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Pedro Schuch: Suspensão dos tributos na calamidade pública

O novo coronavírus trouxe, junto com a crise sanitária, a crise econômica. Com as medidas de isolamento, as demandas por mercadorias e serviços diminuíram de forma abrupta, o que, por consequência, afetou sobremaneira as receitas das empresas brasileiras.

Diante desse quadro, os contribuintes passaram a encarar uma situação delicada, na qual seria necessário conservar seu caixa para pagamento de suas obrigações, sobretudo as obrigações com seus colaboradores. Grande parte das empresas brasileiras, portanto, passou a encarar a necessidade de decidir entre pagar os tributos ou a folha de pagamento. Por isso, tornaram-se frequentes ações pleiteando a suspensão dos tributos durante este período.

O Ministério da Fazenda, em 2012, editou a Portaria nº 12/2012, a qual previu a possibilidade de suspensão dos tributos em caso de calamidade pública:

“Artigo 1º — As datas de vencimento de tributos federais administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), devidos pelos sujeitos passivos domiciliados nos municípios abrangidos por decreto estadual que tenha reconhecido estado de calamidade pública, ficam prorrogadas para o último dia útil do 3º (terceiro) mês subsequente”. 

Com fulcro nesta determinação, os contribuintes foram ao Poder Judiciário solicitar a suspensão dos tributos federais.

Entretanto, ainda houve espaço para a apreciação de outros argumentos. Um dos pontos mais sensíveis nesta discussão toda diz respeito à “teoria do fato do príncipe”. Na prática, os contribuintes atribuíram aos decretos estatais de fechamento das atividades econômicas a qualidade de ato praticado pelo ente estatal que impede o cumprimento da obrigação tributária. Portanto, temos os entes estatais impedindo o funcionamento da atividade econômica e, ao mesmo tempo, cobrando os tributos dos contribuintes.

Por fim, foi invocada também a Constituição Federal para sustentar o pedido dos contribuintes. A Constituição Federal enumera em seu artigo primeiro que a República Federativa do Brasil, enquanto Estado de Direito, tem como fundamentos a dignidade da pessoa humana e os valores do trabalho e da livre iniciativa:

“Artigo 1º — A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I a soberania;

II a cidadania;

III a dignidade da pessoa humana;

IV os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa

V pluralismo político”.

No artigo 3º da CF/88, estão listados os objetivos fundamentais da República. Dois desse objetivos são erradicar a pobreza e garantir o desenvolvimento nacional.

“Artigo 3º — Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II garantir o desenvolvimento nacional;

III erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

Com o amadurecimento das discussões sobre a suspensão de tributos, percebeu-se que o Poder Judiciário passou a ignorar a Portaria do Ministério da Fazenda nº 12/2012, com a alegação de que tal dispositivo infralegal necessita de lei que a regulamente, o que não aconteceu. 

Entretanto, em diversos casos o Judiciário vem se manifestando no sentido de preservar os mandamentos da Constituição Federal, concedendo a suspensão dos tributos quando o pagamento dos mesmos acarreta o atraso no pagamento de fornecedores e, sobretudo, o atraso no pagamento de obrigações trabalhistas, devendo a empresa fazer prova pré-constituída do alegado.

E assim entendeu o Tribunal Regional Federal da 2ª Região em julgamento do Agravo de Instrumento nº 5003596-11.2020.4.02.000/RJ:

“Com efeito, tal atuação deve se dar de forma excepcional, caso a caso, e mesmo assim quando ficar efetivamente demonstrado o abalo financeiro, com risco concreto à subsistência da empresa, à manutenção de empregos e à própria continuidade da prestação do serviço e/ou fornecimento de bens, devendo o interessado comprovar tratar-se de micro ou pequena empresa, que não está demitindo funcionários e que possui histórico de cumprimento dos deveres tributários, não sendo devedor contumaz do fisco, dentre outros elementos necessários a demonstrar a efetiva necessidade do pleito e que não ficaram evidenciados nos presentes autos”.

