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União não pode planejar deslocamento de quilombolas à revelia

O planejamento e a adoção de ações pertinentes ao deslocamento de integrantes de comunidades tradicionais não pode ser realizados à revelia de seus integrantes, conforme determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. 

População quilombola deve ser consultada antes de definir remoção 
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Com esse entendimento, o juiz Ricardo Felipe Rodrigues Macieira, da 8ª Vara Federal Ambiental e Agrária do Maranhão, concedeu liminar para suspender as ações voltadas ao planejamento e execução do processo de realocação de comunidades quilombolas que seriam afetadas pelas obras de ampliação e consolidação do Centro de Lançamento de Alcântara.

O deslocamento está previsto no artigo 6º da Resolução 11, publicada em 26 de março de 2020 pelo Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro e assinada pelo ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno. Ela determina que a Aeronáutica providencie “a execução das mudanças das famílias realocadas”.

A mesma resolução, em seu artigo 4º, indica “aprovar as diretrizes destinadas a orientar a elaboração do Plano de Consulta às comunidades quilombolas do município de Alcântara, Estado do Maranhão, com vistas a atender ao estabelecido na Convenção nº 169, da Organização Internacional do Trabalho”.

Para o magistrado, são duas ações que não podem ocorrer ao mesmo tempo. Ou seja, não é cabível desde já determinar essa remoção enquanto o processo de consulta prévia ainda está em fase inicial, de elaboração do projeto. 

O objetivo, explica, é que não sejam adotas medidas contrárias às demandas livremente expressadas por esses povos. Essa circunstância confere caráter vinculante à realização da consulta prévia, como garantia da participação dos povos tradicionais sobre medidas que repercutirão sobre seus bens e direitos.

“O direito de consulta prévia não pode ser havido como instrumento de oposição diametral com a finalidade inexorável de vetar as ações e decisões pretendidas pelo Estado, mas como recurso de coordenação e diálogo para adoção de políticas públicas que conciliem a demanda do poder público — de relevantíssima importância — com o reconhecimento e proteção da autonomia dos povos tradicionais, constitucionalmente assegurada”, apontou.

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1016857-96.2020.4.01.3700

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Daguer e Soares: Sobre o acordo de não persecução penal

A Lei Anticrime (Lei nº 13.964/2019) representa um marco nas esferas do Direito Penal e do Processual Penal, pois alterou 17 diplomas legais com temas dos mais diversos e complexos. Entre as principiais alterações, vale destacar a introdução do acordo de não persecução penal (ANPP) por meio do artigo 28-A do Código de Processo Penal, ampliando-se a Justiça Penal negociada no país, ao lado de transação penal, suspensão condicional do processo (Lei 9.099/95), acordo de leniência (Lei 12.846/2013) e colaboração premiada (Lei 12.850/13). Com efeito, o acordo de não persecução penal é tema já conhecido no cenário jurídico nacional, tendo em vista que o Conselho Nacional do Ministério Público, a partir das resoluções nº 181/2017 e 183/2018, já havia regulamentado o tema. No entanto, a falta de lei gerava uma série de discussões a respeito da obrigatoriedade do instituto [1] e, por sua vez, certa resistência de adoção na prática forense pelos sujeitos processuais.

Superada a questão da criação da lei, o acordo passa a ser norma cogente, instituindo-se no ordenamento jurídico mais um benefício ao investigado que terá a possibilidade de aceitação e, assim, cumprimento de condições fixadas em lei, como contrapartida pelo não oferecimento da peça acusatória, com o objetivo de, ao final, obter a extinção da punibilidade, sem a geração de qualquer antecedente criminal.

