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Suspensa decisão que permitia Airbnb funcionar em Gramado

O ministro Luiz Fux, no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, suspendeu decisão da Justiça do Rio Grande do Sul que havia garantido o funcionamento da plataforma digital de aluguel por temporada Airbnb em Gramado (RS).

Igreja Matriz São Pedro em Gramado (RS)
Abtessari

Para o ministro, a cidade é um polo turístico na região, e a manutenção das atividades da plataforma revela risco à ordem e à saúde públicas, por interferir na política de combate ao novo coronavírus. A decisão foi proferida no pedido de Suspensão de Liminar 1.334, apresentado pelo Município de Gramado.

Decretos municipais

Os Decretos municipais 73/2020 e 103/202 de Gramado suspenderam por prazo indeterminado os serviços de hotelaria e hospedagem, inclusive na modalidade de aluguel por temporada, entre outras atividades consideradas não essenciais.

Ao constatar que a Airbnb prosseguia com as locações, o município ajuizou ação civil pública para que a plataforma respeitasse os decretos, tendo em vista a dificuldade de fiscalização e o fato de apenas a Airbnb e a pessoa interessada nos serviços terem acesso à negociação. Outro aspecto apontado foi o fato de não se saber o número de pessoas que ficam em um mesmo recinto, o tempo de permanência e o cumprimento das regras de higienização.

O juízo de primeiro grau determinou a interrupção de anúncios, reservas e locações de acomodações pela Airbnb durante a vigência de normas municipais, mas o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS), em agravo interposto pela plataforma, derrubou essa determinação.

Na SL 1.334, o município pedia a suspensão da decisão do TJ-RS, para a proteção da saúde e da vida das pessoas diante do crescimento da Covid-19 e para o cumprimento de decisão do STF no julgamento da ADI 6.341, em que foi garantida a competência concorrente dos entes federativos na tomada de providências normativas e administrativas sobre a pandemia.

Predominância de interesse

No exame do pedido de liminar, o ministro Luiz Fux considerou plausível a tese de que a decisão do TJ-RS esvazia a eficácia do decreto municipal. Segundo ele, o Supremo tem entendido que a competência da União para legislar sobre assuntos de interesse geral não afasta a incidência das normas estaduais e municipais expedidas com base na competência legislativa concorrente. Para a Corte, devem prevalecer as normas de âmbito regional quando o interesse em questão for predominantemente de cunho local, como no caso.

Risco à ordem e à saúde públicas

Conforme o relator, a gravidade da situação exige a tomada de medidas coordenadas, e não se pode privilegiar determinado segmento da atividade econômica em detrimento de outro ou mesmo do próprio planejamento estatal.

O ministro Luiz Fux afirmou que cabe ao Estado guiar o enfrentamento coletivo “aos nefastos efeitos decorrentes dessa pandemia”. Para ele, é inegável que a decisão do TJ-RS representa grave risco de transgressão à ordem pública e administrativa no âmbito do município e violação à saúde pública, diante da real possibilidade de desestruturação das medidas adotadas ao enfrentamento da epidemia naquele território. Com informações da assessoria de imprensa do Supremo Tribunal Federal.

SL 1.334

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Técnico que optou por parcelamento não recebe férias em dobro

Jurisprudência afastada

Técnico que optou por pagamento parcelado não receberá férias em dobro

A 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de um técnico de cadastro que pretendia receber as férias em dobro após optar pelo pagamento de forma parcelada. Segundo a Turma, a opção do empregado por essa forma de pagamento afasta a aplicação da jurisprudência do TST de pagamento em dobro em caso de descumprimento do prazo previsto na CLT.

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Na reclamação trabalhista, o técnico sustentou que a empresa não pagava os valores referentes às férias com a antecipação de dois dias prevista na lei. Por isso, defendia que a situação caracterizava atraso, cabendo o pagamento em dobro. A empresa, em sua defesa, argumentou que a forma de pagamento era opção do empregado.

O relator do recurso de revista do empregado, ministro Evandro Valadão, assinalou que, de acordo com a Súmula 450 do TST, é devido o pagamento em dobro da remuneração de férias quando, ainda que gozadas na época própria, o empregador tenha descumprido o prazo previsto no artigo 145 da CLT.

No caso, porém, há a particularidade de o pagamento ter sido parcelado por opção do empregado, e não do empregador. Assim, não se aplica ao caso a Súmula 450, “que trata de situação diversa e se refere ao pagamento das férias fora do prazo previsto na norma celetista por iniciativa do empregador”. A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

RR–49-46.2019.5.21.0008

Revista Consultor Jurídico, 27 de maio de 2020, 20h25

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Ricetti: Créditos de precatórios e débitos com poder público

Um dos instrumentos previstos para a redução da dívida de precatórios dos entes públicos é a compensação entre créditos de precatórios e débitos existentes com o poder público devedor, conforme atualmente prevê o artigo 105 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, acrescido pela Emenda Constitucional nº 94, de 15 de dezembro de 2016.

