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Idoso não pode ser preso por dever alimentos a filha de 37 anos

Por não verificar os requisitos de atualidade da dívida e de urgência no recebimento da pensão alimentícia, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça afastou a possibilidade de prisão civil de um pai de 77 anos por débito alimentar cuja credora, sua filha, atualmente com 37 anos, demonstrou não depender desses valores para se manter.

De acordo com o processo, em 2011, foi feito acordo extrajudicial para suspender o pagamento da pensão, pois o pai não podia mais suportar o encargo. A filha, à época com 29 anos, já trabalhava. Em 2016, o pai ajuizou ação de exoneração de alimentos, na qual a filha afirmou que, de fato, não tinha mais interesse no recebimento da pensão.

Apesar disso, no mesmo ano, ela ajuizou pedido de cumprimento de sentença de alimentos, alegando que a concordância em desonerar o pai da obrigação valia a partir da data do ajuizamento da ação de exoneração, sem prejuízo da possibilidade de cobrança de dívida alimentícia anterior. Nos autos, o juiz determinou a prisão civil do pai, decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Sem urgência

A ministra Isabel Gallotti, relatora do pedido de habeas corpus no STJ, destacou que a filha, na ação de execução, admitiu não precisar dos alimentos, pois era financeiramente independente.

Em consequência, a ministra aplicou ao caso jurisprudência do STJ no sentido de que a execução de obrigação alimentar pelo rito da prisão tem como pressupostos a atualidade da dívida, a urgência e a necessidade do recebimento da prestação alimentícia.

“Dessa forma, reafirmo não ter pertinência o decreto de prisão civil de pessoa idosa, com quase 77 anos de idade atualmente, para pagamento de valores dos quais comprovadamente não necessita a beneficiária dos alimentos para sua subsistência atual, mas que poderá ser adimplida pelo rito da execução prevista no artigo 528, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil de 2015”, concluiu a ministra o conceder o habeas corpus. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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Pedido de HC sem decisão anexa inviabiliza análise do recurso

Advogado que impetra pedido de habeas corpus e não junta a decisão que recebeu a denúncia inviabiliza o conhecimento da medida. Afinal, sem a juntada de elementos probatórios suficientes para viabilizar a análise do pedido, o julgador não tem como decidir nem por que prosseguir com o recurso.

A falha de instrução fez o desembargador Rogério Gesta Leal, da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, “não conhecer” de HC impetrado pelo advogado criminalista Amadeu de Almeida Weinmann. Ele pretendia trancar ação penal intentada contra uma advogada da Comarca de Sobradinho, denunciada pelos crimes de falsidade ideológica e patrocínio infiel.

Na decisão monocrática, Leal citou precedente do próprio colegiado. Registra excerto de ementa do HC 70063316483, relatado pelo desembargador Ivan Leomar Bruxel: “Cumpre ao advogado, portador da capacidade postulatória, instruir adequadamente o pedido de liberdade. Sem cópia da denúncia, e sem cópia da decisão que decretou a prisão preventiva, inviável o exame da pretensão, pois desconhecidos os fatos e ignorados os motivos da prisão.”

Pedido de reconsideração

Inconformado, Weinmann manejou pedido de reconsideração, visando à reforma da decisão monocrática que não conheceu o pedido de HC. “Ao contrário do afirmado no despacho ora impugnado, o impetrante, advogado com mais de meio século de advocacia, não deixaria, ao impetrar a ordem, de instruí-la com todas as peças processuais”, alegou.

Garantiu ter agido de boa-fé, “pensando que, juntando a notícia de expedição do mandado de citação, por lógico, a denúncia deveria ter sido recebida, dispensando-se a juntada do mandado”. Por fim, destacou que no pedido consta a informação do site do Tribunal de Justiça acerca da expedição do mandado de citação, cujo procedimento não se determina sem o devido recebimento da denúncia. Ato subsequente, juntou cópia da decisão que recebeu a denúncia.

Reconsideração negada

O desembargador Rogério Gesta Leal indeferiu o pedido de reconsideração, mantendo, na íntegra, sua decisão. Ele reconheceu, por óbvio, que a expedição do mandado de citação pressupõe o recebimento da denúncia. Reafirmou, por outro lado, que o pedido veio desacompanhado da decisão que recebeu a peça inicial, circunstância que inviabiliza a análise da pretensão deduzida. E essa constatação, repisou, foi registrada de forma clara e objetiva na decisão monocrática, o que dispensa “qualquer esforço interpretativo” para compreendê-la.