Portanto, a simples existência da portaria do Ministério da Fazenda que prevê a suspensão dos tributos em caso de decretação da calamidade pública não tem sido acolhida pelo Poder Judiciário como fundamento para a sua suspensão. Por outro lado, a comprovação de danos à atividade empresarial, de impossibilidade de pagamento de fornecedores e colaboradores tem sido motivo para a suspensão das cobranças.

 é advogado, coordenador de Consultoria Tributária do escritório Stürmer & Wulff Advogados, pós-graduado em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e membro da rede internacional IR Global e da rede internacional GGI.

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STJ definirá início da existência do crédito em recuperação judicial

A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça vai definir, no rito dos recursos repetitivos, o momento em que o crédito decorrente de fato ocorrido antes do pedido de recuperação judicial passa a existir para o fim de submissão a seus efeitos: se a data do fato gerador ou a do trânsito em julgado da sentença que o reconheceu.

STJSTJ definirá momento da existência do crédito para efeitos da recuperação

Para resolver a controvérsia, o colegiado afetou ao sistema dos repetitivos os Recursos Especiais 1.843.332, 1.842.911, 1.843.382, 1.840.812 e 1.840.531 — todos de relatoria do ministro Villas Bôas Cueva.

A questão submetida a julgamento está cadastrada como Tema 1.051 na base de dados do STJ e tem a seguinte descrição: “Interpretação do artigo 49, caput, da Lei 11.101/2005, de modo a definir se a existência do crédito é determinada pela data de seu fato gerador ou pelo trânsito em julgado da sentença que o reconhece”.

Decisões divergentes

O relator destacou que, embora haja um número considerável de precedentes acerca do tema e a questão já esteja praticamente uniformizada no tribunal, ainda é possível verificar a existência de decisões divergentes nos tribunais estaduais.

Entre os precedentes do STJ mencionados pelo ministro está o REsp 1.727.771, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, no qual se definiu que “a constituição do crédito discutido em ação de responsabilidade civil não se condiciona ao provimento judicial que declare sua existência e determine sua quantificação”.

Segundo o precedente, “tratando-se de crédito derivado de fato ocorrido em momento anterior àquele em que requerida a recuperação judicial, deve ser reconhecida sua sujeição ao plano de soerguimento da sociedade devedora”.

Para o ministro Villas Bôas Cueva, “o julgamento de tal questão em feito submetido ao rito dos recursos repetitivos vai proporcionar segurança jurídica aos interessados e evitará decisões divergentes nas instâncias ordinárias e o envio desnecessário de recursos especiais e agravos a esta Corte Superior”.

Além da afetação, a seção decidiu pela suspensão da tramitação de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão delimitada e tramitem no território nacional, excetuada a concessão de tutelas provisórias de urgência, quando presentes seus requisitos.

Recursos repetitivos

O novo CPC regula no artigo 1.036 e seguintes o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 1.842.911

REsp 1.843.332

REsp 1.843.382

REsp 1.840.812

REsp 1.840.531

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Carf diverge sobre tributação do ganho de AVJ não controlado

Na coluna de hoje, trataremos de uma questão bastante recente no Carf, e que se relaciona diretamente às modificações introduzidas na legislação do IRPJ e da CSLL, pela Lei nº 12.973/2014: a tributação de ganhos decorrentes de AVJ não controlado por meio de subconta vinculada ao ativo ou passivo. Antes de avançar sobre o tema, calha fazermos uma breve contextualização.

No Brasil, a adoção dos padrões internacionais de contabilidade (IFRS), por meio da Lei nº 11.638/2007, afetou diretamente as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. Para mitigar os impactos dessas alterações sobre os contribuintes, criou-se o Regime Tributário de Transição (RTT), pela Lei nº 11.941/2009, estabelecendo, para fins fiscais, um regime de neutralidade das alterações promovidas pela Lei nº 11.638/2007, mantendo-se os parâmetros de apuração dos tributos vigentes em dezembro de 2007.

Nesse contexto, a Lei nº 12.973/2014 veio justamente fazer a adequação definitiva da legislação tributária às normas societárias e contábeis vigentes no país, extinguindo o RTT e firmando uma nova forma de apuração do IRPJ e da CSLL.

Ocorre que um dos critérios de mensuração de elementos patrimoniais que passou a ser adotado com o padrão IFRS foi o da avaliação a valor justo (AVJ) (em substituição ao critério do custo de aquisição), definido no Pronunciamento CPC 46 como “o preço que seria recebido pela venda de um ativo ou que seria pago pela transferência de um passivo em uma transação não forçada entre participantes do mercado na data de mensuração”. Com isso, buscou-se evidenciar de maneira mais precisa a capacidade de geração de fluxo de caixa de cada elemento patrimonial, apresentando-se seu valor atual, e não aquele histórico.

Sob a perspectiva fiscal, entretanto, optou-se expressamente, por meio do art. 13 da Lei nº 12.973/2014, pela manutenção de uma neutralidade fiscal (ou seja, a sua não inclusão no lucro real) dos ganhos decorrentes da avaliação de elementos patrimoniais com base no valor justo, desde que o respectivo aumento no valor do ativo ou a redução no valor do passivo seja evidenciado contabilmente em subconta vinculada ao ativo ou passivo.

É de se ressaltar, que esse controle do AVJ em subconta é uma imposição da legislação fiscal, e não das práticas contábeis, posto como uma condição para o diferimento da tributação dos ganhos evidenciados por esse modelo de mensuração de elementos patrimoniais. Caso não se faça esse controle, o art. 13, §3º, da Lei nº 12.973/2014, estabelece que o ganho seja imediatamente tributado e, mais ainda, dispõe que ele não pode ser utilizado para reduzir o prejuízo fiscal do período corrente.

Pois bem, enfrentaram-se, no âmbito do Carf, autuações fiscais baseadas na ausência de controle do AVJ por meio das subcontas vinculadas aos elementos patrimoniais.

No primeiro caso localizado, julgado pelo Acórdão nº 1402-003.589 (que não tratava especificamente da aplicação do art. 13 da Lei nº 12.973/2014, mas sim do art. 66 da mesma lei, que estabelecia a adoção inicial das novas regras), no qual, por maioria de votos, afastou-se a cobrança de IRPJ e CSLL, sob o argumento de que o ganho de AVJ indica, sim, um acréscimo patrimonial, mas que ele não gozaria de disponibilidade econômica ou jurídica, necessária para fins de tributação, de acordo com o art. 43 do CTN. Ademais, o relator apontou que o contribuinte juntou laudo de consultoria evidenciando que não teria havido qualquer prejuízo ao Erário pela falta de controle do AVJ em subcontas, encampando a tese de que esse registro seria apenas uma obrigação acessória, não avançando sobre a aplicação ou não do art. 13, §3º da Lei nº 12.973/2014.

Ressalte-se, também, que o relator invoca as razões aduzidas no Acórdão nº 1402-002.501. Não obstante, nessa decisão se discutia a tributação de valores registrados em reserva de reavaliação, inclusive pontuou o relator, com acerto, que ela “não se confunde com a avaliação a preço justo, sendo instituto alheio às previsões contidas na Lei nº 12.973/2014, mesmo quando utilizadas para fins hermenêuticos.”.

Em outro caso, julgado no Acórdão nº 1301-004.091, o Recurso Voluntário foi rejeitado, por voto de qualidade.

Nele, a autuação se baseou propriamente no art. 13 da Lei nº 12.973/2014, adotando a relatora integralmente os fundamentos do Acórdão nº 1402-003.589. De maneira complementar, aduz que não obstante a regra expressa que determine a criação de subcontas, ela deve receber uma interpretação finalística, como meio de controle efetivo dos valores diferidos, “a fim de atestar que as adições e exclusões pertinentes sejam realizadas nos montantes adequados”, aduzindo que a empresa juntou laudo atestando a inocorrência de dano ao Erário.

