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MPF lança coletânea de artigos sobre a “lei anticrime”

A Câmara Criminal do Ministério Público Federal lançou nesta quarta-feira (10/6) a coletânea de artigos Inovações da Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019, chamada de “anticrime”.

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O objetivo da publicação é debater, sobre diferentes perspectivas, as mudanças introduzidas pela norma no sistema penal brasileiro. É o sétimo volume de uma série de coletâneas sobre temas relevantes à atuação criminal do Ministério Público brasileiro, como escravidão contemporânea, tráfico de pessoas, crimes cibernéticos, justiça de transição, crimes fiscais, delitos econômicos e financeiros, temas processuais, prova e persecução patrimonial. Publicadas em formato digital e aberto, todas as publicações podem ser conferidas aqui.

A coordenadora da câmara, subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen, explica que o objetivo da série de coletâneas “é ampliar o debate para os diferentes campos profissionais e científicos, oferecendo a todos, e especificamente aos membros do MPF com atuação criminal, uma visão compreensiva das importantes questões tratadas”.

Todas as sete publicações foram produto de seleções públicas de artigos, abertas às inúmeras áreas profissionais e científicas interessadas nos temas debatidos.

Segundo a procuradora regional da República Márcia Noll Barboza, uma das coordenadoras das coletâneas, o escopo dos artigos é tanto científico quanto aplicado, “favorecendo o diálogo entre pontos de vista distintos, por vezes antagônicos, e sempre com o propósito de contribuir à melhor aplicação das normas e entendimentos abordados”.

No caso da sétima coletânea, o foco é a Lei nº 13.964/2019, que, por pretender tornar mais efetiva a persecução penal no Brasil, interesse do Ministério Público, e em razão das discussões científicas que suscita, é tratada em diversos artigos de autoria de membros e servidores do MP, advogados, professores e pesquisadores.

A nova lei resulta do Projeto de Lei nº 882/2019, do então ministro Sergio Moro, e do Projeto de Lei nº 10.372/2018, de comissão presidida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes. O resultado é um texto legal que imprime mudanças significativas no sistema brasileiro, “algumas consideradas positivas, e outras, negativas, sendo diversas delas polêmicas, o que justifica um estudo inclusivo de diferentes pontos de vista”, como afirmam as coordenadoras e organizadoras na apresentação da obra.

As procuradoras da República Andréa Walmsley e Lígia Cireno Teobaldo, que também coordenam a sétima coletânea, destacam que “os artigos cobrem diferentes aspectos dos acordos de não persecução penal, importante inovação que pode alterar o cenário de inefetividade da persecução e que tem recebido significativo apoio da Câmara Criminal do MPF”. Com informações da assessoria do MPF.

Clique aqui para ler a íntegra da coletânea

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Föppel e Mangabeira: Processo penal para quê(m)?

Na tarde do último dia 6, tivemos o infeliz desprazer de ouvir o pronunciamento de uma subprocuradora-geral da República perante o STJ. De acordo com a presentante do Ministério Público (até onde se sabe, ainda fiscal da lei), as evidências, em determinado processo, seriam tão robustas que por si só deveriam tornar desnecessária a instrução do caso penal, condenando-se já ali, “adiantadamente”, quem até então seria apenas investigado.

Segundo a subprocuradora-geral, “apresentamos ao ministro relator prova suficiente inclusive para uma condenação adiantada. Sinceramente, tudo o que nós colocamos, desde o início, não haveria nem motivo pra continuar com a ação, seria momento já pronto para uma condenação”.

Pronto. Acabou-se o processo. Não se quer mais nem ouvir o réu, nem instruir, nem judicializar, nem colher em contraditório. Afinal de contas, como já se escreveu um dia, para alguns o “problema é o processo” [1].

O arrojo, o atropelo processual, sepultou até o eufemismo. Não bastasse a idílica e inconstitucional pretensão de cumprimento antecipado da pena, o mote acusatório, agora, sem rodeios ou palavras confortáveis, parece ser o da condenação “adiantada’. De acordo com a estranha lógica da procuradora da República, presentante do MPF, os elementos da “Operação Faroeste” [2], por si só, seriam tão convincentes que toda a instrução, toda a produção dialética de provas, os debates e os memoriais seriam desnecessários. Afinal, de acordo com a vergonhosa lógica acusatória, para que questionar o que “parece” óbvio?

Esse modelo de processo penal, mais rápido, eficientista, impessoal e frígido não é de hoje vem sendo defendido. Em 2018, ataques foram realizados contra o advogado Alberto Zacarias Toron durante audiência realizada na 13ª Vara Federal de Curitiba. Na sessão, o procurador do MPF, Athayde Ribeiro Costa, arvorou-se a questionar a atitude da defesa, como querendo censurar, de orientar seu cliente a não responder perguntas por si formuladas.

Naquele infeliz episódio, o membro da Procuradoria da República disse que a orientação da defesa “é uma clara afronta à paridade das armas, já que há uma fuga covarde ao contraditório. E se a defesa, que tanto preza pelas garantias processuais, age com deslealdade, deveria ela adotar um comportamento digno e se escusar de fazer perguntas também, já que tanto preza por respeito às garantias”.

É preocupante e pesaroso ver que a presentante do Ministério Público, agora no Superior Tribunal de Justiça, defende ideias tão incompatíveis com o Estado Democrático de Direito. Quer-se, além de corromper o constitucional direito ao silêncio, também violar o direito ao processo! Além de juridicamente insustentável (o pseudoargumento é de uma frivolidade tão grande que seria até risível se sério não fosse), o pronunciamento fere o próprio mister da instituição ministerial, estampado no artigo 1º da Lei Complementar 75, que lhe incumbiu a defesa da ordem jurídica e do regime democrático. ‘”Qual democracia as condenações ‘adiantadas’ buscam prestigiar?”. Ou melhor, “condenações antecipadas são compatíveis com a democracia?”.

O silencio eloquente se faz de novo. E as histórias cobrarão de cada um os preços de suas biografias.

Não se quer acreditar que a subprocuradora-geral da República tenha externado um posicionamento institucional (ou mesmo do grupo que chefia), uma vez que ao fazê-lo comprometeria todo o processo. Espera-se, por outro lado, que esse mesmo Ministério Público repudie as afirmações colocadas por aquela que o presentou.

E vamos caminhando, a largos passos, à beira do precipício da exceção processual. E, enquanto muitos atacam o processo, outros tantos emudecem.

Não emudeceremos.

 é advogado, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro das comissões de Reforma do Código Penal e da Lei de Execução Penal, nomeado pelo Senado Federal.

 é graduando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia.