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STJ mantém indenização de R$ 200 mil a promotor por reportagens

Se em vez de informar a sociedade ou promover debate crítico acerca de tema de interesse social, o veículo de imprensa decide expor de forma sensacionalista a situação em que o acusado se encontra, de modo a incitar seus telespectadores a realizar o prejulgamento social, então surge o dever de indenizar.

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva viu acerto das decisões das instâncias ordinárias 
José Alberto/STJ

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve indenização de R$ 200 mil a ser paga pela TV Record ao ex-promotor Thales Ferri Schoedl, que em 2004 foi preso em flagrante por atirar contra dois estudantes numa festa na praia de Bertioga, no litoral paulista, matando um e ferindo gravemente o outro. 

O réu, que estava em período probatório no Ministério Público à época dos fatos, foi absolvido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo em novembro 2008 — decisão anulada pelo STF em 2018. De agosto de 2007 a outubro de 2008, ele foi alvo de seguidas reportagens da TV Record, que induziram a opinião pública e violaram sua privacidade.

A empresa usou, por exemplo, de câmeras escondidas, fez um jornalista se passar por frequentador da academia para interagir com o acusado e fez simulação computadorizada de fatos que ainda não tinham sido completamente apurados na via judicial.

“Há, de fato, uma exploração sensacionalista do sentimento de injustiça ao enfatizar que o autor, mesmo após ter matado um jovem, frequenta a academia, levando uma vida normal, ou que, após o crime, continuou a receber o salário de promotor de justiça, fato que decorreu da aplicação da lei”, afirmou o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

“Se emissora pretendia criticar a lei, deveria tê-lo feito sem ofender a honra e a imagem do autor. Assim, além de ter agido com total falta de responsabilidade em relação seu o dever de informar, veiculando informações simplórias e parciais”, complementou.

O valor foi mantido em R$ 200 mil porque as reportagens foram exibidas em programas de alcance nacional e estadual, com violações repetidas mais de dez vezes, e também pela capacidade financeira da TV Record e o caráter pedagógico-punitivo.

Clique aqui para ler o acórdão

REsp 1.550.966

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Servente e empresa têm de recolher previdência sobre valor de acordo 

Se acordo entre empresa e empregado não discriminais quais parcelas estão sujeitas à contribuição social, ela incidirá sobre o valor total do compromisso.

TST disse que, sem discriminação, contribuição social incide sobre valor total do acordo trabalhista
ASCS – TST 

Com esse entendimento, a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou recurso da Irtha Engenharia contra a inclusão, em acordo feito com um servente de obras, das contribuições para a Previdência Social. A proposta inicial do acerto delimitava todo o valor como indenização por danos morais.  

O servente ajuizou reclamação trabalhista contra a Solrac Empreiteira, microempresa que o contratou para prestar serviços à Irtha. Na Justiça, ele pediu o pagamento de salários, horas extras, férias, 13º salário e outras parcelas. Também requereu a responsabilização subsidiária da Irtha pelo pagamento caso a ex-empregadora não tivesse condições de cumprir eventual condenação.

Acordo trabalhista

Enquanto o processo tramitava na 101ª Vara do Trabalho de Parnaíba (PI), a Irtha e o servente apresentaram proposta de acordo, pela qual a empresa pagaria R$ 3 mil a título de indenização por danos morais. O juiz homologou o ajuste, mas discriminou as parcelas como saldo de salário, horas extras, FGTS e indenização por danos morais. Por fim, aplicou contribuição previdenciária de R$ 248. 

O Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região (PI) manteve a sentença. Segundo o TRT-22, a conciliação é objetivo fundamental na Justiça do Trabalho, e as partes, a princípio, não estão condicionadas a nenhum tipo de limitação. Contudo, o ato tem de obedecer às leis e não pode ser feito com o objetivo de fraudá-las.

Nos termos do artigo 43, parágrafo 1º, da Lei da Seguridade Social (Lei 8.212/1991), a ausência de discriminação das parcelas acordadas implica a incidência da contribuição previdenciária sobre o valor total do acordo homologado em juízo. O TRT-22 ainda citou decisões do TST no sentido de que a indicação genérica do título de indenização por danos morais ao valor acordado em juízo, sem o reconhecimento de vínculo de emprego, corresponde à ausência de discriminação das parcelas.

O relator no TST do recurso de revista da Irtha, ministro Caputo Bastos, não admitiu a apelação por constatar que as decisões apresentadas para demonstrar divergência foram superadas pela Orientação Jurisprudencial 368 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais.

Nos termos da OJ, é devida a incidência das contribuições para a Previdência Social sobre o valor total do acordo homologado em juízo, independentemente do reconhecimento de vínculo de emprego, desde que não haja discriminação das parcelas sujeitas à incidência da contribuição, conforme o artigo 43 da Lei 8.212/1991. 