“Muito embora tenha sobrevindo a juntada da decisão de recebimento da denúncia, a dilação probatória não é permitida na estreita via do habeas corpus, medida que exige prova pré-constituída. Portanto, deixo de analisar o pedido, o qual deverá ser requerido em via própria”, complementou o desembargador-relator.

Pulando instância

O julgador ainda observou que a última movimentação processual registrada no processo de origem data de 18 de fevereiro de 2020, ocasião em que foi feita a juntada do mandado citatório. Portanto, até então, não havia o oferecimento da resposta escrita na forma do artigo 396-A do Código de Processo Penal (CPP). Este seria o momento oportuno para a arguição de preliminares, bem como para a apresentação de todas as alegações, documentos e justificações que interessam à defesa.

“Desta maneira, não tendo a defesa se manifestado sobre a denúncia perante o Juízo a quo, evidentemente não houve pronunciamento judicial sobre a matéria pela origem. Essa circunstância, como bem deve saber o impetrante, impede a apreciação imediata por este Tribunal de Justiça, uma vez que importaria em supressão de instância, com violação ao princípio que assegura o duplo grau de jurisdição, restando obstado o conhecimento deste writ’.”

Clique aqui para ler a decisão monocrática

Clique aqui para ler a decisão que indeferiu a reconsideração

Ação penal 134/2.19.0002308-1 (Comarca de Sobradinho)

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.

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Suicídio de preso em delegacia não gera responsabilidade do Estado

Filho de preso que cometeu suicídio em delegacia ajuizou ação por danos morais
Reprodução

O juízo da 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal negou, por unanimidade, provimento ao recurso do autor e manteve a decisão da 5ª Vara da Fazenda Pública que julgou improcedentes os pedidos de danos morais e materiais por conta de suicídio de preso em uma delegacia de polícia no Distrito Federal.

Na ação, o autor alega que seu pai se envolveu em um acidente de trânsito com um veículo de um policial militar. Ele (pai do autor) estava alcoolizado e foi preso em flagrante. Segundo a inicial, os policiais, mesmo tendo constatado a situação de desespero do pai  — que temia perder o emprego de motorista —, o deixaram sozinho em uma cela.

Os desembargadores da 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, por unanimidade, negaram provimento ao recurso do autor e mantiveram decisão da 5ª Vara da Fazenda Pública, que julgou improcedentes os pedidos de danos morais e materiais, decorrentes de suicídio de preso em cela de delegacia da polícia do DF, uma vez que configurado fato imprevisível.

Enquanto aguardava o pagamento da fiança, o pai do autor da ação acabou cometendo suicídio. Em razão disso, o filho ajuizou pedido de indenização por falha do estado em garantir a segurança e a integridade física do seu pai enquanto estava preso.

Na 1ª instância, o juízo apontou que, no caso, a responsabilidade do Estado restou afastada em razão da imprevisibilidade do ato extremo de suicídio. “No caso em apreço, conforme as provas colacionadas aos autos, não há previsibilidade de que o preso praticaria o autoextermínio. O evento deve ser previsível para que o Poder Público possa adotar medidas para evitar o dano e, dessa forma, configurar a omissão estatal.”

Ao analisar o recurso, os desembargadores ratificaram a decisão de 1ª instância e mantiveram a sentença. “No caso em apreço, conforme as provas colacionadas aos autos, não há previsibilidade de que o preso praticaria o autoextermínio. O evento deve ser previsível para que o Poder Público possa adotar medidas para evitar o dano e, dessa forma, configurar a omissão estatal.”.

0708913-74.2018.8.07.0018

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Gilmar concede HC a acusada de homicídio que deu à luz na prisão

Ainda que o delito praticado indique a necessidade de prisão preventiva, se a ré é mãe de criança de até 12 anos, o Estado deve priorizar o bem-estar do menor e a proteção da maternidade e da infância. Com esse entendimento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, concedeu Habeas Corpus a uma mulher acusada de roubo duplamente majorado e homicídio qualificado.

Ministro Gilmar Mendes identificou constrangimento ilegal na prisão preventiva de mãe de bebê de 5 meses 
Fellipe Sampaio/SCO/STF

A paciente estava grávida quando foi apreendida e deu à luz enquanto encontrava-se em prisão preventiva. Ela foi representada no caso pelo advogado Guilherme Castro.

A substituição pela domiciliar, foi negada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e, mais recentemente, pelo Superior Tribunal de Justiça.

“Não obstante as circunstâncias em que foi praticado o delito, a concessão da prisão domiciliar encontra amparo legal na proteção à maternidade e à infância, bem como na dignidade da pessoa humana, porquanto prioriza-se o bem-estar do menor”, decidiu o ministro Gilmar Mendes.

Ele levou em consideração o regramento aplicável ao caso — Constituição da República, Lei de Execução Penal, Estatuto da Criança e do Adolescente, Marco Legal da Primeira Infância e a Resolução 62 do CNJ, editada para tempos de crise da epidemia — entendendo que houve constrangimento ilegal sofrido pela mulher presa.

“No caso concreto, a colocação da paciente em prisão domiciliar é medida que se impõe, mormente porque, para além do fato de que seu filho conta com apenas 5 meses, ficou comprovada a imprescindibilidade da paciente aos cuidados da criança, já que esta se encontra em fase de amamentação”, concluiu.

Análise do caso

O ministro Gilmar Mendes ressaltou que analisou o caso apesar de o caso ter sido julgado monocraticamente no STJ, sem interposição de agravo regimental. A jurisprudência da 2ª Turma do STF é pelo não conhecimento de Habeas Corpus nessa situação, com fundamento na carência de exaurimento da jurisdição e por inobservância ao princípio da colegialidade.

Nessas hipóteses, Gilmar Mendes fica vencido, junto com o ministro Celso de Mello, por entender que não haveria óbice para conhecimento do HC. No caso concreto, no entanto, sua análise se deu em obediência ao princípio da proteção judicial efetiva. Afastou o entendimento predominante por ser caso de patente constrangimento ilegal ou abuso de poder.

Clique aqui para ler a decisão

HC 185.215

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Oliva e Brenes: Sobre a exploração sexual infantil

A Lei nº 9.970, de 17 de maio de 2000, instituiu 18 de maio como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Referida lei foi editada em razão do assassinato da menina Araceli [1], em 18 de maio de 1973, à época com apenas oito anos de idade, que, antes de ser morta, foi drogada e estuprada por adolescentes de classe média alta da cidade de Vitória, crime que até hoje permanece impune.

A data foi estabelecida com o escopo de mobilizar e conscientizar a sociedade sobre o estigma, as marcas indeléveis que o abuso e a exploração sexual deixam nas crianças e nos adolescentes [2]. Isso porque o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é claro ao dispor que as crianças e os adolescentes são sujeitos de direito e não podem ser objetos de negligência, exploração, violência, crueldade e opressão.

O abuso sexual caracteriza-se por um ato ou jogo sexual entre um ou mais adultos com uma criança ou adolescente, a fim de estimulá-los sexualmente ou utilizá-los para obter estimulação sexual para si, o que, normalmente, acontece no seio familiar por pessoas com laços parentais (pais, tios, avós, entre outros), ou seja, por pessoas que, a princípio, estariam acima de qualquer suspeita.

Já a exploração sexual ocorre com a intenção de obter vantagem financeira, quando a criança e/ou adolescente são usados como instrumentos de obtenção de lucro por quem os oferece e, também, para satisfação da lascívia de quem paga.

Infelizmente, em grande parte das vezes, esse tipo de crime consuma-se com a conivência e até mesmo colaboração dos pais.

Conforme bem analisado em valiosa cartilha do Ministério Público Federal Procuradoria da República em Mato Grosso do Sul (MPF, 20- -), o abuso e a exploração sexual deixam marcas para a vida toda. As vítimas de violência sexual infantil sofrem danos físicos, podem contrair doenças venéreas e até engravidar. Além desses malefícios, os maiores danos decorrentes da violência sexual afetam a alma das crianças e adolescentes, que não conseguem se relacionar com outras pessoas, tonando-se retraídas, agressivas, sem autoestima, com tendências à depressão e ao suicídio.

