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É lícita a majoração da pena por crime financiado por preso

O fato de o crime ser financiado por alguém encarcerado é motivo hábil a gerar a majoração da pena, pois aumenta a censurabilidade do ato. Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a agravo regimental em Habeas Corpus de um réu que visava a diminuição da pena.

Presidiário financiava tráfico e paga aluguel da casa onde as drogas eram preparadas 
Reprodução

No caso, o réu foi condenado a 7 anos e 6 meses de prisão por tráfico de drogas, que seria financiado por um presidiário, responsável inclusive por pagar o aluguel da casa utilizada para o preparado da droga. Ao STJ, a defesa afirmou que a circunstância não caracteriza dolo superior ao encontrado em delitos tais, sendo indevido o aumento da pena.

Relator, o ministro Antonio Saldanha Palheiro entendeu que a majoração da pena pelo Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul ocorreu de maneira fundamentada, individualizada com base em critérios absolutamente legais e proporcionais.

“O desvalor da culpabilidade, em razão de a atividade ilícita ser financiada por pessoa encarcerada em presídio da região, que pagava inclusive o aluguel da residência destinada ao comércio do entorpecente, evidencia sim um plus na reprovabilidade da conduta do agravante, uma maior censurabilidade do ato, não se verificando, portanto, nenhuma ilegalidade na sua utilização como circunstância judicial desfavorável”, concluiu.

A 6ª Turma ainda negou a aplicação do redutor do parágrafo 3º do artigo 33 da Lei de Drogas, o chamado tráfico privilegiado, pois o réu, ao admitir que vendia drogas em conluio com pessoas dentro de presídios, confirmou que se dedicava às atividades criminosas, sendo fator que impede a concessão da benesse, apesar de primário e de bons antecedentes.

“É de curial relevo observar que a finalidade do legislador, ao inserir a causa de diminuição prevista no § 3º do art. 33 da Lei de Drogas, foi evitar que a punição aplicada aos traficantes de drogas alcançasse pessoas que, por um inconveniente da vida ou por um ato de desespero, cometeram um delito eventual, em completa rota de colisão com a conduta social que sempre mantiveram anteriormente”, explicou o relator.

HC 533.507

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Edgar Guimarães: Responsabilização dos agentes públicos pela MP 966

Em 13 de maio de 2020, o presidente da República editou a Medida Provisória nº 966/2020 dispondo que os agentes públicos somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro em razão da prática de atos relacionados, direta ou indiretamente, com as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública, bem como do combate aos efeitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia da Covid-19.

À primeira vista as normas consubstanciadas em tal medida provisória parecem retratar uma matéria já positivada no artigo 28 da Lei nº 13.655/2018, assim encontrado “o agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em casos de dolo ou erro grosseiro”.

Cabe registrar que o Tribunal de Contas da União, ao julgar certos casos tendo como pano de fundo, exclusivamente, as disposições da LINDB, vem decidindo que o dolo e o erro grosseiro (artigo 28) não afastam a responsabilidade do agente público pela reparação de eventuais danos [1].

De uma análise mais detida das prescrições do novel regramento consubstanciado na MP, notadamente do seu artigo 1º [2], é possível depreender que somente em caso de dolo ou erro grosseiro os agentes públicos serão condenados ao ressarcimento dos danos causados ao erário. A regra, portanto, abrange a responsabilidade civil, que até então era desconsiderada pela Corte de Contas federal, e cuida das balizas da responsabilidade pessoal do agente público, afastando um foco específico de insegurança: a ausência de proteção legal do gestor público honesto que comete erro escusável.

É importante assinalar que a responsabilização nos termos enunciados no parágrafo anterior atinge tão somente as ações ou omissões que estejam relacionadas, direta ou indiretamente, com as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública e o combate aos efeitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia da Covid-19, ou seja, decisões ou opiniões técnicas desvinculadas dessas finalidades não estão abrangidas pela Medida Provisória 966/2020.

Merece destaque ainda o conceito legal de “erro grosseiro”, assim encontrado: “erro manifesto, evidente e inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia”.

É preciso reconhecer que “erro grosseiro” é uma expressão vaga, indeterminada, possibilitando, com isso, interpretações das mais variadas possíveis. Tome-se como exemplo as manifestações do Tribunal de Contas da União que, ao conceituar esse vocábulo, assim se posicionou: equivale a culpa grave [3], é a conduta do agente público que se distancia daquela que seria esperada do administrador médio, avaliada no caso concreto [4]; é aquele que pode ser percebido por pessoa com diligência abaixo do normal ou que pode ser evitado por pessoa com nível de atenção aquém do ordinário, decorrente de grave inobservância de dever de cuidado [5].

