Categorias
Notícias

Agronegócio está na mira da fiscalização tributária

É fato incontroverso que o setor do agronegócio tem sido de fundamental importância para o desenvolvimento econômico e social brasileiro, seja pela sua representatividade no PIB e nas exportações, como ainda pela própria vocação existente em nosso país para seu exercício.

Da mesma forma, não resta dúvida de que sua tributação, por força de suas peculiaridades e propósitos, inclusive, constitucionais, deve ser regulada de forma a ser fomentada e incentivada, o que se concretiza por meio de instrumentos fiscais de incentivos e tratamento diferenciado, o que não se confunde com privilégio.[1]

Apesar de sua importância e necessidade de instrumentos fiscais de fomento e tratamento peculiar, percebe-se que as medidas tributárias nos tempos atuais têm entre seus objetivos alterar esta realidade, extinguindo, inclusive, com claro risco de aumento da carga fiscal.

Isto pode ser comprovado, por exemplo, por projetos que pretendem revogar tributação da cesta básica com alíquota zero de PIS e COFINS, Projetos de Reforma Tributária que tratam o setor como todos os demais, ignorando suas peculiaridades, necessidades e importância[2], além dos próprios incentivos de ICMS como é o caso do Convênio 100/97.

Também não devemos olvidar do atual movimento dos Municípios, os quais, após receberem a delegação quanto à fiscalização e cobrança do ITR, tem realizado medidas arbitrárias quanto à exigência deste imposto, sobretudo, com relação ao VTN, ônus da prova, competência territorial e lançamentos de ofícios.

Todavia, o movimento de agravamento em face do setor do agronegócio vai além de tais exemplos, uma vez, atualmente, quem pretende apontar sua mira é a Receita Federal.

A Receita Federal, como de costume, anualmente, faz a divulgação de seu “Plano Anual de Fiscalização”, onde temos os números do ano anterior e as ações que pretendem efetivar no ano corrente.

Neste sentido, ao divulgar o plano de ação de 2020, a Receita Federal esclarece que, entre as principais operações, estaria o fortalecimento dos tradicionais cruzamentos de dados das pessoas físicas, onde cita mais especificamente “Omissão de rendimentos e despesas fictícias da atividade rural exercida pelo contribuinte, utilizando também as informações das notas fiscais eletrônicas para identificar eventuais divergências”.

Portanto, o produtor rural pessoa física, no plano anual de fiscalização da Receita Federal de 2020, entra como um dos principais focos de fiscalização, seja quanto às receitas e respectivas despesas.

Diante a informatização e nova realidade existente, uma vez que, atualmente, temos SPED, Livro Caixa Digital do Produtor Rural, Nota fiscal eletrônica, Declaração de Ajuste Anual de IRPF, Declaração de ITR, GFIP, E-social, além das informações bancárias resultantes de movimentações financeiras, o produtor rural ficará exposto à uma nova realidade e rigores fiscais.

Com isso temos, duas consequências relevantes: (i) — além das tentativas de mudanças na legislação revogando o tratamento diferenciado tributário ao setor, sofreremos um maior rigor quanto às operações fiscais voltadas ao produtor rural; e (ii) – necessidade de maior gestão e organização do ponto de vista fiscal no controle e apuração de seus tributos, bem como planejamentos tributários.

Deste modo, cabe este alerta, pois sabemos que, ainda, não são todos os produtores rurais que estão devidamente estruturados para enfrentar a severa atuação da fiscalização tributária, especialmente, da Receita Federal.

E, por outro lado, o foco da não se encerra em face do produtor rural, na medida em que também consta entre os objetivos principais da fiscalização em 2020:

“Planejamento tributário internacional abusivo e erosão da base tributária do IRPJ

As exportações de commodities apresentam valores relevantes em nosso país. Entretanto, as informações declaradas revelam que os maiores adquirentes de tais mercadorias se localizam em paraísos fiscais ou países de tributação favorecida, enquanto que os destinos dos produtos nos embarques são efetivamente os maiores consumidores, em prática conhecida por “triangulação na exportação”.

Tais operações triangulares visam à transferência do lucro operacional para que sejam tributados em paraísos fiscais ou países com tributação favorecida, deixando-se de pagar o Imposto de Renda Pessoa Jurídica devido no Brasil.

