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Lívia Machado: Recuperação judicial durante a crise

Com base no atual cenário, as previsões indicam que o comércio mundial será gravemente afetado pela pandemia da Covid-19, com diversas economias impactadas com redução da oferta de produtos e serviços. A interrupção de fornecimento em diferentes cadeias produtivas por causa da baixa demanda, do aumento do desemprego e da perda de renda já é uma realidade no Brasil, complicando ainda mais a situação de empresas que estão em recuperação judicial.

Estamos caminhando para o terceiro mês de isolamento social no país, medida apontada por autoridades médicas e sanitárias mundiais como fundamental para impedir o avanço da Covid-19. Também é fato notório que o fechamento de empresas e indústrias é extremamente prejudicial à economia brasileira.

Com isso, empresas em recuperação judicial sentem o impacto imediatamente, já que precisam manter suas atividades para honrar o pagamento de seus passivos. E o motivo está bem evidente: a restrição no funcionamento e na operação por causa do distanciamento social impede o cumprimento de compromissos firmados em planos de recuperação judicial.

O Poder Judiciário está atento a essa situação. Um exemplo disso é que decisões até então inéditas já estão sendo proferidas por juízes em diferentes partes do Brasil. Já há, inclusive, casos de suspensão temporária de cumprimento do plano de recuperação judicial em virtude de desequilíbrio econômico-financeiro causado por fatos imprevisíveis. Uma decisão com esse teor foi proferida no início de abril pelo juiz Friedmann Anderson Wendpap, da 1ª Vara Federal de Curitiba, no Paraná.

Nesse caso, a suspensão deve vigorar desde a data da decretação da calamidade pública pelo Congresso Nacional, 20 de março, até o reconhecimento, pelo próprio Congresso, do fim do estado de calamidade.

Outra iniciativa já adotada por Tribunais de Justiça do Brasil diz respeito à ampliação do stay period, prazo de 180 dias no qual ficam suspensos o curso de todas as ações e execuções promovidas em face do devedor, contados do seu deferimento, bem como a abstenção de cortes de serviços essenciais às empresas em recuperação judicial durante a pandemia.

Para isso, advogados, administradores e representantes das empresas em recuperação são imprescindíveis. Precisam fazer sua parte ajudando a trazer mais fôlego a esses empreendimentos, o que beneficia empresários com a continuidade de seus negócios e trabalhadores com a manutenção de seus empregos. Uma das formas de fazer isso é elaborar petições e buscar decisões judiciais que possam viabilizar a continuidade das operações e atividades das empresas.

O Conselho Nacional de Justiça elaborou a Recomendação nº 63/2020, com seis orientações aos Tribunais de Justiça para aplicação em processos de recuperação judicial. A ideia é trazer celeridade e segurança jurídica aos processos em andamento neste período de pandemia, marcado por incertezas.

Nesse caso, novamente, cabe a nós, advogados e especialistas atuantes em processos de recuperação judicial, escolher a melhor estratégia para os nossos clientes, peticionando aos magistrados a adoção das medidas constantes na recomendação do CNJ, que são de extrema importância neste momento, tais como prioridade na análise e decisão sobre questões relativas ao levantamento de valores em favor de credores ou empresas recuperandas, suspensão da realização de Assembleias Gerais de Credores presenciais, podendo ser realizadas de forma virtual caso demonstrada urgência em caso especifico, entre outros.

Por fim, fica evidente que a pandemia e o isolamento social, ainda sem data para terminar, representam um período de grande vulnerabilidade, que atinge todos os setores da sociedade. E o nosso papel é garantir que os processos de recuperação judicial já em andamento possam ser conduzidos de maneira adequada, célere e capaz de garantir a saúde das empresas.

Aos empresários, é preciso lembrar que a crise vai passar. E reforçar que a recuperação judicial é um instrumento muito importante, capaz de auxiliar as empresas na superação desse momento de turbulências. Para isso, é preciso escolher uma equipe capacitada, com profissionais competentes, que vão de advogados e contadores até auditores, para conduzir da melhor forma possível o processo de recuperação.

 é advogada especialista em Recuperação Judicial, associada ao escritório Mestre Medeiros — Advogados Associados.

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Covid-19 deixa sistema de justiça criminal dos EUA à beira do caos

Embora a pandemia de coronavírus esteja complicando o sistema de justiça criminal de praticamente todos os países, nos EUA o problema se torna ainda mais complexo, por causa dos direitos constitucionais do réu. O direito a um julgamento rápido é um deles. Em muitos estados, o julgamento tem de ser realizado em até 90 dias após a prisão.

Mas com as cortes fechadas ou com julgamentos protelados por tempo indeterminado, a Justiça dificilmente consegue cumprir o prazo. E os executores da lei não sabem bem o que fazer — a não ser que, se não houver julgamento dentro do prazo, terão de soltar o réu.

Esse direito faz parte da Declaração de Direitos Fundamentais do cidadão, previstos na Sexta Emenda da Constituição. Há outros que também complicam a situação em tempos de coronavírus. Por exemplo, o réu tem direito a um julgamento público. Isto é, o estado não pode manter o réu em uma cela na cadeia, enquanto o julga. O julgamento tem de ser aberto ao público.

Outros direitos constitucionais do réu são: ser julgado por um júri imparcial, na jurisdição em que o crime foi cometido; ver as testemunhas que o estão acusando de crime. E outros direitos comuns, como saber do que está sendo acusado, ter testemunhas de defesa e um advogado.

Se algum desses direitos for violado, por causa do coronavírus, a sentença condenatória pode ser anulada.

Algumas alternativas estão em discussão. Parte delas vêm das Promotorias, que pretendem não processar delitos de pequena monta, o que não é comum nos EUA, pedir aos juízes para serem mais razoáveis na definição de fianças — ou que deixem o réu responder ao processo em liberdade — e estimular acordos de admissão de culpa, para dispensar o julgamento.

Mas tais acordos só beneficiam as pessoas que realmente cometeram crimes. Os inocentes podem preferir se defender em um julgamento, mesmo que tenham que esperar por ele na cadeia. Isso é um risco porque o réu pode ser condenado e pegar uma pena maior por não topar o acordo — e pode contrair a Covid-19 na prisão.

No plano político, parlamentares estaduais e federais estão discutindo medidas legislativas, como a de dar ao presidente do tribunal superior de cada estado o poder de estender o prazo para realizar um julgamento, para além dos 90 dias padrão.

A presidente da Seção de Justiça Criminal da American Bar Association (ABA) disse ao Jornal da ABA que outro efeito do coronavírus será um acúmulo da processos nas cortes e nas Promotorias.

As audiências preliminares, bem como as de definição de fiança, poderão ser feitas por teleconferência ou videoconferência, de forma que, nesses casos, o coronavírus não será um impedimento. Isso também vale para as audiências de concessão de liberdade condicional.

A situação se complica no caso de crimes mais graves, em que responder processo em liberdade não é uma opção. Nesse caso, o réu vai para uma das cadeias superlotadas do país e pode ser executado, antes do tempo, pela Covid-19.

A situação também é mais grave nos EUA, porque o país tem cerca de 2,3 milhões de presos. Dessa população carcerária, cerca de 540 mil estão em cadeias, esperando julgamento — grande parte deles porque não têm dinheiro para pagar a fiança.

 é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.