O ministro ressaltou que o ajuste entre o servente e a empresa foi “mera liberalidade dela”, sem reconhecimento de relação de emprego e com o objetivo apenas de compensar danos morais. Nesse contexto, a referência sobre a natureza da quantia foi genérica, sem atender aos critérios da lei. “A discriminação ocorreria caso se indicasse quais eram os danos que estariam sendo indenizados”, explicou. A decisão foi unânime. Com informações da Assessoria de Imprensa do Tribunal Superior do Trabalho.

RR 358-57.2016.5.22.010

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Moro reconhece que teve mensagens interceptadas por hackers

Vaza jato

Em depoimento à PF, Moro reconhece que teve mensagens interceptadas

No depoimento à Polícia Federal no último sábado (2/5) a que a ConJur teve acesso, o ex-ministro Sergio Moro admitiu que teve mensagens de celular interceptadas por hackers.

Moro prestou depoimento à PF no sábado
Dalmo Meireles/Divulgação

A oitiva foi determinada por Celso de Mello, em inquérito aberto para investigar as declarações do ex-ministro da Justiça referentes à suposta intervenção do presidente Jair Bolsonaro em investigações da Polícia Federal.

No ano passado, o The Intercept Brasil teve acesso a uma série de mensagens de Moro trocadas com procuradores do MPF e outras autoridades ligadas à força-tarefa da “lava jato” em Curitiba, em episódio que ficou conhecido como “vaza jato”. As mensagens reveladas colocaram em xeque a credibilidade do consórcio formado a partir da 13ª Vara Federal da capital paranaense na condução dos julgamentos.

Após a revelação das conversas, a Polícia Federal prendeu alguns dos supostos responsáveis pelo vazamento. Moro, à época já no cargo de ministro, tentou destruir o material encontrado nos dispositivos dos acusados.

Revista Consultor Jurídico, 5 de maio de 2020, 17h52

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Ministro propõe julgamento coletivo de atos de outros Poderes

Autocontenção do Judiciário

Marco Aurélio pede que atos de outros poderes sejam julgados por colegiado

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, encaminhou à presidência da corte ofício solicitando que as decisões relativas à atuação de outros poderes sejam tomadas pelo colegiado, seja no Plenário ou nas turmas.

O ministro cita como motivação “a exceção de vir o Supremo a afastar a eficácia de ato de outro Poder, enquanto Poder” e “a necessidade de guardar a Lei das Leis, a Constituição Federal”.

Assim, propõe emenda ao Regimento Interno do Supremo para dar ênfase à atuação colegiada, com o objetivo de preservar a harmonia entre os poderes por meio da autocontenção do Judiciário.

Clique aqui para ler o ofício

Revista Consultor Jurídico, 4 de maio de 2020, 15h34

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Opinião: Nomeação de Ramagem no STF: o acerto jurídico da liminar

Texto em coautoria com outros advogados[1]

Não é de hoje que manifestamos nosso inconformismo contra o ativismo judicial que tem marcado a atuação de parte do Poder Judiciário. Direitos e garantias constitucionais têm sido constantemente violados, sob pretextos retóricos e messiânicos, abalando o nosso Estado Democrático de Direito.

Temos consciência plena do quanto fazem mal para a nossa jovem Democracia os processos acentuados de politização do Judiciário e de judicialização da política. Contra eles, inclusive, temos nos pronunciado frequentemente.

Não defendemos, com isso, o amesquinhamento do Poder Judiciário ou que ele abdique do seu dever de aplicar as leis ou de fiscalizar e fazer aplicar a nossa Carta Constitucional de 1988.

Por isso, no momento em que se discute a correção jurídica da decisão do Ministro Alexandre de Moraes, que concedeu liminar impedindo a posse de Alexandre Ramagem como Diretor-Geral da Polícia Federal, convém firmarmos nossa posição.

É um debate polêmico, que divide e incendeia a comunidade jurídica.

Entendemos que a decisão foi correta e adequada aos princípios constitucionais e às regras legais em vigor.

De acordo com a nossa Constituição, o Poder Judiciário pode e deve controlar a validade de atos administrativos, a partir de seus requisitos eminentemente jurídicos, mesmo reconhecida a liberdade de opção discricionária do administrador ao praticá-los.

No Estado de Direito, embora juízes estejam impedidos de adentrar ao campo valorativo decisório de mérito das competências administrativas, desde que sejam provocados legitimamente, poderão invalidar atos que ultrapassem esses limites de liberdade.

Uma das razões pelas quais juízes podem anular atos administrativos se dá quando estes são praticados em desacordo com a sua finalidade legal. Quer dizer: um ato administrativo deverá ser anulado sempre que o poder do administrador de praticá-lo tiver sido desviado da finalidade para a qual a lei admitia a sua prática. É o vício denominado de “desvio de poder”.

E foi o que inegavelmente ocorreu na nomeação em discussão. Um claro e inequívoco “desvio de poder”.

Ao ser contrastado pelas denúncias do ex-Ministro Sérgio Moro de que a nomeação de Ramagem visava a que a Polícia Federal atuasse de acordo com os interesses pessoais do Chefe do Executivo, em uma coletiva de imprensa e em outras manifestações, o próprio presidente confirmou esse fato, afirmando, inclusive, que já solicitara desse órgão a realização de uma diligência destinada a obter um depoimento em favor de um de seus filhos.

