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Justiça não pode bloquear verba pública para pagar dívida trabalhista

Não é possível determinação de bloqueio judicial de verbas públicas para quitar, por meio de precatórios, dívidas trabalhistas. Com esse entendimento, a maioria do Plenário do Supremo Tribunal Federal suspendeu o bloqueio de verbas da educação do Amapá. 

Para pagar dívidas trabalhistas, verba de educação — destinada, por exemplo, a merenda escolar — não pode ser penhorada

No julgamento desta quinta-feira (4/6), os ministros acompanharam o relator, ministro Luiz Fux, que já havia suspendido as decisões da Justiça do Trabalho que haviam bloqueado as verbas do estado. Fux também determinara a devolução do dinheiro que eventualmente já tivesse sido penhorado. 

O processo chegou ao Supremo por meio de ação ajuizada pelo governador do estado, Waldez Góes, contra decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região. De acordo com o processo, as verbas seriam destinadas à merenda, ao transporte de alunos e à manutenção das escolas públicas. 

Na ADPF, o governador defendeu que todo dinheiro repassado pelo estado ou União é depositado em contas correntes de caixas escolares e que, portanto, deveria ser destinado apenas ao ensino público. Alegou que, por esse motivo, o montante é impenhorável, de acordo com a lei processual civil. 

Ao analisar o caso, Fux entendeu pela impossibilidade de bloqueio judicial dos valores em questão. Afirmou que a Constituição proíbe a transferência de recursos de um órgão para outro sem prévia autorização legislativa e apontou que os recursos públicos para uso compulsório na educação são impenhoráveis.

O ministro também negou o pedido de aplicação do regime de precatórios, apontando que os caixas escolares também são compostos de dinheiro privado. Para o recebimento dessas verbas, disse, é preciso que haja uma conta específica. 

Único a divergir, o ministro Marco Aurélio afirmou que o governador usou da APDF para “uma verdadeira queima de etapas” e julgou inadequada a via eleita. No mérito, o vice-decano julgou integralmente improcedente o pedido do estado.

Não participou do julgamento o ministro Dias Toffoli, por motivo de licença médica.

ADPF 484

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Flávio Cabral: Responsabilização do Estado na crise

A Covid-19 será um divisor de águas para a vida em sociedade como um todo. Com o Direito Administrativo não seria diferente. Entre a gama de cenários jurídicos que emergem fruto dessa pandemia, um que se mostra da mais alta essencialidade diz respeito à responsabilidade extracontratual do Estado, em particular quando se apuram as inúmeras medidas envolvendo restrições ao funcionamento normal de estabelecimentos comerciais (lockdown, toques de recolher, restrição ao horário de funcionamento e/ou ao número de clientes atendidos, imposição de medidas sanitárias, determinação de afastamento social e uso de máscaras, entre outras).

A questão da responsabilidade estatal decorrente de medidas que acabam impondo restrições a liberdades, em especial as afetas ao exercício da atividade comercial, deve ser analisada com cautela. Há situações variadas que precisam ser consideradas. Um primeiro aspecto é quando essas restrições adotadas pelo Estado pairam no campo da ilicitude.

Nesta hipótese a infração ao ordenamento jurídico pode se mostrar de maneiras diversas: a) a violação pode ser decorrente de uma inconstitucionalidade, envolvendo a violação à repartição constitucional de competências. Esse talvez tenha sido um dos grandes problemas enfrentados durante está pandemia, qual seja, compreender os limites e formas de atuação de um Estado federado como o brasileiro, entendendo o conteúdo das competências atribuídas aos entes federados pela Constituição. Há casos reais verificados em que determinado estado estabeleceu a proibição do funcionamento de certa atividade por meio de um decreto e um município deste Estado, por meio também de um decreto, autorizou essa mesma atividade. A qual determinação estatal atender? Aqui resta evidente que algum dos entes políticos extrapolou de alguma forma os limites da regulação no âmbito da sua competência. Em síntese, uma primeira ilegalidade decorrerá da apuração da violação da repartição de competências no que tange à adoção de medidas para fins de contingenciamento da Covid-19; b) um segundo aspecto diz respeito à proporcionalidade das medidas adotadas. Se de um lado é certo que o Estado é detentor do poder de limitar a propriedade e a liberdade, dentro de uma relação de poder de polícia e de supremacia do interesse público, também é correto que esta atuação estatal precisa ser exercida de maneira proporcional, sob pena de se tornar abusiva e, por conseguinte, antijurídica. Será que o fechamento de todo e qualquer estabelecimento, sem que se faculte medidas alternativas de funcionamento, com protocolos sanitários adequados a cada setor, seria proporcional? Além disso, quais as penalidades aplicáveis em caso de não cumprimento dessas medidas restritivas? Estariam limitadas pela proporcionalidade? e c) o abuso pode advir não da medida restritiva em si, mas da forma que ela acaba sendo cumprida e exigida pelo poder público. Imagine-se agentes públicos que vão fiscalizar o atendimento a um toque de recolher imposto pelo Estado. Caso aqueles humilhem os cidadãos, agredindo-os, física ou verbalmente, haverá um evidente abuso de direito (conduta ilícita).

