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Milena Cintra: Impactos do PL 11.079/2020 nos contratos de locação

Buscando um adequado equilíbrio em áreas extremamente complexas e de difícil ponderação entre interesses, como a das locações urbanas, o Projeto de Lei 11.079/2020 teve sua tramitação encerrada no Senado no último dia 19, aguardando a qualquer momento a sanção do presidente da República.

Conforme o artigo 9º da novata legislação, até 31 de dezembro de 2020 ficará vedada a concessão de liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo referentes ao artigo 59 da Lei nº 8.245/1991, aplicando-se a regra a partir da sua entrada em vigor apenas às ações ajuizadas a partir de 20 de março.

Essa previsão legal tão esperada visa a efetivar o princípio da dignidade humana, evitando a perda do direito basilar de moradia de milhares de locatários em tempos de grave dificuldade financeira, sem a remissão do débito do aluguel que permanece devido em face do locador.

Cumpre chamar a atenção, entretanto, para o fato de que nas locações residenciais ajustadas com o prazo inferior a 30 meses, findo o prazo estabelecido (o que provoca a sua prorrogação automática por prazo indeterminado), permanece assegurado o direito de retomada do imóvel nas hipóteses previstas no artigo 47, incisos I, II, III e IV, da Lei nº 8.245/91, não se aplicando a tais hipóteses às restrições para liminar de despejo consubstanciadas na PL.

Assim é que, desde que atestadas as características/circunstâncias da locação residencial, conforme supradescritas, fica mantida a possibilidade de retomada do imóvel nos seguintes casos: extinção do contrato de trabalho se a ocupação do imóvel pelo locatário relacionada com o seu emprego; pedido para uso próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio; pedido para demolição e edificação licenciada ou para a realização de obras aprovadas pelo poder público, que aumentem a área construída, em, no mínimo, 20% ou, se o imóvel for destinado a exploração de hotel ou pensão, em 50%.

Acrescentam-se também as hipóteses ordinárias de desfazimento da locação urbana, quais sejam: mútuo acordo, prática de infração legal ou contratual, falta de pagamento do aluguel e demais encargos e realização de reparações urgentes determinadas pelo poder público que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário no imóvel ou, podendo, ele se recuse a consenti-las.

Dessa forma, apenas se atendidas todas as características e circunstâncias da locação residencial urbana, bem como preenchidas quaisquer das hipóteses do artigo 47, I, II, III e IV, da Lei nº 8.245/91, poderemos falar em exceção à vedação da concessão de liminar para desocupação de imóvel urbano, oportunidade em que não seria o caso de aplicação da inovação legislativa de urgência.

Vale salientar que o Senado Federal decidiu suprimir o artigo 10º da PL que previa a suspensão total ou parcial do pagamento de aluguéis vencíveis a partir de 20 de março até 30 de outubro para os locatários residenciais que sofrerem alteração econômico-financeira.

O entendimento entre parte dos senadores foi de que o projeto transferia o problema dos locatários para os locadores, além de que a previsão de pagamento de parcelas atrasadas somente a partir de novembro (juntamente com o vencimento dos aluguéis dos meses correntes) causaria maiores problemas financeiros, posto que os locatários não conseguiriam pagar o acúmulo dos valores vencidos e do aluguel mensal.

Em que pese a retirada do artigo, já se tem notícia de ações ajuizadas em tribunais de todo o país com deferimento de suspensão ou simples redução do pagamento do aluguel mensal para os locatários que tiveram sua vida financeira desequilibrada. O fato é que caberá a análise de cada caso concreto pelo julgador, sendo de extrema importância a tentativa de acordo entre as partes a fim de evitar o abarrotamento do Judiciário, principalmente em tempos frágeis de pandemia.

Assim, uma vez mais que evidente a configuração do conflito de interesses opostos no contrato de locação diante do caos instaurado, faz-se necessário conter os excessos em nome da ocorrência do caso fortuito e da força maior. Por outro lado, urge também a observância na fragilidade econômica do momento para que segmentos vulneráveis como os locatários não sofram restrições ao direito à moradia, sendo esse o escopo maior da criação das normas transitórias atinentes à locação urbana no Brasil.