O voto vencedor, entretanto, aduz que para o ano-calendário de 2015 (objeto da autuação) não haveria mais que se falar na neutralidade tributária estabelecida pela Lei nº 11.941/2009, vez que vigente e eficaz o novo regime fiscal. Diante disso, esclarece que a legislação é categórica em afirmar que na ausência do AVJ controlado em subcontas, o efeito tributário é a imediata tributação desses valores, e que eventual entendimento de incompatibilidade entre esse regime e o art. 43 do CTN e o conceito de renda, pressuporia a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei nº 12.973/2014, o que é vedado aos conselheiros do Carf (Súmula Carf nº 02).

Ademais, o redator designado entendeu, ainda, que não haveria inconstitucionalidade dessa norma, tendo em vista que a reavaliação espontânea de ativos sempre esteve sujeita à sua tributação imediata, exceto nos casos em que o legislador condicionasse a não incidência de IRPJ e CSLL, nesse momento, pelo seu controle de algum modo específico, como na conta de reserva de reavaliação, conforme regime estabelecido nos arts. 434, 436 e 437 do RIR/99. Ressalta, também, que o art. 438 do RIR/99 prevê a tributação da reavaliação de participações societárias independente da adoção de qualquer controle, demonstrando que a ordem jurídica não é incompatível com a tributação da renda sem realização.

Por fim, acrescenta que a existência de laudos atestando que não houve prejuízo ao Fisco não altera o panorama estabelecido por expressa disposição legal, ressaltando que esse controle tem a finalidade de permitir ao Fisco controlar a evolução do valor desses ativos e passivos ao longo do tempo, sem necessidade de abertura de procedimentos fiscais, fomentando a eficiência da atividade fiscalizatória.

No Acórdão nº 1401-003.873, foi dado provimento ao recurso do contribuinte por maioria de votos. A relatora pontua que, apesar do contribuinte não realizar o controle do AVJ por meio das subcontas estabelecidas pela Lei nº 12.973/2014, ele teria mantido esse registro em conta de “Ajuste de Avaliação Patrimonial Imobilizado”, e que, portanto, a acusação fiscal seria falsa. Ademais, ela aponta que o contribuinte apresentou laudo técnico identificando o custo de aquisição dos bens, seu valor justo e a contabilização do IRPJ e CSLL diferidos, demonstrando que, ainda que não na forma determinada pela legislação, havia um controle contábil do AVJ.

Ressalta também que, mesmo que não houvesse o controle, a ausência da subconta não ensejaria a tributação, invocando o Acórdão nº 1402-003.589, por se tratar de mera expectativa de ganho, e não renda realizada, cabendo apenas multa por descumprimento de obrigação acessória.

Pois bem, como se vê, atualmente há poucos acórdãos sobre esse relevante tema, na jurisprudência do Carf, mas já se verifica a existência de franca divergência entre as turmas ordinárias das Câmaras Baixas.

Parte dela decorre da premissa de que a obrigação de controle do AVJ em subcontas vinculadas seria uma espécie de obrigação acessória, de modo que o seu descumprimento geraria apenas a incidência de multa. Por outro lado, há uma linha que aduz, a despeito de ser uma obrigação acessória, a legislação federal estabeleceu consequências claras para a sua infringência, qual seja a tributação imediata do valor.

Há, também, menção em todos os acórdãos à apresentação de laudos contábeis que evidenciem a inocorrência de qualquer prejuízo ao Erário, sem, entretanto, que as decisões se aprofundem em esclarecer de que modo tais documentos evidenciam isto, mormente à luz da premissa adotada de que o controle em subconta seria uma obrigação acessória, no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, nos termos do art. 113, §2º, do CTN, cujo descumprimento, em regra, não ofende diretamente os cofres públicos. Essa discussão é assaz relevante, tendo em vista que o laudo foi utilizado como fundamento para afastar a aplicação do art. 13, §3º, da Lei nº 12.973/2014, aos casos concretos.

De certo modo, pode-se dizer que há um conflito entre uma interpretação formal e literal da legislação, e uma interpretação consequencialista, que flexibiliza a aplicação do dispositivo em razão da comprovação de ausência de dano ao Erário.

Diante disso, resta-nos acompanhar o deslinde dessa discussão nas demais turmas das Câmaras Baixas e, especialmente, na Câmara Superior de Recursos Fiscais, em razão da evidente divergência de interpretações.


Art. 13. O ganho decorrente de avaliação de ativo ou passivo com base no valor justo não será computado na determinação do lucro real desde que o respectivo aumento no valor do ativo ou a redução no valor do passivo seja evidenciado contabilmente em subconta vinculada ao ativo ou passivo.

Relator Cons. Lucas Bevilacqua, julgado em 21/11/2018.

Art. 66. Para fins do disposto no art. 64, a diferença positiva, verificada em 31 de dezembro de 2013, para os optantes conforme o art. 75, ou em 31 de dezembro de 2014, para os não optantes, entre o valor de ativo mensurado de acordo com as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e o valor mensurado pelos métodos e critérios vigentes em 31 de dezembro de 2007, deve ser adicionada na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL em janeiro de 2014, para os optantes conforme o art. 75, ou em janeiro de 2015, para os não optantes, salvo se o contribuinte evidenciar contabilmente essa diferença em subconta vinculada ao ativo, para ser adicionada à medida de sua realização, inclusive mediante depreciação, amortização, exaustão, alienação ou baixa.

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: (…)

§ 3º Na hipótese de não ser evidenciado por meio de subconta na forma prevista no caput , o ganho será tributado.

Relator Cons. Caio Quintela, julgado em 16/06/2017.

Redator Designado Cons. Fernando Brasil de Oliveira Pinto, julgado em 17/09/2019.

Relatora Cons. Luciana Zanin, julgado em 11/11/2019.

Entretanto, há que se ponderar que essa conclusão não infirmaria o fundamento da fiscalização, pois tal controle era feito em conta do PL, e não em subconta do ativo, como determinado pela legislação.

 é sócio do Daniel & Diniz Advocacia Tributária, doutor em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, ex-conselheiro titular da 1ª e 3ª Seções do Carf, e professor em cursos de pós-graduação.”

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Justiça proíbe banco de apreender veículo por inadimplência

Como a crise econômica causada pelas medidas de contenção do coronavírus afetou as atividades da empresa ALM Automação, o Centro de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) de Santa Rita do Sapucaí concedeu liminar para impedir o Banco Honda de promover busca e apreensão de um veículo financiado pela companhia.

Crise do coronavírus impossibilitou empresa de pagar financiamento de carro
Kateryna Kon

Além disso, a instituição financeira não poderá negativar o nome da empresa devido à inadimplência total ou parcial das prestações de maio a julho de 2020.

A ALM afirmou que possui um contrato de financiamento com o Banco Honda e que já pagou diversas parcelas. Contudo, disse a companhia, a epidemia trouxe severos impactos negativos sobre sua atividade e suas receitas, o que lhe impossibilita de manter os pagamentos em dia.

Diante dessa realidade, a empresa pediu medida de urgência para suspender os pagamentos das parcelas dos meses de maio, junho e julho de 2020 ou reduzi-las em 50%, proibindo o banco de cobrar encargos contratuais, negativar seu nome e mover ação de busca e apreensão.

O juiz João Paulo da Costa Cruz elogiou o caráter idôneo da empresa. Segundo o julgador, ela ” não quer uma carta branca para deixar de pagar as prestações futuras, indefinidamente, como, parece, alguns têm pedido país afora; pede medidas apenas por três meses, ao fundamento de que sua principal cliente, a Ambev, suspendeu até agosto a tomada de seus serviços”.

Ele ressaltou que a Covid-19 reduziu empregos, salários e receitas de pessoas físicas e jurídicas, que possuem obrigações decorrentes de contratos vigentes, cujo cumprimento está ameaçado por essa redução. Dessa maneira, ele marcou audiência de conciliação, via, videoconferência, para que as partes possam chegar a um acordo.

“Na atual situação de pandemia viral, ao lado da qual já emerge algo que arrisco chamar de pandemia econômica, parece-me que a solução consensual se torna ainda mais importante. Não estou dizendo que a parte autora não deveria ter proposto a presente ação. Longe disso. Ao propô-la, exerceu legitimamente o seu direito de acesso à jurisdição. Parece-me que a solução consensual se torna ainda mais importante, com toda vênia”, ponderou. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MG.

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Saydelles: Estratégias da UE para combater a pandemia

A pandemia da Covid-19 colocou um desafio sem precedentes para grande parte dos países. A paralisação econômica e afetou as cadeias globais de produção, distribuição e circulação. Os impactos estão sendo sentidos tanto pelo lado da oferta quando pelo lado da demanda, a partir do adiamento de despesas de consumo e investimento, causado pelo quadro de elevada incerteza, que vem se refletindo em um aumento da aversão ao risco por parte dos agentes econômicos. Mesmo sem vislumbrar a data final da crise de saúde pública e na iminência de uma crise econômica que promete ser tão ou mais devastadora do que a de 2008 ou a de 1929 —, já se sabe, de antemão, que a tempestade é violenta e necessitará que se cresça à altura do desafio. Nesse sentido, é fundamental pensar em políticas para mitigar o impacto dos danos.

É nesse espírito que se vem fazer breves considerações acerca de alguns dos aspectos econômicos e financeiros trazidos pela Resolução de 17 de abril, aprovada pela União Europeia [1], que visa a estabelecer uma ação coordenada para combater a pandemia e suas consequência. Por certo, a realidade brasileira é bastante diversa da europeia, entretanto, não se pode desprezar o que outros países estão fazendo para enfrentar a crise. Já que nem a ciência jurídica e nem a ciência econômica estão sujeitas a testes laboratoriais, a história e a comparação de sistemas são duas ferramentas que não podem ser ignoradas. Considerando que a presente crise não encontra precedente histórico, mais importância ainda ganha a comparação com modelos estrangeiros, e seu uso como ponto de partida para o debate e para pensar alternativas aderentes à realidade nacional. 

A resolução veio dar resposta à constatação fática de que, inicialmente, as respostas à Covid-19 ocorreram primordialmente à nível doméstico. Dessa forma, procurou-se estabelecer linhas gerais para cooperação e coordenação entre os Estados-membros diante da crise de saúde pública e crise financeira. A resolução está lastreada no princípio da solidariedade entre países membros (artigo 3, TUE), visando a promover a coesão econômica e social e o bem-estar dos povos. Em termos econômicos e financeiros, é possível perceber na resolução quatro grandes grupos de preocupações: I) a cooperação para a saída da crise; II) a manutenção do trabalho e renda; III) as formas de financiamento da retomada; e II) os setores estratégicos para a economia pós-coronavírus.

A um, a cooperação para a saída da crise. A resolução destacou a necessidade de esforços unidos para garantir que nenhum país seja deixado sozinho para combater o vírus e as suas consequências, dentro do espírito de solidariedade subjacente à UE. Nessa linha, um aspecto especialmente destacado é a necessidade de desenvolver políticas que garantam o abastecimento contínuo de alimentos. Esse ponto toca fundamentalmente o setor primário da economia e a indústria alimentar, havendo preocupação de se assegurar a continua produção e circulação, sem obstáculos dentro do mercado único, a fim de evitar que se some uma crise alimentar à crise econômica e de saúde pública. O mercado único é considerado uma fonte de prosperidade e de bem-estar coletivos, constituindo um elemento indispensável para a resposta ao surto da Covid-19. Vale ressaltar que, ainda em termos de cooperação econômica, o Banco Europeu já havia anunciado, em 12 de abril, uma série de medidas. Uma crise internacional exige respostas internacionais. Nesse intuito, a resolução é enfática em apontar a cooperação como alicerce para a superação do desafio posto. 

A dois, manutenção do trabalho e da renda. A resolução manifestou solidariedade em relação àqueles que perderam o emprego e que tiveram as vidas profissionais afetadas pela pandemia. Nessa linha, defende que a Comissão Europeia e que os Estados-membros tomem medidas para manter o maior número possível de postos de trabalho, assegurando que a recuperação seja lastrada na convergência socioeconômica ascendente, no diálogo social e na melhoria dos direitos sociais e das condições de trabalho. Ainda, considera que os Estados-membros devem adotar medidas para assegurar que os trabalhadores sejam protegidos contra a perda de rendimentos. Para salvaguardar o emprego, sugeriu-se a adoção de iniciativas como a redução do tempo de trabalho e compensação de rendimentos. Ademais, incentiva que as autoridades europeias prudenciais e de supervisão explorem opções para reduzir os encargos das pequenas e médias empresas, apelando para a criação de uma estratégia horizontal europeia para a recuperação dessas empresas, lastrada na redução da burocracia e dos custos de acesso ao financiamento. Por fim, manifesta a convicção de que o dever de diligência das empresas, em matéria de direitos humanos e de ambiente, é condição necessária para prevenir e atenuar crises futuras e assegurar cadeias de valor sustentáveis. Em tempos de turbulência econômica e social, é mister assegurar o patamar de direitos conquistados e criar uma rede de proteção social como forma de mitigar o impacto vindouro.

A três, em termos de financiamento da recuperação, a resolução demonstrou um conjunto de preocupações com o papel a ser desempenhado pela União Europeia, pelos Estados-membros e pelos bancos. Em primeiro lugar, apoio à proatividade dos Estados. Há insistência para que as instituições da UE e para que os Estados-membros assegurem a concessão de apoio financeiro para combater os efeitos econômicos da Covid-19. Aponta-se a necessidade de se condicionar esse financiamento à utilização em benefício dos trabalhadores, devendo as empresas beneficiadas se absterem de pagar bônus à administração, praticar atos de evasão fiscal, pagar dividendos ou disponibilizar resgate de ações enquanto receberem esse apoio. Em segundo, reconhece a necessidade de flexibilidade orçamentária. A resolução insiste na adoção de um quadro financeiro plurianual (QFP) ambicioso, que preveja um orçamento reforçado e em consonância com os objetivos da UE, assegurando margem de manobra orçamental suficiente para garantir melhor previsibilidade e maior capacidade de ação, assegurando uma exposição reduzia aos riscos nacionais. Ainda, a resolução reconhece a necessidade de mobilizar fundos adicionais de forma rápida e não burocrática para ajudar os Estados-membros na luta contra a Covid-19 e suas consequências. Em terceiro, apoia a medidas de investimento e de liquidez. A resolução insta a Comissão Europeia a propor um pacote de medidas de recuperação e reconstrução em grande escala para investir na economia no pós-crise. Aponta que o investimento necessário deve ser financiado pelo incremento do QFP e pelos fundos e instrumentos financeiros existentes na UE. Ademais, aponta que esse pacote não deve implicar na mutualização da dívida existente, devendo ser orientado para investimentos futuros. Em quarto, propõe a criação de um Fundo de Solidariedade da UE para a Covid-19. Esse fundo teria por objetivo o apoio aos esforços financeiros empreendidos pelos setores da saúde dos Estados-membros, bem como os investimentos no setor dos cuidados de saúde no pós-crise. Em quinto, insiste no papel ativo do setor bancário. A resolução aponta para a necessidade de o setor bancário permitir às empresas e aos cidadãos com problemas financeiros associados à Covid-19 reduzir ou suspender temporariamente o pagamento de dívidas ou de hipotecas, dando flexibilidade no tratamento de créditos não produtivos. Ainda, sugere a suspensão temporária de pagamento de dividendos e redução das taxas de juros aplicáveis às contas a descoberto. Em especial, aponta para a necessidade das pequenas e médias empresas se beneficiarem da liquidez financeira necessária. Por certo que a construção de uma rede de proteção social pressupõe custos, portanto, é necessário pensar em meios de financiar a retomada da economia. O cenário que se desenha, de quarentenas intermitentes, impede que se pense em uma retomada linear. Urge equacionar a atuação dos Estados em termos econômicos, especialmente diante da perspectiva de enfraquecimento do setor privado e da estagnação atualmente vivenciada.