O artigo 28-A, caput, fixou requisitos que devem ser atendidos para que o Ministério Público elabore a proposta de acordo ao investigado: I) pena mínima inferior a quatro anos; II) confissão formal e circunstanciada; III) crime não cometido com grave ameaça e violência; e IV) necessário e suficiente para reprovação do crime. Além disso, no artigo 28-A, §2º, foram apresentadas vedações: I) se for cabível transação penal; II) o agente tiver sido agraciado com acordo de não persecução, transação penal ou suspensão condicional do processo nos últimos cinco anos; III) ser reincidente ou na presença de elementos probatórios que apontem conduta habitual, reiterada e profissional; e IV) crimes praticados no contexto de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher em razão do sexo feminino.

Por fim, desde que exista a aceitação do acordo pelo investigado, serão cumpridas, cumulativa ou alternativamente, as seguintes condições à luz do que prevê o artigo 28-A, I: I) reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo impossibilidade de fazê-lo; II) prestar serviços à comunidade com pena reduzida; III) realizar prestação pecuniária; e IV) cumprir outra condição a ser estipulada de acordo com o Ministério Público.

Feitas as considerações acima, observa-se a existência de problemática a ser enfrentada em relação ao acordo de não persecução penal e os crimes de natureza tributária.

Nesse contexto, examinando-se os artigos 1º da Lei 8.137/90 (crime contra a ordem tributária) e 168-A e 337-A do Código Penal (crimes de apropriação indébita tributária e sonegação de contribuição previdenciária), denota-se que essas infrações penais atendem aos requisitos para que haja o oferecimento da proposta de acordo pelo Ministério Público, podendo variar, a depender do caso concreto, somente em relação às vedações previstas na novel legislação para obstar sua concretização.

No entanto, a questão que merece ser examinada reside especificamente na condição de reparação do dano (artigo 28-A, inciso I, do Código de Processo Penal) fixada para elaboração do acordo de não persecução penal. Isso porque, há alguns anos, a política criminal relativa aos crimes de natureza tributária redundou em diversas normas autorizando-se o pagamento do tributo pelo devedor/acusado como fundamento para extinção da punibilidade [2], revelando o intuito de utilização do Direito Penal como mero reforço na arrecadação tributária.

Cite-se, a título de exemplo, a orientação do artigo 83, § 4º, da Lei 9.430/96 [3], que assegura a extinção da punibilidade a qualquer tempo pelo pagamento do tributo, existindo, inclusive, decisões dos tribunais superiores [4] em que se reconhece a benesse até mesmo após a condenação com trânsito em julgado.

Nesse caso, há verdadeiro paradoxo em relação à condição de reparação do dano no acordo de não persecução penal e a própria extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo, visto que o adimplemento figurará como causa de extinção da punibilidade a qualquer tempo da persecução penal. Trata-se, na verdade, de caminho até mais benéfico, pois não exigiria do investigado o cumprimento das demais condições eventualmente acordadas entre as partes (artigo 28-A, II a V) e muito menos a incidência da vedação de novo benefício nos próximos cinco anos ou não oferecimento em razão da conduta habitual, profissional ou reiterada (artigo 28-A, § 2º, II e III). Acrescente-se, ainda, que o acordo de não persecução penal exige a confissão formal e circunstanciada do fato criminoso, o que também não se verifica na norma extintiva da punibilidade.

A própria doutrina apresentou ressalva quanto à peculiaridade da condição de reparação do dano no acordo envolvendo crimes de natureza tributária [5] e, mais recentemente, proferiu-se decisão questionando a postura do Ministério Público de não oferecimento da benesse em relação à mesma infração penal [6].

Em outras palavras, tratando-se de instituto que visa a beneficiar o investigado, uma vez que cria mais uma hipótese de não oferecimento da peça acusatória no sistema jurídico relativizando-se o princípio da obrigatoriedade com a posterior extinção da punibilidade, não faz sentido que seja imposto o pagamento do tributo como condição obrigatória para fins de acordo de não persecução penal, especialmente se houve indicativo da impossibilidade de adimplemento, como dito expressamente na legislação em comento. Ademais, deve-se destacar que o mero parcelamento do tributo, realizado antes do oferecimento da peça acusatória (artigo 83, § 2º, Lei 9.430/96), já é causa suspensiva da pretensão punitiva, tratando-se, assim, de norma também mais benéfica.