 é advogada cível e do consumidor, especialista em Direito Público.

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STF rejeita pedido de MT e mantém divisa com o Pará inalterada

Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual, julgou improcedente ação cível originária ajuizada pelo Estado de Mato Grosso com o objetivo de ver reconhecida, como parte do seu território, extensão de terra incorporada ao Pará em 1922.

Divisa em disputa entre Mato Grosso e Pará
Reprodução

A controvérsia diz respeito ao marco geográfico conhecido originalmente como Salto das Sete Quedas, localizado à margem do rio Araguaia, que teria sido eleito pelos dois estados, mediante convênio firmado em 1900, como divisa geográfica a oeste.

Na ação, Mato Grosso alegava equívoco na elaboração da “Primeira Coleção de Cartas Internacionais do Mundo” pelo Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, sucedido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao considerar ponto inicial do extremo oeste a Cachoeira das Sete Quedas, e não, segundo convencionado, o Salto das Sete Quedas. Segundo o estado, todos os mapas posteriores veicularam o mesmo erro, o que reduziu seu território. Por sua vez, o Pará argumentava que houve somente a mudança de nome do mesmo local.

Perícia

Segundo o relator, ministro Marco Aurélio, a perícia do Serviço Geográfico do Exército solicitada por ele concluiu que o acidente geográfico acordado como ponto de divisa oeste entre Pará e Mato Grosso na convenção de limites de 1900 é o situado mais ao sul, denominado, até 1952, Salto das Sete Quedas e, a partir desse ano, como Cachoeira das Sete Quedas. Portanto, teria havido apenas alteração de nomenclatura do local de referência para a definição dos limites.

De acordo com o relator, os peritos fizeram levantamentos de campo com a presença de representantes e assistentes técnicos dos dois estados e definiram as coordenadas de outros acidentes naturais situados entre os marcos apontados pelas partes como sendo o correto.

Realizaram também entrevistas com a população ribeirinha nas proximidades dos marcos geográficos e pesquisaram documentos históricos localizados em diversas instituições situadas no país e no exterior. A perícia apontou ainda que o único documento em que houve inversão dos nomes, o que alteraria a linha divisória entre os estados, foi a Carta de Mato Grosso e Regiões Circunvizinhas, de 1952.

Com a decisão de mérito, foi revogada a medida liminar concedida anteriormente pelo relator e referendada pelo Plenário que suspendia a regularização de terras situadas em faixa territorial ainda não demarcada entre os estados. Com informações da assessoria de imprensa do Supremo Tribunal Federal.

ACO 714

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Juíza manda Fundação Palmares retirar textos contra Zumbi

Direito à identidade

Juíza manda Fundação Palmares retirar textos contra Zumbi

Sérgio Camargo criticou a decisão e disse que a Fundação Palmares está sob censura
Reprodução/Facebook

A juíza Maria Cândida Carvalho Monteiro de Almeida, da 9ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, determinou que a Fundação Palmares retirasse dos canais de comunicação da instituição os artigos “Zumbi e a Consciência Negra — Existem de Verdade?”, de Luiz Gustavo dos Santos Chrispino, e “A Narrativa Mística de Zumbi dos Palmares”, de Mayalu Felix.  A informação é da jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo.

A decisão da magistrada foi provocada por pedido liminar apresentado pelos deputados federais Benedita da Silva (PT-RJ) e Áurea Carolina (PSol-MG), e deputados Bira do Pindaré (PSB-MA) e Túlio Gadêlha (PDT-PE). A multa por descumprimento da decisão judicial é de R$ 1 mil por dia. 

“Concluo, com base nessas considerações, que a permanência dos artigos questionados no sítio institucional da Fundação Cultural Palmares ameaça o patrimônio histórico-cultural brasileiro e viola o direito à identidade, ação e memória da comunidade negra e a sua garantia a condições adequadas para a preservação, expressão e desenvolvimento de sua identidade”, diz trecho da decisão.

O militante bolsonarista Sérgio Camargo que atualmente comanda a Fundação Palmares afirmou que a instituição está sob censura e disse que irá recorrer da decisão.

