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Não cabe ação popular para questionar direito à saúde pública

O comando constitucional (artigo 5º, inciso LXXIII), ao tratar da ação popular, não se refere a ato lesivo relacionado à saúde pública, mas, sim, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Assim, a ação popular não é o caminho adequado para se questionar o direito à saúde.

ReproduçãoAção popular não é caminho adequado para pedir construção de hospital

Com esse argumento, a juíza Lais Helena Bresser Lang, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, julgou extinta, sem resolução de mérito, uma ação popular que pedia a construção de um hospital de campanha na zona leste de São Paulo, região mais populosa da cidade e também a mais afetada pelo coronavírus.

Para a juíza, os autores da ação queriam a “implementação coercitiva de política pública”, o que, segundo ela, deve ser visto com muita cautela, “sob pena de afronta ao primado constitucional da Separação dos Poderes e, quiçá, ingerência danosa na atividade administrativa e, consequentemente, prejuízo ao interesse público”.

Lang destacou que a Constituição não trata de atos lesivos contra a saúde pública nas hipóteses de ação popular e que o texto não pode ser interpretado de forma extensiva. “Caso a intenção do legislador fosse a de permitir a discussão sobre o direito à saúde, no bojo da ação popular, tê-lo-ia previsto de forma assertiva ou então na categoria de “direito difuso ou coletivo”, como exempli gratia encontra-se previsto na Lei 7347/85, que rege a ação civil pública”, disse.

Sendo assim, a magistrada afirmou que a omissão em pauta há de ser tida como um silêncio eloquente da lei, e como tal observado. “O interesse de agir, consoante pacífica doutrina e jurisprudência, traduz-se no binômio necessidade/adequação. A ação deve ser um meio necessário e interposta de forma adequada, para a satisfação do pretenso direito. Tendo os autores eleito ação de todo inadequada para os fins colimados, há carência de ação”, concluiu Lang

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Erika Oliveira: Efeitos da Covid-19 nas relações imobiliárias

A indústria da construção civil é claramente um termômetro da economia brasileira e mundial, sendo uma das maiores geradoras de empregos do país, com o número surpreendente de mais de 70 mil vagas criadas no ano passado no setor, correspondendo a 11% [1] do total de empregos surgidos no país em 2019.

No Brasil, a construção civil iniciou o ano de 2020 em claro ritmo de bull market, após disparar mais de 100% [2] na Bolsa e ter crescimento de 1,6% no ano de 2019, sendo a maior alta do Ibovespa no setor desde 2013 [3].

A reviravolta, no entanto, foi verificada em março de 2020 com o avanço exponencial da Covid-19 [4], o que, de forma inesperada, obrigou os governos a implementarem medidas duras e sem precedentes para a contenção da propagação do vírus, o que, por consequência, ocasionou a abrupta interrupção desse movimento de crescimento e reestruturação da construção civil.

Com a interrupção das obras, férias coletivas, escassez de material, insumos e mão-de-obra e, sobretudo, em razão da piora da percepção dos empresários acerca das expectativas para os próximos trimestres e a insegurança dos consumidores para aquisição de novos imóveis ou mesmo a manutenção de contratos preexistentes, já houve perdas significativas para o setor [5].

A projeção é de que os impactos sejam ainda maiores a médio e longo prazo, em razão dos mesmos motivos listados, o que acarretará, certamente, no atraso na entrega das chaves dos imóveis adquiridos na planta e o aumento da inadimplência.

É possível dizer que, além de paciência e trabalho árduo, deverá haver uma compreensão recíproca, ou seja, de todos aqueles que atuam nas relações contratuais, para minimizar os impactos da situação vivida.

É esperado que em razão da fragilidade da economia e dos eventuais atrasos na entrega dos imóveis, o número de ações ajuizadas aumente significativamente, seja com o objetivo de se pleitear a rescisão contratual, seja com o objetivo de obter indenização material.

