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Hallan Rocha: Considerações sobre planejamento previdenciário

É fato incontroverso: mais do que nunca, e definitivamente, o brasileiro precisa adquirir um novo comportamento e uma nova cultura quanto às suas expectativas para a terceira idade. É fundamental que adote como condição de vida o planejamento previdenciário e financeiro. Aquele modelo que vivemos durante décadas, de esperar a aposentadoria para descansar e, ainda que modestamente, desfrutar da velhice já não nos cabe. É imprescindível ao adulto de hoje se planejar economicamente seja por meio de aplicações das mais diversas, bem como organizar o modelo e valor de contribuições para, caso queira, viver a terceira idade com conforto e independência financeira. 

Não estou aqui para defender a reforma da Previdência Social, bem longe disso, o foco é ser previdente. O Brasil tem passado e avança com notável velocidade comparativamente com outros países no processo de envelhecimento populacional. Portanto, buscar interesse pela aposentadoria somente na velhice levará o segurado a uma enorme decepção financeira, e as consequências advindas dela.

Pelas projeções do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a população idosa do nosso país vai saltar de cerca de 23 milhões de pessoas com 60 anos ou mais em 2014 para cerca de 41,54 milhões em 2030, e 73,55 milhões em 2060, em uma população estimada total para o país, daqui a 40 anos, de 218,17 milhões. Atualmente, uma em cada dez pessoas é idosa; em 2060, uma em cada três será idosa. O número de pessoas ativas, com idade entre 15 e 64 anos, por idoso, que é a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos, passará de 11,5 (2000) para 2,3 (2060).

Os dados numéricos de hoje já estariam em colapso se o Brasil não tivesse uma Previdência estruturada dentro de um sistema de seguridade social, o qual permite o financiamento dos benefícios previdenciários por outras arrecadações (PIS, Cofins, CSSL e concurso de prognósticos).

Mas o “bônus demográfico”  fenômeno que ocorre quando um país tem uma quantidade de pessoas em idade economicamente produtiva maior do que a parcela de pessoas em idade não produtiva, como idosos e crianças ameaça consideravelmente o equilíbrio das contas públicas.

Daí porque insisto na necessidade de se formar desde cedo uma cultura previdenciária que deve, obrigatoriamente, ser associada a uma cultura financeira, para que saibamos digerir o mais rapidamente possível essa nova realidade e, de forma planejada, encontrarmos meios complementares de nos mantermos quando pararmos de trabalhar. Poupança? Tesouro? Imóveis? Tudo isso juntamente com um bom e adequado planejamento previdenciário.

A melhor forma de investir na terceira idade é outra questão cuja discussão não cabe aqui. O que sem dúvida me traz aqui é a urgência de, repito, chamar a atenção do jovem adulto, do adulto em plena atividade para adquirir um novo comportamento financeiro, reservando parte de seus rendimentos, necessariamente, para a terceira idade, com investimento e com organização de suas contribuições junto à Previdência Social. É bom que cuidemos para que seja um tempo de qualidade, de dignidade, de autossuficiência financeira e conforto.

 é advogado previdenciarista e tributarista, sócio-fundador do escritório Azzi, Rocha & Santos Advogados Associados e ex-presidente do Instituto Goiano de Direito Previdenciário (IGDP).

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Ausência de doença ocupacional pode ser definida sem vistoria no local

O operador de caldeira afirmava que havia sido sido impedido de produzir prova
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Mesmo que não seja feita vistoria no local de trabalho, a Justiça pode decidir que inexiste doença ocupacional — desde que as demais provas produzidas sejam suficientes para que se conclua pela inexistência de nexo causal com a enfermidade.

Com esse entendimento, a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame do recurso de um operador de caldeira da Martinucci do Brasil Móveis para Escritório Ltda., de Curitiba (PR).

O reclamante queria demonstrar em juízo que seus problemas de coluna eram resultado de seus 12 anos de trabalho na empresa. Em seu recurso, argumentou, assim, ter havido cerceamento de defesa. Mas o colegiado entendeu que a vistoria não alteraria o julgamento do ação trabalhista, diante das demais provas consideradas pelas instâncias inferiores.

Perícia médica

O empregado sustentava que o perito nomeado pelo juízo estaria obrigado a cumprir “escrupulosamente” seu encargo, pois, para que fosse reconhecida a doença ocupacional, seria preciso conhecimento técnico. Em reforço à sua tese, disse que não haveria como afirmar que a conclusão do laudo seria mantida, caso o perito visitasse o seu local de trabalho. O operador acrescentou ainda que uma resolução do Conselho Federal de Medicina determina que o médico, além do exame clínico e dos exames complementares, deve considerar o estudo do local e da organização do trabalho e a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, estressantes e outros.