Além da referida conceituação legal, a Medida Provisória prescreve alguns fatores [6] que devem ser considerados para que possa se caracterizar ou não um “erro grosseiro”, contribuindo, assim, para o surgimento de um cenário de certa segurança para o gestor público na tomada de decisões e, também, impedindo aquilo que se denominou de paralisia das canetas, quando se opta pela omissão em razão do temor de uma eventual responsabilização.

Ao contrário do que parece se tratar de mera reedição de matéria já positivada, a medida provisória consagra uma nítida distinção em relação à LINDB, propiciando segurança aos agentes públicos na adoção das medidas que efetivamente lhe pareçam ser as mais adequadas para o enfrentamento da emergência de saúde pública causada pela pandemia da Covid-19, no sentido de que eventuais erros escusáveis não acarretarão a sua responsabilização.

Por fim, caberá ao Tribunal de Contas da União rever o seu entendimento de que os parâmetros de responsabilidade pessoal do artigo 28 da LINDB não abrangem a responsabilidade civil, na medida em que tal posicionamento fragiliza o objetivo deste dispositivo no sentido de conferir uma proteção jurídica ao gestor público honesto.

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[1] Ver Acórdão nº 11.762/18; Acórdão 14.130/19; Acórdão nº 2.768/19; Acórdão 5.547/19. 

[2] “Artigo 1º — Os agentes públicos somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados, direta ou indiretamente, com as medidas de:” (grifos do autor)

[3] Acórdão 1.762/2018 – Segunda Câmara

[4] Acórdão 2.860/2018 – Pleno. Juliana Bonacorsi de Palma, após a análise de 133 acórdãos do TCU, identificou uma pluralidade de comportamentos que atenderiam ao referencial do administrador médio, situação que levou a autora a concluir que “dentre as várias métricas que o TCU se vale para responsabilizar, a do administrador médio é a mais pitoresca”. (PALMA, Juliana Bonacorsi de. Quem é o ‘administrador médio’ do TCU. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/controle-publico/quem-e-o-administrador-medio-do-tcu-22082018.

[5] Acórdão 3.327/2019 – Primeira Câmara.

[6] “Artigo 3º  Na aferição da ocorrência do erro grosseiro, serão considerados: I – os obstáculos e as dificuldades reais do agente público; II – a complexidade da matéria e das atribuições exercidas pelo agente público; III – a circunstância de incompletude de informações na situação de urgência ou emergência; IV – as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação ou a omissão do agente público; e V – o contexto de incerteza acerca das medidas mais adequadas para enfrentamento da pandemia da covid-19 e das suas consequências, inclusive as econômicas”.

 é advogado, professor em cursos de pós-graduação, consultor jurídico (aposentado) do Tribunal de Contas do Estado do Paraná, presidente do Instituto Paranaense de Direito Administrativo, árbitro da Câmara de Arbitragem e Mediação da FIEP-PR, conselheiro da OAB-PR, pós-doutor em Direito pela Università del Salento (Itália), doutor e mestre em Direito Administrativo pela PUC-SP.

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Costa, Heidrich e Morais: O protesto de títulos e a pandemia

Com a paralisação da economia provocada pela pandemia da Covid-19, muitas empresas têm encontrado enorme dificuldade financeira para fazer frente às suas obrigações de natureza mercantil, trabalhista e tributária, entre outras. Um dos caminhos utilizados pelas empresas para enfrentar tal problema tem sido a tentativa de recuperação dos seus créditos junto aos devedores.

Nesse sentido, na ausência de uma solução amigável, algumas empresas passam a buscar medidas coercitivas de recuperação de crédito, tanto de caráter judicial (ações de cobrança, execuções, etc.), quanto extrajudicial, neste caso com especial destaque para o protesto de títulos, definido como “o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida” [1].

Observa-se, no entanto, que a utilização do protesto de títulos tem encontrado algumas barreiras no atual momento de pandemia, notadamente aquelas impostas pelo Poder Judiciário, que, em recentes decisões, vem desidratando e enfraquecendo tal medida coercitiva extrajudicial de recuperação de crédito [2].  

Nesse sentido, a Justiça paranaense proferiu recente decisão para suspender por 30 dias o protesto tirado contra uma empresa, sob o argumento de que a medida, adotada durante o período da pandemia, poderia gerar dano à empresa, que ficaria impossibilitada de obtenção de crédito [3].

