Categorias
Notícias

Maria Lindoso: A proteção dos dados pessoais sem a LGPD

Diversos artigos recentes mostraram as preocupações que estão sendo debatidas com o adiamento da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), programada inicialmente para o correr em abril deste ano.

A maior parte dessas preocupações decorre do fato de que o Brasil é um dos países mais atrasados na codificação da proteção de dados pessoais, o que pode aumentar a exposição dos usuários a diversos problemas, como a coleta de dados feita de forma desautorizada; o compartilhamento de dados sem autorização e sem respeito à finalidade inicialmente informada ao usuário; o tratamento discriminatório, entre outros.

Além disso, os usuários vão sofrer por mais algum tempo com a ausência de fiscalização, auditorias e sanções quando do tratamento ilegal de dados pessoais, considerando-se que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados sequer teve sua existência aprovada ainda.

Dada a relevância de leis que protejam os usuários, e considerando, nas palavras de Bruno Bioni, que “a proteção dos dados pessoais é instrumental para que a pessoa possa livremente desenvolver a sua personalidade” [1], como ficará a proteção de dados pessoais até 2021 (se não ocorrer um novo adiamento)?

Para responder essa pergunta, deve-se ter em mente que o Brasil possui outros diplomas que oferecem garantias mínimas aos usuários em relação à exploração de seus dados pessoais. Veja: não se ignora a extrema relevância (e urgência) da LGPD, que representou um marco jurídico paradigmático, inserido novas discussões e parâmetros em relação ao uso de dados pessoais associadas às diversas discussões sobre a legalidade de atuação de diversos entes distintos. Mas, ao mesmo tempo, é necessário considerar que existem outros mecanismos legais que, no vácuo legal, podem assegurar ao usuário direitos mínimos em relação aos seus dados.

Como ressaltado pelo ministro Marco Aurélio Bellizze e por Isabela Maria Pereira Lopes em oportunidade recente, a LGPD se insere em um amplo contexto jurídico já existente de proteção da privacidade e dos dados pessoais, o qual vinha se aperfeiçoando e culminou na edição de um diploma forte e coeso com os valores constitucionais atualmente vigentes [2].

O ápice desse contexto jurídico, por óbvio, é a Constituição Federal, que veda, de forma expressa, qualquer tratamento discriminatório por parte de qualquer agente. Assim, a simples leitura do texto constitucional permite concluir que as empresas que tratam dados pessoais não podem se valer da exploração de bases de dados, das análises preditivas feitas por sistemas automatizados, tampouco do comércio de dados, para tratarem de forma diferenciada determinados grupos de pessoas, causando-lhes prejuízo sem qualquer justificativa.

A Constituição obriga, portanto, dever de cuidado em relação ao uso de dados com potencial discriminatório e que podem ser utilizados em prejuízo de grupos minoritários. Assim, desde o uso de softwares para contratação de empregados, até as análises de crédito, todo o tratamento de dados deve ser feito levando-se em consideração a vedação ao tratamento discriminatório.

Também a Constituição oferece o direito de uso do habeas data como mecanismo possível de ser utilizado por um usuário para controlar as informações constantes em bases de dados a seu respeito. Através desse instrumento, é possível ter acesso aos dados cadastrados em nome de um usuário, além de ser possível retificar informações incorretas ou dados não verídicos constantes em determinada base [3].

Nessa mesma linha, tem-se que o Código Civil estabelece obrigação de boa-fé como norteadora de todos os contratos e relações jurídicas. Assim, existente um termo de uso dos dados pessoais quando da contratação do serviço, e tendo sido informada uma finalidade específica para a coleta e tratamento daqueles dados pessoais, têm os agentes a obrigação de obedecerem esse termo, agindo de boa-fé, ainda que se possa reconhecer eventual abusividade na contratação feita por adesão.

A Lei nº 12.414/2011, que dispõe sobre o uso de bancos de dados para formação de históricos de crédito, também é um diploma relevante para ser considerado na ausência da LGPD. Esse diploma veda o uso de informações excessivas para formação de históricos de crédito — ou seja, informações que não se relacionem com a capacidade de auferir as condições de pagamento de um consumidor —, bem como de informações sensíveis que são aquelas cujo uso pode ensejar discriminação de gênero, raça, classe social, entre outros.

Também essa Lei dos Bancos de Dados assegura ao usuário o direito de acesso das informações constantes em seu cadastro, inclusive seu histórico e como foram firmadas as conclusões a seu respeito. Dessa forma, os princípios de transparência e de respeito à finalidade, que são tão relevantes na LGPD, já se encontram presentes, ao menos para o contexto das análises de crédito. Também pode-se perceber que os usuários detêm o controle da exploração de seus dados pessoais, e podem se valer dessa lei para assegurar que seu uso não se dará de forma abusiva ou prejudicial [4].