Foram identificados contribuintes que realizam 100% de suas exportações por meio de tais triangulações simulando operações mercantis justamente para transferir ao exterior o lucro das verdadeiras operações de compra e venda.”

Naturalmente, por sua vocação exportadora e serem os produtos rurais em sua maioria comodities, mais uma vez o agronegócio ficará exposto à fúria da Receita Federal no tocante a tais operações, supostamente, denominadas de “planejamento tributário abusivo”.

Possível, assim, concluir que, infelizmente, um dos principais setores econômicos nacionais, o qual deve ser fomentado e garantido, tem sido objeto de “ataques tributários”, os quais somente prejudicarão à própria sociedade, economia nacional e participação do Brasil no cenário internacional.

Da mesma forma que muitos outros países tem orgulho e defendem suas vocações, está na hora de termos uma verdadeira defesa de um dos principais (para não dizer principal) segmentos econômicos do Brasil, com relevância inquestionável no cenário internacional.    

[1] https://www.conjur.com.br/2017-out-20/direito-agronegocio-tributacao-diferenciada-agronegocio-nao-privilegio

 é advogado tributarista, sócio do Brasil Salomão e Matthes Advocacia. É doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, pós-doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal) e ex–membro do Carf.

Categorias
Notícias

Fábio Oliveira Lima: O plenário virtual nos tribunais

Seguindo a nossa tradição forense, os órgãos colegiados dos tribunais reúnem-se para a exposição, discussão e deliberação do processo em ambientes situados nas respectivas sedes e com a presença física obrigatória e simultânea dos seus integrantes, em sessão denominada de presencial.

Com a evolução tecnológica, os tribunais, na busca de conferir realidade ao princípio constitucional da razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF) e de vencer a demanda, que é sempre crescente, passaram a adotar o julgamento em ambiente eletrônico, através de sessão virtual, em que se dispensa a presença simultânea dos desembargadores. Sessão virtual não se confunde com sessão presencial por videoconferência, em que há a exigência da participação simultânea e ao vivo dos julgadores, só que situados em ambientes físicos diferentes. Na sessão virtual a deliberação ocorre sem a presença concomitante dos desembargadores, que, durante um período delimitado, manifestam-se, cada um a seu tempo, por meio eletrônico.

Vozes destacadas e de elevado espírito público têm advogado que a dinâmica procedimental do plenário virtual violaria cânones do devido processo legal, sob os argumentos de que os julgamentos não são públicos e há restrição ao contraditório.

No ambiente da gestão judiciária, a inovação nasce, quase sempre, na mira da negação, até que sejam compreendidos seus propósitos e as suas nuances.

Há que pontuar, em primeiro plano, que o julgamento em sessão virtual, para além de estar expressamente autorizado pelo Código de Processo Civil (artigo 193 c/c artigo 943, CPC/15), tem plena conformação com os valores atuais da sociedade, que amplamente aceita como eficiente e segura a realização de diversas atividades públicas e privadas sem a necessidade de contato pessoal ou reunião presencial. O Judiciário não pode ficar distante e alheio a essa realidade. É nesse cenário que surge a sessão virtual, com claros ganhos de eficiência e celeridade à prestação jurisdicional do segundo grau. Fundamentalmente, otimiza-se a pauta dos julgamentos complexos. A sessão presencial, com seu ritualismo necessário, deve ficar reservada às causas que exijam debate mais verticalizado. Idealmente, à sessão virtual são remetidos os processos de menor complexidade, que dispensam uma discussão mais aprofundada quanto a aspectos de fato ou mesmo de direito, ou os processos em que já há posição jurisprudencial consolidada do próprio órgão julgador, do tribunal local ou dos tribunais superiores sem efeito vinculante.

Consigne-se, ainda, que, em Pernambuco, apesar de o julgamento virtual não ficar restrito a processos e recursos em que não caiba sustentação oral não há restrição de classe processual , cabendo ao talante discricionário do relator a definição do que será ou não submetido ao plenário virtual, essa discricionariedade é mitigada ou controlada porque os vogais, o representante do Ministério Público e as partes podem, sem declaração de justificativa, manifestar oposição ao julgamento virtual, deslocando, automaticamente, o julgamento para a sessão presencial. A prerrogativa da oposição ao julgamento virtual, sem a necessidade de qualquer justificativa, mantém a dinâmica da sessão virtual dentro dos princípios básicos do devido processo legal. O julgamento eletrônico assume, claramente, a natureza de um negócio processual atípico (artigo 190 do CPC/15) firmado entre o Estado-juiz e as partes, através dos respectivos patronos, em que o acordo procedimental, a partir da não oposição ao julgamento virtual, inclui a impossibilidade de sustentação oral e dos apartes autorizados pelo inciso X do artigo 7º do Estatuto da OAB.