Nesses casos de ilicitude, a responsabilização estatal nos parece mais clara e óbvia. Nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, o Estado responderá na modalidade objetiva, cabendo ao particular comprovar a conduta do Estado, o dano (certo e jurídico) e o nexo de causalidade (direto e imediato).

Por outro lado, em não se averiguando nenhuma ilicitude nas restrições tomadas pelo Estado, haveria como ele ser responsabilizado?

Deve-se lembrar, tratando-se de lição comezinha entre os administrativistas bem como na jurisprudência pátria, que, em tese, o Estado também pode ser responsável pela prática de condutas lícitas. A melhor doutrina aponta que o fundamento de tal responsabilização é o princípio da isonomia, no sentido de que, se uma conduta lícita do Estado gera benefícios a toda a coletividade, não seria isonômico que somente um sujeito ou um grupo de sujeitos determinados arcasse com praticamente todos os ônus decorrentes do ato estatal. A responsabilização do Estado representaria, então, uma repartição desses ônus. Ocorre que, para que haja esse reconhecimento, é necessário que o dano sofrido pelos particulares apresente algumas características próprias. Além de ter que ser certo e jurídico (exigência presente também para a responsabilização do Estado por atos ilícitos), o dano precisaria ser especial (onere determinado ou determinados particulares, não sendo um dano genérico) e anormal (aquele que ultrapassa os meros agravos patrimoniais inerentes ao convívio social).

Feitas essas considerações teóricas preliminares, resta então saber se as restrições à atividade comercial, que sejam enquadradas como lícitas, poderiam ser enquadradas como indenizáveis ou não. Veja que quanto ao aspecto do dano anormal nos parece aceitável que ele se encontre presente. Não se pode ter como algo rotineiro ou esperado da vida em sociedade ter que manter seu estabelecimento comercial fechado por semanas, talvez meses. Ou ter que reduzir para até 30% o número de clientes atendidos por vez, por exemplo.

O ponto-chave reside justamente no quesito da especialidade do dano. Com a proporção que a pandemia atingiu, aliada às medidas estatais adotadas por quase todos os estados e municípios brasileiros, verifica-se que o dano não atingiu só um sujeito ou grupos específicos e determinados de sujeitos. A atividade comercial como um todo foi afetada. Alguns tiveram danos maiores, outros menores, mas aproximadamente todos (com exceção de setores pontuais, como fabricantes de álcool em gel, por exemplo) tiveram algum tipo de dano em razão das medidas de contingenciamento adotadas pelo Estado. Nota-se que o aspecto da especialidade fica fluido, uma vez que temos um dano compartilhado por praticamente toda a população. Além disso, lembrando-se do fundamento da responsabilidade por ato lícito, a igualdade ou isonomia, ela perderia o sentido no momento em que se apura que a sociedade como um todo sofreu danos. Responsabilizar o Estado, neste caso, seria ampliar a repartição do ônus com todos que já estão a sofrer danos.

Ademais, levando-se em consideração a previsão do artigo 21 da LINDB, que traz a necessidade de se levar em conta as consequências jurídicas e administrativas no momento de se proferir uma decisão judicial (dentro dos limites jurídicos, para não se cair em uma ideia puramente pragmatista), apura-se que, caso se permita, de maneira irrestrita, uma responsabilidade do Estado por ato lícito, tendo em vista que as medidas restritivas estatais afetaram praticamente toda a população, o Estado estaria figurando, utilizando-se de uma expressão corrente, como um “segurador universal”, que teria que indenizar cada indivíduo, o que, diante do cenário atual, mostrar-se-ia faticamente impossível, ainda mais quando se recorda que quem financia o Estado, essencialmente, são os cidadãos por meio do pagamento de tributos.

