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STJ estuda retorno das sessões presenciais no início de agosto

Saúde em primeiro lugar

STJ estuda retorno das sessões presenciais no início de agosto

O Superior Tribunal de Justiça estuda a possibilidade de voltar com as sessões de julgamento presenciais no início dos trabalhos forenses do segundo semestre, em agosto. Segundo o presidente da corte, ministro João Otávio de Noronha, tudo vai depender da evolução da epidemia do coronavírus.

STJSTJ monitora epidemia e estuda retorno das sessões presenciais no início de agosto

“Precisamos pensar prioritariamente na saúde das pessoas — ministros, servidores, operadores do direito e todos aqueles que trabalham no STJ. Vamos agir com responsabilidade e cautela. O restabelecimento das sessões presenciais é importante, mas deve ocorrer com o maior grau de segurança possível. Estamos atentos à evolução do quadro da pandemia e às orientações técnicas das autoridades sanitárias”, afirmou o ministro.

Trabalho remoto

O STJ suspendeu as sessões presenciais de julgamento em março, mas manteve a prestação jurisdicional e o atendimento ao público por meio do trabalho remoto.

Os julgamentos por videoconferência vêm acontecendo desde o início de maio. Esse novo formato, para substituir temporariamente as sessões presenciais, foi autorizado pelo Pleno em abril e regulamentado pela Resolução 9/2020. O prazo para as sessões por videoconferência foi prorrogado até 1º de julho pela Instrução Normativa 9.

Permanece em vigor a Resolução 8/2020, que prorrogou por tempo indeterminado as Resoluções 4/2020 e 5/2020. Os normativos estabelecem, entre outras providências, a adoção preferencial do trabalho remoto no tribunal. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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Revista Consultor Jurídico, 3 de junho de 2020, 13h35

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Idoso não pode ser preso por dever alimentos a filha de 37 anos

Por não verificar os requisitos de atualidade da dívida e de urgência no recebimento da pensão alimentícia, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça afastou a possibilidade de prisão civil de um pai de 77 anos por débito alimentar cuja credora, sua filha, atualmente com 37 anos, demonstrou não depender desses valores para se manter.

De acordo com o processo, em 2011, foi feito acordo extrajudicial para suspender o pagamento da pensão, pois o pai não podia mais suportar o encargo. A filha, à época com 29 anos, já trabalhava. Em 2016, o pai ajuizou ação de exoneração de alimentos, na qual a filha afirmou que, de fato, não tinha mais interesse no recebimento da pensão.

Apesar disso, no mesmo ano, ela ajuizou pedido de cumprimento de sentença de alimentos, alegando que a concordância em desonerar o pai da obrigação valia a partir da data do ajuizamento da ação de exoneração, sem prejuízo da possibilidade de cobrança de dívida alimentícia anterior. Nos autos, o juiz determinou a prisão civil do pai, decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Sem urgência

A ministra Isabel Gallotti, relatora do pedido de habeas corpus no STJ, destacou que a filha, na ação de execução, admitiu não precisar dos alimentos, pois era financeiramente independente.

Em consequência, a ministra aplicou ao caso jurisprudência do STJ no sentido de que a execução de obrigação alimentar pelo rito da prisão tem como pressupostos a atualidade da dívida, a urgência e a necessidade do recebimento da prestação alimentícia.

“Dessa forma, reafirmo não ter pertinência o decreto de prisão civil de pessoa idosa, com quase 77 anos de idade atualmente, para pagamento de valores dos quais comprovadamente não necessita a beneficiária dos alimentos para sua subsistência atual, mas que poderá ser adimplida pelo rito da execução prevista no artigo 528, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil de 2015”, concluiu a ministra o conceder o habeas corpus. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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João Felipe Assis: A PEC do Orçamento de Guerra e o Bacen

Aprovar a PEC 10/2020, também conhecida como PEC do Orçamento de Guerra, tem sido visto como essencial para o combate à crise econômica decorrente da pandemia da Covid-19. Ela acrescenta o artigo 115 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Entre outras disposições ela permite que o Banco Central (Bacen) compre títulos em mercados secundários de instituições não financeiras. Isso tem causado preocupação em certos setores, pois existe o medo de que a nossa autoridade monetária comece a descuidar da estabilidade monetária e sofra uma captura pelo governo.

Em diversos países com independência legal da autoridade monetária levantam-se dúvidas sobre a legitimidade dessas burocracias com tantos poderes. No caso brasileiro, em que o Bacen não tem uma independência legal, foi levantado o risco de esse órgão ser capturado pelo governo e, usando seus novos poderes, colocar em risco a estabilidade monetária adquirida desde o Plano Real.

Antes de tudo, temos de entender o porquê de uma autoridade monetária independente. Alan Blinder, ex-dirigente do FED (banco central dos EUA), defende de maneira paradigmática esse arranjo. O controle da inflação é uma meta de longo prazo e os governos teriam foco no curto prazo nomeadamente, no calendário eleitoral. Em diversas situações, a estabilidade monetária exige sacrifícios no curto prazo, algo que os políticos poderiam se recusar a fazer em virtude de uma eleição próxima. Por isso, assim como Ulisses pede para ser amarrado pela sua tripulação para não ser seduzido pelas sereias em A Odisseia, os governos se amarram a um corpo técnico independente: o Banco Central. Nesse arranjo, o Bacen deveria cumprir as metas estabelecidas em lei pelos agentes políticos, mas teria liberdade na forma de executar essas metas. Para isso, os dirigentes dos bancos centrais teriam mandatos fixos [1].

Em resumo, o governo oferece esse poder a uma burocracia não eleita, mas exige transparência e limita sua competência a um tema específico. Em regra, os Bancos Centrais só guardam pela estabilidade de preços e, subsidiariamente, pela higidez do sistema financeiro. Ousar ir na contramão desse modelo seria flertar com a possibilidade de crises inflacionárias.

A história brasileira contribui para esse entendimento. A Lei 4595/64 previa independência e mandatos fixos paras os dirigentes do Bacen. Contudo, alterações ulteriores nos governos militares (em especial durante o governo Costa e Silva) retiraram essa independência legal e usaram o Banco Central para financiar o governo [2]. O resultado disso foram as décadas de hiperinflação. Esse problema só foi controlado pelo Plano Real, que estabeleceu uma independência de fato, mas não alterou a Lei 4595/64. Ou seja: o Bacen não é formalmente independente.

