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Não cabe ao Judiciário definir quais atividades devem funcionar

Não cabe ao Poder Judiciário decidir qual ramo de atividade econômica pode ou não funcionar durante a epidemia do novo coronavírus, ainda que medidas profiláticas estejam sendo adotadas ou que determinado setor abra epenas parcialmente. 

Para Toffoli, não cabe ao Judiciário definir quais atividades devem ou não funcionar    Nelson Jr./SCO/STF

O entendimento é do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, ao considerar válido decreto municipal em vigência que determina o fechamento dos escritórios de advocacia em João Pessoa (PB). A decisão, em antecipação de tutela, foi proferida nesta segunda-feira (15/6).

Toffoli apreciou um pedido de suspensão liminar ajuizado pelo próprio município de João Pessoa contra decisão do Tribunal de Justiça da Paraíba. A corte estadual, acatando a uma solicitação feita pela OAB-PB, permitiu a reabertura dos escritórios, a despeito do decreto que vigora na cidade. 

Para o presidente do STF, “apenas eventuais ilegalidades ou violações à ordem constitucional vigente devem merecer sanção judicial, para a necessária correção de rumos, mas jamais promover-se a mudança de políticas adotadas, por ordem de quem não foi eleito para tanto e não integra o Poder Executivo, responsável pelo planejamento e execução dessas medidas”. 

Ainda segundo ele, “não se mostra admissível que uma decisão judicial, por melhor que seja a intenção de seu prolator ao editá-la, venha a substituir o critério de conveniência e oportunidade que rege a edição dos atos da administração pública, notadamente em tempos de calamidade como o presente, porque ao Poder Judiciário não é dado dispor sobre os fundamentos técnicos que levam à tomada de uma decisão administrativa”. 

Portas fechadas

De acordo com o município de João Pessoa, o simples fechamento físico das bancas não impede a prestação dos serviços de advocacia, inexistindo, portanto, óbice ao normal exercício da profissão. 

A prefeitura argumentou, ainda, que a decisão do TJ-PB coloca a ordem pública e a saúde pública em risco, uma vez que foi registrado aumento dos casos de contaminação pelo novo coronavírus no estado da Paraíba e em sua capital. 

Na decisão, Toffoli argumentou não ser demais “ressaltar que a gravidade da situação por todos enfrentada exige a tomada de providências estatais, em todas as suas esferas de atuação, mas sempre através de ações coordenadas e devidamente planejadas pelos entes e órgãos competentes, e fundada em informações e dados científicos comprovados e não em singelas opiniões pessoais de quem não detém competência ou formação técnica para tal”. 

Sobre o fechamento físico das bancas, ressaltou que “em nenhum momento foi impedido o exercício da advocacia, naquele urbe, ou mesmo a entrada dos advogados em seus escritórios, tendo sido determinada, tão somente, a manutenção de suas portas fechadas, como forma de preservação das necessárias medidas de isolamento social”. 

SS 5.395

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Carlos Abrão: 15 anos da Lei de Recuperação e Falências

Pajardi, saudoso jurista italiano, diria que vivemos um tempo da falência da falência, exatamente o contraponto que veio a ser instaurado a partir da pandemia na economia. O Diploma nº 11.101/05 teve o principal e inegável mérito de encontrar uma solução legal a fim de que o estado de crise empresarial fosse superado, porém, o grande teste da legislação teve início em 2015, com a entrada de grandes companhias em recuperação judicial, e a derrocada maior aconteceu por força da operação “lava jato”.

Numa escala vetor e de valores, a legislação necessita alteração, não como se apresenta na conjuntura atual, mas pensada, refletida e adaptada. Pequenas e médias empresas não têm fluxo de caixa para pagamentos elevados do administrador e demora excessiva no processamento, a recuperação extrajudicial se revelou tímida e pouco adstrita aos interesses do empresário em dificuldade financeira.