Recentemente, inclusive, a ministra Nancy Andrighi, da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, proferiu decisão [5] em que decidiu pela obrigatoriedade do agente explorador dos dados pessoais de comunicar o usuário sobre o compartilhamento das informações produzidas a seu respeito, derivando essa obrigação da Lei dos Bancos de Dados e do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe, em seu artigo 43, que “o consumidor terá acesso às informações existentes” sobre ele.

Como asseverado no voto condutor, “em qualquer circunstância, tem o consumidor o direito de tomar conhecimento de que informações a seu respeito estão sendo arquivadas/comercializadas por terceiro, sem a sua autorização”.

Essa modificação é inovadora e também fundamental para ajudar a suprir as lacunas que postergação do início de vigência LGPD deixou, não só porque aumenta a capacidade do usuário de controlar o uso de seus dados pessoais, mas também porque reforça a existência de uma obrigação de transparência em relação ao compartilhamento de conteúdo, mesmo diante da inexistência de um diploma específico para proteção dos dados pessoais.

Um outro mecanismo que reforça o controle do usuário em relação ao tratamento e compartilhamento de seus dados pessoais diz respeito ao direito de explicação e oposição em relação às decisões automatizadas. Essa disposição, que será reforçada pela LGPD, já está presente no Marco Civil da Internet (Lei nº 12.985/2014), ainda que de forma limitada ao pedido de explicações sobre justificativa, legalidade e previsão contratual [6]. Assim, mesmo de forma restrita, o usuário pode se valer desse mecanismo para ter acesso aos critérios que fundamentam uma decisão tomada, essencialmente, pelo tratamento massivo de dados pessoais.

Além desses diplomas, existem outros julgados relevantes para orientar os cuidados dos agentes em relação à exploração dos dados pessoais enquanto a LGPD não estiver valendo.

Os próprios tribunais, e mais especificamente o Superior Tribunal de Justiça, em uma postura sempre progressista e frequentemente favorável ao usuário, resolviam questões relacionadas aos dados pessoais desde os anos 90, quando o STJ primeiramente destacou a importância do habeas data para a temática da proteção de dados pessoais através do acesso ao conteúdo por parte do usuário [7].

Além disso, e como bem ressalvado pelo ministro Villas Bôas Cueva em artigo recente, ainda em 1995 o ministro Ruy Rosado Aguiar já discutia a necessidade de se garantir o direito à autodeterminação afirmativa através da limitação do compartilhamento de dados sem a autorização do usuário e, em 2001, a ministra Eliana Calmon adotou entendimento semelhante para garantir o direito à privacidade e à proteção de dados pessoais. Ou seja, o direito de controlar a extensão de sua própria personalidade no mundo virtual, e de deter controle sobre seus dados pessoais já é uma realidade reconhecida pelos tribunais e que impõe aos agentes de mercado cuidados especiais, mesmo sem a LGPD.

Assim, considerando que alguns dos princípios mais relevantes da LGPD — como a vedação ao tratamento discriminatório, o direito de transparência, o controle do usuário sobre seus dados e o respeito à finalidade no tratamento de dados pessoais — já estão inseridos em diplomas legais, além de já terem sido reconhecidos pelos tribunais, é importante que se mantenha vivo o espírito de conformidade que vinha sendo cultivado quando se esperava a vigência da LGPD para 2020, prestigiando-se a proteção dos dados pessoais até, se tudo der certo, 2021.

 


[3] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional.9 ed. rev. atual. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 799—800

 é advogada, professora voluntária da Universidade de Brasília e doutoranda em Direito Civil pela mesma universidade.

Categorias
Notícias

Opinião: O uso das videoconferências na Justiça do Trabalho

O acesso à Justiça é um dos direitos humanos fundamentais. A preocupação com o pleno acesso à Justiça por intermédio da prestação jurisdicional célere e efetiva como uma das principais formas de tutelar os direitos fundamentais nas relações de trabalho ainda é grande no Brasil.

A permanente evolução e modificação das relações de trabalho e dos meios de produção no mundo é uma realidade. A cada dia nos deparamos com novas tecnologias, muitas delas impulsionadoras de novos negócios e formas de trabalho. Assim como a tecnologia impacta as relações de trabalho e os modos de produção, também produz reflexos no processo judicial e no Poder Judiciário.

Manuel Castells destaca que “a era da internet foi aclamada como o fim da geografia” [1]. Como a internet é uma tecnologia da comunicação e como a comunicação é a essência da atividade humana, todos os domínios da vida social estão sendo modificados pelos usos disseminados da Internet” [2].

Não é diferente no Poder Judiciário brasileiro. A tecnologia proveniente dos novos meios informáticos (processo judicial em meio eletrônico, audiência por teleconferência, uso do aplicativo WhatsApp para negociar conciliações, realizar notificações, teletrabalho, etc.) desempenha papel fundamental não apenas na ampliação do acesso à justiça mas também na implementação de medidas que possibilitem o funcionamento do Poder Judiciário e a manutenção da prestação jurisdicional mesmo em tempo de pandemia da Covid-19, já que esta impõe a vedação de expediente presencial no Poder Judiciário como forma de evitar a disseminação do contágio.