No ano passado, o governo enviou uma proposta de lei completar (PLP 112/19) para conferir mandatos fixos à diretoria do Bacen e fixar como seus objetivos a estabilidade de preços e a proteção do sistema financeiro. A crise do coronavírus virou essa pauta de cabeça para baixo e a ordem do dia passou a ser impedir uma depressão econômica. A PEC do Orçamento de Guerra vai nesse segundo caminho.

Como dito anteriormente, ela autoriza o Bacen a comprar títulos no mercado com autorização do Ministério da Economia e devendo avisar ao Congresso quando faz isso. Isso contorna uma proibição do parágrafo 1º do artigo 164 da Constituição, que proíbe que o Banco Central empreste para instituições não financeiras [3].

Essa ideia não vem do nada. Na crise de 2008, os bancos centrais agiram comprando diversos títulos no mercado financeiro injetando liquidez no mercado e emitindo dinheiro “do ar”, algo admitido pelo próprio presidente do FED da época, Ben Bernanke. Esse fenômeno ficou conhecido como quantitative easing (QE). Havia uma expectativa de que, após dez anos da crise, fosse deixada para trás essa alquimia de criar dinheiro. Christine Lagarde, a atual presidente do BCE (Banco Central Europeu), assumiu o cargo prometendo rever a política de QE, mas o coronavírus a fez voltar atrás e injetar 750 bilhões de euros na economia via QE. Nessa crise, o FED está operando para salvar as pequenas empresas e o Bank of England assumiu que irá financiar o governo com emissão de moeda.

O Brasil, como já foi visto, tem proibições constitucionais de operações de financiamento com as instituições não financeiras. Por isso, a PEC do Orçamento veio para flexibilizar essas restrições. Mas isso não ameaça a estabilidade alcançada desde o Plano Real? É importante tomar algumas lições da nossa história monetária para ter uma resposta a essa pergunta.

O cientista político americano Matthew Taylor, em um estudo sobre o Bacen, aponta um dado interessante: as principais mudanças nessa instituição ocorrem sem grandes mudanças legislativas ou momentos disruptivos [4]. O golpe de 64 criou a lei que instituiu o Bacen e lhe conferiu independência, tirada já no segundo governo militar sem alterar a Lei 4595/64 por completo. A Constituinte de 88 estabeleceu essas proibições ao Bacen e nem assim a inflação conseguiu ser controlada até o Plano Real, que não estabelece de maneira formal a independência de nossa autoridade monetária. Ou seja, há algo mais do que o Direito Positivo no tema da independência dos Bancos Centrais a ser levado em conta.

Bruce Ackermann, professor de direito constitucional de Yale, em seu artigo “A nova separação dos poderes”, sugere que instituições como os Bancos Centrais devam ser incluídos nos desenhos de separação de poderes. Isso porque o núcleo da doutrina da separação de poderes seria da limitação do poder, e não ter três poderes especificamente [5]. Nesse tema, os juristas brasileiros têm debates similares com instituições como o Ministério Público e os Tribunais de Contas.

A PEC do Orçamento de Guerra inclui o Bacen nesse desenho maior. Nos parágrafos do novo artigo 215 dos ADCT, a necessidade de o Bacen informar seus atos nessa crise confere poderes ao Congresso Nacional para sustar as decisões desse órgão. Isto é, existe a previsão de um controle do Legislativo para impedir a captura do Bacen pelo governo no desenho da PEC, ou seja, na própria Constituição.

Evidentemente, isso não é garantia de que não haverá uma captura, afinal como a nossa história mostra os grandes arranjos institucionais não são o suficiente para garantir a estabilidade monetária. Apesar disso, esse é um risco necessário se quisermos combater a crise econômica provocada pela pandemia. O foco parece ser passar a enxergar o Bacen não apenas como um tema para economistas, mas também para o direito constitucional.

Mesmo com o fim da crise (que há de chegar), ainda haverá o dilema enfrentado em países com Bancos Centrais independentes: depositar um grande poder em uma autoridade não eleita. Acreditava-se que as autoridades monetárias não fariam outro QE depois de 2008, mas as crises são imprevisíveis.

O Bacen é um tema que ainda ocupará o nosso debate jurídico. Aliás, em um certo tom de blague, os juristas já estão no centro desse debate mesmo sem perceber. Jerome Powell, presidente do FED, e Cristine Lagarde, presidente do BCE, (dois dos maiores Bancos Centrais do mundo) não são economistas de formação, mas juristas. Falta agora o restante da comunidade jurídica ingressar no debate e se debruçar sobre o Banco Central com a atenção que ele merece. Isso será essencial para que a PEC do Orçamento de Guerra não ameace a independência do Bacen.

 


[1] BLINDER, Alan. Bancos centrais: teoria e prática, São Paulo: Ed. 34, 1999.

[2] FRANCO, Gustavo. A Moeda e a Lei. São Paulo: Zahar, 2017.

[3] cf. Constituição Federal: Artigo 164. A competência da União para emitir moeda será exercida exclusivamente pelo banco central. § 1º. É vedado ao banco central conceder, direta ou indiretamente, empréstimos ao Tesouro Nacional e a qualquer órgão ou entidade que não seja instituição financeira.

[4] TAYLOR, Matthew. Institutional Development through Policy—Making: a Case Study of the Brazilian Central Bank. World Politics 61—3 (2009): 487—515.

[5] ACKERMAN, Bruce. The new separation of powers. Harvard Law Review 113 (2000): 633–729.

 é mestrando em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e licenciado em Direito pela Universidade de Lyon III — Jean-Moulin, na França.

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Entrevista: José Eduardo Cardozo, advogado e ex-ministro da Justiça

José Eduardo Martins Cardozo apareceu e saiu dos holofotes da cena política em dois processos de impeachment. Em ambos, suas teses acabaram derrotadas. No primeiro, como presidente da CPI da Máfia dos Fiscais na Câmara de Vereadores de São Paulo, durante a gestão do então prefeito de São Paulo Celso Pitta (1997-2000), o pupilo do ex-prefeito Paulo Maluf acabou se safando em votação no plenário, em junho de 2000.