Considerando especificamente o cenário de atraso na entrega dos imóveis, que comprovadamente se deram em decorrência da Covid-19, é possível sustentar a ocorrência de caso fortuito ou de força maior, previsto no artigo 393, do Código Civil [6], que preceitua que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes do caso fortuito ou força maior se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Em situações menos complexas, os institutos do caso fortuito e da força maior são de difícil verificação prática e aplicação pelo Judiciário, já que vulgarmente utilizados por empresas do setor para justificar atrasos que poderiam de fato ser evitados.

No entanto, em situação extrema como a pandemia causada pela Covid-19, é possível evocar o caso fortuito e força maior sem grandes dificuldades, já que as construtoras e incorporadoras imobiliárias, por certo, não deram causa aos problemas enfrentados e tampouco poderiam evitá-los, sendo estes os fatores da excludente do nexo de causalidade em relação a eventuais prejuízos suportados pelos consumidores.

Inclusive, o Código Civil, em seu artigo 625, inciso I [7], prevê a possibilidade de suspensão da obra em razão do motivo de força maior, reforçando a ideia de impossibilidade de responsabilização do empreiteiro e da incorporada em razão de atrasos a que não deram causa e que não poderiam ser por eles evitados.

Esclarecida a possibilidade das construtoras e incorporadoras evocarem o caso fortuito e de força maior para justificar o atraso na entrega do imóvel, surge o questionamento acerca do direito do consumidor de receber multas e penalidades relacionadas ao referido atraso.

Nesse prisma, embora seja pacífico o entendimento da validade da cláusula prevista na maioria dos compromissos de venda e compra que possibilita o atraso na entrega das obras por 180 dias, espera-se do Poder Judiciário uma maior flexibilização desse prazo, podendo ser prorrogado em razão da pandemia, sem a aplicação da aludida cláusula penal.

Um cenário ainda mais sensível e alarmante para o setor é aquele em que o consumidor, alegando impossibilidade ou desinteresse na manutenção do contrato, pugna pela rescisão do instrumento, com a aplicação de multa compensatória e a restituição dos valores pagos.

Não é demais relembrar que toda a crise enfrentada nos últimos anos no setor imobiliário se deve justamente aos problemas desencadeados pela desistência voluntária por parte dos adquirentes, que não refletem apenas em seu direito individual, mas colocam em xeque a viabilidade do empreendimento como um todo e comprometem drasticamente a subsistência da atividade do incorporador, correndo o risco, entre tantos outros, de dispender altíssimos valores com os distratos, além de suportar os prejuízos decorrentes do cancelamento do empreendimento.

Nesse contexto, levando-se em consideração que o setor da construção civil é responsável por gerar grande parte dos empregos formais no Brasil e por aquecer a economia, conforme tratado no início deste artigo, temos que o problema a ser enfrentado pelas construtoras e pelo Judiciário ao tratar das ações de rescisão contratual é delicado e exige atenção do ponto de vista macro.

Inobstante a questão afeta à economia de modo geral, por certo o promitente comprador que não estiver disposto a suportar o atraso na entrega da obra ou não tiver condições de manutenção do contrato não poderá ser impedido de prosseguir com a rescisão do instrumento, porém, seguirá como rescisão imotivada, devendo suportar as penalidades previstas no contrato e na Lei n° 13.786/2018 (Lei do Distrato), que prevê multa de 25% para empreendimentos sem patrimônio de afetação ou de 50% para empreendimentos com patrimônio de afetação.

Em contrapartida, é inevitável que o Judiciário atente para aqueles casos em que o consumidor demonstrar de forma cabal e nos termos dos artigos 478, 479 e 480 do Código Civil [8], que em razão dos efeitos da Covid-19 na sua capacidade financeira o contrato se tornou excessivamente oneroso, hipótese em que poderá se eximir das penalidades previstas na lei e, em contrapartida, pugnar pela restituição integral dos valores pagos, devidamente atualizados.

Os dois cenários apresentados são sensíveis e certamente impactarão de forma drástica a economia brasileira, seja do ponto de vista do consumidor, seja do ponto de vista do incorporador, existindo justificativas suficientes para defesa de um ou do outro lado.

Justamente em razão do problema generalizado que apresentará desafios para todos os participantes da relação contratual e, principalmente, para a economia de modo geral, o caminho recomendável e saudável para a solução do conflito que certamente existirá, de fato não é a judicialização da questão ou a rescisão do contrato pura e simples, mas a intensificação das negociações entre contratante e contratado, por vezes intermediada por advogados e conciliadores, com concessões recíprocas e revisitação de cláusulas contratuais, caso seja necessário.

De tudo o que se espera para o correto enfrentamento dos danos causados pela Covid-19 no mercado imobiliário é que do lado da incorporadora se atente ao dever de informação, para que seja oportunizado ao consumidor, mesmo diante do conhecido cenário de crise de saúde pública e econômica, com pleno conhecimento do status da obra, da forma que os efeitos da pandemia afetará seu contrato e, principalmente, todas as medidas que o Incorporador está adotando para minimizar estes impactos.

Do lado do consumidor, espera-se, dentro do possível, um esforço acentuado e compreensão em relação aos impactos da crise no seu contrato, devendo priorizar a manutenção da relação contratual, ainda que para isso seja necessária a renegociação de valores, prazos para pagamento e revisitação de cláusulas contratuais em geral.

Por fim, sabendo que inexistem precedentes jurídicos e econômicos da situação atualmente vivida no Brasil e no mundo, o que se espera é um esforço mútuo para que sejam mantidos os compromissos assumidos, dentro dos princípios da transparência, boa-fé, proporcionalidade e razoabilidade, viabilizando, assim, a retomada do crescimento do mercado imobiliário brasileiro.

Erika Raissa Loiola de Oliveira é advogada, sócia do escritório Lee, Brock e Camargo Advogados e pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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Gisele Pimentel: Os efeitos da Covid-19 para os shopping centers

A Covid-19 é uma doença causada por um vírus mutante oriundo de outras espécies de animais, já hoje reconhecida como causadora da maior pandemia da humanidade moderna.

Em meio ao cenário de incertezas, em alguns mercados maduros, como o da China e dos Estados Unidos, os governos, cada um com sua estratégia, mostram reação à pandemia realizando injeções financeiras maciças na economia.

No Brasil, entre as muitas medidas de combate à corrente pandemia, autoridades estaduais e municipais de variadas localidades do território nacional ora recomendaram, ora determinaram, o fechamento dos shopping centers por períodos prorrogáveis de duas a quatro semanas, mantidas em funcionamento apenas algumas poucas operações, como farmácias e supermercados, bem como serviços de delivery das praças de alimentação, entre outras atividades classificadas como essenciais ao atendimento do público em situação de emergência.

Nesses casos, o impacto nos contratos está sendo gerado por restrições adotadas pela Administração Pública o “fato do príncipe”, na expressão consagrada na tradição jurídica em virtude da pandemia. São essas restrições e sua influência sobre cada contrato que precisam ser analisadas individualmente.

Nesse contexto, surgem inúmeros artigos jurídicos sobre o impacto do coronavírus nas relações contratuais. Muitos desses textos qualificam a pandemia como “caso fortuito ou força maior”, concluindo, a partir daí, que os contratantes não estão mais obrigados a cumprir seus contratos, nos termos expressos do artigo 393 do Código Civil brasileiro. Outros preferem qualificar o avanço da Covid-19 como “fato imprevisível e extraordinário”, invocando o artigo 478 do Código Civil para deixar aos contratantes a possibilidade de extinção do contrato ou sua revisão.

Tal cenário faz palpitar pleitos diversos, muitos irrazoáveis, como pedidos de isenção de aluguel e encargos atinentes aos espaços comerciais em shoppings centers.

O certo, porém, é que cada solução dependerá, sempre, de cada relação contratual, individualmente considerada. É preciso, antes de se qualificar acontecimentos em teoria, compreender o que aconteceu em cada contrato, impondo-se a indagação central: a pandemia provocou, efetivamente, a impossibilidade de cumprimento da prestação pelo devedor? Que impactos a pandemia causa sobre cada parte contratante, e qual o encaminhamento justo a conferir ao citado “fato do príncipe”?