Esse é o cenário em que nos encontramos na atualidade e é evidente que a continuidade dos serviços somente é possível porque o processo judicial tramita em meio eletrônico, o que permite que a demanda seja ajuizada perante a Justiça do Trabalho de qualquer lugar do Brasil. Para juízes, servidores e advogados, o processo judicial em meio eletrônico significa quebra do paradigma de necessidade de presença física em determinado local, que os processos sempre estão acessíveis pelo computador e que seu campo de atuação não precisa ficar restrito ao âmbito de uma Vara do Trabalho ou cidade.

Embora a previsão de realização de audiências por videoconferência não seja uma novidade, foi a necessidade de manutenção do isolamento social para evitar a contaminação pelo coronavírus que tornou urgente a utilização dessa tecnologia específica para viabilizar a continuação de uma parcela importante dos processos que tramitam na Justiça do Trabalho.

Antes da pandemia de coronavírus já havia prática de atos processuais à distância, com uso de imagem e voz, a exemplo da oitiva de depoimentos de partes ou testemunhas que estavam em lugar distinto daquele onde havia sido ajuizada a demanda judicial. Há notícias de realização de oitivas pelos aplicativos Whatsapp, Skype, entre outros.

Foi a necessidade de manter os serviços da área fim da Justiça do Trabalho em pleno funcionamento que levou a publicação de normas regulamentando a utilização das audiências telepresenciais ou por videoconferência.

Não faria sentido ter um processo judicial que se desligasse da forma física (autos de papel) e embarcasse na modernidade (um processo imaterial, acessível por meio da rede mundial de computadores e que se alinhasse com as avançadas tecnologias disponíveis no mundo) como é o processo judicial em meio eletrônico e não utilizar as ferramentas existentes e já previstas em lei para permitir a realização das audiências por videoconferência.

A realização de audiências por videoconferência é a melhor solução existente no momento para possibilitar uma continuidade mais ampla da prestação jurisdicional e a manutenção do isolamento social exigido em razão do perigo de contaminação pelo coronavírus.

Para demonstrar que a utilização de meios tecnológicos no processo judicial não é uma novidade ou extravagância, faremos um breve relato histórico em torno de algumas normas jurídicas que tratam do assunto.

Otávio Pinto e Silva [3] aponta que a Lei 7.244, de 7 de novembro de 1984, que dispôs sobre a instituição dos então chamados juizados especiais de pequenas causas, previu utilização de tecnologia no §3º do artigo 14, que assim dispôs: Os atos realizados em audiência de instrução e julgamento deverão ser gravados em fita magnética ou equivalente (…)”. Em ambos os casos, não se trata de utilização de meio eletrônico, mas sim do uso de algum tipo de tecnologia no processo e para prática de ato processual.

Observe-se que o artigo 1º da Lei 9.800, de 26 de maio de 1999, abriu a possibilidade de prática de atos processuais por meio de “(…) sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar (…)”. Portanto, a lei não limitou a transmissão de dados e imagens à transmissão por fax, mas anteviu a possibilidade do surgimento de outras tecnologias que pudessem cumprir a mesma tarefa de maneira mais eficaz.

A Lei 10.259, de 12 de julho de 2001, previu que as Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais poderão reunir-se pela via eletrônica na hipótese dos juízes componentes da respectiva turma serem domiciliados em cidades diversas (§3º do artigo 14 da Lei 10.259, de 12 de julho de 2001).

Trata-se de dispositivo moderno até hoje, pois embora já haja exemplos de sessões de tribunais em que os advogados das partes manifestam-se oralmente por meio de videoconferência, a lei dos Juizados Especiais Federais prevê expressamente a reunião dos julgadores por meio eletrônico, o que privilegia o princípio constitucional da razoável duração do processo, entre outros.

A Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006, tratou especificamente da informatização do processo judicial.

Como anotam José Carlos de Araújo Almeida Filho [4] e Cláudio Mascarenhas Brandão [5], a polêmica sobre a utilização de videoconferência para realização de interrogatório de réu preso e outros atos processuais no âmbito do processo penal cessou com a publicação da Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009.

Por meio dela, os artigos 185 e 222 do Código de Processo Penal foram alterados. O §2º do artigo 185 do Código de Processo Penal passou a permitir, como excepcionalidade, que de ofício ou por requerimento das partes, sempre por decisão fundamentada do juiz, o réu preso possa ser interrogado por videoconferência ou “outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real”  o que demonstra que a legislação abriu caminho para novas tecnologias que possam se desenvolver além da videoconferência.

A medida é excepcional porque a lei determina quais são as situações em que a videoconferência pode e deve ser utilizada nos quatro incisos do §2º do artigo 185 do Código de Processo Penal [6].