Na mesma linha, nos autos de Ação Civil Pública movida pelo Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Pouso Alegre (MG), a Justiça mineira proferiu recente decisão determinando a suspensão e/ou o registro de protestos e possíveis negativações de estabelecimentos representadas pelo mencionado sindicato, durante o período de pandemia, utilizando o fundamento de que são “incontestáveis os efeitos econômicos que advêm de referida medida e, consequentemente, necessitarão das linhas de crédito criadas pelo governo, de modo que a existência de negativações impossibilitará a utilização dos recursos” [4].

Semelhante ratio, aplicada para suspender o protesto de títulos envolvendo relações privadas, tem sido também empregue pelos tribunais para em ações de natureza tributária coibir o Fisco de promover a inscrição de empresas devedoras no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados (Cadin), por entender que tais medidas “podem de forma imediata sonegar do empresário a manutenção de sua atividade nesta situação de excepcionalidade” [5]. 

Importante ressalvar que as atuais restrições impostas às medidas extrajudiciais (protesto de títulos, inscrição no Cadin, entre outros), não têm sido aplicadas pelo Poder Judiciário em relação às medidas coercitivas judiciais, ou seja, ao credor permanece garantido o direito de exigir judicialmente a satisfação de seu crédito, ainda que no atual período de pandemia.

Em tempos de Covid-19, portanto, a despeito de permanecer íntegro o direito de crédito, alguns mecanismos para a sua satisfação (em especial o protesto de títulos) têm encontrado restrições impostas pelo Poder Judiciário, notadamente aqueles que podem inviabilizar a obtenção de crédito e, por consequência, a própria manutenção da atividade da empresa inadimplente.

Por fim, e como estímulo à reflexão, se a jurisprudência se consolidar no sentido de legitimar a suspensão do protesto das empresas inadimplentes durante o período emergencial decretado em razão da Covid-19, em última análise, considerando indevido o protesto, o Poder Judiciário possibilitará a tais empresas inadimplentes não apenas requererem a suspensão do protesto, mas também pleitearem eventual indenização pelos prejuízos que tal protesto vier a lhes causar.

 


[2] Como as decisões judiciais trazidas neste artigo não dizem nada a respeito especificamente do protesto de letra de câmbio, fica aberta a discussão: deveria se limitar o uso do protesto pelo credor (portador) apenas contra o devedor principal ou também contra o sacador, o endossadores e os avalistas da letra (protesto cambiário necessário), caso em que se retiraria do credor o direito de regresso contra estes últimos se o protesto não se realizar “em tempo útil” (artigo 32 do Decreto nº 2.044/08).

Julio Morais é advogado do escritório ALM Advogados.

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TJ-MG confirma condenação de empresa por verme em caixa de leite

Ficou feio

TJ-MG confirma condenação de laticínio por verme encontrado em caixa de leite

Por considerar que o dano foi suficientemente comprovado, a 13ª Câmara Cível do TJ-MG confirmou a condenação da Usina Laticínios Jussara, dada em primeira instância, por causa de um corpo estranho encontrado por uma mulher em uma caixa de leite produzido pela empresa. A usina terá de pagar à consumidora R$ 15 mil por danos morais.

Fábrica da Laticínios Jussara localizada 

na cidade de Patrocínio Paulista
Divulgação

Alegando ter encontrado algo semelhante a um verme em uma caixa de leite da marca Jussara, a mulher entrou com uma ação por danos morais na comarca de Guaxupé-MG. Ela contou que passou mal após ingerir o produto e que teve de ser atendida em um posto de saúde de sua cidade, já que apresentava vômitos e dor abdominal.

Condenada a pagar a indenização, a empresa recorreu ao TJ-MG com a alegação de que não havia provas da contaminação do leite. Além disso, a empresa argumentou que a entrada de um corpo estranho na embalagem era impossível e que o lote fora aprovado pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF/Mapa) para comercialização.

No recurso, a empresa pediu a redução do valor da indenização, caso a condenação fosse mantida, mas não teve sucesso. O relator, desembargador Luiz Carlos Gomes da Mata, entendeu que o laudo médico comprovou a contaminação e que as fotos anexadas ao processo confirmaram os fatos narrados pela consumidora.

“O mesmo laudo ainda registrou que a ora apelada compareceu ao posto de saúde portando o leite e o elemento nele encontrado”, argumentou o relator, que teve seu voto acompanhado pelos desembargadores José de Carvalho Barbosa e Newton Teixeira Carvalho. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-MG.

Acórdão 1.028.712.009.538.800.120.191.463.867

Revista Consultor Jurídico, 10 de maio de 2020, 17h26