Algumas perguntas adicionais:

— O lojista pode se considerar, ipso facto, impedido de pagar as verbas locatícias, pelo fato da cessação de seus negócios no espaço locado? Mesmo que se trate de um banco, ou outro com notória capacidade econômica? 

— Seria possível cogitar-se de uma força maior sistêmica, a gerar efeitos especiais sobre cada contrato da cadeia produtiva?

 É razoável cogitar-se de onerosidade excessiva, ou da teoria da imprevisão, em situação na qual não existe a vantagem extrema para qualquer das partes contratantes (artigo 478 do Código Civil)?

Vale lembrar que, para a economia em geral e para a própria saúde das relações sociais, é imprescindível que a maior parte dos contratos já firmados seja mantida e que as prestações devidas sejam cumpridas. O pacta sunt servanda não merece ataques desnecessários neste momento.

Antes de qualquer judicialização, é dever das partes recorrer à boa-fé objetiva e ao dever de renegociar. A extinção de vínculos contratuais e a revisão judicial de contratos são remédios extremos que as partes devem evitar sempre que possível, diante do imperativo de mútua cooperação e lealdade que deriva do artigo 422 do Código Civil brasileiro e do princípio constitucional da solidariedade social, artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal.

 é gerente jurídica e de compliance da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce).

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Opinião: Concursos públicos para segurança pública e saúde

A pergunta que vem deixando muitas pessoas que sonham com um cargo público: concursos públicos para as áreas de segurança pública e da saúde, afinal, estarão todos suspensos?

O Direito não comporta antinomias. Se há ambiguidade na lei, enquanto sistema completo, precisamos de instrumentos, de métodos e de vetores para estabilizar expectativas, fixar interpretações jurídicas e, em última instância, assegurar a paz social.

É nesse sentido, inclusive, que faremos uma análise clara e objetiva sobre o Projeto de Lei Complementar 39/2020 (derivado do Plano Mansueto — PLP 149/2019), o qual enceta um programa federativo de enfrentamento às consequências da Covid-19, reorganizando alguns aspectos da arquitetura fiscal da União, Estados e Municípios. Tal projeto foi aprovado pelo Senado Federal e segue para a sanção presidencial.

Mesmo antes de inovar verdadeiramente nossa ordem jurídica, tal instrumento normativo já vem causando muitas incertezas aos candidatos de certames públicos. Por isso, o ponto nevrálgico de discussão aqui é se ele suspenderá a realização e a nomeação em face dos concursos da área de saúde e de segurança pública. Afinal, estarão todos suspensos?

Antes de respondermos a tal questionamento, cumpre-nos dizer que este Projeto de Lei não pode ser decotado da realidade social e econômica que estamos vivendo. O referido projeto constrói regras excepcionais de distribuição de recursos da União, principalmente porque, pelo nosso sistema centrípeto de arrecadação tributária, boa parte do dinheiro do Brasil encontra-se nas mãos dela.

Tal ajuda do Governo Federal demandará contrapartidas dos demais entes federativos. Para receberem tal auxílio, os Estados e os Municípios precisam atender a um conjunto de restrições de gastos, porquanto não seria razoável receber auxílio federal para gastos absolutamente discricionários e descontextualizados da conjuntura vivida.

No que tange às contratações, nos termos do art. 8º, inciso IV, ficam proibidas, salvo nos seguintes casos: a) as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa; b) as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios; c) as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal; d) as contratações de temporários para prestação de serviço militar; e) as contratações de alunos de órgãos de formação de militares.

Fato é que, mesmo sabendo do caráter excepcional de nomeações nesse período, as contingencialidades da crise de saúde mundial sobrelevam a importância de recomposição de determinadas categorias profissionais, principalmente por estarem mais expostas aos riscos de contaminação e por necessitarem intensificar suas ações funcionais em prol da manutenção da teia social. É o caso dos profissionais de saúde e da segurança pública.