Nos casos envolvendo crimes de natureza fiscal, soa desarrazoado fixar o pagamento do tributo como condição inexorável à consecução do acordo de não persecução penal, inclusive porque poderá o Ministério Público ajustar “outras condições” que se revelem necessárias ao caso concreto, a partir da discricionariedade para fins de prevenção e reprovação da infração penal. Além disso, deve ser facultada ao investigado a possibilidade de manifestação a respeito das condições, como forma de alcançar o melhor pacto com base nas peculiaridades do agente e do fato.

Portanto, considerando a possibilidade de recebimento do tributo inadimplido pela via administrativa ou por meio do ajuizamento de execução fiscal pelo Estado, em se tratando dos crimes de natureza tributária, a reparação do dano como condição deve ser excluída quando da formulação do acordo de não persecução penal pelo Ministério Público, uma vez que as normas vigentes de suspensão da pretensão punitiva ou de extinção da punibilidade daquele que busca adimplir sua dívida pelo parcelamento ou pagamento são mais benéficas.

 é advogada criminalista e pós-graduanda em Direito Penal e Processo Penal na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, campus Londrina.

 é advogado criminalista, professor de Direito Penal da PUC-PR e mestrando em Direito Penal pela PUC-SP.

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Celso pede para Moro e Bolsonaro opinarem sobre sigilo de reunião

Inquérito no STF

Celso pede para Moro e Bolsonaro opinarem sobre sigilo gravação de reunião

Em decisão na noite desta terça-feira (12/5), o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, pediu para os representantes do presidente Jair Bolsonaro e do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, opinarem sobre a possibilidade de levantamento do sigilo da gravação de reunião ministerial que consta do Inquérito 4.831.

Ministro Celso de Mello é relator do inquérito no Supremo Tribunal Federal

O material faz parte da investigação sobre as declarações dadas pelo ex-ministro sobre o presidente da República e foi exibido às partes mais cedo, nesta terça. O sigilo decretado pelo ministro foi parcial e temporário, cabendo agora decidir sobre sua extensão.

A decisão do relator também dá poder de opinião ao procurador-geral da República, Augusto Aras. Ele, o advogado de Moro e a Advocacia-Geral da União terão prazo de 48 horas para opinar sobre o regime de sigilo sobre o registro audiovisual da reunião.

O acesso à íntegra da reunião entre Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão, ministros e presidentes de bancos públicos, ocorrida em 22 de abril, no Palácio do Planalto, havia sido pedido pela defesa do ex-ministro da Justiça. Inicialmente, a AGU (Advocacia-Geral da União) solicitou que apenas uma parte da gravação fosse entregue.

Clique aqui para ler a decisão

Inq 4.831

Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2020, 21h59

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Retorno de servidores ao trabalho é decisão da administração pública

Critério de conveniência

Retorno de servidores ao trabalho é decisão da administração pública

Por 

A decisão judicial não pode substituir o critério de conveniência e oportunidade da Administração, no tocante ao retorno de alguns funcionários para atividades específicas, não se podendo imiscuir no mérito do ato administrativo.

Prefeitura de Ribeirão PretoMunicípio de Ribeirão Preto, no interior de SP

Com esse entendimento, o desembargador João Negrini Filho, do plantão judiciário do TJ-SP, acolheu pedido da Prefeitura de Ribeirão Preto e autorizou o retorno de servidores a atividades presenciais, com exceção daqueles que integram o grupo de risco da Covid-19.

O sindicato que representa a categoria entrou na Justiça contra a medida por entender que os servidores ficariam expostos ao contágio pelo coronavírus. Após decisão favorável ao sindicato em primeiro grau, o município recorreu ao TJ-SP e disse que, para a implantação de medidas emergenciais de enfrentamento à epidemia, tais como distribuição de kits de alimentos e pedagógicos aos alunos da rede pública, é indispensável que haja um número mínimo servidores atuando de forma presencial.