Embora não mencionados por esses autores, são dignos de nota outras alterações promovidas também as disposições da Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009. Ao réu foi garantido o direito de acompanhar também por videoconferência os atos da audiência de instrução e julgamento previstos nos artigos 400, 411 e 531 do Código de Processo Penal (§4º do artigo 185 do Código de Processo Penal). Se o interrogatório ocorrer por videoconferência, é assegurado ao réu comunicar-se com o advogado que esteja no ato da videoconferência por via telefônica. Além disso, o defensor que está no presídio e o advogado que está na sala de videoconferência podem se comunicar por telefone (§5º do artigo 185 do Código de Processo Penal).

A previsão do §3º do artigo 222 do Código de Processo Penal é de que se a testemunha tiver domicílio fora da jurisdição em que deva ser ouvida, sua inquirição poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico em tempo real. Essa disposição é importante por diversas razões. Dentre elas, pode-se dizer que é importante porque: prestigia o princípio constitucional da duração razoável do processo; se preocupa com a economia processual; revela a tendência de extinção da remessa de cartas precatórias inquiritórias; e demonstra o uso eficaz de meios tecnológicos para encurtar distâncias e fazer valer o princípio da eficiência.

Consideramos a Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009, uma legislação avançada, pois antecipou a utilização de registros de sons e imagens em tempo real (no caso, a videoconferência) para prática de ato processual (audiência) em razão das peculiaridades do direito e processo penal. Ainda hoje aproximadamente dez anos após a publicação da Lei 11.900 estão em desenvolvimento sistemas para gravação de sons e imagens em tempo real para utilização no sistema previsto pela Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. Por isso o pioneirismo da Lei 11.900.

O Código de Processo Civil brasileiro (Lei 13105, de 16 de março de 2015) criou várias disposições sobre a utilização da videoconferência em processos judiciais a exemplo dos artigos 236, §3º; 385, §3º; 453, §§1º e §2º; 461, §2º; e 937, §4º.

A videoconferência é uma ferramenta cada vez mais popular para evitar deslocamentos, cortar custos, facilitar e ampliar o acesso à justiça. Têm se tornado comuns as notícias sobre uso da videoconferência não só no âmbito criminal para salvaguardar a segurança de partes, juízes, servidores e advogados como também no âmbito cível e trabalhista para garantir o efetivo acesso à Justiça quando qualquer das partes encontra-se distante do local de realização da audiência, dentro ou fora do Brasil.

A aparente novidade que parece causar burburinho é a utilização ampla da videoconferência para realização das audiências na Justiça do Trabalho, sejam elas audiências de conciliação ou mesmo de instrução (o que implica tomar os depoimentos pessoais das partes e ouvir as testemunhas), como forma de manter o isolamento social exigido para evitar contaminação pelo coronavírus e dar prosseguimento aos processos judiciais que necessitem da realização de audiências como proposto pelo Ato Conjunto CSJT GP VP e CGJT n.006, de 4 de maio de 2020.

A realização de audiências por videoconferência possui vantagens e desvantagens. Como vantagens podemos apontar: manutenção do isolamento social necessário para evitar a propagação do coronavírus; possibilita o acesso à Justiça; possibilita que qualquer pessoa com acesso à internet participe da audiência por videoconferência, o que alarga o espectro do acesso à Justiça; prestigia, amplia e maximiza o princípio da oralidade, que é princípio específico do Direito Processual do Trabalho, já que a audiência por videoconferência pode ser reduzida a termo na ata de audiência ou mesmo gravada; torna ainda mais efetivo o princípio da desterritorialização criado pelo processo judicial eletrônico, pois não há necessidade de presença física em determinado local geográfico para qualquer pessoa (juízes, servidores, partes, advogados, testemunhas, peritos, etc.) participar da audiência; e amplia o princípio da imediatidade da prova pois qualquer magistrado de qualquer grau de jurisdição terá amplo contato com a prova oral coletada, já que a audiência por videoconferência é gravada.

No rol das desvantagens da realização das audiências por videoconferência podemos citar: necessidade de conexão com a internet; utilização de aparelho de telefone celular, tablet ou computador; problemas de conexão com a internet; e insegurança demonstrada por juízes e advogados quanto ao aspecto da realização da audiência de instrução e a garantia de que partes e testemunhas não ouvirão os depoimentos umas das outras.

De fato, os problemas de ordem técnica e material (problemas de conexão com a internet, acesso das partes e testemunhas a dispositivos que permitam acesso à videoconferência como telefone celular e computador, por exemplo) dependem de situações particulares incontroláveis pelo Poder Judiciário. Entretanto, como contra-argumento, vale lembrar que em notícia publicada no sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), afirma-se que no ano de 2013 metade dos brasileiros teve acesso à internet e 130,8 milhões de pessoas na faixa etária de dez anos ou mais de idade tinham telefone celular para uso pessoal. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2013 (PNAD) demonstrou que dos 32,2 milhões de domicílios do país que tinham microcomputador (49,5% do total de residências), 28 milhões tinham acesso à internet. Segundo a pesquisa, esse número representa 43,1% do total de domicílios em todo o país. [7]

Os dados obtidos pela pesquisa elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística confirmam uma realidade vivida pela sociedade brasileira, na qual as pessoas utilizam cada vez mais a internet para realizar as mais diversificadas atividades: desde consultar o horóscopo, ler as notícias no jornal, ouvir músicas, assistir a vídeos no YouTube, realizar transações bancárias, adquirir produtos, até realizar consultas ao andamento de processos judiciais seja por meio de sítios na internet seja por meio de aplicativos disponibilizados pelo Poder Judiciário.