A quatro, a necessidade de se pensar uma “nova economia” para a retomada. Nesse aspecto, em primeiro, a resolução aponta para a necessidade de se desenvolver uma nova estratégia industrial. A indústria deve ser mais competitiva e resiliente face aos choques globais. Nesse ponto, apoia a reintegração das cadeiras de abastecimento no interior da UE e o aumento da fabricação interna de produtos essenciais (medicamentos, princípios farmacêuticos, equipamentos e materiais médicos, dentre outros). Em segundo, incentiva a área da saúde. A resolução considera que pesquisadores, empresas inovadoras e a indústria europeia devem receber apoio financeiro para que encontrem uma cura para a Covid-19, instando os Estados-membros a aumentarem o apoio a programas de investigação, desenvolvimento e inovação destinados a compreensão da doença, aceleração do diagnósticos e testes e desenvolvimento de uma vacina. Nessa linha, sugere aproveitar a oportunidade e se propor um plano de ação para a autonomia da saúde em domínios estratégicos como os princípios ativos farmacêuticos , reduzindo a dependência em relação a outros países. Em terceiro, aponta para a indústria verde e da tecnologia como pilares da retomada. A resolução aponta que o pacote de recuperação deve ter no seu cerne o Pacto Ecológico Europeu e a transformação digital como impulsionadores iniciais à economia, melhorando a resiliência e criando emprego contribuindo simultaneamente para a transição ecológica e para a promoção do desenvolvimento econômico e social sustentável. Destaca-se que as respostas devem estar alinhadas com o objetivo da UE de neutralidade climática. Melhor do que pensar em um “retorno à normalidade” é pensar em uma “nova normalidade” e, na retomada da economia, novos setores podem ser incentivados.

Assim, depreende-se da resolução que a cooperação e a solidariedade serão fundamentais para o reerguimento da economia no período pós-pandemia. Deve-se apostar nas relações multilaterais como ferramenta de retomada. Por hora, deve-se assegurar o emprego e a renda, inclusive como forma de mitigar o impacto social advindo da pandemia. Em termos de financiamento, deve-se adotar estratégias multiníveis, envolvendo a UE e os Estados-membros, dando-se destaque ao papel a ser desempenhado pelos bancos. Por fim, deve-se repensar a estratégia industrial, dando importância à área da saúde, de tecnologia e da indústria verde como pilares fundamentais da economia, promovendo uma retomada econômica e social que seja sustentável.

Essa breve análise da resolução de 17 de abril visou a demonstrar, em linhas gerais, algumas das estratégias pensadas na União Europeia para combater a pandemia e suas consequência. É certo que a realidade enfrentada é distinta da brasileira, mas, diante do ineditismo da crise, deve-se valorizar o que é pensado alhures como forma de fomentar e de inspirar o desenvolvimento de estratégias para superação dos desafios vindouros. Certamente, a cegueira deliberada em relação ao estrangeiro não é o melhor caminho para o enfrentamento de uma crise de tal magnitude. Acima de tudo, deve-se crescer à altura das desafiadoras circunstâncias.

 é membro associado do Instituto de Estudos Culturalistas (IEC) e da Associação Brasileira dos Estudantes de Arbitragem (ABEArb).