A questão envolvendo a compensação de débitos com créditos de precatório não é novidade no Direito brasileiro. O § 2.º do artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, acrescentado pela Emenda Constitucional nº 30, de 13 de setembro de 2000, emenda esta que instituiu o pagamento parcelado da dívida de precatórios em dez anos, previa o poder liberatório conferido ao credor do precatório que, em caso de não liquidação pelo ente devedor da parcela anual do precatório até o final do exercício, poderia deixar de pagar tributos devidos à entidade devedora, respeitado, por certo, o limite de seu crédito.

A figura do poder liberatório foi objeto de discussões e contendas judiciais, principalmente no tocante à necessidade de lei editada pelo ente devedor que regulamentasse a forma e os requisitos como se daria a dita compensação, à luz do que prevê o artigo 170 do Código Tributário Nacional, que cuida da compensação tributária. A intensa judicialização da questão, que resultou em decisões favoráveis e contra a autoaplicação do poder liberatório, acabou por prejudicar a eficiência de tal mecanismo, como instrumento de conciliação dos interesses dos credores e devedores de precatório.

A compensação envolvendo precatórios voltou ser objeto de previsão constitucional com a Emenda nº 62, de 9 de dezembro de 2009, que alterou o artigo 100 da Constituição Federal e instituiu o Regime Especial de Pagamento de Precatórios, no qual ficou estabelecido o prazo de até 15 anos para que os entes devedores quitassem seus estoques. A nova redação contida nos §§ 9º e 10º do artigo 100 da Carta Federal permitia, não propriamente uma compensação, mas o direito de abatimento unilateral, pelo ente devedor, dos débitos do credor do precatório no momento da expedição do ofício requisitório. A “compensação unilateral”, todavia, foi julgada inconstitucional pelo STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4425 e 4456, restando validados, contudo, os abatimentos realizados até 25/03/2015.

Com o advento da Emenda Constitucional nº 94, de 15 de dezembro de 2016, a compensação, como faculdade para o credor de precatório, passou a ser prevista no artigo 105 do ADCT, que dispõe: “Enquanto viger o regime de pagamento de precatórios previsto no artigo 101 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é facultada aos credores de precatórios, próprios ou de terceiros, a compensação com débitos de natureza tributária ou de outra natureza que até 25 de março de 2015 tenham sido inscritos na dívida ativa dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observados os requisitos definidos em lei própria do ente federado”.

Segundo previsto no referido artigo 105, a compensação ficou condicionada à edição de lei própria pelos entes federativos, que deveriam prever seus requisitos. Ocorre que a exigência de legislação própria pelo ente devedor acabou por não conferir a eficiência esperada à compensação.

Atento aos reclamos de credores interessados em compensar seus créditos e diante da inércia das entidades devedoras em regulamentar a questão, o Congresso Nacional editou a Emenda Constitucional nº 99, de 17 de dezembro de 2017, que ao alterar e aperfeiçoar o Regime Especial de Pagamentos de Precatórios, acrescentou os §§ 2ºe 3º ao artigo 105 do ADCT e concedeu o prazo de 120 dias, a partir de 1º de janeiro de 2018, para que os entes devedores editassem a lei própria regulamentadora da compensação, sendo que após decorrido o referido prazo e constatada a inércia legislativa, os credores ficaram autorizados a optar pela compensação de seus créditos de precatórios com débitos existentes com o ente devedor, desde que inscritos até 25 de março de 2015.

Disso resulta, portanto, que a compensação de crédito de precatórios com débitos inscritos pelo poder público passou a ser, atualmente, um direito subjetivo do credor, independentemente da existência de lei regulamentadora editada pelo ente público devedor.

E quais seriam os requisitos para que o direito à compensação fosse exercido?

Sobre esse ponto, o primeiro passo é verificar se há ou não regulamentação da questão pelo ente devedor. Havendo legislação regulamentadora, deverão ser observados os seus requisitos, somados aos requisitos trazidos pelo artigo 105 do ADCT e aos pressupostos que se aplicam à compensação como modo de extinção de obrigações.

Nesse contexto, infere-se da redação do artigo 105 a existência dos seguintes requisitos básicos da compensação: 1) que o regime especial de pagamento tenha sido adotado pelo ente devedor e esteja em vigência, já que não são todos os entes que optaram ou que se enquadram nessa sistemática de pagamento; 2) manifestação expressa e escrita do credor do precatório sobre a intenção de compensar, que contenha os dados como a sua identificação, sua legitimidade e dados suficientes para identificação do crédito de precatório e da dívida a ser compensada, já que se trata de uma faculdade e um direito seu; e 3) que os débitos, tributários ou não, estejam inscritos em dívida ativa até 25 de março de 2015.

Atendidos os requisitos acima, deverão ainda ser observados os requisitos da compensação como meio de extinção de obrigações, com suas devidas conformações. Nessa linha é possível afirmar que as dívidas a serem compensadas devem ser certas quanto à sua existência e determinadas quanto ao seu valor, vencidas e exigíveis.