A preocupação com o devido processo legal é uma constante no formato do plenário virtual do Tribunal de Justiça. O edital de convocação, a que se dá ampla publicidade, indica os desembargadores que participarão do plenário virtual. Isso para possibilitar o controle social do princípio do juiz natural, já que a formação dos órgãos colegiados obedece a regras pré-constituídas e firmes em critérios estritamente objetivos, e o exercício da ampla defesa e do contraditório, na medida em que a composição dos órgãos colegiados tem influência decisiva na previsibilidade das decisões, além do que facilita acesso ao julgador para que possam ser apresentadas as manifestações e os memoriais pelos interessados.

Realçada crítica, que não se pode desconsiderar, prende-se à circunstância de que, em todo o período de duração da sessão virtual, apenas o conteúdo do relatório será disponibilizado para as partes e os interessados. A divulgação dos votos dar-se-á no encerramento da sessão, com a proclamação do resultado do julgamento. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade do inciso IX do artigo 7º do Estatuto da OAB, que previa a sustentação oral pelo advogado após o voto do relator, sob o fundamento de que: I) o contraditório se estabelece entre as partes e não entre magistrado e as partes; e II) poderia causar tumulto processual (ADI 1.127). Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio (onde existe a mesma razão deve haver a mesma regra de Direito). Na sessão virtual, tornar público o voto na medida em que for sendo proferido no ambiente eletrônico levaria, na prática forense, a estabelecer um contraditório a cada voto manifestado. A publicidade aos votos somente ao final não qualifica o julgamento eletrônico como secreto, como afirmam alguns. O controle das partes e da sociedade ocorrerá exatamente como ocorre no julgamento presencial sempre a posteriori. Tradicionalmente, o exercício da ampla defesa se dá antes do julgamento.

Não se advogue que a garantia constitucional da imperiosa necessidade da fundamentação das decisões judiciais (artigo 93, inciso IX, CF) sofre relevante mitigação, na medida em que o vogal apenas assinala, no painel eletrônico, mediante registro por certificação digital, que acompanha o relator ou a divergência, deixando de apresentar suas razões de decidir. A consciência jurídica nacional, com amplo respaldo da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, admite como idônea a fundamentação pela técnica da remissão, como razão de decidir, à motivação declinada pelo voto antecessor. Não se pode esquecer que mesmo no julgamento presencial há expressa autorização para a fundamentação per relacionem, de modo que os vogais que estiverem de acordo com o voto e a fundamentação do relator poderão se limitar a declarar sua concordância.

Há, ainda, uma imposição normativa que mantém o formato da sessão virtual em estreita harmonia com o princípio constitucional que assegura a fundamentação das decisões judiciais (artigo 93, inciso IX, CF). A declaração de voto passa a ser obrigatória quando o desembargador vogal divergir do relator ou o acompanhar com ressalva de entendimento. É que, divergindo do relator, o voto vogal poderá assumir a posição de voto vencido, de modo que sua declaração será obrigatória (artigo 941, § 3º) ou assumirá a condição de voto vencedor, condutor da ratio decidendi. Acompanhando o relator por outro fundamento, impõe-se igualmente a declaração de voto. Isso porque sua fundamentação pode constituir a ratio decidendi ou, se não for, facilitará a compreensão da razão de decidir do colegiado. Sem a exteriorização das razões que levaram ao resultado do julgamento não há devido processo legal e nem jurisdição válida. Isso porque o princípio constitucional da ampla defesa não teria como ser exercitado com efetividade e impossível seria o controle social da atividade jurisdicional. Se o relator ficar vencido e o voto condutor da divergência não for declarado, haverá nulidade do julgamento.

Sendo unânime o julgamento ou quando houver divergência que não atraia a aplicação da técnica de julgamento prevista no artigo 942 do CPC/15, o processo segue para a lavratura do acórdão pelo relator. Quando, no entanto, o resultado do julgamento não for unânime e a hipótese atrair a regra do artigo 942 do CPC/15, o processo será encaminhado, automaticamente, para a sessão presencial, com a publicação de nova pauta, com vistas à continuidade do julgamento perante o colegiado ampliado.