Mas o trabalho de Cardozo rendeu a cassação de três vereadores e, na eleição daquele mesmo ano, foi o candidato a vereador mais votado na capital paulista, com quase 230 mil votos.

Em 2016, depois de dois mandatos como vereador, outros dois como deputado federal e cinco anos à frente do Ministério da Justiça (2011-2016), deixou a função de advogado-Geral da União em maio quando a então presidente Dilma Rousseff foi afastada pela Câmara dos Deputados. Passou a atuar como advogado particular da petista durante o processo de impeachment no Senado.

Nos embates com Janaina Paschoal, uma das coautoras do pedido contra Dilma, a hoje deputada estadual pelo PSL levou a melhor na batalha. E acabou sendo eleita em 2018 com a votação mais expressiva (2.060.786) na história da Assembleia Legislativa de São Paulo.

Cardozo se retirou da vida política e voltou a ser advogado e professor. Procurador do Município de São Paulo aposentado, hoje advoga e dá aulas na capital paulista (PUC) e em Brasília (UniCEUB).

Em entrevista exclusiva à ConJur, bateu no ativismo judicial, defendeu sua gestão à frente do Ministério da Justiça durante os governos Dilma  (2011-2016) e lembrou da pressão que sofreu tanto do seu partido [PT] quanto da oposição por suposta falta de “controle” sobre as ações da Polícia Federal.

Lembrou de quando foi convocado para depor no Congresso: “Das duas, uma, ou eu não controlo [a PF] ou eu instrumentalizo. Decidam. Na verdade, não era nem controlar nem instrumentalizar, é saber respeitar o Estado de Direito, só isso”.

Cardozo criticou os “engenheiros de obras prontas” nos casos da “Lei Anticorrupção” e do instituto da delação premiada, ambas sancionadas por Dilma e ferramentas essenciais nas condenações proferidas pelo então juiz Sergio Moro.

Quando você faz uma lei, é a partir da análise do momento em que é elaborada. Nunca imaginei que fosse ser utilizada da forma abusiva que foi.”

Na conversa de mais de 2 horas pelo telefone, o professor falou muito sobre impeachment, do acordo de cooperação investigativa com os Estados Unidos, de Constituição, do governo Bolsonaro e do nosso ordenamento jurídico.

“Não foi o ordenamento jurídico que falhou [nos abusos cometidos pela “lava jato”]. Foram os homens que operavam o ordenamento jurídico que falharam. Pelo Estado de Direito, os fins não justificam os meios. Pelo Estado de Direito, não poderiam ter feito coisas como foram feitas, condenações sem provas, condenações por convicções, condenações midiáticas, operações feitas para chamar atenção da opinião pública.” 

Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

ConJur — Na entrevista em que anunciou que deixava o governo, o então ministro Sergio Moro [Justiça] citou vocês [governos Lula e Dilma]. Disse que a Polícia Federal não sofreu interferência direta como viria a sofrer neste atual governo. Não deixa de ser um elogio, mas também não foi temerário deixar o consórcio formado a partir da 13ª Vara Federal de Curitiba operar com tamanha liberdade?
José Eduardo Cardozo — É uma crítica que tenho ouvido muitas vezes. Lembro da época que até fui criticado por alguns companheiros. Por adversários também, quando uma investigação chegava aos deles.

Diziam que estava instrumentalizando a Polícia Federal contra eles. Fui até chamado no Congresso. Estava em curso uma investigação que falava do cartel do Metrô de São Paulo. Tinha mandado abrir uma investigação e me chamaram para dizer que eu estava intimidando o Congresso, instrumentalizando a Polícia Federal.

Falava: das duas, uma, ou eu não controlo ou eu instrumentalizo. Decidam. Na verdade, não era nem controlar nem instrumentalizar, é saber respeitar o Estado de Direito, só isso. Não se  pode interferir numa investigação, a não ser em casos de abusos, abrindo inquéritos. E isso foi feito em todos os casos por mim quanto pelo Leandro Daiello, que era o diretor-geral da Polícia Federal.

ConJur — Mas houve muito abuso, não? Fica a impressão de que Polícia Federal e Ministério Público são incontroláveis, sem hierarquia.
Cardozo — Estes órgão têm autonomia investigativa, mas não têm autonomia para cometer abusos. Várias inquéritos foram abertos quando se tinha vazamento. Aliás, vou ser bem sincero. Na “lava jato”, parte daquilo que a imprensa falava em vazamento, era Moro quem já tinha levantado o sigilo de inquérito. Então não havia ilegalidade. Agora, se alguém da força-tarefa indicava aos jornalistas páginas do processo… Mas era público.

Muitas vezes a Polícia Federal é a parte visível das operações porque faz a busca, a prisão. A Polícia Federal apenas cumpre o que um juiz determina.

O ministro da Justiça não tem como punir delegado, mesmo que ele ache que a ordem judicial é arbitrária. Você está cumprindo ordem judicial. Quem tem que fiscalizar abusos do Judiciário não é o ministro da Justiça. É o CNJ (conselho da Justiça), o CNMP (conselho do Ministério Público).

Essa má compreensão das instituições que funcionam num Estado de Direito tem uma mentalidade autoritária. Cobra agir com os amigos diferente do que se age com os adversários. E isso fazia com que nós sofrêssemos muitas críticas de descontrole.

ConJur — Em 2014 o FBI já tinha feito grandes acordos no combate à corrupção no Brasil. Em 2013 Dilma havia sancionado a chamada “Lei Anticorrupção” e também oficializado o instituto da delação premiada. Não foi o conjunto dessas ações que possibilitou quase todas as condenações de Moro?
Cardozo — Era um projeto de lei muito antigo. Nós apoiamos. Quando você faz uma lei, é a partir da análise do momento em que é elaborada. Nunca imaginei que fosse ser utilizada da forma abusiva. Na verdade, visava combater organizações criminosas. Era necessária para enfrentá-las.

