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Negociação de drogas por telefone não sustenta denúncia, diz STJ

A ausência total de apreensão de entorpecentes e sua comprovação por laudo técnico caracterizam situação em que a denúncia por tráfico de drogas deve ser rejeitada. A negociação das substâncias captada em interceptação telefônica, por si só, não sustenta a continuidade da ação criminal.

Materialidade do tráfico de drogas não pode ocorrer por interceptação telefônica
Reprodução

Com esse entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a rejeição de denúncia contra dois acusados de tráfico internacional de drogas. Segundo o Ministério Público Federal, ambos negociaram a compra de 100 kg de pasta base de cocaína e 20 kg de cloridrato, com emprego de arma de fogo, vindos do Paraguai para Uberlândia (MG).

A negociação foi captada por ligações gravadas, mas as drogas nunca foram apreendidas. Para o ministro Nefi Cordeiro, autor do voto vencedor, há ausência de lastro probatório mínimo. 

Ele explicou que se admite que a prova da materialidade do tráfico possa ser demonstrada por outros meios se a apreensão impossibilitada por ação do criminoso, “que não poderia de sua má-fé se beneficiar”. Não é o caso dos autos, já que não há materialidade a embasar a denúncia.

Fortes indícios

Ficou vencido o relator, ministro Rogério Schietti, para quem a justa causa para a ação penal é a “conformidade com a ordem jurídica e um certo grau de prova”, segundo doutrina da ministra Maria Thereza de Assis Moura, vice-presidente do STJ e autora de obra sobre o tema.

Ele entendeu presentes “fortes indícios/provas da prática do crime de tráfico de drogas”. Apontou, por exemplo, para as descobertas da “operação comenda”, que tratou do caso, para entender que a negociação captada nas interceptações não é um caso isolado.

Destacou que líderes de organizações criminosas dificilmente são flagrados na posse da droga e que as tratativas feitas pelos acusados, para importação, pagamento e aquisição de entorpecentes, são suficientes. Além disso, as características da atuação descrita nestes autos coincidem com as de outros atos delituosos, perpetrados pelo mesmo grupo criminoso, em que houve apreensão de drogas.

“Diante de tais considerações, embora não tenha havido, neste caso, a apreensão de droga e, por conseguinte, conquanto não haja sido realizado exame preliminar de constatação da substância, reputo que, especificamente no caso dos autos, há lastro mínimo de elementos informativos suficientes a evidenciar a tipicidade da conduta atribuída aos recorridos, no que diz respeito ao crime de tráfico de drogas”, concluiu.

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REsp 1.800.660

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Pena por posse de drogas só aumenta com reincidência específica

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o aumento de pena no crime de posse de drogas para consumo próprio só pode ser aplicado em caso de reincidência específica. Com isso, mudou seu próprio entendimento sobre o tema, pois, até então, considerava que o aumento da pena era aplicável à reincidência genérica.

O ministro Nefi Cordeiro defendeu a mudança de entendimento do STJ
ConJur

A nova decisão foi tomada na análise de um recurso do Ministério Público que sustentava que a reincidência genérica bastaria para o aumento da pena. O recurso era referente ao caso de um réu condenado por receptação e posse de drogas para consumo próprio. Ele havia sido anteriormente condenado por roubo, então foi aplicada a causa de aumento do artigo 28, parágrafo 4º, da Lei de Drogas, na primeira instância. A pena ficou, então, em um ano de reclusão e dez meses de prestação de serviços comunitários.

Mais tarde, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo mudou a decisão com o argumento de que o aumento de pena previsto no artigo 28 da Lei de Drogas deve ser aplicado apenas se o réu tiver condenação anterior por posse de drogas para consumo próprio, o que não era o caso. O MP entendia que a condenação anterior por roubo bastava para que a pena fosse aumentada, por isso recorreu ao STJ, que confirmou a decisão de segunda instância. Assim, a pena de prestação de serviços do réu caiu para cinco meses.

O ministro relator do recurso, Nefi Cordeiro, disse que era preciso alterar o entendimento anterior da 6ª Turma, pois, segundo ele, uma análise mais aprofundada da situação levou à conclusão de que a reincidência citada no parágrafo 4º do artigo 28 tem de ser específica, ou seja, para que a pena seja ampliada é preciso que a condenação anterior tenha sido pelo mesmo crime de posse de drogas para consumo próprio. 

“A melhor exegese, segundo a interpretação topográfica, essencial à hermenêutica, é de que os parágrafos não são unidades autônomas, estando vinculadas ao caput do artigo a que se referem”, argumentou o ministro. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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REsp 1771304

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Delegado baleado em serviço deve ser indenizado pelo estado

O policial ferido durante diligência deve ser indenizado pelo estado, já que atividades de risco inerente atraem a responsabilidade objetiva, e não a subjetiva. Assim, como o estado está no papel de empregador, nem é preciso apurar se agiu com culpa ou dolo.