As forças de segurança, por exemplo, estão contempladas em outras leis derivadas desse momento de crise de saúde mundial. Isso reforça a tese de que, a despeito de restrições de gastos, tais categorias vêm recebendo atenção especial do legislador pela essencialidade de suas funções e pelos maiores riscos dela derivados. Dentro desse espírito, a Lei 13.898/2020 veda, no art.  18, uma série de despesas, mas excepciona, no § 1º, ações de segurança pública; o Decreto nº 10.282/2020, que regulamenta a Lei 13.979/2020, estabelece, como não poderia deixar de ser, a segurança pública como serviço essencial indispensável ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (art. 3º, § 3º, III). Por isso, acreditamos que o Projeto de Lei não pode ser interpretado fora dessas balizas.

Neste cenário, a discussão sobre o tratamento diferenciado dos profissionais de saúde e de segurança precisa ser avaliada sem desconsiderar a necessidade de se recompor a defasagem histórica de pessoal e a precariedade de infraestrutura das polícias e do sistema de saúde. Até porque os policiais e os profissionais de saúde tendem a adoecer nessa crise sanitária mundial em razão da maior exposição ao vírus, o que escancarará ainda mais a dívida histórica em investimentos nessas áreas.

Quando se lê o artigo 10 do presente Projeto de Lei, poder-se-ia acreditar, num primeiro momento, que se determina a suspensão dos prazos de validade de todos os concursos públicos já homologados na data da publicação do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, em todo o território nacional, até o término da vigência do estado de calamidade pública estabelecido pela União. Contudo, essa não é a melhor exegese do dispositivo: deve-se perceber tal mecanismo como uma garantia aos candidatos de concursos que, uma vez não abarcados pelas exceções legais de contratação elencadas no inciso IV, do art. 8º, não sejam prejudicados em virtude desse período de vedação a nomeações.

Dessa forma, conjugando-se o art. 8º, inciso IV, com o art.  10, não há outra interpretação senão a de que os concursos homologados só serão suspensos se não estiverem contemplados nas exceções mencionadas no inciso IV do art. 8º, inclusive com o mote de recompor as lacunas estruturais preexistentes (vacâncias).

Defendemos que, implicitamente, deva existir o importante requisito de serem tais concursos vinculados às áreas essenciais (por mais que isso não esteja previsto expressamente no Projeto de Lei). Aduzimos isso, pois esse não parece ser o momento adequado para contratações que não se destinem às atividades de enfrentamento à pandemia. Repare que a contratação fora dessas áreas não estaria vedada pela Lei (desde que se encaixem nas exceções construídas no bojo do art.  8º, inciso IV), mas não pareceria política e economicamente adequada.

Ademais, certames públicos derivados da reestruturação do quadro de pessoal, por meio da criação de novos cargos a partir da vigência da referida lei, salvo se vinculada às demais exceções do art.  IV do art.  8º, podem ser suspensos, mesmo que afetos a áreas absolutamente estratégicas para o combate à pandemia (inclusive saúde e segurança pública). A lei e o contexto não permitem o aumento irrestrito da máquina pública, mas, tão somente, a recomposição das vagas da carreira que já estavam preteritamente vacantes ou nos casos das demais exceções infralistadas, como nas hipóteses de contratações de temporários para prestação de serviço militar e de alunos de órgãos de formação de militares:

Art. 8º. IV – admitir ou contratar pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares.

Acerca das vacâncias, frisamos que tal Projeto de Lei não se limita ao preenchimento de vacâncias ocorridas após a entrada em vigor desse novo comando normativo ou mesmo em face da publicação do Decreto Legislativo n. 6 de 20 de Março de 2020. Se essa fosse a intenção do legislador, teria deixado expresso tal marco delimitatório no inciso IV, do art. 8º do Projeto, o que optou por fazer somente no caput do art. 10. Até porque, a nosso ver, a sensibilidade do legislador em tentar corrigir a deficiência histórica em áreas estratégicas foi tardia, mas não inoportuna.

Outra importante informação é que os concursos em andamento não precisam ser paralisados ou suspensos, porquanto o requisito necessário para eventual sobrestamento é que tenha havido a homologação do certame até a data da publicação do Decreto Legislativo n. 6, de 20 de Março de 2020 (nos termos do art.  10 do Projeto de Lei). Já os concursos ainda não iniciados, se tiverem por fundamento a reposição de vacâncias (atuais ou pretéritas), serão permitidos por força do art. 8º, inciso V.