Tem-se, portanto, que o formato adotado pelo plenário virtual garante plena observância dos princípios fundamentais do processo, notadamente os da ampla defesa e da publicidade. Não há comprometimento do princípio da colegialidade e da segurança dos julgados. O julgamento continua colegiado. Haverá discussão, possibilidade de convencimento mútuo entre os julgadores e divergências, só que tudo ocorrerá no ambiente eletrônico. A dinâmica procedimental da sessão virtual, em que os vogais têm acesso previamente ao voto do relator e dispõem de tempo razoável para examinar com vagar as questões de direito e de fato, acaba por proporcionar maior segurança ao julgado. É uma alternativa, que supera, em eficiência e segurança, o julgamento em lista, até então utilizado largamente pelos tribunais.

Categorias
Notícias

Natália Santos: A tecnologia blockchain e o Direito

A tecnologia blockchain, também conhecida como “protocolo de confiança”, foi criada em 2008 por Satoshi Nakamoto como a principal inovação tecnológica do bitcoin, porém não se confunde com a conhecida criptomoeda. Na verdade, a blockchain é a tecnologia por trás do bitcoin e de todas as criptomoedas, mas também pode ser utilizada nos mais variados seguimentos, como no setor educacional, alimentício, automobilístico, marketing, na área da saúde e até mesmo no campo do direito.

A tecnologia propõe imutabilidade, transparência e descentralização como medida de segurança, funcionando como um livro-razão público sem o intermédio de terceiros. Trata-se de uma base de dados distribuída que guarda um registro de transações permanentes e à prova de violação, não podendo ser alterada, eis que armazena informações em blocos dependentes uns dos outros, formando uma cadeia de blocos.

Essas informações não são armazenadas em um computador central, mas sim em milhares de computadores, cada qual com o seu backup, o que significa que não há um ponto único de falha, pois se um nó deixa a rede, outros nós já têm armazenada uma cópia exata de toda a informação compartilhada. Isso faz com que a tecnologia seja segura, pois um hacker não poderia modificar informações na blockchain sem controlar toda a rede.

Quais são as vantagens e desvantagens?
A maior vantagem da tecnologia é que suas informações são criptografadas exigindo uma assinatura digital, o que gera segurança nas transações e garante a proteção contra possíveis ameaças, sendo um mecanismo inviolável para armazenamento de dados.

A dificuldade da tecnologia está na exigência de uma grande capacidade de processamento ou de uma rede capaz de aguentar um grande volume de dados, para evitar sobrecarga. Além disso, a sua implementação carece da reunião de diversos projetos, como a tecnologia da informação, dependendo da colaboração de terceiros, o que pode tornar o processo de aplicação um pouco complicado. Portanto, é importante que a implantação seja bem avaliada e planejada para o seu bom desempenho.

Diferentes tipos de blockchain
A tecnologia pode ser utilizada em diversos negócios em função da sua base de registro de transações. Na área da educação, apresentamos como principal exemplo a emissão de diplomas, certificados, credenciais e históricos de múltiplos cursos. Nesse segmento, a Universidade Federal da Paraíba (UFPB) foi considerada a primeira universidade do Brasil a emitir diplomas via blockchain.

A tecnologia na esfera jurídica
No campo do Direito, ela pode refletir de inúmeras formas, sendo muito utilizada em consultoria consultiva. O OriginalMy é um dos exemplos mais relevantes, por se tratar de um protocolo de verificação de identidade pessoal que aproveita a tecnologia para gerenciar as identidades digitais. Ou seja, ele pode constatar a autenticidade de diversos tipos de documentos digitais, como contratos e a identidade de pessoas. Desse modo, a segurança e a confiança oferecida têm sido comparadas à fé pública dos cartórios na autenticação, além de facilitar o registro e transferência de bens móveis e imóveis, evitando o risco de falsificação e todo o procedimento burocrático.

Segundo a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), é possível usar a tecnologia para identificar a origem e autoria de uma obra, agilizar a concessão de registros de marcas e patentes e controlar e combater a pirataria. Isso porque o autor de uma obra pode certificar uma peça na medida em que ela será criada, aplicando-se a proteção contra plágios, ou mesmo enquanto estiver aguardando a confirmação do registro no órgão oficial, podendo ser utilizada como meio adicional de proteção.