Estado responde objetivamente por danos causados a policial por tiros
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Com este entendimento, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça gaúcho confirmou sentença que condenou o estado do Rio Grande do Sul a indenizar um delegado da Polícia Civil ferido no confronto com traficantes em Caxias do Sul. O colegiado manteve o valor da reparação por danos morais em R$ 50 mil, mas diminuiu, de R$ 50 mil para R$ 20 mil, reparação pelos danos estéticos.

O relator da apelação, desembargador Eugênio Facchini Neto, afirmou que a obrigação de indenizar prevista no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, se aplica também à responsabilidade complementar dos empregadores, nos casos de acidentes de trabalho que se desenvolvam em condições de periculosidade inerente. É que, à luz da Constituição, não se pode considerar dolo ou culpa com um ‘‘teto’’, mas como ‘‘piso mínimo’’ de proteção do trabalhador. Assim, nada impede que a legislação infraconstitucional amplie a proteção devida ao trabalhador, elo frágil da cadeia produtiva.

Conforme o relator, ao julgar o Recurso Extraordinário 828.040 – tema 932 da repercussão geral –, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o empregador tem responsabilidade civil objetiva em acidentes de trabalho nas atividades de risco inerente.

‘‘A atividade policial traz inerentes riscos aos policiais. E dentre estes riscos está o de os agentes serem surpreendidos por suspeitos e terem sua integridade física diretamente afetada. Não por outra razão há pagamento de verbas indenizatórias de antemão aos servidores públicos que exercem tais atividades’’, anotou no acórdão.

Ação indenizatória

O delegado da Polícia Civil Marcelo Grolli acabou baleado nas duas pernas e no braço direito durante uma perseguição a suspeitos de tráfico de drogas em Caxias do Sul, ocorrida no dia 7 de outubro de 2011. Para se recuperar das lesões sofridas, ele teve de passar por 16 procedimentos cirúrgicos e ainda precisou se tratar de transtornos pós-traumáticos e de ansiedade decorrentes do fato.

Na inicial indenizatória, ajuizada exatamente cinco anos depois do tiroteio, o autor argumentou que o fato de o estado ter custeado os procedimentos cirúrgicos importa no reconhecimento de sua responsabilidade pelos danos sofridos. Pediu 50 mil de indenização para a reparação dos danos estéticos (cicatrizes) e mais R$ 50 mil a título de indenização por danos morais. Afinal, o fato que gerou os danos se enquadra como acidente de serviço, conforme reconhecido pela Resolução 51.868 do Conselho Superior de Polícia.

Citado pela 2ª Vara da Fazenda Pública de Caxias do Sul, o estado apresentou contestação, alegando, inicialmente, que a exposição ao risco é inerente à profissão de policial civil. Afirmou que o caso requer a aplicação da responsabilidade subjetiva, e não objetiva. Assim, antes de se falar em indenização, é preciso analisar elementos como conduta, dano, nexo causal e culpa do estado. Em síntese, é preciso a comprovação de conduta omissiva por parte do Estado e sua culpa (lato sensu) para o ocorrido, bem como o nexo causal entre o dano e a atuação estatal.

Sentença procedente

A juíza Maria Aline Vieira Fonseca julgou totalmente procedente a ação, inclusive acolhendo os valores sugeridos para o quantum indenizatório. Nas razões de decidir, a julgadora observou que, nas ações que envolvem segurança pública, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sinaliza que cabe ao empregador – no caso dos autos, o Estado do Rio Grande do Sul – demonstrar o correto e adequado cumprimento das normas de segurança.

Ou seja, o estado tem o ônus de provar que adotou os meios suficientes e adequados para assegurar a preservação da integridade física do seu servidor, respeitando as normas de segurança e medicina do trabalho, a fim de evitar ou diminuir o risco de lesões.

Conforme a juíza, a falta de treinamento técnico e o pequeno número de policiais destacados para um serviço de alta complexidade, como o de combate a uma quadrilha de traficantes de drogas, contribuíram para o evento danoso. Um dos policiais que estavam na ação – destacou a julgadora – disse que o 3º Distrito de Polícia, que conta com um delegado e três agentes, investiga e combate todo o tráfico de drogas em Caxias do Sul. Em juízo, a testemunha resumiu bem a situação dos policiais: ‘‘Treinamento, a gente recebeu na academia; depois, nunca mais”.

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Processo 010/1.16.0026544-8

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.