Informação importante é que o legislador não se imiscuiu nas nomeações derivadas de mandamentos judiciais. Diferentemente do que o fez em relação ao art.  8º, inciso I, permitindo a concessão de quaisquer tipos de vantagens pessoais somente quando derivada de sentença judicial transitada em julgado (afastando as de caráter precário), não houve qualquer tipo de especificação nesse sentido em relação às contratações de servidores. Nesse caso, por óbvio, parece evidente que não há justificativa para o desrespeito às ordens judiciais de nomeação, ainda que a título de tutela de urgência ou de evidência.

Em resumo, não só é permitido, como é absolutamente necessário recompor ao máximo o quadro das carreiras diretamente envolvidas no enfrentamento da pandemia (precipuamente as da área saúde e da segurança pública), pois, em sendo real o risco de adoecimento dos integrantes destas categorias profissionais, não seria possível a nomeação de novos servidores em virtude somente de licença médica (a qual não induz a vacância do cargo público). Ou seja, tais contratações, permitindo uma recomposição dos quadros de pessoal (mesmo que atrasada), servem também como reserva de pessoal em um momento para lá de delicado.

 é delegado de polícia do RJ e professor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, da Escola da Magistratura de Mato Grosso e do Cers. Autor de livros e palestrante.

Eduardo Fontes é delegado de Polícia Federal, professor do Cers (onde também coordena a pós-graduação) e especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos pelo Ministério da Justiça. Coordenador do Iberojur no Brasil e autor e coordenador da Juspodivm.

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Juíza nega testes quinzenais de coronavírus para policiais penais

Por não ver justificativa suficiente para concessão de liminar, a juíza Leila Cury, da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, negou um pedido feito pelo Sindicato dos Policiais Penais do DF (SINDPEN/DF), que pedia que o Distrito Federal fosse obrigado a aplicar, quinzenalmente, testes diagnósticos durante o período em que persistir a pandemia da Covid-19.

 Juíza nega realização quinzenal de testes de coronavírus para policiais penais no DF
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No pedido, o sindicato alega que o governo do Distrito Federal estaria descumprindo a Lei Distrital 5.321/2014, acrescida pela Lei Distrital 6.554/2020, que estabelece a obrigatoriedade de realização de testes diagnósticos em servidores públicos que estejam em contato com possíveis portadores de agente infeccioso a cada 15 dias.

Segundo o sindicato, apenas os policiais penais que apresentem sintomas da Covid-19 estariam sendo submetidos aos referidos testes.

Ao analisar o caso, a magistrada destacou que as afirmações feitas pela parte autora não são suficientes para justificar a concessão do pedido em caráter liminar, pois não foram apresentados elementos que comprovem a presença dos requisitos legais para tal acolhimento.

Segundo a juíza, o Sindicato não apresentou qualquer comprovante apto a indicar a necessidade urgente da referida testagem, assim como não houve indicação da existência de um quantitativo de testes de posse da Secretaria de Saúde do DF em número suficiente para atender ao público mencionado. “Nesse sentido, eventual acolhimento da tutela ora analisada, sem a manifestação da parte contrária e sem o necessário embasamento técnico, implicaria em uma determinação judicial manifestamente temerária”, ressaltou a magistrada.

Por fim, a magistrada pontuou que “as ações colocadas em prática pela SSP/DF, em conjunto com a Secretaria de Saúde do DF, demonstram atenção constante à categoria representada pela parte autora, de forma que não vislumbro fundamento relevante e urgente para o acolhimento do pleito em análise, ao menos em sede de tutela de urgência”. Com informações da assessoria de comunicação do TJ-DF.

0402929-26.2020.8.07.0015

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Academia de ginástica de BH deve ficar fechada, diz TJ-MG

Uma academia de ginástica de Belo Horizonte — a Sempre Viva — havia conseguido na Justiça autorização para funcionar. Mas uma decisão do TJ-MG desta terça-feira (12/5) suspendeu a liminar que havia sido concedida no primeiro grau, determinando, assim, que o estabelecimento permaneça fechado durante o período de confinamento decorrente da epidemia de Covid-19.

Para TJ-MG, prefeitura de BH tem competência para determinar fechamento de academias de ginástica

A suspensão da liminar foi determinada pela desembargadora da 8ª Câmara Cível do TJ-MG, Ângela de Lourdes Rodrigues. A liminar do primeiro grau havia sido concedida em 5/5. Em tal decisão, o juiz Maurício Leitão Linhares, ao conceder a autorização, questionou a legalidade e a constitucionalidade do Decreto Municipal 17.328/2020, que suspendeu temporariamente os alvarás de localização e funcionamento.

Em seu pedido de suspensão de liminar, a prefeitura de Belo Horizonte alegou que restrição obedece a critérios científicos “recomendados por autoridades sanitárias federais, estaduais, e internacionais, e, também, nas orientações decorrentes da própria experiência de outros municípios, estados e países com o enfrentamento da covid-19”.

Para o município, a academia de ginástica não se enquadra em nenhuma das exceções estabelecidas no decreto municipal. Sendo assim, somente pode desempenhar o expediente interno com portas fechadas e adoção de escala mínima de pessoas, estritamente necessário à manutenção de serviço e à manutenção de seus equipamentos e insumos.

A desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues ressaltou a competência do município para editar norma de restrição de atividades econômicas em razão da Covid-19. Segundo ela, essa competência já reconhecida expressamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão cautelar proferida em 8 de abril deste ano, na ADPF 672.

Ao deferir o pedido liminar, a magistrada disse que “em análise sumária, afigura-se que o colendo Supremo Tribunal Federal, diante do caótico cenário advindo da pandemia de Covid-19, tem assinalado a competência dos entes municipais no controle da saúde, o que seguramente inclui a questão do isolamento social”.

No início desta semana, o presidente Jair Bolsonaro editou decreto segundo o qual salões de beleza, barbearias e academias de esportes são atividades essenciais. Mas vários governadores afirmaram que não seguirão a nova norma. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-MG.

Processo 1.0000.20.058036-3/001

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Cônjuge que autoriza o outro a ser avalista não deve ser citado

Um homem que entrou em um negócio como avalista e foi cobrado por falta de pagamento tentou escapar da cobrança alegando que sua mulher não foi citada como litisconsorte, mas a estratégia não deu certo. Como sua cônjuge limitou-se a autorizar a participação do marido na operação financeira, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que ela não pode ser considerada avalista e, por isso, negou o recurso que pretendia obter a anulação da ação de execução.

A ministra Isabel Gallotti foi a relatora do recurso no Superior Tribunal de Justiça
Rafael Luz/STJ

Quando as cédulas de crédito da qual ele era avalista não foram pagas, o homem sofreu a ação de execução proposta pela credora, uma instituição bancária. Ele, então, apresentou exceção de pré-executividade com a alegação de que é casado em comunhão universal de bens e que, por isso, sua esposa deveria ter sido citada como litisconsorte — como isso não ocorreu, ele pleiteou a decretação da nulidade da execução.

O caso foi julgado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que não deu ganho de causa ao impetrante. A alegação foi que o título de crédito tem natureza pessoal e que, portanto, só pode ser atribuído ao avalista. Como a esposa assinou o documento da operação financeira apenas para dar seu consentimento ao marido para participar do negócio, ela não pode ser considerada avalista, segundo o TJ-MG.

O homem, então, recorreu ao STJ, mas a corte confirmou a decisão tomada pelo tribunal de segunda instância.

“Tal como bem observou a corte local, não há de se falar em litisconsórcio necessário porque o cônjuge do avalista não é avalista ou tampouco praticou ato visando à garantia”, argumentou a relatora do recurso, a ministra Isabel Gallotti.

Segundo ela, mesmo que a esposa fosse considerada avalista, isso não seria motivo para provocar o encerramento da ação de execução.

“Não seria o caso de extinção do feito, como pretende o recorrente, mas de mero retorno dos autos à origem para emenda à inicial, o que não é o caso”, explicou a ministra. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 1475257