A síntese, portanto, é que, diante do cenário global da pandemia e que as medidas estatais adotadas afetaram a sociedade como um todo, tornando-se fluida a questão da especialidade do dano eventualmente sofrido, como regra não há como se pensar em responsabilização do Estado pelos atos estatais lícitos de contingenciamento. É evidente que a casuística pode trazer novos contornos, porquanto, analisando-se casos concretos específicos, pode-se apurar que as restrições pelo Estado trouxeram a sujeitos determinados danos extremamente gravosos, muito superiores aos sofridos pelo resto da sociedade, o que permitiria analisar (a depender do conjunto probatório) se seria o caso ou não de o Estado vir a ser responsabilizado. Mas, diante do atual cenário, estas hipóteses seriam excepcionais.

De qualquer maneira, a melhor forma de atuação do Estado nesses casos será, sem sombra de dúvida, agir por meio de uma administração consensual. Primeiramente, cabe ao Estado adotar medidas (tributárias, administrativas, previdenciárias, assistenciais etc) que visem a minimizar as perdas sofridas pelos particulares. Por outro lado, também se faz imprescindível que Estado e particulares façam concessões mútuas, na via administrativa, principalmente, de modo a acordarem eventuais pagamentos de cunho indenizatório ou medidas compensatórias, de comum acordo.

Em algumas palavras finais, o cenário implantado pela Covid-19 nos traz novos dilemas e novos desafios. Temos que solucioná-los, levando-se em consideração as particularidades inerentes à situação excepcional vivenciada, mas sem abandonarmos todo embasamento jurídico já construído até então. Pregar uma responsabilização genérica e total do Estado, ademais de não encontrar respaldo em toda a construção jurídica já feita até então, não será a solução mais adequada para a crise pela qual passamos.

 é professor, procurador da Fazenda Nacional, pós-doutor pela PUC-PR e doutor em Direito Administrativo pela PUC-SP.

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TJ-SP informa ao STJ que apelação de réu está pendente há 3 anos

Réu apelou ao TJ-SP em 2017, mas decisão do STJ que relaxou prisão menciona demora de 5 anos para o julgamento do recursoJorge Rosenberg

A ConJur noticiou nesta quarta-feira (3/6) uma decisão do STJ que relaxou a prisão de um réu, sob o fundamento de que ele aguardava por quase cinco anos o julgamento de apelação, que foi proposta no Tribunal de Justiça de São Paulo apenas em junho de 2017 — há cerca de três anos, portanto.

Diante dessa divergência na contagem dos anos durante os quais o réu aguarda o julgamento de apelação, a Presidência da Seção Criminal entrou em contato com a ConJur para comunicar que informou ao STJ que os autos do recurso estão conclusos para o relator desde 9 de janeiro de 2018.

Clique aqui para ler o acórdão

HC 560.144

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Não é possível compensar dívida fiscal com precatório previdenciário

Uma empresa que possui dívida fiscal para com o governo estadual não pode fazer a compensação tributária se utilizando de precatórios expedidos pelo instituto de previdência deste mesmo governo estadual. Isso não é possível porque governo estadual e instituto de previdência são pessoas jurídicas distintas.

Ministro Napoelão Nuned Maia adequou decisão à jurisprudência do STJ

Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso de uma empresa gaúcha. Ela esperava usar precatório alimentar que receberia do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul para fazer a compensação de crédito fiscal de titularidade dessa unidade da federação.

A decisão foi confirmada em embargos de declaração, providos com efeitos infringentes em 27 de maio. Relator, o ministro Napoleão Nunes Maia afirmou que a jurisprudência pacífica do STJ indica a “impossibilidade de compensar débitos tributários com precatório de entidade pública diversa ante a inexistência de norma regulamentar do artigo 170 do Código Tributário Nacional”.

Há ainda precedentes específicos relacionados ao governo gaúcho e seu instituto de previdência, tanto na 1ª quanto na 2ª Turma, que julgam matéria de Direito Público. Por conta disso, a compensação tem sido negada desde a sentença inicial. 

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por exemplo, destacou no acórdão que “autarquia com personalidade jurídica, patrimônio, direitos, deveres e obrigações próprios e independentes não se confunde com o estado do Rio Grande do Sul para fins de compensação, não sendo adequado aplicar-lhes, pois, o disposto no art. 368, do Código Civil, uma vez que não há efetivo encontro de contas”.

Segundo o artigo 368 do CC, “se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem”.

E ainda em primeiro grau, o juízo apontou a “necessidade de manutenção de um mínimo de segurança jurídica ao se lidar com precatórios, pois o mercado de venda de precatórios subverteu-se de tal forma que situações absurdas e fraudulentas têm acontecido, com o que o Poder Judiciário não pode concordar e chancelar”.

Clique aqui para ler o acordão

AResp 1.120.808