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Pierpaolo Cruz Bottini: O futuro de Bolsonaro e Moro

Moro prestou depoimento neste sábado (2/5) na Polícia Federal para esclarecer o conteúdo de seu discurso, proferido em entrevista coletiva, na semana passada, quando anunciou sua saída do Ministério da Justiça. Segundo a PGR, os fatos narrados pelo ex-ministro podem caracterizar, da parte de Bolsonaro, falsidade ideológica, advocacia administrativa e obstrução da Justiça, em princípio. Por outro lado, Moro pode incorrer em denunciação caluniosa e prevaricação, entre outros.

Comecemos por Bolsonaro.

A falsidade ideológica existirá caso o presidente tenha expressamente determinado a publicação da exoneração do diretor-geral da Polícia Federal no Diário Oficial com a assinatura do ex-Ministro da Justiça. Caso a subscrição tenha sido inserida por ordem de terceiros, sem sua ciência, não haverá crime de sua parte. Tudo dependerá das provas colhidas no inquérito.

No que se refere a supostas tentativas de interferir em inquéritos policiais, há várias hipóteses possíveis. Caso se chegue à conclusão de que Bolsonaro pretendia alterar o comando da Polícia Federal para, futuramente, intervir em investigações, não há crime. Há diversas faltas na conduta, mas para que o direito penal atue é necessário mais do que simples intenções ou planos.

Por outro lado, se o Presidente tentou, concretamente, intervir em inquéritos, a situação é distinta, a depender do ocorrido. Se a ingerência se limitou a um pedido de informações sobre investigações em andamento, o fato é indiferente sob um prisma penal. Mesmo que sigiloso o expediente, ter notícias sobre seu conteúdo é diferente de atrapalhar seu desenvolvimento. Poderia haver delitos relacionados à quebra de sigilo, mas ao que consta sua execução sequer foi iniciada, e não há como punir a instigação de crime sequer tentado.

Caso a interferência tenha ido além do pedido de informações, a situação é mais grave. Se existiram atos concretos de intervenção em investigação sobre organização criminosa, haverá obstrução de Justiça, com pena de três a oito anos de prisão. Se houve apenas pedidos de tratamento mais brando ou investigações menos rigorosas, existirá advocacia administrativa, caracterizado como o ato de patrocinar interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário. A pena é de detenção de três meses a um ano.

Nesses casos, o presidente terá praticado, no mínimo, crime comum relacionado ao cargo, a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal caso a Câmara dos Deputados admita seu processamento.

Quanto a Moro, sua conduta pode caracterizar denunciação caluniosa, se tiver dado causa à instauração de investigação policial ou similares contra Bolsonaro, imputando-lhe crime de que o sabe inocente.

Por outro lado, se Bolsonaro praticou crimes (advocacia administrativa ou obstrução de investigação), Moro pode ter prevaricado ou praticado contravenção penal. Para a primeira hipótese, deve ficar configurado que ele deixou de determinar investigação dos atos do presidente para satisfazer a interesses pessoais (CP, arigo. 319). Para a segunda, basta demonstrar que ele não comunicou a autoridade competente crime “de que teve conhecimento no exercício da função pública” (LCP, artigo 66).

O futuro jurídico — e quiçá político — de ambos depende das investigações da Polícia Federal e da decisão do Procurador-Geral da República que, diante das provas colhidas, deverá propor o destino mais adequado ao caso. A sorte e o azar estão lançados.

 é advogado, sócio do escritório Bottini e Tamasauskas e professor livre-docente de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP.

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Sem lista tríplice, Doria pode escolher terceiro nome para PGJ.

Um parecer da Procuradoria-Geral do Estado, produzido em 1995, após a eleição de Mário Covas para o governo do estado de São Paulo, pode mudar os rumos da corrida eleitoral para cargo de procurador-geral de Justiça agora. E influir diretamente nas escolhas de dirigentes de universidades e fundações públicas do estado.

Apelidadas de “democratismos antidemocráticos”, essas eleições são consideradas nocivas ao interesse público, na medida em que servem a interesses de corporações, em conflito com o interesse da população.

Diferente do que acontece no Ministério Público Federal, a lista tríplice do MP de São Paulo é prevista em lei. O parecer de 1995 prevê alternativa quando o governador não recebe uma lista com três nomes. Nesse caso, ele teria o direito de preencher as vagas com qualquer um dos procuradores elegíveis do MP de São Paulo, e só depois fazer sua escolha.

A opinião técnica veio para resguardar o direito de escolha do chefe do executivo estadual, já que, na época, se cogitava a possibilidade de o MP de São Paulo indicar apenas um nome, constrangendo o governador.

Em 2020, a eleição teve dois candidatos. O vencedor foi o procurador Antonio Carlos da Ponte que recebeu os votos de 1.020 de seus colegas. O segundo colocado foi o ex-subprocurador-geral de Políticas Criminais do Ministério Público de São Paulo, Mario Luiz Sarrubbo, com 657 votos.

Não houve terceira candidatura, o que, em tese, faculta ao atual governador João Dória e possibilidade de completar a lista com um nome de sua escolha entre os pouco mais de 300 procuradores elegíveis para o cargo de procurador-geral de Justiça.

O pleito do MP-SP de 2020 foi marcado por um forte movimento pelo voto nulo pregado, preferencialmente, por grupos de WhatsApp de promotores e procuradores.

Existe ainda outro fator que torna a nomeação do PGJ deste ano ainda mais relevante: as eleições municipais. O procurador-geral é responsável por aprovar os promotores eleitorais nas zonas eleitorais. O mandato do novo PGJ vai abarcar toda a fase de formação das coligações partidárias. Diante desse cenário, a responsabilidade do governador na nomeação é ainda maior.

Precedente inverso

Em 2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo enfrentou uma questão inversa, na escolha do membro que preencheria o quinto constitucional. O caso foi parar no Conselho Nacional de Justiça.

O TJ-SP rejeitou por duas vezes a lista sêxtupla de integrantes do Ministério Público destinada ao preenchimento da vaga do quinto constitucional. Na ocasião, membros do Órgão Especial recusaram a lista sob o argumento de ela violou a tradição do TJ de só nomear procuradores para a vaga do MP.

O caso só foi decidido no CNJ, que acabou revogando a decisão do TJ-SP. “Agora, imagine o que aconteceria se eles não tivessem entregado uma lista completa”, comentou à ConJur um procurador que pediu para não ser identificado.