Negrini afirmou que a decisão agravada afastou da administração municipal seu “legítimo juízo discricionário de conveniência e oportunidade de organização dos serviços públicos tecnicamente adequados”. Para ele, a decisão recorrida dificulta o exercício das funções típicas administrativas, especialmente aquelas ligadas às ações necessárias à mitigação dos danos provocados pela epidemia.

“Note-se que as funções serão desempenhadas para melhor atendimento das questões escolares, sendo que alunos e professores continuam interagindo à distância, por sistema remoto de ensino. Por fim, consigne-se a necessidade de observação dos cuidados atinentes à saúde dos servidores”, concluiu o desembargador ao deferir a liminar pleiteada pelo município.

2090908-74.2020.8.26.0000

 é repórter da revista Consultor Jurídico

Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2020, 21h57

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Polícia prende suspeito de ameaçar juiz que decretou lockdown

Preso no Paraná

Polícia prende suspeito de ameaçar de morte juiz que decretou lockdown no MA

Juiz Douglas Martins recebia ameaças desde dezembro de 2019 nas redes sociais
Divulgação

A Polícia Civil do Maranhão prendeu o suspeito de ameaçar de morte o juiz Douglas Martins, titular da Vara de Interesses Difusos e Coletivos da Comarca da Ilha de São Luiz, no Maranhão. A prisão contou com o apoio do Centro de Operações Policiais Especiais da Polícia Civil do Paraná.

O magistrado recebia ameaças desde dezembro de 2019, que se intensificaram, no entanto, após ele decretar o lockdown (bloqueio dos serviços não essenciais) em São Luís e mais três municípios da região metropolitana. Uma das mensagens dizia que o juiz iria morrer caso não voltasse atrás na decisão. Imediatamente, o magistrado pediu investigação à Polícia Civil do Maranhão.

A operação conjunta tem o inquérito presidido pelo delegado Odilardo Muniz, chefe do Departamento de Combate a Crimes Tecnológicos (DCCT), órgão da Superintendência Estadual de Investigações Criminais (SEIC), e contou com o apoio da Comissão de Segurança Institucional do Tribunal de Justiça do Maranhão, presidida pelo desembargador Raimundo Barros.

Segundo relato do juiz, o suspeito inicialmente o ameaçou por meio de mensagens privadas, mas depois ficou sabendo que algumas delas haviam se tornado públicas. “Vivemos momentos de muita intolerância em nosso país. As pessoas já não se contentam em divergir e debater ideias diferentes. A diferença de pensamento é natural e necessária”, disse o magistrado.

Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2020, 21h52

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CNMP abre processo contra promotor que teria perseguido Gilmar

Abuso processual

CNMP abre processo disciplinar contra promotor que teria perseguido Gilmar

Por 11 votos a 1, o Conselho Nacional do Ministério Público determinou, nesta terça-feira (12/5), a abertura de processo disciplinar contra o promotor Daniel Balan Zappia, do Ministério Público de Mato Grosso. O expediente tem o objetivo de checar se ele cometeu abuso processual ao propor diversas ações civis públicas contra o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes — familiares do ministro também figuraram em ações propostas por Zappia.

Como Gilmar passou a ser objeto reiterado da atenção do promotor, ao CNMP caberá avaliar se o membro do MP atuou com “excesso de zelo” ou com “nítido abuso processual”.

Gilmar Mendes e familiares foram alvo de seguidas ações por parte do promotor 
Divulgação/AASP

O promotor, que atua em Diamantino (MT), já havia passado por sindicância interna sobre o ocorrido, posteriormente arquivada pela Corregedoria do Ministério Público. Em recurso interno, o plenário do CNMP entendeu que há necessidade de a reclamação ser mais bem elucidada. 

Sindicância 1.00141/2019-12

Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2020, 21h40

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Juíza nega liminar que pedia suspensão do rodízio ampliado em SP

Sem mudanças

Juíza nega liminar que pedia suspensão do rodízio ampliado em São Paulo

Depois de ver três liminares serem concedidas a paulistanos que por razões diversas não poderiam respeitar o rodízio ampliado de veículos, a prefeitura de São Paulo obteve uma vitória nesta terça-feira (12/5): a 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital negou uma liminar que pedia a suspensão da medida tomada pelo prefeito Bruno Covas.

O rodízio ampliado de veículos em São Paulo teve início nesta segunda-feira
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Em sede de ação pública, a liminar foi negada pela juíza Celina Kiyomi Toyoshima, que, em sua decisão, afirmou não ver motivos para suspender o rodízio, criado para diminuir a circulação de pessoas pela cidade de São Paulo durante a epidemia da Covid-19.

“Não há, em princípio, vício formal na edição do Decreto nº 59.402/2020, não cabendo ao Poder Judiciário se imiscuir nas diversas medidas que estão sendo adotadas pelo poder público para contenção do alastramento da pandemia mundial do novo coronavírus (Covid-19), que têm sido baseadas nas orientações proferidas pelos órgãos sanitários, Ministério da Saúde e Organização Mundial da Saúde”, argumentou a juíza.

Cabe recurso da decisão tomada pela magistrada nesta terça. E ela deixou claro que a vitória judicial obtida pela prefeitura paulistana pode ter vida curta. “É prematuro o deferimento da liminar, que poderá ser revista após a vinda da contestação.”

Iniciado nesta segunda-feira (11/5), o rodízio determina que apenas metade da frota pode rodar nas ruas de São Paulo a cada dia. Nos dias ímpares, só podem circular os carros cujas placas terminam também em número ímpar. Nos dias pares, podem sair das garagens apenas os veículos cujas placas terminam em número par. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-SP.

Ação Popular 1022933-87.2020.8.26.0053

Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2020, 21h30

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Sem prova de inatividade, sem auxílio emergencial, diz TRF-4

O desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, manteve decisão liminar que negou o pagamento de auxílio emergencial a uma trabalhadora que não comprovou estar inativa em seu emprego. Ela pediu a concessão do auxílio emergencial pela via judicial após ter o benefício negado pela Caixa Econômica Federal na cidade de Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre.

Trabalhadora não conseguiu sacar auxílio da Caixa
Reprodução

Segundo a decisão do desembargador, a autora não preenche cumulativamente todos os itens previstos no artigo 2º da Lei 13.982/2020, que regula a concessão do auxílio emergencial durante a pandemia do novo coronavírus no Brasil. O despacho foi proferido na segunda-feira (11/5).

Mandado de segurança

A mulher, que trabalha como operadora de loja, ajuizou mandado de segurança contra a Caixa e a União Federal no fim de abril. Ela declarou nos autos que está sem trabalho desde março em decorrência da epidemia. Disse que, segundo a Lei 13.982/2020, beneficiários do programa Bolsa Família estão automaticamente habilitados a receber o auxílio emergencial através de pagamento do valor mais vantajoso entre os dois benefícios.

A 2ª Vara Federal de Canoas indeferiu a liminar requerida para o fim de determinar o imediato pagamento da primeira parcela do auxílio. Para o juiz federal Fábio Hassen Ismael, apesar de a autora ter comprovado, por meio de carteira e contrato de trabalho, ser trabalhadora intermitente, ela não apresentou provas de que está inativa no momento.

Agravo de instrumento

Em combate à decisão, a autora recorreu ao TRF-4 por meio de agravo de instrumento. Repisou os argumentos de que está sem trabalho desde março e que, por ser beneficiária do Bolsa Família, deveria ter recebido o auxílio emergencial na mesma data de pagamento do benefício.

Ao negar o pedido de antecipação da tutela recursal, o desembargador Leal Júnior, da 4ª Turma, reforçou o entendimento do juízo de primeira instância. Ou seja, em sede liminar, o fato de receber o Bolsa Família, por si só, não torna devido o pagamento do auxílio emergencial.