Revista Consultor Jurídico, 29 de maio de 2020, 21h44

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Celso de Mello arquiva notícia-crime contra Sergio Moro

Sem competência ou provas

Celso de Mello arquiva notícia-crime contra Sergio Moro

Não cabe ao Supremo Tribunal Federal ordenar, induzir ou estimular o oferecimento de acusações penais, função que é exclusiva do Ministério Público, de acordo com a Constituição Federal de 1988. Principalmente quando o acusado em notícia-crime sequer tem prerrogativa de foro para ter o caso tutelado pelo Supremo Tribunal Federal.

Ministro Celso de Mello recebeu petição sem documentos ou provas do crime 
STF

Com esse entendimento, o ministro Celso de Mello não conheceu e determinou o arquivamento de notícia-crime enviada por advogado contra Sérgio Moro, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública.

O envio diz respeito a suposto crime cometido ao afirmar que, para aceitar o cargo no governo, pediu ao presidente Jair Bolsonaro pensão para sua família caso lhe acontecesse algo.

Como destacou o decano do STF, a petição enviada sequer contou com qualquer documento que embasasse minimamente a notícia-crime. Além disso, o cargo de ministro da Justiça não está incluso no artigo 102, alíneas b e c da Constituição, que define os casos em que o Supremo tem competência originária.

Além disso, a função acusatória definida pela Constituição é do Ministério Público. “Fica evidente, assim, que o Poder Judiciário não dispõe de competência para ordenar, para induzir ou, até mesmo, para estimular o oferecimento de acusações penais (ou de promover investigações criminais) pelo Ministério Público”, disse o decano.

Clique aqui para ler a decisão

Pet 8.818

Revista Consultor Jurídico, 29 de maio de 2020, 21h42

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OAB vai ao STF por acesso aos autos no inquérito das fake news

Violação das prerrogativas

OAB vai ao STF por acesso a depoimentos no inquérito das fake news

Por 

O argumento de que a simples vista dos autos comprometeria um inquérito é frágil e não encontra guarida no atual Estado Democrático de Direito. Além disso, configura violação à liberdade dos investigados e às prerrogativas da advocacia, que tem o direito de, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa.

Ministro Alexandre de Moraes é o relator do inquérito das fake news no STF 
Carlos Moura/SCO/STF

Com esse entendimento, a Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal com pedido de liminar para garantir a obtenção de cópias de todos os elementos de provas já documentados em referência ao empresário Allan Lopes dos Santos, um dos investigados no Inquérito 4.781, que apura o uso de fake news contra integrantes da corte.

Os advogados apontam que os investigados prestaram depoimento e foram alvo de busca e apreensão, mas que em três tentativas o acesso aos autos foi negado pelo Supremo. A entidade ainda destaca que a imprensa tem divulgado trechos dos depoimentos, o que reforça a necessidade de obter o teor das investigações.

O pedido se baseia na Súmula 14 do STF, segundo a qual “é direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.

“As chamadas fake news, os ataques às instituições do país e também aos integrantes das mesmas de forma pessoal, as ameaças em relação à manutenção da democracia são atos odiosos e merecem toda a repulsa dessa Corte e da Ordem dos Advogados do Brasil, mas devem ser punidas na medida das respectivas culpabilidades e responsabilidades, após o devido processo legal, ampla defesa e contraditório”, destaca a peça, assinada pela cúpula da entidade.

Clique aqui para ler o pedido

Inq 4.781

 é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 29 de maio de 2020, 21h23

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MP pede suspensão de decreto que autorizou volta de cultos no Rio

O Ministério Público moveu nesta quinta-feira (28/5) ação civil pública pedindo a suspensão do decreto carioca que permite a volta de cultos religiosos presenciais na cidade.

Cultos podem facilitar propagação do coronavírus, diz MP-RJ

A Promotoria argumenta que o Decreto municipal 47.461/2020 se contrapõe às medidas restritivas sanitárias estabelecidas pelo estado do Rio ao garantir o funcionamento de tempos religiosos. Essas cerimônias podem gerar aglomerações e aumentar o risco de propagação do coronavírus.

