justiça, suspendeu a decisão que afastou o desembargador. O entendimento foi de que fragiliza o direito de defesa do acusado instaurar um único processo administrativo disciplinar para simultaneamente apurar fatos que não guardam conexão entre si.

O Estado de Santa Catarina então impetrou mandado de segurança no Supremo, em que pediu a cassação da decisão administrativa do CNJ e alegou inexistir qualquer vício no PAD.

Ao analisar o caso, a ministra acolheu os argumentos, considerando que até o momento a liminar não foi referendada pelo Plenário do CNJ, situação que contraria o Regimento Interno do CNJ e fragiliza o contraditório e a ampla defesa, além de causar insegurança jurídica.

“Reintegrar um magistrado agora poderia conduzir à prática de atos judiciais que poderiam ser tisnados de nulidade, se não subsistir o seu retorno às funções”, afirma Cármen. 

Clique aqui para ler a decisão

MS 36.908