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Lei do Agro, patrimônio de afetação e efeitos fiscais (página 1 de 3)

No último mês de abril tivemos a publicação da “Lei do Agro”, consubstanciada na Lei n. 13.986/2020 (conversão da MP 897/2020), a qual traz inovações como o Fundo Garantidor Solidário (FGS), patrimônio rural em afetação, cédula imobiliária rural, além de alterações na cédula de produtor rural (CPR) e outros títulos do agronegócio.

Neste breve texto pretendemos traçar algumas considerações a respeito de efeitos fiscais no tocante ao patrimônio rural de afetação.

Este instituto jurídico é conhecido do setor imobiliário, nos termos do art. 31-A, da Lei n. 4.591/64, inserido por meio da Lei n. 10.931/2004, onde enuncia que:

“Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.

§ 1º O patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do incorporador ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos e só responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva.”

De forma sintética, o patrimônio de afetação no setor imobiliário diz respeito à constituição de uma universalidade de bens (imóveis e móveis) com a finalidade específica a consecução de determinada incorporação e entrega de unidades aos respectivos adquirentes. Com isso, tem-se segurança jurídica em tais relações, eis que referido patrimônio seria uma forma de proteger o empreendimento e os respectivos adquirentes, impedindo que dívidas e obrigações que não tenham relação com este atinjam este patrimônio afetado.

Com relação ao patrimônio rural em afetação, sua disciplina consta do Capítulo II, da Lei n. 13.986/2020 (Lei do Agro), ao dispor o art. 7º que “O proprietário de imóvel rural, pessoa natural ou jurídica, poderá submeter seu imóvel rural ou fração dele ao regime de afetação”.

A finalidade deste instituto será, conforme parágrafo único do art. 7º:

“No regime de afetação de que trata o caput deste artigo, o terreno, as acessões e as benfeitorias nele fixadas, exceto as lavouras, os bens móveis e os semoventes, constituirão patrimônio rural em afetação, destinado a prestar garantias por meio da emissão de Cédula de Produto Rural (CPR), de que trata a Lei nº 8.929, de 22 de agosto de 1994, ou em operações financeiras contratadas pelo proprietário por meio de Cédula Imobiliária Rural (CIR).”

Trata-se, portanto, de uma forma de estabelecer uma garantia quanto à emissão de cédula de produtor rural (CPR) ou operações financeiras por meio da cédula imobiliária rural (CIR).

Ele será constituído por solicitação do proprietário por meio de registro no cartório de imóveis (art. 9º), sendo que os bens e direitos integrantes do patrimônio “não se comunicam com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do proprietário ou de outros patrimônios rurais em afetação por ele constituídos”, desde que: (i) – vinculado o patrimônio rural em afetação a CIR ou a CPR; (ii) – na medida das garantias expressas na CIR ou na CPR a ele vinculadas; (iii) – somente CIR e CPR podem ser constituída sobre este patrimônio; (iv) – o imóvel afetado “não poderá ser objeto de compra e venda, doação, parcelamento ou qualquer outro ato translativo de propriedade por iniciativa do proprietário”.

Deste modo, por ser um patrimônio destinado a garantir CIR e CPR, não pode ser utilizado para realizar ou ser garantia “de qualquer outra obrigação assumida pelo proprietário estranha àquela a qual esteja vinculado” (art. 10, § 3º), sendo “impenhorável e não poderá ser objeto de constrição judicial” (art. 10, § 3º). Da mesma forma, não poderá ser atingido “pelos efeitos da decretação de falência, insolvência civil ou recuperação judicial do proprietário de imóvel rural” ou mesmo integrar massa concursal (art. 10, § 4º), tendo como exceções à esta proteção “obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais do proprietário rural” (art. 10, § 5º).