O direito ao culto em nenhum momento foi suprimido, sustenta o MP, uma vez que ele pode ser exercido remotamente, como vêm fazendo diversas organizações religiosas. “Não há, deste modo, qualquer prejuízo ao exercício da referida atividade e da propagação da fé e da mensagem do líder religioso aos seguidores da igreja”, destaca o órgão.

De acordo com o MP, a volta dos cultos presenciais durante a epidemia de coronavírus viola diversos princípios constitucionais, como a razoabilidade, precaução e prevenção na saúde. Além disso, a medida pode ser considerada, no mínimo, erro grosseiro, uma vez que é contrária a estudos técnicos epidemiológicos.

Dessa maneira, o MP pede liminar para que o município do Rio se abstenha de editar atos que extrapolem os limites de sua competência suplementar para estabelecimento de medidas sanitárias de combate à Covid-19.

O MP diz que a prefeitura não pode flexibilizar o isolamento social sem respaldo em estudos técnicos embasados em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde, vigilância sanitária e epidemiológica, mobilidade urbana, segurança pública e assistência social, levando em consideração a análise de dados e peculiaridades econômicas, sociais, geográficas, políticas e culturais da cidade.

Além disso, o MP requer que o município do Rio amplie, por meio dos canais oficiais públicos, inclusive redes sociais, campanhas educativas de esclarecimento à população, conscientizando sobre as medidas restritivas em vigor e os efeitos desejados que eventualmente forem obtidos, bem como sobre os riscos decorrentes da não adesão ao isolamento social. Para o caso de descumprimento das obrigações acima, a Promotoria pede aplicação de multa diária no valor de R$ 5 mil ao prefeito Marcelo Crivella. Com informações da Assessoria de Imprensa do MP-RJ.

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Nomear PGR para o Supremo era praxe na ditadura

“Só prá complementar, se aparecer aí uma terceira vaga — espero que ninguém desapareça —, o Augusto Aras entra fortemente na terceira vaga.” Em live nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro prometeu nomear o procurador-Geral da República, Augusto Aras, para o Supremo Tribunal Federal. Desde 1988, quando o Brasil ganhou uma nova Constituição, nenhum mandatário da República indicou um PGR para o STF. Mas ainda que seja tão vaga quanto improvável, a promessa de Bolsonaro ressuscita uma prática que valia quase como norma durante os anos da ditadura militar.

Ministro aposentado Sepúlveda Pertence

O último procurador-geral a vestir a toga de ministro do Supremo foi Sepúlveda Pertence. Ele foi nomeado pelo presidente José Sarney (1985-1989) para chefiar o Ministério Público da União em 1985, já na era pós-ditadura, e para assumir uma cadeira no supremo em 1989. Sepúlveda tinha sido membro do Ministério Público do Distrito Federal, mas foi cassado pela ditadura militar em 1968, por força do AI-5.

Quando foi nomeado procurador-geral por Sarney, exercia a advocacia privada. Foi a Constituição de 1988 que determinou que o procurador-Geral da República seria escolhido pelo presidente da República “dentre integrantes da carreira, maiores de 35 anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado, para mandato de dois anos, permitida a recondução”.

Durante o período da ditadura militar, todos os ocupantes do Palácio do Planalto fizeram o gambito do chefe do Ministério Público da PGR para o STF. Castello Branco (1964-67), o primeiro general-presidente, nomeou o primeiro PGR da ditadura. Osvaldo Trigueiro de Albuquerque Mello foi nomeado pouco mais de um mês depois do golpe. Antes de completar dois anos no cargo, foi chamado para ocupar no STF numa das vagas criadas pelo AI-2, que aumentou de 11 para 16 o número de ministros da corte.


Ministro PGR Nomeado

por
STF Nomeado

por
Firmino Paz 1979-1981 Figueiredo 1981-1982 Figueiredo
Moreira Alves 1972-1975 Médici 1975-2003 Geisel

Francisco Albuquerque

1969-1972 Médici 1972-1983 Médici
Décio de Miranda 1967-1969 Costa e Silva 1978-1986 Geisel
Osvaldo Trigueiro 1964-1965 Castello Branco 1965-1975 Castello Branco

Décio Meirelles de Miranda foi o único do grupo que não fez a transição direta da PGR para o STF. Nomeado para comandar o Ministério Público em 1967, por Costa e Silva (1967-69), permaneceu no cargo por dois anos, quando foi nomeado ministro do Tribunal Federal de Recursos, futuramente Superior Tribunal de Justiça, em 1988.