Agora, prender pessoas para delatar. Nunca imaginei que fossem dar uma latitude tão grande a isso. Hoje, pela experiência, acho que essa lei tem que ser aperfeiçoada para evitar o abuso de poder. Naquela época não tínhamos essa avaliação. Você nunca prevê o futuro.

Achava que as pessoas iam utilizar essa lei dentro das finalidades que ela estabelece e não utilizando a lei como pretexto para verdadeiros atos de tortura, quando o investigador vem e diz: “ou fala o que eu quero ou continua preso”.

Então, me admiro também, muitas vezes, alguns engenheiros de obras prontas. No momento em que a lei foi aprovada, não falaram nada.

ConJur — Houve cooperação da força-tarefa de Curitiba diretamente com investigadores dos Estados Unidos sem o governo federal ser informado. O que o senhor tem a dizer?
Cardozo — A Polícia Federal tem acordos de cooperação com polícias do mundo inteiro, não só com os Estados Unidos. Evidentemente eu não sei te dizer que tipo de contatos foram utilizados pela força-tarefa, Ministério Público e Polícia Federal com o acordo de cooperação. Há muita especulação sobre isso. Sou daqueles que não falo por convicções, só com provas.

Então, sinceramente, acho que não tenho como falar de fatos que eu não sei e que pesa haver muita especulação a respeito.

ConJur — Anos depois, como o senhor avalia a operação “lava jato”. Está enfraquecida?
Cardozo — A “lava jato” tem dois lados. Uma intenção muito boa e um propósito excelente que é o combate à corrupção. A corrupção é um dos grandes malefícios do Brasil historicamente.

Mas tem um lado perverso. No Estado de Direito, os fins não justificam os meios. E em face dessa situação eu vi na operação situações extremamente abusivas. Aquelas que competiam à Polícia Federal eu mandei abrir sindicância. Todavia, vi uma série de abusos no âmbito do Poder Judiciário e no âmbito do Ministério Público.

Prisões indevidas, temporárias, cautelares, apenas com o objetivo de intimidar, de criar fatos midiáticos ou delações premiadas. Situações de perda de imparcialidade. Aliás, todas elas agora escancaradas pelas divulgações do The Intercept Brasil.

Então vejo um lado perverso, demoníaco, que prestou um grande desserviço ao país, que é exatamente essa burla da legalidade, responsável pelo desequilíbrio de poder. Acho que seria perfeitamente possível, como todos os países do mundo fazem, combater a corrupção de frente, sem comprometer a saúde das empresas. A “lava jato” acabou provocando, no Brasil, problemas e danos econômicos seríssimos.

Nós tentamos dialogar com o Ministério Público justamente para punirem as pessoas físicas que tinham feito isso. Punir o CPF, mas não punir as empresas.

ConJur — Nosso ordenamento jurídico falhou?
Cardozo — Não foi o ordenamento jurídico que falhou. Foram os homens que operavam o ordenamento jurídico que falharam. Pelo Estado de Direito, os fins não justificam os meios. Pelo Estado de Direito, não poderiam ter feito coisas como foram feitas, condenações sem provas, condenações por convicções, condenações midiáticas, operações feitas para chamar atenção da opinião pública ao invés de uma finalidade de investigação.

ConJur — Uma avaliação da gestão de Moro à frente do Ministério da Justiça.
Cardozo —  Logo que ele aceitou, para meu espanto, um ministério daquele que indiretamente ajudou a eleger, achava antiético. Dizia também o seguinte: pelo perfil que eu observava, Jair Bolsonaro, que eu conheci, porque fui deputado com ele, e Sergio Moro, que observei como juiz, a situação era incompatível sem que um se submetesse ao outro.

E neste pouco mais de um ano que esteve no Ministério da Justiça a atuação ficou muito a desejar. Se limitou ao tal do “pacote anticrime”. Se tivesse sido aprovado na versão que ele mandou para o Congresso, seria um desastre. Vi também uma postura muito acanhada como ministro durante a crise do coronavírus. Ele sumiu.

ConJur — O senhor publicou recentemente um artigo aqui na ConJur em que defende decisão liminar que impediu a posse do novo diretor-geral da Polícia Federal escolhido pelo presidente.
Cardozo — Exato.

ConJur — No mesmo texto, porém, discorda de uma também decisão monocrática do STF, em 2016, que impediu a posse do ex-presidente Lula como ministro da então presidente Dilma. Pode explicar melhor?
Cardozo — Tenho sido muito crítico do ativismo judicial. Julgar significa aplicar dentro das possibilidades daquilo que a lei e a Constituição dizem. Não pode ser aquilo que eu quero que a Carta diga. Descalibra o Estado de Direito. Feita a ressalva, digo que a teoria do controle de atos administrativos pelos textos jurídicos é uma norma antiga e pacífica. Vem do Direito francês e tem relação com a aplicação do princípio da legalidade. Se no Estado de Direito é a lei que determina o que é interesse público, o ato administrativo perfeito tem por finalidade alcançá-lo. Se um ato administrativo concretamente praticado se desvia da finalidade que a lei consagra, é um ato ilegal. E se é ilegal, o Judiciário tem o dever de anular. Normalmente, os autores brasileiros e estrangeiros afirmam que o desvio de poder não exige uma prova documental, digamos assim, absoluta, mas que ele se revela por um conjunto de indícios que somados mostram a finalidade desviada do ato. Exigir recibo de desvio de poder é a mesma coisa que exigir recibo de corrupção. Você prova por um conjunto de indícios.

No caso do presidente Bolsonaro, parece que fica claro, com o conjunto de indícios que mostram a correção da decisão do ministro Alexandre de Moraes. A renúncia de Moro isolada, por si só, não seria um conjunto de indícios.

Bolsonaro já disse que teve que pedir quase de joelhos para a Polícia Federal investigar uma coisa que poderia mostrar a inocência dos seus filhos. O presidente da República nem manda nem pede investigação para preservar quem quer que seja ou para punir quem quer que seja. Quem conduz uma investigação, pela lei, é o delegado de polícia. O ministro da Justiça e presidente da República são apenas superiores administrativos da Polícia Federal. Isso não lhes dá o direito de pedir investigação, até porque num caso desse tipo em que eu queira proteger alguém, isso obviamente tem a ver com a ausência do princípio da impessoalidade, que está previsto no artigo 37 da Constituição.