O relator do caso na corte ainda ressaltou que a mulher não apresentou no processo nenhum documento que demonstre a negativa formal do pagamento do auxílio por parte da Caixa.

“Destaco que a agravante afirma ter obtido informações em agência da Caixa, contudo, não veio aos autos um indeferimento formal do auxílio emergencial. Assim, sem oitiva da autoridade impetrada [superintendente da CEF], não é possível afirmar a existência de lesão a direito”, declarou Leal Júnior no despacho monocrático.

O mandado de segurança ainda pende de análise de mérito pela 2ª Vara Federal de Canoas. (Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-4)

Clique aqui para ler a decisão do desembargador

MS 5004089-35.2020.4.04.7112/RS

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Licitação do porto seco de Anápolis enfrenta conflito de liminares

Um conflito de liminares tem gerado insegurança jurídica na licitação para assumir o porto seco de Anápolis, em Goiás. Enquanto uma da Justiça Federal de Anápolis autoriza a continuidade da licitação, outra da Justiça Federal do Distrito Federal determina a suspensão do procedimento.

Porto seco de Anápolis tem sido alvo de guerra de liminares
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Na decisão mais recente, desta terça-feira (12/5), a Justiça Federal de Brasília suspendeu a licitação até o fim do processo. Além disso, ordenou que, caso a Receita Federal finalize o procedimento e assine o contrato, ele será desconstituído.

Anteriormente, a desembargadora Daniele Maranhão da Costa, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, havia revogado sua própria decisão — esta havia impedido a continuidade do processo, conforme determinava liminar da Justiça Federal de Anápolis.

Porém, antes, a Justiça Federal de Brasília já havia determinado, também em liminar, a suspensão da licitação. A decisão atendeu a pedido feito pela Porto Seco Centro Oeste, que é a atual responsável pelo terminal alfandegário

O caso teve início em 2017, quando a Aurora da Amazônia foi a melhor colocada na primeira fase da concorrência aberta pela Receita Federal para operar o terminal. Depois, porém, a empresa foi inabilitada por não cumprir um dos requisitos técnicos do edital.

O terreno apresentado pela empresa para receber o porto seco está fora da zona do Distrito Agroindustrial de Anápolis (Daia), conforme determina Lei municipal 2.508/97. Apesar de o local ser próximo, não configura como área adjacente ao distrito, segundo o poder público municipal. Inconformada, a empresa ajuizou ação na Justiça Federal de Anápolis, que em decisão liminar determinou a continuidade do procedimento, desconsiderando o entendimento do Conselho Municipal da Cidade (Comcidade) e da Procuradoria Geral do Município, que reconheceram que o local não se enquadra como parte do distrito e não pode receber o terminal alfandegário.

Do outro lado, a Porto Seco Centro Oeste, atual exploradora e concorrente no processo licitatório, contestou o resultado da primeira fase da licitação na Justiça Federal de Brasília — que, segundo determina o edital, é a responsável para resolver as questões desta licitação.

Nela, a Porto Seco afirma que a concorrente usou uma manobra, oferecendo uma proposta de preços aparentemente exequível, mas com preços irrisórios. Na proposta comercial foram apresentadas seis tarifas com o mesmo valor (R$ 0,02), o que descumpre o edital, que veda a apresentação de valores “simbólicos, irrisórios ou de valor zero, ou que não comprovem a exequibilidade da proposta” para buscar melhor nota na classificação final. O juiz de Brasília, então, concedeu liminar suspendendo a licitação.

Com isso, foi instaurada a insegurança jurídica no caso. A questão chegou a ser parcialmente resolvida no TRF-1, quando a desembargadora Daniele Maranhão suspendeu a liminar de Anápolis, que mandava continuar a licitação. Porém, no último mês, a desembargadora mudou seu posicionamento, restabelecendo a liminar.

A Porto Seco Centro Oeste já recorreu da decisão, afirmando entre outras coisas que a Justiça de Anápolis não poderia julgar a questão, já que o edital prevê que a Justiça do DF é quem deve julgar as questões envolvendo a licitação.