Portanto, pode-se considerar desvinculada da realidade a afirmação de que as pessoas teriam menos acesso às audiências por videoconferência porque não têm acesso à internet.

Quanto à preocupação quanto à validade ou incolumidade da prova oral colhida por meio de audiência por videoconferência vale lembrar que da mesma forma que não adianta pensar o processo judicial em meio eletrônico como mera reprodução do processo de papel, não se deve pensar na audiência por videoconferência como mera repetição daquilo que se praticava nas audiências presenciais.

Novas soluções, novas práticas devem ser implementadas, com ou sem o uso da tecnologia, para viabilizar a prática do ato de colher provas orais na audiência por videoconferência com a necessária segurança. Para isso propomos a realização de compromisso diferenciado das partes e testemunhas visando a assegurar que estejam livres da interferência de terceiros, seja de forma presencial ou por meio de utilização de aparelhos de transmissão de sons e imagens, além da criação de salas de videoconferência separadas de forma que fique assegurado que uma parte ou testemunha não ouvirá o depoimento da outra.

Importante lembrar que as partes podem celebrar negócio processual (artigo 190 do CPC), o que significa que elas próprias poderiam solicitar a realização de audiência por videoconferência ou convencionar sobre seus ônus e poderes, o que pode dizer respeito a requisitos específicos do depoimento de partes e testemunhas.

Em conclusão, a realização das audiências por videoconferência tem previsão legal desde 2015 com o advento do Código de Processo Civil e atende às necessidades de acesso à Justiça e continuidade da prestação jurisdicional. A prudência, colaboração e a criatividade de juízes, advogados e demais atores processuais contribuirá para que atravessemos esse momento excepcional e que a utilização de meios tecnológicos no processo judicial continue a ser utilizada de forma ágil, segura e prática.

 


[1] CASTELLS, Manuel. A galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, edição digital setembro 2015, p. 172.

[3] SILVA, Otavio Pinto e. Processo eletrônico trabalhista. São Paulo, LTr, 2013, p. 52.

[4] ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo. Processo eletrônico e teoria geral do processo eletrônico: a informatização judicial no Brasil. 5.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p.68.

[5] BRANDÃO, Cláudio Mascarenhas. Processo eletrônico na Justiça do Trabalho. In: CHAVES, Luciano Athayde (Org.). Curso de processo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2012, p. 754.

[6] “Artigo 185 § 2o Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades: I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento; II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal; III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do artigo 217 deste Código; IV – responder à gravíssima questão de ordem pública”. BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 3 out. 1941. Disponível em: <https://goo.gl/j44Cxv>. Acesso em: 3/4/2018.

 é juíza do Trabalho titular da 1ª Vara do Trabalho de Sobral (CE) e doutora em Direito do Trabalho pela PUC-SP.

 é juiz do Trabalho substituto no TRT da 17ª Região e doutor em Direito do Trabalho pela PUC-SP.

Categorias
Notícias

Auxílio emergencial só pode ser sacado na Caixa, diz juiz

As medidas para conter aglomerações tomadas pela Caixa Econômica Federal, estado do Ceará e União estão se mostrando eficientes. Assim, não há omissão evidente por parte das entidades entidades. 

Para juiz, Caixa já está tomando medida para reduzir aglomerações
Andréa Rêgo Barros/PCR

O entendimento é do juiz Gustavo Henrique Teixeira de Oliveira, da 6ª Vara Cível do Ceará, ao indeferir pedido para que o auxílio emergencial de R$ 600 pudesse ser sacado em outros bancos em funcionamento no estado, para além da Caixa. A decisão, em caráter liminar, foi proferida nesta quarta-feira (13/5). 

A ação civil pública foi movida pelo Ministério Público Federal e Ministério Público do Ceará. As instituições solicitaram que a Caixa compartilhasse sua base de dados e rede de tecnologia com todas as instituições financeiras de varejo para facilitar o pagamento do auxílio e evitar a concentração de pessoas. 

Segundo a decisão, no entanto, “o fato gerador das aglomerações em frente às agências da Caixa é muito mais a falta de informação por parte da população, especialmente a população mais carente, quanto aos meios de recebimento e saque do auxílio emergencial, do que a forma em que vem sendo realizado o pagamento deste benefício”. 

Ainda segundo ele, “a Caixa tem ajustado os mecanismos tecnológicos e vem difundindo informações e esclarecimentos para a população em geral sobre o cadastramento e pagamento do auxílio emergencial, comprometendo-se, inclusive, a ampliar essa divulgação através de mídia não espontânea de abrangência local e nacional, carros de som, perfis oficiais nas redes sociais e canais mais populares”. 