Esses males impõem-nos o dever de ficarmos atentos aos primeiros sinais de que a criança e/ou adolescente sofreram violência sexual.

Entre os sinais é possível destacar: criança alegre e afetuosa que se torna retraída, triste, chorosa, irritada, agressiva, passa a ter pesadelos e sono agitado, começa a falar palavrões e a realizar gestos obscenos, demonstra demasiado interesse pelos órgãos genitais, apresenta baixo rendimento escolar, começa a ter medo de ir a lugares dos quais gostava e costumava frequentar, apresenta vermelhidão ou lesões nos órgãos genitais e sujeira incomum nas roupas íntimas, entre outras características (MPF, 20- -).

A ação ou a omissão de submeter crianças e adolescentes à exploração sexual configura crime com pena de reclusão de quatro a dez anos e multa, além de perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da unidade da federação em que o crime se verificou. Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifique a submissão da criança ou adolescente à exploração sexual, consoante prevê o artigo 244-A e § 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Relevante dizer também que a Convenção nº 182 da Organização Internacional do Trabalho e o Decreto nº 6.481/2008 estabelecem que a utilização, a demanda e a oferta de criança para fins de exploração sexual, produção de pornografia ou atuações pornográficas estão entre as piores formas de trabalho infantil Lista TIP.

Outrossim, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Consolidação das Leis do Trabalho proíbem o trabalho de adolescentes em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social (ECA, artigo 63, III; CLT, artigos 403, parágrafo único, e 405, II).

Portanto, para evitar os traumas e a fissura que os atos de violência sexual provocam na alma das crianças e dos adolescentes, é preciso que atuemos de forma preventiva, adotando providências como orientar as crianças no sentido de que ninguém deve tocar suas partes íntimas (aquelas que, na menina, são cobertas pelo biquíni e, no menino, pela sunga); a não ficar sozinhas na companhia de estranhos; a gritar por socorro quando alguém tentar tocar suas partes íntimas; a não ficar sozinhas em banheiros públicos e com pessoas alcoolizadas, enfim, a proteger-se (MPF, 20- -). Necessário, também, que pais e responsáveis ou, quando estes também de alguma forma forem coniventes, cúmplices, quaisquer outros, familiares ou não, velem para que tais exposições não ocorram e supervisionem, ainda, acessos à internet e às redes sociais.

É preciso, por fim, que para vivificar o princípio da proteção integral e absolutamente prioritária que deve ser devotada a crianças e adolescentes (artigo 227 da CRFB e ECA), o Estado e a sociedade (também a comunidade, com ideia de maior proximidade), bem como a família, organizem-se para evitar que crianças e adolescentes sejam vítimas de atos (comissivos ou omissivos) de violência sexual, a fim de assegurar-lhes o desenvolvimento físico, moral, psíquico e social para que desenvolvam todas as suas capacidades e habilidades na mais absoluta plenitude, tão necessárias para o exercício de uma vida adulta saudável e realizada.

Não fique em silêncio. Denuncie. Disque 100.

“Pecar pelo silêncio, quando se deveria protestar, transforma homens em covardes”. (Abraham Lincoln)

 

Referências bibliográficas:

BRASIL, CÂMARA DOS DEPUTADOS. PL 267/1999. Disponível em: <http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD23MAR1999.pdf#page=10>. Acesso em: 16/5/2020.

BRASIL, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes: Marcas para a vida toda. Procuradoria da República em Mato Grosso do Sul, [20- -], [S.l.: s.n.].

 é juiz do Trabalho substituto do TRT da 15ª Região e coordenador do Juizado Especial da Infância e Adolescência (JEIA) de Presidente Prudente (SP).

 é juiz do Trabalho aposentado do TRT da 15ª Região e ex-coordenador do Juizado Especial da Infância e Adolescência (JEIA) de Presidente Prudente (SP).

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Taís Vaz: O sistema constitucional de crises e a Covid-19

O mundo atravessa uma época sombria, de rotina e ações inéditas. O indivíduo se força a ficar em casa, pela sua própria sobrevivência, com a interrupção de sua rotina habitual. D’outro lado, o Estado busca meios de passar pelo momento de crise sanitária e econômica, de nebuloso horizonte.