O Executivo tem liberdade para escolher quem queira nomear, mas se junto de evidências que cercam a nomeação ou qualquer ato administrativo mostrar que esta nomeação se destina a desrespeitar a lei, aí é desvio de poder.

ConJur — E o caso do ex-presidente Lula?
Cardozo — Vamos aos fatos. Primeiro, Moro divulga ilegalmente um áudio descontextualizado. Hoje fica cada vez mais claro que, se tivesse divulgado todos os áudios que envolviam aquela conversa vazada, nós saberíamos que Lula não queria ser nomeado justamente para que não dissessem que ele estava tentando se livrar da prisão. Mas naquele momento não eram conhecidas as descontextualizações do áudio.

Esse áudio é a razão de ser da decisão do Supremo, uma prova ilícita que a Corte [decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes] não sabia que era.

Mas mesmo que não fosse ilícita, a presidente, claramente, por meio de seus ministros, em uma nota oficial, disse que não confirmou aquele diálogo nesse sentido. Explicou que o sentido era outro. Lula não tinha aceitado naquele momento. Só poderia ir à posse já marcada de dois ministros numa sexta-feira porque acompanharia dona Marisa ao hospital.

Então o que eu tenho juridicamente é uma prova ilegal, que pedia uma interpretação, não confirmada pela presidente. O Supremo então tinha que ter esse contexto. A teoria do desvio de poder é a mesma a qualquer ato administrativo, só que no caso de Lula e Dilma não havia a certeza.

ConJur — Sobre impeachment. Se Eduardo Cunha não tivesse poder regimental de timing do processo, o desfecho poderia ter sido outro?
Cardozo — Não tenho a menor dúvida que sim. A bola propulsora do impeachment foi Eduardo Cunha, que contou com o apoio do grupo comandado por Aécio Neves.

Esse grupo não concordava com o resultado das eleições de 2014. E desde o primeiro dia tentou articular razões para o impeachment. Recontagem, que as máquinas de votação não funcionavam. Moveram tudo o que podiam. Aí, quando nada deu certo, foram para o impeachment. Contavam com Cunha porque o o presidente da Câmara queria controlar o governo para parar a “lava jato”. Ele não escondia isso.

E a gota d’água foi quando Dilma não comandou o PT, e nem deveria, para que o partido votasse contra o pedido de processo de cassação dele.

ConJur — O senhor não acha que o presidente da Câmara acumula muito poder?
Cardozo — Acho que a legislação do impeachment, como um todo, é muito antiga. Consegue ser mais velha do que eu, de 1950 [Cardozo nasceu em 1959].

Houve até um pedido do PCdoB, que entrou com uma ação no Supremo para criar regras depois do impeachment já aberto. Houve uma decisão do ministro [Luís Roberto] Barroso, e o STF acatou as regras como base do julgamento do presidente Fernando Collor. É necessária uma nova lei que rediscipline o impeachment. Precisa ser ajustada à Constituição de 1988, ao espírito democrático dela, inclusive dessa questão da abertura do processo de impeachment.

ConJur — No impeachment de Dilma, muitos defenderam que os crimes de responsabilidade tenham natureza penal. Outros defendem que são de natureza política.
Cardozo — O  fato dele ser chamado de crime não o transforma num processo penal, até porque um presidente pode ser condenado penalmente ou não condenado penalmente e ter ou não ter um processo de impeachment.

São responsabilizações diferentes, o que não afasta a necessidade de ter pressupostos jurídicos. A diferença entre o presidencialismo e o parlamentarismo, uma delas, está justamente no fato que quando um presidente perde a maioria parlamentar, ele cai. No presidencialismo, não. Então isso mostra que não basta perder a maioria parlamentar, é necessário juridicamente ter pressupostos e um ato ilícito grave sobre o qual se abre defesa para que se perca o mandato.

Ora, portanto não é um processo só político, em que basta a conveniência. É necessário demonstrar a ocorrência de um fato que justifique o crime de responsabilidade.

ConJur — O senhor acha que a presidente Dilma não cometeu crime. E o presidente Bolsonaro?
Cardozo — Não tenho a menor dúvida. Tinha muita dúvida antes, nos últimos meses. Porque os primeiros atos dele foram irracionais, destemperados, falava-se muita bobagem. Falar bobagem e mostrar situações de descompasso com a racionalidade não são crimes de responsabilidade.

A partir do momento em que passa a participar da convocação de atos antidemocráticos. Em que tenta utilizar o seu poder para interferir nas investigações, isso a meu ver configura crime de responsabilidade.

Agora, há um juiz de conveniência e oportunidade que compete ao Congresso. O presidente pode partir para o ilícito e entender que não é caso de impeachment porque seria pior para a sociedade tirá-lo do que ele ficar. Então, por isso que é um processo jurídico-político.

ConJur — Alguma sugestão de como deveria ser redesenhado o processo de impeachment no presidencialismo brasileiro?
Cardozo — Tenho duas sugestões. Uma micro e outra macro. A micro é uma nova lei, uma perspectiva que seja mais segura, para garantir  o contraditório.

Numa perspectiva maior, daí eu falo das minhas convicções, que não são nem as do meu partido. Sou parlamentarista, acho o presidencialismo um sistema que traz instabilidade política e insegurança. Então, pessoalmente, se pudesse, proporia para o país o semipresidencialismo, que acho que se ajustaria muito bem à realidade histórica e cultural brasileira, nos moldes que existe em Portugal e na França. E isso casa com o voto distrital misto, que é o sistema alemão. Tudo isso qualificaria o sistema perfeito? Não, porque não existem sistemas perfeitos nem democracia perfeita, embora seja o melhor dos sistemas.

ConJur — Acha que o inquérito autorizado pelo Supremo contra Bolsonaro pode canalizar a decisão para o Judiciário em vez de ficar no Congresso?
Cardozo — Pode. A Procuradoria-Geral da República teria que denunciá-lo. Aí a autorização para abertura do processo pode implicar no seu afastamento. Claro, até o julgamento do processo. Então, talvez, se isso vier a acontecer, seria a maneira mais rápida, dentro da Constituição, desde que provado que ele praticou o crime. Ele pode ser afastado.