Tínhamos uma lei muito divorciada do seu contexto, mas com o avanço da pandemia o quadro mudou drasticamente, setores como turismo e aviação foram arrebentados e a recuperação não se fará de forma esperada, comércio bem reduzido, aumentando o eletrônico, e uma complicação enorme no setor de serviços. Precisamos destruir os nós que demonstram formalismo e transformar a recuperação em procedimento, e não simples processo municiado de recursos que sobem às instâncias e paralisam a recuperação.

Boa a entrada do produtor rural na recuperação, preenchidos os seus requisitos, mas o que assistimos é a universalização da recuperação invadindo escolas, estabelecimentos de ensino, e até atividades sem fins lucrativos e sem registro de comércio. O futuro marca-se incerto e indeterminado, mas a grande incógnita é, não apenas a mudança legal, marco revolucionário, mas a efetiva aplicação pela Justiça na interpretação dos aspectos de soerguimento da empresa.

Entendemos que o rastro de boa-fé tem sido deixado de lado, raros os casos de afastamento do controlador ou dos maus administradores, e no mais das vezes não podemos conviver com planos que excedem o tempo de duração, sejam constantemente alterados e signifiquem o calote, nos quais a finalidade é de pagar apenas valor simbólico do macro endividamento. Estudos de viabilidade são necessários, não no início do requerimento e seu deferimento, mas o administrador judicial deve ser pró-ativo e evidenciar ao juízo as deformidades do plano e sua consequente impossibilidade de cumprimento.

Um vasto rosário de dúvidas nos identifica com uma legislação moderna mas ao mesmo tempo que se definha rápida e diariamente, na medida em que os problemas contemporâneos são muito mais do que falta de capital de giro ou de caixa, mas envolvem consumo, clientela, ponto, renegociação de luvas e do próprio locativo, já que muitos locadores não ensejam perdas, além do que shopping centers fechados meses a fio terão que abrir mão de participação e mudarão substancialmente as estruturas para se evitar aglomeração mantendo permanente higienização, a exemplo de salas de cinema com menor frequência e público com distância mínima.

O treinamento e a especialização de magistrados é inadiável, a máquina judiciária precisa de investimentos e corpo técnico à altura, muitas cidades pequenas, cujos prefeitos concederam benefícios fiscais para atrair empresas naquelas localidades, o juízo é carente de infraestrutura, donde a circunscrição manteria ao menos um juízo empresarial especializado. A dialética rompe o momento de mera mudança do marco legal, mas sugere um conjunto de medidas para permitir que o devedor se recupere, mas ao mesmo tempo que o credor não seja o único sacrificado. A expressão fortuito ou força maior não pode ter o condão de reescrever completamente o contrato mediante cláusulas e condições que favoreçam apenas uma das partes, a acentuada elevação da moeda estrangeira preocupa aqueles que tem contratos de câmbio e ainda as operações de importação de produtos, já que somos dependentes de insumos. O decálogo produtivo e real do momento atual sinaliza a implementação de medidas tendentes à recuperação do negócio por meio de medidas legais estruturantes

A partir dessa catalogação e consubstanciando o problema maior de não sobrecarregar a máquina judiciária, é essencial não decapitar empresas ou trucidar empresários de forma maquiavélica. A propósito, e considerando a forma sazonal de muitos setores afetados pelo momento de paralisação, temos a ponderar o seguinte:

1) Prazo de 90 dias finda a pandemia para reestruturação amigável;

2) Intervenção das câmaras setoriais para incremento das medidas profiláticas;

3) Devedores que se socorrerem da autofalência poderão ter continuidade automática dos seus negócios com novo ciclo de vida empresarial;

4) Setorialmente as entidades de classe fariam um relatório sobre o reaquecimento econômico e a expectativa de alteração de planos extrajudiciais;

5) Suspensão de todos os processos em curso e de obrigações vencidas por até 180 dias;