Fato é que, inegavelmente, nós nos encontramos em um momento de crise. E, para contextos como o atual, a Constituição Federal de 1988 traz o que a doutrina denomina de sistema constitucional das crises, composto pelas também apelidadas Válvulas de Panela de Pressão.

Esse sistema foi construído com o intuito de retomar a estabilidade em casos de tumulto institucional. São medidas excepcionais modeladas para situações de crise, como meios de resposta a determinadas anormalidades, restritas a certos locais e períodos. Por isso, regem-se pelos princípios da necessidade e da temporariedade.

A doutrina enumera como hipóteses: a intervenção federal, o estado de defesa e o estado de sítio. A primeira afasta a autonomia de determinado ente federativo, por meio da intervenção da União, nas hipóteses taxativamente previstas no artigo 34 da Constituição, com o fim de cessar conduta do ente atingido que comprometa a estabilidade institucional. As outras duas se prestam ao restabelecimento da ordem pública e paz social, às quais se restringe a presente análise.

A decretação dos estados de defesa e de sítio são de competência privativa do presidente da República, após oitiva dos Conselhos da República e da Defesa Nacional órgãos de consulta do presidente, cujo pareceres não têm caráter vinculativo. Ocorre que, diferentemente do estado de defesa, o estado de sítio pressupõe prévia aprovação do Congresso Nacional acerca da decretação por parte do presidente. Nesse caso, não havendo a aprovação, o presidente está impedido de decretá-lo.

O estado de defesa, assim como o estado de sítio, repercute em uma situação de legalidade extraordinária. Ou seja, a Administração Pública, dentro desse contexto, está autorizada a atuar em certas situações, independentemente da existência de lei, em lógica contrária à regra geral da observância do princípio da legalidade, segundo o qual toda a atuação da Administração Pública deve obediência ao previsto na lei.

Outra distinção reside no seu tempo de duração. Enquanto o estado de defesa pode ser decretado por período de até 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias, uma única vez, o estado de sítio pode ser, inicialmente, decretado por 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias, quantas vezes for necessário.

A decretação do estado de defesa deve estar fundada em uma das duas hipóteses do artigo 136 da Constituição: grave e iminente instabilidade institucional que ameace a ordem pública ou a paz social; ou manifestação de calamidade de grandes proporções na natureza que atinja a ordem pública ou a paz social.

Depois de ouvidos os órgãos de consulta supramencionados, o presidente da República instaura o estado de defesa por meio de decreto, que especifica as áreas abrangidas e as medidas a serem adotadas.

O decreto presidencial, então, deve ser submetido à apreciação do Congresso Nacional em até 24 horas, acompanhado da sua respectiva justificação. Em dez dias, o Congresso deve apreciá-lo e deliberar sobre a questão por maioria absoluta. Entendendo pelo seu descabimento, a medida deve ser cessada.

Durante o estado de defesa, algumas medidas anormais podem ser adotadas, conforme previsão do artigo 136, §1º, inciso I, da Carta Magna. São elas: restrição aos direitos de reunião, sigilo de correspondências e comunicações, bem como ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos por parte da União, nos casos de calamidade pública.

O decreto do estado de sítio, por sua vez, possui como pressupostos: comoção grave de repercussão nacional, ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia das medidas tomadas em prévio estado de defesa ou declaração de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.

Durante a sua vigência, podem ser adotadas medidas ainda mais restritivas, como obrigação de permanência em determinadas localidades, restrições à prestação de informações e liberdade de imprensa, suspensão da liberdade de reunião, busca e apreensão em domicilio, intervenção nas empresas de serviços públicos e requisição de bens.

Ante todo o aqui exposto, indaga-se: diante de um sistema constitucional de crises, não seria proveitoso a sua utilização no momento atual de Covid-19? De fato, estamos em um contexto de calamidade pública expressa, com necessidades eminentes de isolamento e resguarde, que se mostram necessários para a superação desta crise do modo menos lesivo possível.

Todavia, diante de um governo de perfil eminentemente populista, de extrema preocupação com a economia e resistência expressa acerca do isolamento social, evidente que não seria de grande valia a decretação de um estado de defesa ou de sítio.