Quase uma década mais tarde, o general Ernesto Geisel (1974-1979) lembrou-se de seu nome para alojá-lo no Supremo. Logo ao assumir a presidência, o general Emílio Médici (1969-1974) nomeou Francisco Manoel Xavier de Albuquerque para a PGR e ao findar o mandato de dois anos colocou-o no Supremo.

Seu sucessor na PGR foi José Carlos Moreira Alves, que foi nomeado por Médici e a quem o general Geisel transplantou para a Suprema Corte, onde se tornou uma das mais influentes figuras por quase três décadas. Além da chefia da PGR e do comando do STF, Moreira Alves ocupou, ainda que momentaneamente, a presidência da República (de 7 a 10 de julho de 1986) e do Congresso (em 1º e 2 de fevereiro de 1987, na instalação da Assembleia Nacional Constituinte). Foi o único brasileiro a presidir os três poderes da República.    

O último premiado com uma suprema nomeação foi Firmino Ferreira Paz, a quem o general João Baptista Figueiredo (1979-1985) designou PGR em 1979 e elevou a ministro do STF em 1981. Um prêmio mesmo: um ano depois, aposentou-se ao atingir a idade da aposentadoria compulsória de 70 anos. Para os outros quatro procuradores-gerais do período autoritário, faltou a vaga no Supremo para recompensá-los. São eles: Alcino Salazar (1965-1967, governo Castello Branco); Haroldo Teixeira Valadão (30/3 a 13/11 1967, sob Costa e Silva); Henrique Fonseca de Araújo (1975-1979, Ernesto Geisel); Inocêncio Mártires Coelho (1981-1985, governo João Figueiredo).

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Maria Eduarda Rago: Lockdown não viola direito à liberdade religiosa

A Carta Magna brasileira garante a liberdade religiosa em seu artigo 5º, inciso VI, e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos faz a mesma consideração em seu artigo 18. Esses dois dispositivos são peças-chave para entender a questão a ser debatida a seguir: diante do quadro pandêmico causado pelo Covid-19, a medida mais radical de isolamento, intitulada como lockdown, fere o direito fundamental de liberdade religiosa?

Para iniciarmos o debate, cabe trazer à tona o pensamento do constitucionalista José Afonso da Silva acerca da subdivisão da liberdade de religião em: a) liberdade de crença: liberdade para escolher ter ou não religião ou participar de seita religiosa, ou até mesmo para mudar de religião/seita; b) liberdade de culto: liberdade para orar e praticar os atos religiosos em casa ou em público, assim como o recebimento das devidas contribuições; c) liberdade de organização religiosa: “diz respeito à possibilidade de estabelecimento e organização de igrejas e suas relações com o Estado” [1].

A partir disso, entende-se que o tema do lockdown causa estranhamento e, mais estritamente às liberdades de culto e de organização religiosa, resta saber se de fato ficam prejudicadas. Recentemente, o estado de Pernambuco foi alvo de polêmica acerca dessa matéria em razão do Decreto nº 49.017/2020, de 11 de maio, o qual dispõe sobre intensificação de medidas restritivas voltadas ao Covid-19. Entre essas medidas, destaca-se a restrição à circulação de veículos e pessoas, prevista no artigo 3º, o qual elenca um rol de atividades essenciais, sem menção alguma às gravações e transmissões ao vivo de cultos, o que foi imediatamente criticado pelas autoridades religiosas, que interpretaram essa ausência como violação à liberdade religiosa.

O argumento autorizado pela Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos) é de ordem estrutural e logística: a realização da cerimônia nos espaços de culto gera uma melhor qualidade para os fiéis, uma vez que dispõe de instrumentos musicais, isolamento acústico, internet mais veloz, suporte de equipes de mídia, dentre outros fatores [2]. Contudo, apesar de verdadeiro o teor do posicionamento colocado pela associação, não é suficiente para caracterizar a lesão ao direito de liberdade religiosa, uma vez que o culto tem, ainda que com uma qualidade menor, condições de ser realizado nos lares e transmitidos por gravações, além de contar como método aliado à locomoção o uso de táxi e motoristas de aplicativo. Isso tudo visando o bem maior da coletividade pela tentativa de diminuição da curva de disseminação do coronavírus, sendo uma medida radical, mas de eficácia temporária e excepcional.