Na petição, MPF e MPE também argumentaram que muitos brasileiros não possuem conta na Caixa ou em qualquer outra instituição financeira. Assim, restringir o saque a apenas uma instituição acaba por gerar mais filas, já que além de retirar o benefício, é necessário abrir uma conta. 

Com relação a isso, o juiz disse que, “conforme explicado pelos representantes dos réus, dentre as diversas formas para o recebimento do benefício foi viabilizada a criação sem custo de uma conta poupança digital por meio de aplicativo da Caixa na qual é possível ser depositado o valor”. 

Clique aqui para ler a decisão

0805781-40.2020.4.05.8100

Categorias
Notícias

TCU ordena devolução de auxílio emergencial recebido por militares

Servidores não estão entre aqueles que podem receber o auxílio emergencial, segundo a Lei 13.982/2020. Por isso, o ministro do Tribunal de Contas da União Bruno Dantas determinou, em liminar, que os Ministérios da Defesa e da Cidadania não concedam o benefício a militares, cancelem os cadastros já feitos e obtenham a devolução dos valores pagos irregularmente.

73,2 mil militares receberam, de forma irregular, o auxílio emergencial

O Ministério da Defesa informou que 73,2 mil militares das Forças Armadas receberam o auxílio emergencial de R$ 600. Segundo o TCU, esse contingente representaria, no

mínimo, R$ 43,9 milhões pagos na primeira parcela e poderiam chegar a R$ 131,8

milhões caso as três parcelas sejam pagas.

O objetivo da concessão do benefício é proteger pessoas em situação de vulnerabilidade social, como trabalhadores informais e de baixa renda — além de reduzir os impactos econômicos das medidas de combate ao coronavírus.

A equipe de fiscalização da Secretaria de Controle Externo da Gestão Tributária da Previdência e da Assistência Social (SecexPrevidência) apresentou representação ao TCU, argumentando que a Lei 13.982/2020, que criou o auxílio emergencial, não autoriza que servidores públicos o recebam.

Ao conceder a liminar, Bruno Dantas afirmou que há fumaça do bom direito, pois os Ministérios da Defesa e da Cidadania reconheceram o recebimento do benefício por militares, e não há previsão legal que os torne aptos a obter o auxílio. Além disso, o ministro disse haver perigo da demora, já que a segunda parcela do programa está prestes a ser paga.

Dantas também determinou que o Ministério da Defesa informe ao TCU as medidas tomadas para apurar eventuais faltas funcionais dos militares que solicitaram o auxílio emergencial e para prevenir novas ocorrências de militares envolvidos em pedidos indevidos de benefícios sociais.

Além disso, o ministro ordenou que os Ministérios da Defesa e da Cidadania identifiquem os militares e demais servidores federais, estaduais e municipais que estão na lista de beneficiários do auxílio emergencial.

Enquanto isso

O Ministério Público Federal pediu a revisão de todos os pedidos de recebimento do auxílio emergencial negados no país.

Na ação, o procurador da República Oscar Costa Filho aponta que diversas pessoas que preenchem os requisitos para receber o benefício tiveram seus requerimentos negados pelo sistema da Caixa Econômica Federal.

Clique aqui para ler a decisão

Processo 018.851/2020-7

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.

Categorias
Notícias

Fábio Oliveira Lima: O plenário virtual nos tribunais

Seguindo a nossa tradição forense, os órgãos colegiados dos tribunais reúnem-se para a exposição, discussão e deliberação do processo em ambientes situados nas respectivas sedes e com a presença física obrigatória e simultânea dos seus integrantes, em sessão denominada de presencial.

Com a evolução tecnológica, os tribunais, na busca de conferir realidade ao princípio constitucional da razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF) e de vencer a demanda, que é sempre crescente, passaram a adotar o julgamento em ambiente eletrônico, através de sessão virtual, em que se dispensa a presença simultânea dos desembargadores. Sessão virtual não se confunde com sessão presencial por videoconferência, em que há a exigência da participação simultânea e ao vivo dos julgadores, só que situados em ambientes físicos diferentes. Na sessão virtual a deliberação ocorre sem a presença concomitante dos desembargadores, que, durante um período delimitado, manifestam-se, cada um a seu tempo, por meio eletrônico.

Vozes destacadas e de elevado espírito público têm advogado que a dinâmica procedimental do plenário virtual violaria cânones do devido processo legal, sob os argumentos de que os julgamentos não são públicos e há restrição ao contraditório.

No ambiente da gestão judiciária, a inovação nasce, quase sempre, na mira da negação, até que sejam compreendidos seus propósitos e as suas nuances.