ConJur — Sobre Constituição. O senhor acha que ruiu esse modelo de 1988?
Cardozo – Não. Sou um defensor da Constituição de 1988, embora ache que existem algumas questões que nós devemos discutir para aperfeiçoá-la. O grande mérito dela é que firmou um Estado Democrático de Direito e assegurou direitos fundamentais e instituições como nunca antes nós tivemos na nossa história.

Evidentemente que há aspectos, por exemplo, em que acho que não andou bem. A reforma agrária, por exemplo. A Constituição de 1946 é um pouco mais avançada do que a nossa atual. Mas, de modo geral, é uma Constituição avançadíssima dentro da nossa história.

ConJur — Um dos argumentos utilizados para o impeachment de Dilma era a questão orçamentária, equilíbrio fiscal, que está dentro desse desenho da Constituição.
Cardozo — Sou favorável ao equilíbrio fiscal. Acho que nenhum governo pode ser irresponsável com as suas contas. O que eu sou contra é o engessamento que foi feito não pela nossa Constituição, mas por aquela emenda ao longo do governo Temer [2016-2018], que engessa teto de gastos. Aí é um pecado introduzido pelo Michel Temer.

ConJur — A emenda do teto de gastos e a reforma trabalhista redesenharam a Constituição?
Cardozo — Acho que trouxe grandes marcas à Constituição. Ou seja, o mal não está na estrutura da Constituição de 1988, está em certas questões que foram nela introduzidas, a meu ver incompatíveis a seu próprio espírito. O Congresso decidiu. A reforma trabalhista foi muito ruim. O teto de gastos foi péssimo. Não é questão para ser tratada em Constituição. A Carta Magna tem que colocar os grandes princípios. Ali se tentou agradar o mercado e realmente se esqueceu que o Estado Democrático de Direito do Brasil é um Estado social.

ConJur — Na campanha de 2018 Fernando Haddad chegou a defender uma nova Constituição. O que o senhor pensa a respeito?
Cardozo — Não concordo. Acho que o redesenho constitucional do Brasil hoje vai sair pior a emenda que o soneto. Uma Constituinte hoje, no clima que nós vivemos no Brasil de intolerância, de ódio disseminado, onde o símbolo da arminha prevalece ao símbolo do coração. Diria que seria uma Constituição do ódio, não da pacificação e não da estruturação de um Estado democrático, como faz a de 1988.

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Alíquota progressiva previdenciária equivale a confisco de salário, diz juiz

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O regime de progressividade das alíquotas de contribuição previdenciária estabelecido pela Emenda Constitucional nº 103/2019 viola o princípio do não confisco e fere a razoabilidade da tributação. Com esse entendimento, o juiz Renato Coelho Borelli concedeu liminar para suspender a regra do artigo 11 da reforma da previdência, a pedido da Associação dos Juízes Federais do Brasil.

Questão ainda será julgada pelo STF

Com isso, a União não poderá implementar o desconto das novas alíquotas nos contracheques de todos os juízes federais encampados pela associação, permanecendo o mesmo patamar de contribuição vigente antes da promulgação da emenda constitucional, de 11%. Pela reforma da previdência, esse percentual previu variação de 14% a 22%, a depender dos vencimentos.

Isso faria com que, em alguns casos, a carga tributária suportada por juízes federais em seus pagamentos fosse de mais de 40%, somados a contribuição previdenciária e o imposto de renda incidente sobre vencimento ou provento. Na avaliação do juiz Renato Coelho Borelli, a medida fere o princípio do não confisco.

“Entendo que por mais que sejam relevantes as razões atuariais que levaram à aprovação da EC 103/2019, não se pode considerar razoável uma tributação que alcança quase a metade dos vencimentos ou proventos dos servidores e pensionistas”, apontou.

A norma foi contestada por algumas entidades de classe no Supremo Tribunal Federal, que ainda não se manifestou sobre sua constitucionalidade

“A despeito de inexistir norma prevendo especificamente o montante ou percentual a ser considerado como confisco, o certo é que a norma constitucional deve ser entendida como uma exigência de razoabilidade da tributação. Nesse ponto, convém salientar que o entendimento doutrinário e jurisprudencial é no sentido de que a razoabilidade da tributação deve ser aferida a partir da carga tributária imposta por um mesmo ente, e não de cada tributo isoladamente”, destacou o magistrado.

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1009622-08.2020.4.01.3400

 é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 13 de maio de 2020, 20h15

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TCU ordena devolução de auxílio emergencial recebido por militares

Servidores não estão entre aqueles que podem receber o auxílio emergencial, segundo a Lei 13.982/2020. Por isso, o ministro do Tribunal de Contas da União Bruno Dantas determinou, em liminar, que os Ministérios da Defesa e da Cidadania não concedam o benefício a militares, cancelem os cadastros já feitos e obtenham a devolução dos valores pagos irregularmente.

73,2 mil militares receberam, de forma irregular, o auxílio emergencial

O Ministério da Defesa informou que 73,2 mil militares das Forças Armadas receberam o auxílio emergencial de R$ 600. Segundo o TCU, esse contingente representaria, no

mínimo, R$ 43,9 milhões pagos na primeira parcela e poderiam chegar a R$ 131,8

milhões caso as três parcelas sejam pagas.

O objetivo da concessão do benefício é proteger pessoas em situação de vulnerabilidade social, como trabalhadores informais e de baixa renda — além de reduzir os impactos econômicos das medidas de combate ao coronavírus.

A equipe de fiscalização da Secretaria de Controle Externo da Gestão Tributária da Previdência e da Assistência Social (SecexPrevidência) apresentou representação ao TCU, argumentando que a Lei 13.982/2020, que criou o auxílio emergencial, não autoriza que servidores públicos o recebam.

Ao conceder a liminar, Bruno Dantas afirmou que há fumaça do bom direito, pois os Ministérios da Defesa e da Cidadania reconheceram o recebimento do benefício por militares, e não há previsão legal que os torne aptos a obter o auxílio. Além disso, o ministro disse haver perigo da demora, já que a segunda parcela do programa está prestes a ser paga.