De outro lado, à parte de qualquer ideologia ou plano de ação, a adoção desse sistema constitucional de crise implica na incidência de efetivos controles políticos e judiciais, concomitantes e posteriores. Exemplos disso são os artigos 140 e 141 da Constituição.

Esses dispositivos preveem a designação de comissão especial de congressistas para fiscalizar a execução das medidas adotadas, bem como a obrigação de o presidente da República, ao final desses estados excepcionais, remeter ao Congresso mensagem com a especificação e justificação das providências adotadas.

Nem poderia ser diferente. A excepcionalidade de tais estados advém da possibilidade de adoção de condutas estatais restritivas de direitos individuais. E, diante da relevância de tais direitos, mormente em uma sociedade fundada na dignidade da pessoa humana, é muito tênue a linha divisora do necessário à superação de um estado de crise e da efetiva violação de direitos fundamentais. Este último cenário poderia, por si só, configurar crime responsabilidade do presidente da República e causar seu impeachment.

Por isso, a decretação desses estados de excepcionalidade, naturalmente, carregam consigo um temor natural de responsabilização por parte do presidente da República, que pode, tentando acertar, cair em erro e cavar sua própria cova. Isso se torna ainda mais fácil quando diante de uma realidade atípica, que demanda ineditismo e celeridade nas condutas estatais e, portanto, mais suscetíveis a erros.

Ante o exposto, paira o questionamento sobre a conveniência de uma decretação de estado de defesa ou de sítio no contexto atual, bem como se tais mecanismos se mostram convidativos ao governo atual ou mesmo a qualquer outro, diante do seu elevado grau de risco de responsabilização.

 é advogada autônoma em Salvador e pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Baiana de Direito e Gestão.

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TJ/SP: Mãe solteira e desempregada não será presa por deixar de pagar pensão alimentícia

O desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, do TJ/SP, concedeu HC preventivo para que mãe solteira e desempregada não seja presa por não pagar a pensão alimentícia de filha que vive com os avós. Para o magistrado, decretar a prisão neste momento, em nada auxiliará nas despesas familiares.

“Considerando-se que a paciente é mãe de família e possui três filhas menores de idade, duas sob seu cuidado direto, a decretação da prisão neste momento de pandemia e em que ela se encontra desempregada, infelizmente, em nada auxiliará nas despesas familiares, ao contrário, poderá deixá-las em grave situação de penúria.”

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A mulher foi intimada a pagar alimentos no montante de R$ 3 mil para a filha mais velha, de 12 anos, que é autista e está sob a guarda dos avós. Devido ao pagamento não ter sido efetuado, foi decretada prisão civil por 30 dias. A mãe alega que está desempregada há dois meses e tem duas outras filhas sob seus cuidados, de 7 e 5 anos.

Para o desembargador Pereira Calças, a circunstância “indica a aplicação de antigo precedente da Colenda Suprema Corte no sentido de que o inadimplemento da obrigação alimentar em relação à filha primogênita da paciente não foi voluntário e inescusável, mas derivou da situação de desemprego, que, infelizmente, nesta situação terrível de pandemia que campeia pelo universo da Covid-19, que traumatiza a humanidade, não autoriza que se esqueça das virtudes que o Poder Judiciário deve seguir: Prudência, Justiça, Fortaleza e Temperança”.

O magistrado citou acórdão de relatoria da ministra do STF Cármen Lúcia, que entendeu que a Constituição só permite prisão por dívida decorrente de prestação de alimentos quando o inadimplemento é voluntário e inescusável.

“Voto, neste caso, como votou a Ministra Cármen Lúcia. Não há inescusabilidade que daria estofo à autorização de prisão por dívida alimentar excepcionada na Carta Constitucional que tem como pedra angular a dignidade da pessoa humana.”

Informações: TJ/SP.

__________

Para que o leitor encontre as notícias jurídicas específicas sobre coronavírus, reunimos todo o material em um site especial, constantemente atualizado. Acesse: www.migalhas.com.br/coronavirus

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TJ/SP: Mãe desempregada não será presa por deixar de pagar pensão alimentícia

O desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, do TJ/SP, concedeu HC preventivo para que mãe solteira e desempregada não seja presa por não pagar a pensão alimentícia de filha que vive com os avós. Para o magistrado, decretar a prisão neste momento, em nada auxiliará nas despesas familiares.