O “x” da questão para a certeza da inconstitucionalidade da norma não esteve exatamente na suposta violação do direito, mas na quebra do princípio da isonomia. As autoridades religiosas contaram como forte ‘carta na manga” a incoerência do próprio legislador, que permitiu a transmissão de aulas nos estabelecimentos de ensino (Decreto Estadual n. 49.017/2020, inciso XXVII), o que causou forte disparidade, afinal de contas: por que às igrejas foi proibido e às escolas não?

Por esse motivo, a Anajure teve seu argumento como vencedor e o governo do Estado se viu obrigado a alterar o dispositivo que trata da questão. Por meio do Decreto nº 49.024/2020, de 15 de maio, foram inseridas no anexo de atividades essenciais a preparação, a transmissão e a gravação de cerimônias religiosas.

Longe de encerrar o debate com respostas satisfatórias, o desembargador Bartolomeu Bueno, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Pernambuco, indeferiu, no dia 15 de maio, o pedido de uma igreja presbiteriana que solicitou ser excluída do rodízio obrigatório de automóveis em curso no estado. Ele sustentou que a obediência a essa medida não fere a liberdade religiosa, uma vez que podem se munir do uso de táxis e motoristas de aplicativo, como fora anteriormente abordado neste texto [3].

Sem nenhuma intenção de esgotar o tema, o que podemos concluir a partir desta análise é que o lockdown não viola o direito fundamental à liberdade religiosa, mas precisou ser revisto no Estado de Pernambuco pelo fato de ter tratado diferente grupos distintos com o mesmo objetivo: às escolas foi dado o direito e às igrejas foi negado, o que caracterizou forte descumprimento do princípio da isonomia e, consequentemente, tornou o dispositivo previsto no Decreto nº 49.017/2020 inconstitucional.

 é discente do curso de graduação em Direito da UPE, e membro do grupo de pesquisa “Fundamentos do Direito Contemporâneo” (CNPq-UPE)

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Magistratura nacional se une após ataques ao STF: “Não há espaço para retrocessos”

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O Codepre – Colégio de Presidentes de Tribunais de Justiça do Brasil enviou ofício ao presidente do STF, ministro Dias Toffoli, em apoio à mais alta Corte de Justiça do país. O Codepre é presidido pelo desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha, do TJ/MT.

Desde a divulgação do vídeo da reunião ministerial que levou à saída de Moro do governo, Jair Bolsonaro tem feito uma série de declarações polêmicas. Nesta semana, após operação determinada pelo Supremo no inquérito das fake news, que teve como alvos políticos e empresários ligados ao presidente, Bolsonaro afirmou que “ordens absurdas não se cumprem” e que “temos que botar limites”.

O Codepre assevera que “não há espaço para retrocessos, ainda que ataques pontuais neste momento delicado para as instituições brasileiras tentem desestabilizar a tão sonhada consolidação da nossa democracia”.

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O Colégio de Presidentes de Tribunais de Justiça do Brasil (Codepre), reitera integral apoio ao Supremo Tribunal Federal que, em seus 129 anos de história, vem prestando imensuráveis serviços à sociedade brasileira, firmando-se como instituição indispensável à garantia dos direitos dos cidadãos, ao Estado Democrático de Direito e à consolidação da democracia.

Não há outra palavra para definir o Poder Judiciário Brasileiro neste momento, que não a união.

União entre todos os tribunais, que respeitam a harmonia e independência entre os Poderes – sistema de freios e contrapesos previstos em nossa Carta Magna – mas que também ressalta a necessidade de respeito à autonomia da magistratura, no desempenho de suas funções constitucionais.

Em se tratando destes princípios, não há espaço para retrocessos, ainda que ataques pontuais neste momento delicado para as instituições brasileiras, tentem desestabilizar a tão sonhada consolidação da nossa democracia.

 Aos ministros do Supremo Tribunal Federal, contem conosco.