Para o registro do patrimônio rural de afetação, haverá necessidade de o titular instruir com os seguintes documentos (art. 11 e 12): (i) – inscrição do imóvel no Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR), do domínio do requerente e da inexistência de ônus de qualquer espécie sobre o patrimônio do requerente e o imóvel rural; (ii) – inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR); (iii) – regularidade fiscal, trabalhista e previdenciária do requerente; (iv) – certificação, perante o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do georreferenciamento do imóvel do qual a totalidade ou a fração está sendo constituída como patrimônio rural em afetação; (v) – prova de atos que modifiquem ou limitem a propriedade do imóvel; (vi) – o memorial de que constem os nomes dos ocupantes e confrontantes ( com a indicação das respectivas residências;(vii) – planta do imóvel, obtida a partir de memorial descritivo assinado por profissional habilitado e com a Anotação de Responsabilidade Técnica, que deverá conter as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional adotada pelo Incra para a certificação do imóvel perante o Sigef/Incra; e (viii) – coordenadas dos vértices definidores dos limites do patrimônio afetado, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional adotada pelo Incra para certificação do imóvel perante o Sigef/Incra.

Segundo esclarecido acima, este patrimônio de afetação tem por destino garantir dois tipos de títulos de crédito ligados à atividade rural: (i) – CIR; e (ii) – CPR.

A cédula imobiliária rural (CIR) está prevista no Capítulo III da Lei do Agro, esclarecendo art. 17, que se trata de título de crédito “nominativo, transferível e de livre negociação, representativa de promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito de qualquer modalidade” e “obrigação de entregar, em favor do credor, bem imóvel rural, ou fração deste, vinculado ao patrimônio rural em afetação, e que seja garantia da operação de que trata o inciso I do caput deste artigo, nas hipóteses em que não houver o pagamento da operação até a data do vencimento”.

 

Por sua vez, a cédula de produtor rural (CPR) tem previsão no art. 1º, da Lei n. 8.929/94, o qual preceitua:

“Art. 1º Fica instituída a Cédula de Produto Rural (CPR), representativa de promessa de entrega de produtos rurais, com ou sem garantias cedularmente constituídas. (Redação da pela Lei nº 13.986, de 2020)

 é advogado tributarista, sócio do Brasil Salomão e Matthes Advocacia. É doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, pós-doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal) e ex–membro do Carf.

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Norma do BC que limita renegociação de dívida é questionada no STF

Princípio da Isonomia

Norma do BC que limita renegociação de dívida é questionada no STF

A Confederação Nacional do Turismo (CNTUR) ajuizou ação no Supremo Tribunal Federal contra trechos da Resolução 4.782/2020 do Conselho Monetário Nacional (CNM) e do Banco Central, que trata trata de programa especial de renegociação de dívidas, em decorrência dos efeitos econômicos da pandemia do novo coronavírus. O relator é o ministro Marco Aurélio.

A resolução prevê a renegociação e a prorrogação de dívidas bancárias, empréstimos e financiamentos de devedores e mutuários no período de 60 dias ou mais.

A confederação alega que a medida fere o princípio da isonomia, ao conferir tratamento diferente a empresas inadimplentes, impondo-lhes restrições e limites, quando sua finalidade deveria ser garantir o acesso amplo e irrestrito de todos à renegociação e à prorrogação dos vencimentos das parcelas de empréstimos e financiamentos.

Segundo a CNTUR, no lugar de flexibilizar, as instituições financeiras desfiguraram os objetivos sociais e econômicos das medidas protetivas com a imputação de acréscimos de valores, taxas, juros e correção monetária.

A autora da ação pede ao Supremo que determine que todas as flexibilizações previstas na resolução sejam direcionadas de forma ampla a todas as pessoas jurídicas e físicas, sem restrição, distinção ou exigências, adimplentes ou não, com a postergação dos vencimentos para o final do contrato.

Requer também que as instituições financeiras se abstenham de imputar juros, multas e correção monetária sobre as operações financeiras objeto da respectiva renegociação. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 6.368

Revista Consultor Jurídico, 10 de abril de 2020, 16h45