No entanto, o juízo de primeiro grau considerou desnecessária a realização de perícia técnica no ambiente de trabalho, levando em conta que os fatos e as provas contidas no processo eram suficientes para o julgamento da ação trabalhista. De acordo com a sentença, mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR), não foi identificada a existência de nexo de causalidade ou de concausalidade entre as doenças e a função de operador de caldeira, exercida por 12 anos na empresa. 

O relator do recurso na 4ª Turma, ministro Alexandre Ramos, observou que a perícia médica tem por objetivo aferir a condição de saúde do empregado e que, conforme as conclusões médicas identificadas, ficou comprovado que a vistoria ao local de trabalho seria dispensável. 

Ao entender que não houve cerceamento de defesa, o relator observou que, a partir dos exames clínicos e dos documentos médicos apresentados, o perito concluiu que o trabalhador apresentava escoliose, coxartrose e espondilose, sem qualquer relação com suas atividades na empresa. O ministro disse ainda que o TRT formou seu convencimento diante das provas, “todas fundamentadas”. Com informações da assessoria de imprensa do Tribunal Superior do Trabalho.

RR-1306-33.2013.5.09.0661

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Temporário tem direito a estabilidade em caso de acidente laboral

O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza de garantia provisória de emprego em caso de acidente de trabalho, nos termos do artigo 118 da Lei da Previdência Social (Lei 8.213/1991). O entendimento está fixado no item III da Súmula 378 do TST.

Repositor de loja teve acidente de trabalho, mas TRT-2 havia negado estabilidade provisória, pois contrato era temporário
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Assim, a 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu o direito à estabilidade provisória de um repositor de loja da Mazzini – Administração e Empreitas Ltda., de São Paulo (SP). Ele prestava serviços ao Carrefour Shopping Taboão, em Taboão da Serra (SP), e sofreu acidente a caminho do trabalho.

O empregado contou, na reclamação trabalhista, que o acidente gerou uma lesão que exigiu a realização de procedimento cirúrgico. Durante o afastamento de 30 dias, contudo, foi demitido. Ele sustentou que teria direito à estabilidade provisória, pois acidentes ocorridos durante o deslocamento para o trabalho constituem acidentes de trabalho.

O juízo da 1ª Vara do Trabalho de Taboão da Serra deferiu o pedido do empregado, determinando sua reintegração do empregado. Mas o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), ao destacar que o repositor fora admitido por contrato temporário, aplicou a tese jurídica prevalecente no TRT-2, que afasta o direito nessa circunstância.

No TST, a decisão de segunda instância foi revertida. O relator do recurso de revista do trabalhador, ministro Douglas Alencar, aplicou o entendimento sumulado. Por unanimidade, a Turma restabeleceu a sentença, para determinar a reintegração do empregado ou, caso esgotado o período de estabilidade, o pagamento da indenização substitutiva. Com informações da assessoria de imprensa do Tribunal Superior do Trabalho.

RR-1002170-73.2015.5.02.0501

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Legislador não pode fazer sabatina prévia com todas autoridades

A Assembleia Legislativa não pode fazer sabatina prévia para aprovar a nomeação de todas as autoridades nomeadas pelo chefe do Executivo local. Assim entendeu o Plenário do Supremo Tribunal Federal ao julgar, nesta quarta-feira (3/6), ação que questiona trechos da Constituição de Roraima.

Por maioria, os ministros entenderam pela impossibilidade de sabatinar previamente dirigentes de autarquias, presidentes de empresas públicas de economia mista, de fundações públicas, interventores de municípios, defensores-públicos gerais e titulares da Procuradoria-Geral do Estado.

A ação foi ajuizada pelo governo de Roraima contra dispositivos da Emenda 7/1999, que previa sabatina prévia pela Assembleia Legislativa para referendar as nomeações. 

Nesta quarta, os ministros retomaram julgamento, que começou em 2018. Na ocasião, o relator, ministro Ricardo Lewandowski, entendeu que é constitucional a sabatina para autarquias e fundações públicas e a arguição pública dos interventores dos municípios. Mas ele foi contrário a essa possibilidade no caso de sociedades de economia mista e empresas públicas. Assim, declarou parcialmente inconstitucional a exigência prévia da Assembleia. 

Além disso, considerou que não ofende a Constituição Federal a possibilidade de arguição do defensor público-geral no Estado, pois o cargo no âmbito federal deve ser sabatinado pelo Congresso Nacional, e a previsão de arguição pública dos interventores dos municípios. Apenas o ministro Luiz Edson Fachin acompanhou o voto integralmente.

Acabou vencendo a divergência apresentada pelo ministro Alexandre de Moraes, para quem a intervenção deve ser ato de competência do chefe do Poder Executivo. De acordo com o ministro, a Constituição define que, em até 24 horas, o decreto de intervenção em estado deve ser analisado pelo Congresso Nacional, para verificar as condições, hipóteses, extensão e legalidade do ato, mas não para aprovar o interventor nomeado pelo presidente da República.