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OAB repudia declaração de Bolsonaro de que exame de Ordem é “caça-níquel”

O Conselho Federal e o Colégio de Presidentes de Seccionais da OAB emitiram nota oficial nesta sexta-feira, 29, externando “absoluta indignação” e repudiando declarações do presidente Jair Bolsonaro, segundo quem o exame da OAB é “caça-níquel”.

Diferentemente do que foi mencionado pelo presidente da República, o Exame não exerce, nunca exerceu e jamais exercerá função arrecadatória. Pelo contrário, o certame atualmente é aplicado em aproximadamente 180 cidades do Brasil, com as isenções previstas em lei, sem nenhum recurso público e com valores módicos, similares aos praticados em concursos pelos órgãos governamentais”, dizem o Conselho Federal e o Colégio de Presidentes.

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A nota defende ainda que o exame de Ordem busca exclusivamente atestar a capacidade jurídica dos examinandos, e foi concebido “para a proteção do cidadão contra aqueles que não lograram conquistar condições básicas de conhecimento para o exercício profissional da advocacia”.

  • Veja abaixo a íntegra da nota.

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Nota pública

A Diretoria do Conselho Federal e o Colégio de Presidentes de Seccionais da OAB vêm, por meio da presente nota oficial, manifestar sua mais absoluta indignação e repudiar as acusações infundadas feitas pelo excelentíssimo presidente da República na manhã desta sexta-feira (29).

Ao afirmar que o Exame de Ordem é um “caça-níquel muitas vezes”, o mandatário da nação demonstra completo desconhecimento das finalidades da Lei nº 8.906/1994 e desinformação sobre os requisitos necessários ao exercício da profissão da advocacia, tão importante para a cidadania e a justiça.

É importante esclarecer que o Exame de Ordem vem sendo aplicado desde 1994 e foi declarado constitucional, de forma unânime, pelo Supremo Tribunal Federal. Trata-se de etapa indispensável a qualquer bacharel que deseje exercer plenamente, e com o mínimo de condições técnicas, as atribuições da profissão.

Sua legalidade decorre do art. 8°, inciso IV, da Lei 8.906/94, o qual estabelece que, “para inscrição como advogado, é necessária a aprovação em Exame de Ordem”. Tal dispositivo se coaduna com o artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, que disciplina ser “livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

Diferentemente do que foi mencionado pelo presidente da República, o Exame não exerce, nunca exerceu e jamais exercerá função arrecadatória. Pelo contrário, o certame atualmente é aplicado em aproximadamente 180 cidades do Brasil, com as isenções previstas em lei, sem nenhum recurso público e com valores módicos, similares aos praticados em concursos pelos órgãos governamentais.

O Exame de Ordem tem a finalidade exclusiva de atestar a capacidade jurídica dos examinandos, evitando possíveis e muitas vezes irremediáveis prejuízos a terceiros. Foi concebido para a proteção do cidadão contra aqueles que não lograram conquistar condições básicas de conhecimento para o exercício profissional da advocacia – que é essencial à Justiça, conforme dispõe a Constituição em seu artigo 133.

Vale salientar que a exigência de preparação mínima se faz ainda mais urgente diante da falta de critérios adequados para impedir a proliferação indiscriminada de cursos de Direito no país. Atualmente, são mais de 1.700, muitos deles com aproveitamento mínimo no Exame de Ordem, o que reitera a necessidade de sua manutenção, inclusive como forma de fomentar a melhoria da qualidade do ensino jurídico. Aliás, o Exame tem sido objeto de anseio de outros conselhos profissionais, em especial na área da saúde, na busca pela valorização das instituições voltadas à educação que prestam um serviço digno e de qualidade, a fim de preservar vidas e direitos.

A Ordem dos Advogados do Brasil defenderá a manutenção do Exame de Ordem como ferramenta de defesa da sociedade, o qual também vem sendo reivindicado por tantos outros conselhos profissionais, em especial na área da saúde, como forma de valorizar as instituições de ensino que prestam um serviço educacional digno e de qualidade, assim como preservar direitos, vidas e respeito à sociedade, impedindo o “estelionato educacional” em muitos locais do nosso Brasil.