6) Pedidos coletivos por setor para fins e efeitos da recuperação judicial obtendo-se uma sentença coletiva que poderia ter execução singular na hipótese de não cumprimento dos padrões globais definidos pelo juízo;

7) Aumento do período de blindagem para as empresas envolvendo sócios e garantes solidários;

8) Convolação de parte substancial da dívida em participação no negócio sem repercutir na responsabilidade solidária ou subsidiária na hipótese de quebra;

9) Pedidos de recuperação durante o período pós pandemia poderão ser publicizados pela rede mundial e registrados na Junta Comercial para conhecimento de terceiros e respectivas impugnações;

10) Contrapartida da redução dos prazos destinados à recuperação de micro e médias empresas até três anos e grandes companhias, cinco anos.

O modelo francês, que tem peculiaridades e maior adaptabilidade, fornece ferramentas para diversas extensões de recuperação, bem diferente da legislação brasileira; chegou o momento e o tempo assim preside que devemos marchar a passos largos para a reconstrução da economia, do cenário do fomento empresarial e prudencialmente de regras inovadoras em termos de possibilitar que empresas saudáveis não se submetam ao regime de extinção fruto da quebra. E uma das conclusões vitais a qual chegamos é que até a pandemia o número de recuperações nos últimos 15 anos superou 25 mil pedidos e doravante o quadro será sombrio no sentido de maior número de quebras e menor recuperação.

Em tempo de recessão, depressão e falta de consumo com a real perda do poder aquisitivo, o Diploma 11.101/05 encerrou um ciclo auspicioso, cabe aos brasileiros vocacionados permitir que a fundação não seja abalada para redimensionar normas econômicas e jurídicas, instrumentos seguros para que não tenhamos terremotos ou tsunamis que causem graves problemas sociais. E para tanto já estamos no limite de buscarmos reformular a lei sem ambicionar milagres econômicos ou recuperações impossíveis, mas pluralmente uma racionalidade maior dentro do contexto adverso contingenciado por um contexto imprevisível e duração indeterminada.

Arregacemos as mangas das camisas e mudemos o que é possível para o monitoramento constante do que pode ser aperfeiçoado e melhorado em termos de ferramentas em prol da atividade produtiva.

 é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, doutor pela USP com especialização em Paris, professor pesquisador convidado da Universidade de Heidelberg e autor de obras e artigos.

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Confirmado recebimento de denúncia por atraso em prestação de contas

Prefeitura de Pau dos Ferros (RN)
Marcos Elias de Oliveira Júnior/Wikipedia

A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, rejeitou embargos de divergência apresentados contra acórdão da 6ª Turma pelo ex-prefeito de Pau dos Ferros (RN) Leonardo Nunes Rêgo e manteve a decisão que determinou o recebimento da denúncia por crime de responsabilidade em razão de atrasos reiterados na prestação de contas do município.

O relator dos embargos, ministro Ribeiro Dantas, invocando precedente da ministra Laurita Vaz (HC 249.835), afirmou que o atraso na prestação de contas configura o crime previsto no artigo 1º, VI, do Decreto-Lei 201/1967, e que o eventual dolo da conduta terá de ser apurado durante a instrução do processo.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte havia rejeitado a denúncia por considerar que as contas atrasaram, mas foram apresentadas, o que afastaria a ideia de que o então prefeito teve a intenção de não cumprir a lei. A decisão foi reformada pela 6ª Turma.

Nos embargos de divergência, a defesa sustentou que o acórdão da 6ª Turma divergiu de dois julgados da 5ª Turma em casos similares, nos quais se entendeu que o mero atraso da prestação de contas, quando não houver lesão à moralidade administrativa ou aos recursos públicos, não configura crime de responsabilidade.

Dinstinção

O ministro Ribeiro Dantas, no entanto, destacou que, no caso do ex-prefeito de Pau dos Ferros, os atrasos aconteceram reiteradamente e sem justificativa durante os quatro anos em que ele esteve no cargo, diferentemente do que ocorreu nos precedentes citados pela defesa.