Logo, quanto ao crédito de precatório, não pode haver discussão quanto a sua titularidade e validade, sendo que eventual discussão sobre o seu valor, já que não são raros os questionamentos sobre a incidência de juros sobre precatórios, a princípio pode ser um óbice à realização da compensação até que a questão seja definitivamente pacificada. Contudo, nada obsta a concordância das partes ou a renúncia à discussão pelo próprio credor, que pode anuir com os cálculos do ente devedor, de modo a viabilizar a pretensão de compensar seus crédito.

Nos casos de cessão convencional de precatório, deverão ainda ser observados os requisitos quanto à validade da cessão de crédito, quais sejam: 1) capacidade e legitimidade para ceder; 2) celebração da cessão mediante instrumento público ou instrumento particular que conste a indicação do lugar onde foi celebrado, a qualificação do cedente e do cessionário, a data e o objetivo da cessão com a designação e a extensão dos direitos cedidos (artigos 288 e 654, §1º, do Código Civil); 3) comunicação ao juízo em que foi expedido o crédito do precatório; 4) comunicação a entidade devedora; e 5) homologação da cessão pelo juízo competente.

Quanto à exigibilidade, certeza e liquidez da dívida tributária ou não tributária, tais requisitos acabam sendo preenchidos com a regular inscrição pelo ente devedor, observado o marco temporal de até 25 de março de 2015. Todavia, ao optar pela compensação, o interessado deverá renunciar a eventual discussão administrativa ou judicial envolvendo o débito a ser compensado.

Cabe sublinhar que, à luz do artigo 46 da Resolução nº 303/2019 do Conselho Nacional de Justiça, a compensação independe da ordem cronológica do precatório e de sua natureza, devendo ser considerado como o valor líquido disponível para fins de compensação, o valor “obtido após reserva para pagamento dos tributos incidentes e demais valores já registrados junto ao precatório, como a cessão parcial de crédito, compensação anterior, penhora e honorários advocatícios contratuais”.

Além de tais exigências, que decorrem do artigo 105 do ADCT ou de normas relativas à compensação e aos créditos e débitos que serão objeto do “encontro de contas”, vários entes federativos editaram leis próprias para prever outros requisitos específicos.

O município de São Paulo, por exemplo, além das exigências constitucionais acima referidas, regulamentou a compensação de precatórios por meio da Lei Municipal nº 16.953/2018, que em seu artigo 2º, inciso I, prevê um requisito bem específico ao definir que o crédito de precatório pode ser utilizado para compensar até 92% do montante atualizado do débito, de natureza tributária ou não tributária, inscrito em dívida ativa até 25 de março de 2015, sendo que tais débitos não podem ter sido objeto de parcelamentos incentivados anteriormente pactuados, tais como PPI (Programa de Parcelamento Incentivado) e PRD (Programa de Regularização de Débitos).

No caso do estado do Rio Grande do Sul, que regulamentou a compensação por meio da Lei Estadual nº 15.038/2017, alguns requisitos específicos são exigidos: 1) o débito inscrito em dívida ativa poderá ser objeto de compensação até o limite de 85%; 2) o débito a ser compensado com o crédito de precatório tenha o valor correspondente a 10% do respectivo montante, devidamente atualizado, pago em até três parcelas, devendo a primeira ser adimplida juntamente com o pedido de compensação, a segunda no prazo de 30 dias e a terceira no prazo de 60 dias contados do protocolo do pedido de compensação; e 3) o devedor deverá manter em dia parcelamentos por ele realizados.

Nota-se dos casos acima citados que houve uma restrição à compensação e os entes federativos optaram por regulamentar o tema e promover uma iniciativa de arrecadação de ao menos partes dos débitos a serem compensados.

Não obstante as restrições impostas pelas leis próprias dos entes federativos, é certo que a compensação, de um lado, mostra-se como importante mecanismo de redução da dívida dos entes públicos em mora com seus precatórios e, de outro, uma vantagem aos credores de precatórios que poderão utilizar o crédito para abatimento de suas dívidas ou mesmo ceder seus créditos a outros devedores do poder público para que estes se utilizem do direito de compensar suas dívidas, possibilidade esta que acaba aquecendo o mercado de cessão de precatórios.

Embora a compensação envolvendo precatórios ainda seja objeto de discussões e dúvidas entre credores e interessados, não se pode menosprezar o avançado trazido pelas Emendas Constitucionais 94/2016 e 99/2017 no sentido de conferir maior incentivo e segurança jurídica para que este mecanismo seja utilizado por credores e devedores, amenizando, nesse contexto, as consequências negativas trazidas pelo histórico de inadimplência e morosidade no pagamento de precatórios por grande parte dos entes públicos devedores.

 é procurador do município de Guarujá e especialista em Direito Público pela Escola Paulista da Magistratura.