Dantas também determinou que o Ministério da Defesa informe ao TCU as medidas tomadas para apurar eventuais faltas funcionais dos militares que solicitaram o auxílio emergencial e para prevenir novas ocorrências de militares envolvidos em pedidos indevidos de benefícios sociais.

Além disso, o ministro ordenou que os Ministérios da Defesa e da Cidadania identifiquem os militares e demais servidores federais, estaduais e municipais que estão na lista de beneficiários do auxílio emergencial.

Enquanto isso

O Ministério Público Federal pediu a revisão de todos os pedidos de recebimento do auxílio emergencial negados no país.

Na ação, o procurador da República Oscar Costa Filho aponta que diversas pessoas que preenchem os requisitos para receber o benefício tiveram seus requerimentos negados pelo sistema da Caixa Econômica Federal.

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Processo 018.851/2020-7

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.

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Toffoli anula suspensão de ICMS e ISS em São Luís e Aracaju

Na crise do coronavírus, não cabe ao Judiciário decidir quem deve ou não pagar impostos ou quais políticas públicas devem ser adotadas. Com esse entendimento, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, anulou decisões que haviam suspendido a cobrança de ICMS e ISS — em São Luís e Aracaju, respectivamente.

Toffoli afirmou que não cabe ao Judiciário decidir quem não paga imposto
G.Dettmar /Agência CNJ

No caso da capital maranhense, o Tribunal de Justiça suspendeu, por seis meses, a cobrança de ICMS a uma empresa. Toffoli afirmou que a decisão pode gerar grave dano à ordem público-administrativa e econômica de São Luís.

“Não se ignora que a situação de pandemia, ora vivenciada, impôs drásticas alterações na rotina de todos, atingindo a normalidade do funcionamento de muitas empresas e do próprio Estado, em suas diversas áreas de atuação. Mas, exatamente em função da gravidade da situação, exige-se a tomada de medidas coordenadas e voltadas ao bem comum, não se podendo privilegiar determinado segmento da atividade econômica, em detrimento de outro, ou mesmo do próprio Estado, a quem incumbe, precipuamente, combater os nefastos efeitos decorrentes dessa pandemia”, apontou.

De acordo com o ministro, cabe ao Executivo e ao Legislativo decidir que políticas públicas — incluindo tributárias — devem ser adotadas no momento. E o Judiciário só deve intervir em caso de ilegalidade ou inconstitucionalidade.

Segundo Toffoli, a suspensão de ICMS não pode ser determinada de forma isolada pela Justiça, sem uma análise de seus impactos no orçamento municipal. Até porque uma decisão do tipo pode ser repetida em inúmeros processos, esvaziando os cofres públicos em um momento em que é preciso ter recursos para combater a epidemia.

Em outra ação, o ministro já havia anulado decisão do TJ-SP que havia suspendido o pagamento de IPTU à capital paulista por uma empresa específica.

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STP 185 (São Luís) e SS 5.373 (Aracaju)

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.

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Automatização vai impedir STJ de julgar mesma tese mil vezes

Se uma decisão judicial está em conformidade com a orientação predominante e de força vinculante das cortes superiores, então ela não pode chegar ao gabinete dos ministros. A automatização da triagem processual e, de forma geral, os investimentos em informática serão os responsáveis por garantir que isso não aconteça.

STJ

Essa é a visão do presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, para garantir a eficiência da corte diante da previsão do aumento de casos por conta da crise decorrente da pandemia.

O presidente do STJ, que permanece no cargo até o final de agosto, falou sobre o tema durante o seminário virtual Saída de Emergência, produzido pela TV ConJur e que teve como tema Judiciário, Mediação e Direito Privado.

Mediador do evento, Otavio Rodrigues, do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e da USP, indagou sobre o planejamento da corte para combater o “surto de processos” que se anuncia, após o surto do coronavírus.

“Não cabe ao STJ ficar julgando qualquer coisa, mil vezes a mesma tese. Não existe isso no mundo. Precisamos continuar investindo no parque tecnológico, na automatização. E usar a tecnologia para valer”, afirmou o ministro, que citou dois núcleos, responsáveis pela triagem e identificação de processos, já com uso de tecnologia de ponta: Núcleo de Admissibilidade e Recursos Repetitivos (Narer) e Núcleo dos Recursos Repetitivos (Nurer).

Eles atuam com programas desenvolvidos pelo setor de tecnológica de informação para que determinados processos sequer cheguem ao sistema da corte. “Se está em conformidade com a orientação predominante, se foi julgado com força vinculante, ele impede que isso chegue ao gabinete. Estamos melhorando o processo de triagem”, explicou o ministro.

Desta forma, o STJ consegue diminuir o “tempo morto do processo” — aquele em que, após os prazos para o advogado, o caso tramita dentro da corte. A pandemia, afirma Noronha, serviu inclusive para apresentar outras possibilidades tecnológicas tais como a ampliação do julgamento virtual e a realização de sustentação oral por videoconferência.

“O que precisamos fazer é continuar investindo. E melhorar a qualidade da decisões nas instâncias ordinárias. Julgar contra uma súmula, uma orientação predominante nada mais é do que trazer custo ao erário. Precisamos de uma Justiça mais harmoniosa. Do tribunal superior ao juiz de primeiro grau, é preciso impor entendimento sem que isso sacrifique o princípio do livre convencimento, que é motivado nos fatos, não na tese. Quem dá a última palavra é o tribunal superior”, apontou.

Justiça gratuita

O ministro defendeu, ainda, um reajuste das custas do Judiciário para alcançar um ponto de equilíbrio. Se hoje ele considera que é muito barato litigar, é preciso readequar, mas sem inviabilizar o acesso à Justiça.

Esse aspecto foi destacado pelo professor Eneas Matos, da USP, que participou do seminário e criticou a falta de boa fé ao buscar o benefício da Justiça gratuita, o que faz com que pobres precisem provar que são pobres.

“No congresso, tramite um projeto de lei que cria o Fundo Judiciário. Ele reajusta as custas judiciais, e todo dinheiro fica para a modernização tecnológica da Justiça Federal. Será proibido usar qualquer verba para pagar salário ou o que for. Exclusivamente para adquirir equipamentos necessários à boa gestão da Justiça. Vamos ter que discutir seriamente as custas judiciais. Mas elas não podem inviabilizar o acesso à Justiça”, destacou Noronha.