“Considerando-se que a paciente é mãe de família e possui três filhas menores de idade, duas sob seu cuidado direto, a decretação da prisão neste momento de pandemia e em que ela se encontra desempregada, infelizmente, em nada auxiliará nas despesas familiares, ao contrário, poderá deixá-las em grave situação de penúria.”

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A mulher foi intimada a pagar alimentos no montante de R$ 3 mil para a filha mais velha, de 12 anos, que é autista e está sob a guarda dos avós. Devido ao pagamento não ter sido efetuado, foi decretada prisão civil por 30 dias. A mãe alega que está desempregada há dois meses e tem duas outras filhas sob seus cuidados, de 7 e 5 anos.

Para o desembargador Pereira Calças, a circunstância “indica a aplicação de antigo precedente da Colenda Suprema Corte no sentido de que o inadimplemento da obrigação alimentar em relação à filha primogênita da paciente não foi voluntário e inescusável, mas derivou da situação de desemprego, que, infelizmente, nesta situação terrível de pandemia que campeia pelo universo da Covid-19, que traumatiza a humanidade, não autoriza que se esqueça das virtudes que o Poder Judiciário deve seguir: Prudência, Justiça, Fortaleza e Temperança”.

O magistrado citou acórdão de relatoria da ministra do STF Cármen Lúcia, que entendeu que a Constituição só permite prisão por dívida decorrente de prestação de alimentos quando o inadimplemento é voluntário e inescusável.

“Voto, neste caso, como votou a Ministra Cármen Lúcia. Não há inescusabilidade que daria estofo à autorização de prisão por dívida alimentar excepcionada na Carta Constitucional que tem como pedra angular a dignidade da pessoa humana.”

Informações: TJ/SP.

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TJ-SP concede HC preventivo a mãe desempregada que não pagou pensão

Inadimplemento não voluntário

TJ-SP concede HC preventivo a mãe desempregada que não pagou pensão alimentícia

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A Constituição só permite prisão por dívida decorrente de prestação de alimentos quando o inadimplemento é voluntário e inescusável. Com esse entendimento, o desembargador Manoel Pereira Calças, do plantão judiciário do TJ-SP, concedeu Habeas Corpus preventivo para que uma mãe solteira e desempregada não seja presa por não pagar a pensão alimentícia da filha que vive com os avós.

123RFTJ-SP concede HC preventivo a mãe desempregada que não pagou pensão

Pereira Calças citou acórdão de relatoria da ministra do Supremo Tribunal Federal Cármen Lúcia que prevê a prisão apenas em situação de inadimplemento voluntário, que não é o caso dos autos. “Voto, neste caso, como votou a ministra Cármen Lúcia. Não há inescusabilidade que daria estofo à autorização de prisão por dívida alimentar excepcionada na Carta Constitucional que tem como pedra angular a dignidade da pessoa humana”, disse.

A mulher foi intimada a pagar pensão de R$ 3 mil para a filha mais velha, de 12 anos, que é autista e está sob a guarda dos avós. Como o pagamento não foi feito até o momento, foi decretada prisão civil por 30 dias. A mãe alega que está desempregada há dois meses e tem mais duas filhas sob seus cuidados, de 7 e 5 anos.

Para o desembargador, a circunstância “indica a aplicação de antigo precedente da Suprema Corte no sentido de que o inadimplemento da obrigação alimentar em relação à filha primogênita da paciente não foi voluntário e inescusável, mas derivou da situação de desemprego, que, infelizmente, nesta situação terrível de pandemia que campeia pelo universo da Covid-19, que traumatiza a humanidade, não autoriza que se esqueça das virtudes que o Poder Judiciário deve seguir: prudência, justiça, fortaleza e temperança”.

Ainda segundo Pereira Calças, considerando que a impetrante é mãe de família e possui três filhas menores de idade, duas sob seu cuidado direto, a decretação da prisão neste momento de pandemia e em que ela se encontra desempregada em nada auxiliará nas despesas familiares, ao contrário, poderá deixá-las em grave situação de penúria.

 é repórter da revista Consultor Jurídico

Revista Consultor Jurídico, 17 de maio de 2020, 14h21