Há que pontuar, em primeiro plano, que o julgamento em sessão virtual, para além de estar expressamente autorizado pelo Código de Processo Civil (artigo 193 c/c artigo 943, CPC/15), tem plena conformação com os valores atuais da sociedade, que amplamente aceita como eficiente e segura a realização de diversas atividades públicas e privadas sem a necessidade de contato pessoal ou reunião presencial. O Judiciário não pode ficar distante e alheio a essa realidade. É nesse cenário que surge a sessão virtual, com claros ganhos de eficiência e celeridade à prestação jurisdicional do segundo grau. Fundamentalmente, otimiza-se a pauta dos julgamentos complexos. A sessão presencial, com seu ritualismo necessário, deve ficar reservada às causas que exijam debate mais verticalizado. Idealmente, à sessão virtual são remetidos os processos de menor complexidade, que dispensam uma discussão mais aprofundada quanto a aspectos de fato ou mesmo de direito, ou os processos em que já há posição jurisprudencial consolidada do próprio órgão julgador, do tribunal local ou dos tribunais superiores sem efeito vinculante.

Consigne-se, ainda, que, em Pernambuco, apesar de o julgamento virtual não ficar restrito a processos e recursos em que não caiba sustentação oral não há restrição de classe processual , cabendo ao talante discricionário do relator a definição do que será ou não submetido ao plenário virtual, essa discricionariedade é mitigada ou controlada porque os vogais, o representante do Ministério Público e as partes podem, sem declaração de justificativa, manifestar oposição ao julgamento virtual, deslocando, automaticamente, o julgamento para a sessão presencial. A prerrogativa da oposição ao julgamento virtual, sem a necessidade de qualquer justificativa, mantém a dinâmica da sessão virtual dentro dos princípios básicos do devido processo legal. O julgamento eletrônico assume, claramente, a natureza de um negócio processual atípico (artigo 190 do CPC/15) firmado entre o Estado-juiz e as partes, através dos respectivos patronos, em que o acordo procedimental, a partir da não oposição ao julgamento virtual, inclui a impossibilidade de sustentação oral e dos apartes autorizados pelo inciso X do artigo 7º do Estatuto da OAB.

A preocupação com o devido processo legal é uma constante no formato do plenário virtual do Tribunal de Justiça. O edital de convocação, a que se dá ampla publicidade, indica os desembargadores que participarão do plenário virtual. Isso para possibilitar o controle social do princípio do juiz natural, já que a formação dos órgãos colegiados obedece a regras pré-constituídas e firmes em critérios estritamente objetivos, e o exercício da ampla defesa e do contraditório, na medida em que a composição dos órgãos colegiados tem influência decisiva na previsibilidade das decisões, além do que facilita acesso ao julgador para que possam ser apresentadas as manifestações e os memoriais pelos interessados.

Realçada crítica, que não se pode desconsiderar, prende-se à circunstância de que, em todo o período de duração da sessão virtual, apenas o conteúdo do relatório será disponibilizado para as partes e os interessados. A divulgação dos votos dar-se-á no encerramento da sessão, com a proclamação do resultado do julgamento. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade do inciso IX do artigo 7º do Estatuto da OAB, que previa a sustentação oral pelo advogado após o voto do relator, sob o fundamento de que: I) o contraditório se estabelece entre as partes e não entre magistrado e as partes; e II) poderia causar tumulto processual (ADI 1.127). Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio (onde existe a mesma razão deve haver a mesma regra de Direito). Na sessão virtual, tornar público o voto na medida em que for sendo proferido no ambiente eletrônico levaria, na prática forense, a estabelecer um contraditório a cada voto manifestado. A publicidade aos votos somente ao final não qualifica o julgamento eletrônico como secreto, como afirmam alguns. O controle das partes e da sociedade ocorrerá exatamente como ocorre no julgamento presencial sempre a posteriori. Tradicionalmente, o exercício da ampla defesa se dá antes do julgamento.

Não se advogue que a garantia constitucional da imperiosa necessidade da fundamentação das decisões judiciais (artigo 93, inciso IX, CF) sofre relevante mitigação, na medida em que o vogal apenas assinala, no painel eletrônico, mediante registro por certificação digital, que acompanha o relator ou a divergência, deixando de apresentar suas razões de decidir. A consciência jurídica nacional, com amplo respaldo da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, admite como idônea a fundamentação pela técnica da remissão, como razão de decidir, à motivação declinada pelo voto antecessor. Não se pode esquecer que mesmo no julgamento presencial há expressa autorização para a fundamentação per relacionem, de modo que os vogais que estiverem de acordo com o voto e a fundamentação do relator poderão se limitar a declarar sua concordância.

Há, ainda, uma imposição normativa que mantém o formato da sessão virtual em estreita harmonia com o princípio constitucional que assegura a fundamentação das decisões judiciais (artigo 93, inciso IX, CF). A declaração de voto passa a ser obrigatória quando o desembargador vogal divergir do relator ou o acompanhar com ressalva de entendimento. É que, divergindo do relator, o voto vogal poderá assumir a posição de voto vencido, de modo que sua declaração será obrigatória (artigo 941, § 3º) ou assumirá a condição de voto vencedor, condutor da ratio decidendi. Acompanhando o relator por outro fundamento, impõe-se igualmente a declaração de voto. Isso porque sua fundamentação pode constituir a ratio decidendi ou, se não for, facilitará a compreensão da razão de decidir do colegiado. Sem a exteriorização das razões que levaram ao resultado do julgamento não há devido processo legal e nem jurisdição válida. Isso porque o princípio constitucional da ampla defesa não teria como ser exercitado com efetividade e impossível seria o controle social da atividade jurisdicional. Se o relator ficar vencido e o voto condutor da divergência não for declarado, haverá nulidade do julgamento.

Sendo unânime o julgamento ou quando houver divergência que não atraia a aplicação da técnica de julgamento prevista no artigo 942 do CPC/15, o processo segue para a lavratura do acórdão pelo relator. Quando, no entanto, o resultado do julgamento não for unânime e a hipótese atrair a regra do artigo 942 do CPC/15, o processo será encaminhado, automaticamente, para a sessão presencial, com a publicação de nova pauta, com vistas à continuidade do julgamento perante o colegiado ampliado.

Tem-se, portanto, que o formato adotado pelo plenário virtual garante plena observância dos princípios fundamentais do processo, notadamente os da ampla defesa e da publicidade. Não há comprometimento do princípio da colegialidade e da segurança dos julgados. O julgamento continua colegiado. Haverá discussão, possibilidade de convencimento mútuo entre os julgadores e divergências, só que tudo ocorrerá no ambiente eletrônico. A dinâmica procedimental da sessão virtual, em que os vogais têm acesso previamente ao voto do relator e dispõem de tempo razoável para examinar com vagar as questões de direito e de fato, acaba por proporcionar maior segurança ao julgado. É uma alternativa, que supera, em eficiência e segurança, o julgamento em lista, até então utilizado largamente pelos tribunais.

Categorias
Notícias

Domingues: Cibercrimes em tempos de pandemia

Em tempos de crise e histeria causadas pela pandemia da Covid-19, criminosos aplicam golpes para angariar vantagens ilícitas com a utilização da internet e da tecnologia.

De modo geral, cibercrimes são os crimes praticados por meio da internet ou com o auxílio desta para sua consumação. Os cibercriminosos — como são denominados os praticantes destes ilícitos — utilizam-se da tecnologia e da internet para aplicar diversos golpes e fazer suas vítimas em todo o país. E essa prática vem crescendo diariamente durante a disseminação do novo coronavírus, principalmente em razão da vulnerabilidade e da falta de informação da população.

Como exemplo, podemos citar e-mails e links que prometem dar acesso a informações sobre o novo coronavírus, como mapas de calor da doença. Há também a divulgação de inúmeros aplicativos não oficiais que supostamente permitem acesso ao auxílio emergencial concedido pelo Governo Federal. Em ambos os casos, a partir do momento em que a vítima acessa o endereço de internet ou baixa o aplicativo, seus dispositivos/computadores são invadidos por um malware (software nocivo). Assim, os cibercriminosos acessam todas as informações, dados e conteúdos daquele dispositivo/computador, deixando a vítima em estado de extrema vulnerabilidade. Essa prática é denominada pelo Direito Digital como phishing e considerada crime pelo artigo 154-A do Código Penal.

Outra prática em evidência durante a pandemia é a divulgação desenfreada de notícias falsas, principalmente em aplicativos de conversas. Conhecidas como fake news, elas possuem o único intuito de dissipar informações falsas, que podem levar a população a erro sobre determinado assunto. Apesar de não ser tipificada pelo Código Penal Brasileiro, é importante ressaltar que, a depender do teor da notícia, os responsáveis por sua disseminação podem responder por crimes de difamação, injúria e outros.

Ainda, os cibercriminosos também se aproveitam do período de isolamento social para adquirir, de forma ilícita, dados pessoais dos usuários de diversas plataformas. Recentemente, a plataforma de videoconferência remota Zoom foi alvo desses criminosos. Como resultado, houve o vazamento de dados de milhares de usuários. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) trata sobre o tema e prevê punições para as empresas que não tomarem as medidas necessárias para a segurança dos dados de seus usuários/clientes. Com entrada em vigor prevista para agosto de 2020, a LGPD, mais do que nunca, mostra-se um importante mecanismo para resguardar e proteger os dados pessoais dos brasileiros.

Enquanto passamos pelo período de maior crise do século, devemos nos preocupar e tomar todos os cuidados para não sermos vítimas desses “novos” crimes. Medidas simples podem ser tomadas para evitar que os cibercriminosos tenham sucesso, tais como: buscar informações em sites oficiais; utilizar somente aplicativos oficiais; verificar sempre a fonte da notícia antes de compartilhar; utilizar sistemas de criptografia quando da realização de videoconferências e chamadas de vídeo, entre outras. Desconfie de notícias chamativas, confira a veracidade das informações e, na dúvida, não acesse o site/link. Lembre-se de que os cibercrimes também são graves e precisam ser combatidos.

 é advogado especializado em compliance e Direito Digital e sócio fundador do escritório VD Advocacia e Compliance, na cidade de Ribeirão Preto (SP).