Assim, até que seja julgado o agravo, as duas liminares seguem válidas, gerando a insegurança na licitação do porto seco, que é o 3º maior do país. A previsão da Receita Federal é de que a estação aduaneira movimente mais de R$ 45 bilhões nos próximos 25 anos.

Clique aqui para ler a decisão

Processos 1008584-29.2018.4.01.3400 (Brasília) e 5470582-64.2019.8.09.0006 (Anápolis)

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Newton e Nuñez: O tribunal do júri após a pandemia

O tribunal do júri é uma problemática obrigatória (Bourdieu, 2009) do campo do Direito e, também por isso, desperta sentimentos e posicionamentos antagônicos. Em meio a uma crise pandêmica, que se mostra muito mais letal que uma simples “gripezinha”, impôs-se um importante questionamento: qual é o futuro do dito tribunal popular? Por se tratar de um tema que nos intriga, quer como pesquisadora, quer como defensor atuante no júri, escolhemos esse como o objeto de análise deste texto.

Muito embora as atividades forenses se encontrem afetadas pela correta e necessária política de isolamento já que ainda há governantes que atribuem aos CPFs um valor infinitamente maior que qualquer CNPJ e, assim, as sessões plenárias estejam suspensas, há, ao menos, uma certeza: ainda que se possa desejar o fim do tribunal do júri, o artigo 60, § 4º, inciso IV, da Constituição da República impede que esse intento se concretize. A partir disso, surge a impossibilidade de sua extinção, de modo que resta saber até que ponto seu formato pode ser modificado, considerando a experiência de funcionamento remoto da atividade jurisdicional promovida pela pandemia. Pensamos, de partida, em quatro cenários possíveis, sobre os quais pretendemos, ainda que sucintamente, discorrer: I) realização das sessões de júri somente com a presença física do juiz e dos jurados; II) realização dos julgamentos virtualmente, com todos os envolvidos distantes; III) realização do júri somente com partes, jurados e juiz, sem o público e sem testemunhas; e IV) suspensão dos júris até que a situação se normalize.

O procedimento pelo qual são julgados os crimes dolosos contra a vida é marcado por uma ritualística própria. Para além do que é visualmente perceptível, como o uso das vestes talares, afigura-se como o único procedimento que conta com uma dimensão pública explícita, isto é, um espaço físico que comporta uma plateia. Ademais, a presença dos jurados, que caracteriza a “participação popular na Justiça”, retira dos magistrados “togados” o poder de produção da decisão e a entrega aos “cidadãos comuns”. Além disso, a dinâmica do julgamento em plenário, que prevê uma nova instrução, esta, para os jurados, evidencia a dimensão ritual do júri. No plenário, as teses da acusação e da defesa podem mudar, de acordo com o andamento do julgamento, o que demonstra que a produção da prestação jurisdicional está ligada, de modo muito estreito, com o ritual público de julgamento

A necessidade do trabalho remoto imposto neste momento, em correto e necessário atendimento às recomendações das autoridades sanitárias internacionais, baseadas em evidências empíricas, isto é, científicas, levou à produção da Resolução nº 314, por parte do Conselho Nacional de Justiça, que regulou o uso da videoconferência nesse período. A resistência ao uso das videoconferências, no caso do júri, a despeito do que se possa pensar em relação a outros contextos da Justiça Criminal, não constitui uma versão pós-moderna e tupiniquim do ludismo jurídico, mas, sim, uma preocupação que ganha sentido, ao analisarmos o funcionamento do júri e a dimensão da produção da verdade judiciária nesse ritual tão específico.