Assista abaixo ao seminário:

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Mediação é saída mais eficiente para entraves do Direito Privado

No momento em que a crise causada pela epidemia impacta profundamente as relações contratuais no Brasil, levar as demandas por renegociação e readequação ao Judiciário não é uma saída viável. A mediação surge como opção mais eficiente.  É a opinião dos especialistas que participaram, nesta segunda-feira (11/5), de debate promovido pela TV ConJur.

ConJur

O seminário virtual “Saída de Emergência” teve como tema Judiciário, Mediação e Direito Privado e foi mediado por Otavio Rodrigues, do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e da USP. Ele abriu os trabalhos destacando iniciativas como o Projeto de Lei 1.179/2020.

Para o presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, a saída para a crise não está no ajuizamento de demandas, mas na renegociação — preferencialmente fora dos autos judiciais. Ela deve ser feito caso a caso, de acordo com as especificidades de cada relação contratual.

“Não adianta querer cobrar das empresas aéreas, que agora não têm faturamento. Dinheiro não se inventa. Não se pode permitir que se faça a revisão de todos os contratos se o direito decorresse para todos. Isso não pode ser verdade. Temos segmentos que estão se beneficiando da crise, funcionando normalmente. E outros, profundamente prejudicados”, afirmou o ministro.

O presidente do STJ destacou que o ideal seria que toda demanda passasse por tentativa de mediação antes da chegar ao Judiciário, que já está combalido em cenário que deve piorar por conta da crise. “A melhor maneira de intermediar o diálogo entre as partes é a mediação. Ela não é da nossa tradição, nossa cultura. Não vamos impor da noite para o dia. Mas precisamos continuar tentando, como estamos fazendo”, disse.

Diante desse cenário, o advogado e professor da USP Eneas Matos aponta como positivas iniciativas como a do Conselho Nacional de Justiça, que estuda a instituição de uma plataforma online para mediação, o que pode facilitar o processo e diminuir os custos.

“As partes conseguirem chegar a um acordo com boa-fé traz resultado mais eficaz e rápido para o Judiciário. Vamos ter a vantagem na questão do abarrotamento de processos. E tem algo que não podemos esconder: o aumento do número de demandas. Toda crise faz aumentar as demandas, e isso traz um custo elevado. Com a plataforma, podemos diminuir os custos”, apontou.

Destravamento e cooperação

Dentre os benefícios para adoção da mediação apontados durante o evento, a professora Maria Cândida Kroetz, da UFPR, destacou a manutenção de uma das premissas do Direito Privado: a liberdade. Ao buscar um reequilíbrio do contrato pela mediação, as partes assumem de novo uma autonomia para fazer essa repactuação.

“Só os próprios envolvidos vão saber quais são as necessidades e como a crise impactou a relação entre eles. Eles precisam de um campo, um espaço para isso, e é o que a mediação oferece. Às vezes a gente pensa em algo vinculado ao processo judicial, mas a mediação oferece outras possibilidades”, explicou. 

Já o advogado Gabriel Nogueira Dias chamou atenção que a preocupação número 1 das empresas nesta crise econômica é o travamento das cadeias produtivas. Empresa que é credora, muitas vezes, é também devedora. Pela mediação ou pela via judicial, será necessário impedir que haja esse travamento.

“A função da Justiça é ser meio para uma solução, não para mais confusão. Aí acho que é perfeita a ideia de separar o joio do trigo: permitir o que é legítimo por parte da necessidade das partes não terem chegado a um acordo em comparação com o que é mero oportunismo. Não podemos, enquanto advogados, tornar a crise um meio para oportunismo”, disse.

Ele ainda destacou dados que indicam o aumento das mediações realizadas e a desjudicialização, mas apontou que ainda há falhas no processo: demora excessiva e restrições a causas de alto valor. “Os instrumentos para mediação estão postos normativamente, mas no momento de crise precisamos de diálogo e boa-fé”, afirmou.

Assista abaixo ao seminário

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Juiz suspende cobrança de tributos de empresas hospitalares

A disseminação do novo coronavírus gera impactos negativos em todas as empresas, inclusive naquelas que exercem atividade essencial, dificultando, assim, o recolhimento de tributos. 

Para magistrado, embora hospitais exerçam atividade essencial, são economicamente afetados pelo coronavírus
Reprodução

Com esse entendimento, o juiz Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, da 21ª Vara Federal Cível de Minas Gerais, determinou a suspensão da exigibilidade dos tributos federais devidos pelos filiados do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Casas de Saúde de MG (SINDHOMG). A decisão, em caráter liminar, foi proferida em 27 de abril.

“Muito embora o objeto social dos filiados do impetrante seja o exercício de atividade de saúde, que é considerado como atividade essencial, tal não os exclui do âmbito dos atingidos economicamente pelas medidas de contenção da Covid-19”, afirma o magistrado. 

De acordo com ele, a epidemia levou a uma acentuada queda no número de cirurgias e procedimentos eletivos, o que repercute diretamente na receita e no faturamento de hospitais e clínicas, principalmente nas de pequeno e médio porte. 

“As consequências são tão gravosas que já se tem notícias de que, para que esses estabelecimentos consigam sobreviver, terão que partir para demissão e outras medidas tendentes à redução do gasto. Assim, mesmo inserindo-se entre as atividades consideradas essenciais, os filiados do sindicato autor são também vítimas econômicas das medidas de contenção da pandemia tomadas pelo governo”, prossegue a decisão. 

O juiz determinou a suspensão da exigibilidade dos tributos federais, inclusive daqueles incluídos em parcelamentos, para o último dia útil do terceiro mês subsequente a março. A decisão influi também nos meses seguintes, enquanto durar o estado de calamidade pública. 

Foi responsável pela defesa do sindicato o advogado Daniel Carvalho Monteiro de Andrade, sócio e coordenador da área de Direito Tributário do Monteiro de Andrade, Diniz, Galuppo, Albuquerque e Viana Advogados Associados (Madgav). 

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1013642-06.2020.4.01.3800