Nos contratos, também pode ser uma importante aliada, pois por se tratar de uma base de dados imutável, as partes podem garantir a impossibilidade de adulteração do conteúdo depois que ele for assinado, conferindo integridade e autenticidade nos documentos, além de trazer maior segurança por meio do uso de identidades verificadas por assinatura eletrônica.

A tecnologia também poderá contribuir no processo de compliance da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), já que pode ser facilmente integrada em sites, portais ou aplicativos, permitindo ao usuário que assine contratos ou documentos digitais e requerimentos de autorização para acessar os dados pessoais. Portanto, poderá ser incorporada na preservação dos dados e para evitar a invasão de hackers e sanções por descumprimento da legislação.

Outro importante exemplo de utilização da blockchain são os contratos inteligentes, conhecidos como smart contracts. Trata-se de contrato autoexecutável criado para facilitar a negociação, proporcionando confiança nas transações online, com objetivo de consentir que pessoas desconhecidas façam negócios online sem o intermédio de uma autoridade central. Com a referida tecnologia, um contrato de locação, por exemplo, pode ser firmado por meio de um software de automação, no qual os dados das partes e da locação são preenchidos automaticamente, com assinatura digital e os envolvidos podem acessar os documentos com uma senha única, sem possibilidade de alteração do conteúdo.

É importante ressaltar que tais aplicações ainda estão emergindo no campo do Direito, por se tratar de uma tecnologia nova, sendo necessária sua regulamentação para assegurar as relações jurídicas.

No cenário atual, com o aumento das transações online, é imprescindível maior segurança dos dados, o que pode ser perfeitamente fornecido pela tecnologia blockchain, mas ainda é preciso crescimento e credibilidade frente ao novo mercado virtual.

Natália Marques dos Santos é advogada do escritório Costa Marfori.

Categorias
Notícias

Município não pode proibir abordagem sobre gênero nas escolas

É inconstitucional trecho de lei de Foz do Iguaçu (PR) que proíbe abordagem sobre gênero nas escolas. A decisão foi tomada na sessão virtual do Plenário do Supremo Tribunal Federal que encerrou nesta sexta-feira (8/5). 

Cármen Lúcia entendeu que município interveio em matéria que cabe à União
Carlos Moura / SCO STF

Por unanimidade, o colegiado acompanhou o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, que apontou a competência da União para elaborar o Plano Nacional de Educação em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os municípios.

Por isso, considerou que o município interveio no conteúdo ministrado nas instituições de ensino, matéria que compete à União.

De acordo com a ministra, ao proibir a adoção e divulgação de políticas de ensino ou disciplinas que “tendam a aplicar a ideologia de gênero, o termo ‘gênero’ ou ‘orientação sexual’, o município ultrapassou as balizas constitucionais pelas quais lhe é autorizada tão somente a complementação normativa para atendimento de peculiaridades locais”.

A ação foi ajuizada pelo Partido Comunista do Brasil, que afirmou que a legislação municipal demonstra clara censura ao tema. O artigo 5º da lei, definiu, por emenda, que “ficam vedadas em todas as dependências das instituições da rede municipal de ensino a adoção, divulgação, realização ou organização de políticas de ensino, currículo escolar, disciplina obrigatória, complementar ou facultativa, ou ainda atividades culturais que tendam a aplicar a ideologia de gênero, o termo ‘gênero’ ou ‘orientação sexual’”.

Em julho de 2018, o ministro Dias Toffoli, acolheu o pedido e suspendeu o trecho por entender que a supressão de conteúdo curricular trata de medida grave que atinge o direito ao saber. Além disso, afirmou que mesmo que estados e municípios não podem dispor de modo contrário ao que está na lei federal.

Clique aqui para ler o voto da relatora

ADPF 526

Categorias
Notícias

Para advocacia, resolução do CNJ cria mais dúvidas do que soluções

A Ordem dos Advogados do Brasil vai precisar entrar com embargos de declaração contra a Resolução 318 publicada nesta quinta-feira (7/5) pelo Conselho Nacional de Justiça. Ao tentar regular a questão dos prazos processuais entre processos físicos e virtuais e diante da possibilidade de lockdown, a norma mais confunde do que resolve.