Se nas audiências criminais comuns a instrução probatória de modo remoto, por videoconferência, já nos leva a suscitar uma série de violações aos direitos e garantias processuais, no caso das sessões plenárias do júri o afastamento das partes, um possível isolamento dos jurados e a produção probatória à distância afetam diretamente a produção da decisão judicial, que depende da realização do ritual. Assim, se as sessões remotas poderiam ser justificadas pelo risco de contaminação diante da aglomeração de pessoas, não se pode olvidar do fato de que o tribunal do júri, a despeito de todas as suas solenidades e pompas, aos olhos de uns desnecessárias, é marcado por um dinamismo único, quando contrastado com os demais procedimentos previstos na legislação processual penal e civil. Tal característica fica muito clara ao pensarmos na instrução em plenário e nos debates. O contato imediato da defesa com o réu nesses momentos é imprescindível, o que se mostra impossível por meio do uso da videoconferência mesmo que o acusado se encontre acompanhado de outro defensor, no presídio ou onde estiver. Uma alteração no depoimento da testemunha, caso comparado com a primeira fase, ou mesmo uma contradição produzida diante dos jurados, pode não só mudar a estratégia defensiva, mas a própria forma de inquirição, o que indica a necessidade do contato da defesa com o acusado. Destarte, o manejo da videoconferência fragiliza a garantia da sua plenitude. Com isso já descartaríamos qualquer solução que significasse o afastamento do réu, do ritual.

O livre convencimento imotivado impede saber as razões para os votos dos jurados. Esse é um dos motivos pelos quais o procedimento se torna ainda mais importante, e o valor justiça necessita ser resguardado com mais atenção. A garantia do processo, por meio da forma, é pedra angular nesse procedimento de produção da verdade judiciária e precisa ser levado a sério. O risco de um julgamento contrário à prova dos autos em razão do tédio decorrente das demoras ocasionadas pelo sistema de transmissão de vídeo e som, as alterações na feição ou mesmo de voz do acusado no seu interrogatório, que eventualmente não possam ser percebidas pelos jurados, necessitam ser evitados, o que expõe o perigo no uso de tais tecnologias. O que nos leva a descartar, igualmente, a possibilidade da realização das sessões somente na presença de jurados e juiz. Ainda não podemos esquecer o risco da quebra da incomunicabilidade dos jurados e, por via reflexa, do sigilo das votações, o que impõe o afastamento da ideia do cidadão-juiz remoto.

Em razão dessa resistência ao uso das videoconferências, uma inquietação não pode ser olvidada: o que fazer se os plenários aprazados não se realizarem? Por mais que alguns possam considerar como uma resposta ingênua, é esse o momento propício para que os agentes do Poder Judiciário e do Ministério Público compreendam o caráter excepcionalíssimo que deveria ser atribuído à prisão processual e que a proporcionalidade surgiu como forma de preservação dos direitos e garantias fundamentais, o que nem sempre é observada por manifestações ou decisões performáticas.

O que será que será do júri na pós-pandemia? Descritos os quatro cenários possíveis, nos resta afastar todos que importem na ausência do réu. Ainda, qualquer possibilidade que afete a produção probatória diante dos jurados também se torna inconstitucional. Por fim, considerando que a solução da virtualização completa do ritual, como nos filmes de ficção científica, que criam realidades aumentadas, não estão a nosso dispor, só nos resta, em atendimento aos princípios de direito e garantia dos direitos dos acusados, manter a sua suspensão, evitando decisões definitivas mais gravosas e de modo que possamos, ao voltarmos a nos encontrar, produzir novamente os rituais, buscando a produção da justiça, em contexto e em ação. Para quem quiser usar soluções remotas, restará aos inquietos desafiar com seus risos. É esse o júri constituído por gente e por sofrimentos que são vistos pelos olhos humanos, e não por telas, que será amado e odiado.

 

Referência bibliográfica

BOURDIEU, Pierre. A Economia das Trocas Simbólicas. 6ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2009 [1974].

Izabel Nuñez é antropóloga e advogada, pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e do Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos. Integra a Comissão de Defesa do Estado Democrático de Direito da OAB-RJ.

 é defensor público do Rio de Janeiro e mestre em Direitos Fundamentais e Novos Direitos pela Universidade Estácio de Sá. Foi defensor público do estado de São Paulo (2007-2010).