Essa intenção presidencial de retirar a atuação da PF dos trilhos legais foi confirmada por mensagens escritas divulgadas pelo próprio ex-ministro Sérgio Moro, ainda não contestadas, e, também, pela notória relação de amizade que o nomeado mantém com o núcleo da família Bolsonaro.

Não queremos dizer, com isso, que qualquer nomeação de um amigo para um cargo de confiança seja ilícita. Cargos de confiança existem para serem ocupados por pessoas que mantém uma relação de confiança com quem escolhe seus ocupantes. E é bom que seja assim.

O que se afirma é que é ilegal nomear-se alguém para cumprir uma missão ilícita, qual seja, a de fazer com que a Polícia Federal deixe de investigar parentes ou aliados do presidente da República , ou ainda, que esse órgão rompa com o dever legal de sigilo, prestando informações sobre investigações que, por lei, não podem ser prestadas.

Justamente por tal razão, não se afigura pertinente a pecha de incoerência da decisão liminar, por ter vedado a nomeação de Alexandre Ramagem para a Direção Geral da Polícia Federal, ao tempo em que o manteve no cargo de Diretor-Geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). À Polícia Federal, que detém atribuições de polícia judiciária, cabe resguardar o segredo quanto ao andamento de investigações em curso, mesmo ao presidente da República, e sobretudo quando se tratar de apurações que envolvam seus familiares. Isso diferencia a natureza do órgão em comparação com a Abin, cuja competência, aí sim, destina-se a suprir a cúpula governamental com elementos informativos necessários à tomada de decisões de gestão.

Nesse contexto, o rompimento do preceito constitucional da impessoalidade, admitido pelo próprio presidente, traduz fato incontroverso que enseja a avaliação da ocorrência do desvio de poder, facultando a impetração de mandado de segurança preventivo para conter o iminente ato abusivo.

Por isso, temos como acertada a decisão do Ministro Alexandre de Moraes.

Uma liminar não é uma decisão definitiva e deve ser concedida sempre que a aparência do direito é boa e a demora de uma decisão definitiva seja prejudicial.

Foi o que ocorreu, no caso, em face das próprias palavras do presidente e da urgência de se evitar a posse daquele que, declaradamente, receberia do presidente da República a missão de desviar a PF do seu dever de atuar de acordo com o princípio republicano.

Nos parece, assim, que a vedação da posse de Alexandre Ramagem na Direção-Geral da Polícia Federal distingue-se essencialmente da liminar que impediu a posse do ex-presidente Lula como ministro-chefe da Casa Civil no governo da presidenta Dilma Rousseff. Naquele caso, tudo derivou de um áudio ilicitamente divulgado pelo então juiz federal Sergio Moro que, apesar de imprestável como prova, induziu o STF a considerar haver uma tentativa de obstrução de justiça, num clima midiático que inibiu  o necessário choque de versões entre o que alguns pretendiam extrair do diálogo mantido e a própria explicação dada pela então chefe do Executivo. Isso eliminava, à época, ao nosso ver, a aparência da ilegalidade e a possibilidade daquela matéria ser discutida pela via do mandado de segurança.

Ou seja: embora no plano do direito possam parecer situações análogas, a nomeação feita por Dilma envolvia prova ilícita, contestada veementemente e, na soma, implicava , também,  versões fáticas discrepantes e ocultação intencional de fatos relevantes, manipulados com um objetivo conhecido e inconfessável.  A nomeação feita por Bolsonaro, por sua vez, diz respeito à prova lícita e à narrativa do próprio Presidente, confirmando o desvio de finalidade em que incorreu.

Entendemos, pois, que rejeitar nefastos ativismos ou abusos judiciais não significa defender que o Poder Judiciário deva deixar de cumprir, dentro da lei e da Constituição, a sua importante função de controlar atos administrativos abusivos praticados por um Chefe de Estado arbitrário e que ignora a lei, as instituições e os interesses públicos.

Este é o desafio.

 


[1]

Weida Zancaner, advogada, mestre em Direito e professora de Direito Administrativo. Membro do IDAP do IDID e do IBDA.

Fernando Hideo Lacerda, advogado criminalista, doutor e mestre em Direito.

 Marco Aurélio de Carvalho, sócio fundador do Grupo Prerrogativas e da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD). Conselheiro do Sindicato dos Advogados de São Paulo. Sócio fundador do CM Advogados. Especialista em Direito Público

Carol Proner, advogada, professora de Direito Internacional da UFRJ, membro fundador da ABJD.

Fabiano Silva dos Santos, advogado, mestre e doutorando em direito pela PUC/SP.

Mauro de Azevedo Menezes, advogado, mestre em Direito Público pela UFPE, ex-presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República.

José Eduardo Cardozo é advogado. Foi ministro da Justiça e Advogado Geral da União. Professor da PUC-SP, mestre em Direito e doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca (Espanha) e pela USP.