Resolução do CNJ criou dúvidas quanto aos prazos, segundo advocacia
CNJ

É o que o conselheiro federal da OAB, Ary Raghiant, definiu como “pandemia processual” durante seminário virtual realizado nesta quinta-feira pela TV ConJur. “Quando isso se afunilar e processos chegarem, a contagem de prazo vai ser problema clássico e vamos ter que ir no superior e fazer juntadas de certidões ou de informações particularizadas”, apontou.

Em suma, a resolução confirma que os prazos processuais para processos virtuais foram retomados na segunda (4/5), mas os físicos continuam suspensos. Em estados com decretos de lockdown, todos os prazos podem ser suspensos. Isso também pode ocorrer em locais em que a situação esteja tão complicada que impossibilite trabalho forense regular. Neste caso, o Tribunal de Justiça deve fundamentar o pedido ao CNJ.

Ary Raghiant cita como exemplo o estado do Pará, onde dez cidades estão sob lockdown. “Nas dez está suspenso prazo e nas demais não?”, indaga. Questiona, também, como fica a situação em relação à Justiça Federal. Se em São Paulo a situação evoluir para um lockdown e os prazos forem suspensos, como fica a situação do Mato Grosso, estado também abrangido pelo TRF-3?

“Veja que temos mais dúvidas do que soluções. A Resolução 318, de certa forma, não deixa claro inclusive o que é unidade da federação. Temos decretos feitos por municípios. Precisamos ver se ela contempla também. As pessoas vivem nas cidades, não no estado ou União. Vamos ter que fazer embargos de declaração e ver como resolver esses problemas”, afirmou.

Controvérsia

Quase ao mesmo tempo em que a Resolução 318 era divulgada, o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa) protocolava um ofício pedindo ao CNJ a suspensão dos prazos processuais em todo o país até o dia 31 de maio, com posterior reavaliação sobre a possibilidade de estender ainda mais a medida.

O Cesa pedia que o CNJ levasse em consideração o fato de que, em sua maioria, os advogados dependem do contato direto com pessoas que “obrigatoriamente têm que atender o distanciamento social” e de informações ou documentos que estão em poder de terceiros (empresas ou órgãos públicos) que estão, muitos deles, com as atividades suspensas, o que torna impossível o cumprimento dos prazos.

São queixas parecidas com as que já tinham sido levantadas pela ConJur em relação à retomada dos prazos na segunda-feira (4/5). O presidente da seccional de São Paulo da OAB, Caio Augusto Silva dos Santos, por exemplo, destacou que poderia haver dificuldade de cumprir os prazos quando fosse necessário cumprir diligências que não poderão ser feitas devido ao isolamento social. Por exemplo, quando uma empresa precisar ter acesso a documentos que estão em sua sede para se defender devidamente.

Já o presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Renato José Cury, declarou que a retomada dos prazos funciona para escritórios com estrutura, mas não para advogados que dependem de entidades para exercer a profissão.

A queixa foi ecoada no ofício do Cesa, que também pedia que o CNJ levasse em consideração o fato de que “parte da advocacia depende do acesso a computadores ou a rede de internet de terceiros (salas dos advogados nos fóruns, sedes das OABs etc), o que representaria uma circulação maior de pessoas nesse momento em que se recomenda o isolamento social”.

Continuidade

Por sua vez, o conselheiro e presidente do gabinete de crise do CNJ Henrique Ávila explicou, em artigo publicado pela ConJur, que as resoluções do CNJ foram sendo editadas conforme as necessidades impostas pelo combate à epidemia.

Se a suspensão dos prazos processuais era inevitável num primeiro momento, a sua continuidade acabaria levando a um crescente represamento de ações e recursos nos tribunais. O CNJ também levou em conta que advogados, juízes e servidores também já estavam melhor adaptados ao trabalho remoto e às limitações impostas pela epidemia da Covid-19.

Assim como na suspensão dos prazos e sua posterior retomada, as resoluções do CNJ levam em consideração as alterações no cenário nacional e as especificidades das demandas judiciais, escreve Ávila.

“Essa é a hora de, mais do que nunca, todos os atores processuais atuarem na mais estrita cooperação e compreensão mútua, com empatia e solidariedade, entre juízes, advogados, membros do MP, defensores públicos, e todos os integrantes do sistema de Justiça, para que possamos superar juntos esse período de impensável anormalidade em que vivemos.”

Clique aqui para ler a resolução do CNJ