“Em análise detida dos autos, é possível constatar que os atrasos na prestação de contas por parte do representante do poder executivo local eram reiterados, conforme se percebe do próprio acórdão do Tribunal de Justiça. Além disso, não há justificativa demonstrada para esses atrasos”, afirmou.

Para o ministro, como não houve apenas um mero atraso na prestação de contas, é possível concluir que, ao menos para efeito de recebimento da denúncia, estão presentes elementos passíveis de caracterizar o dolo.

Ribeiro Dantas afirmou ainda que, segundo a jurisprudência do STJ, a verificação do elemento subjetivo do crime de responsabilidade (no caso, o dolo) é conclusão que decorre da instrução do processo, razão pela qual não se pode trancar antecipadamente a ação penal. Com informações da assessoria de imprensa do Superior Tribunal de Justiça.

EREsp 1.195.566 

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Reintegração de área ocupada por indígenas no RS é suspensa

Indígenas estão no parque desde 2016, após terem sido expulsos de outras áreas
Ricardo Stuckert

A reintegração da posse de área do Parque Municipal João Alberto Xavier — no município de Carazinho (RS) —, ocupada por indígenas da etnia Kaingang, foi suspensa pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região havia acolhido o pedido do município, em sede de liminar, para que a área fosse reintegrada no prazo de 30 dias corridos, sob pena de desocupação forçada.

No pedido de Suspensão de Liminar (SL) 1.216, o Ministério Público Federal (MPF) apontava risco de grave lesão à ordem e à segurança públicas, caso a determinação do TRF-4 fosse executada. Destacou que o grupo de indígenas da etnia Kaingang, que reside na área desde 2016, é formado por 183 pessoas, entre eles idosos, gestantes e crianças.

Segundo o MPF, há uma situação de extrema vulnerabilidade social, em razão do grupo não dispor de local para habitação. Esse contexto levou os indígenas, após sucessivos deslocamentos resultantes de ordens de desocupação proferidas em ações de reintegração de posse anteriores, a se abrigarem, provisoriamente, no Parque Municipal João Alberto Xavier da Cruz, até que sobrevenha a conclusão do processo de identificação e delimitação de território no Município de Carazinho.

O MPF também defendeu que a decisão do TRF-4 não contribui para a composição do litígio e agrava a situação, pois os Kaingang procurarão outra área para ocupar. Desse modo, a suspensão da decisão amenizaria os efeitos do conflito até a solução definitiva para alocação dos indígenas, que somente acontecerá com o encerramento do processo judicial de demarcação.

De acordo com o ministro Dias Toffoli, o risco de dano à integridade dos indígenas é patente, pois a medida de reintegração é imediata e não foram estabelecidos critérios mínimos para assegurar a realocação dos grupos Kaingang com segurança, dignidade e respeito à cultura indígena.

“Independentemente de o Poder Público ser ou não o causador da mora para a conclusão do processo demarcatório ou da observância das normas ambientais pelos indígenas, a reintegração liminar de posse não pode acontecer a qualquer custo, mormente sem ponderar as peculiaridades dos indivíduos envolvidos (idosos, gestantes e crianças)”, destacou.

Para Toffoli, caso cumprida a ordem, haverá risco de grave lesão não só à ordem e à segurança públicas, como também a interesse superior legalmente protegido: o direito dos indígenas à terra e à garantia de sua sobrevivência física e cultural. “Há que se considerar que a proteção social, antropológica, econômica e cultural conferida aos índios pela Constituição Federal, preconizada em seu artigo 231, tem como tema central em debate e pressuposto fundamental para sua aplicação a garantia à terra e o vínculo estabelecido entre essa e as comunidades indígenas”, concluiu. Com informações da assessoria de imprensa do STF.

Clique aqui para ler a decisão

SL 1.216 (RS)