Além disso, Moraes discordou da sabatina do defensor público-geral do estado, afirmando que a Constituição prevê que a Defensoria Pública deve ser organizada por lei complementar. Segundo o ministro, a Lei Complementar 80/1994 define a necessidade de aprovação do defensor público-geral federal pelo Senado, mas não no âmbito dos estados.  

Seu voto foi acompanhado pelos ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Rosa Weber e Cármen Lúcia.

Já o ministro Marco Aurélio votou para excluir da sabatina os dirigentes da sociedade de economia mista e o interventor nos municípios.

Questionamento antigo

Não é a primeira vez que tal Emenda é questionada no STF. Em 2015, o Plenário já havia definido que submeter autoridades nomeadas pelo Poder Executivo a sabatina na Assembleia Legislativa ofende a divisão dos poderes, e, por isso, é inconstitucional.

À época, o governo de Roraima questionou as emendas à Constituição estadual 7/1999 e 23/2009. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ADI 2.167

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Lucas Castro: A Convenção 190 da OIT e o ‘cercadinho’ do Planalto

Desde o início do seu mandato, o presidente da República costuma atender a simpatizantes políticos e a jornalistas nos momentos de sua entrada e saída no Palácio da Alvorada. Militantes e profissionais da imprensa têm sua entrada monitorada pelo Gabinete de Segurança Institucional e ficam separados uns dos outros e da comitiva presidencial por grades, sendo tal espaço popularmente conhecido como “cercadinho” do Planalto.

A relação entre presidente da República e imprensa nunca foi amistosa. Por sua iniciativa, assinaturas de jornais em unidades do governo federal foram canceladas [1], a renovação de concessão de emissora considerada inimiga sempre é questionada [2], além de sempre haver referências a uma perseguição midiática, desde as primeiras entrevistas após a eleição [3].

A publicação de notícias que desagradam ao chefe do Poder Executivo sempre resultam em desentendimentos entre este, militantes que o apoiam e os jornalistas que fazem a cobertura na entrada do palácio. Tais divergências já levaram ao proferimento de expressões como “cala a boca” [4], “imprensa lixo” [5] e “no dia que vocês tiverem compromisso com a verdade, eu falo com vocês de novo” [6] pelo presidente e seus seguidores, além de responder a perguntas com gestos indecorosos [7]. Até um humorista que faz imitações do chefe do Executivo federal foi levado ao local para responder às perguntas dos jornalistas, que recusaram a investida [8].

Em face das agressões perpetradas aos profissionais, diversos veículos de comunicação retiraram os trabalhadores daquele local [9], condicionando o retorno a garantias mínimas de segurança, de responsabilidade do Gabinete de Segurança Institucional, vinculado à Presidência da República.

Tais atos, praticados pelo presidente da República e por seus apoiadores, podem configurar assédio moral no âmbito do Direito do Trabalho? Antes de responder a tal pergunta, apresenta-se o conceito de assédio moral feito por Maurício Godinho Delgado como sendo a “conduta reiterada seguida pelo sujeito ativo no sentido de desgastar o equilíbrio emocional do sujeito passivo, por meio de atos, palavras, gestos e silêncios significativos que visem ao enfraquecimento e diminuição da autoestima da vítima ou a outra forma de tensão ou desequilíbrio emocionais graves” [10].

As ações trabalhistas que tratam de assédio moral levam à condenação dos empregadores, caso haja demonstração da existência dos pressupostos da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta comissiva ou omissiva do ofensor; o dano material ou imaterial; o nexo de causalidade; a culpa ou dolo, estes últimos nos casos em que não se trate de responsabilidade objetiva do empregador.

A Convenção 190 da OIT [11], que trata do assédio no mundo do trabalho, muda alguns conceitos que estavam consolidados na jurisprudência trabalhista. Em seu artigo 1°, define violência e assédio no mundo do trabalho como sendo uma gama de comportamentos e práticas inaceitáveis, ameaças ou apenas uma ocorrência única, que vise ou resulte em danos físicos, psicológicos ou sexuais. Não existe, portanto, a necessidade de reiteração da conduta ilícita, sendo configurado o assédio em apenas um único ato ilegítimo.

O artigo 2° da convenção define que a norma não protege apenas os trabalhadores investidos em uma relação de emprego, mas todos aqueles que militam no mundo do trabalho, independentemente da sua condição contratual, incluindo pessoas em treinamento, estagiários, aprendizes, ex-empregados, candidatos a emprego e os próprios empregadores.

O artigo 3° dispõe que o trabalhador pode ser vítima de assédio não apenas no local de trabalho físico tradicional, mas também em eventos relacionados ao trabalho e em espaços públicos, além de abranger todas as condutas que configurem assédio e todas as pessoas que tenham relação com tais atos (artigo 4°).

Não há, portanto, responsabilidade apenas dos empregadores na prevenção do assédio nas relações de trabalho, devendo autoridades públicas e militantes políticos respeitarem todos os trabalhadores que desempenham suas funções no “cercadinho” do Planalto, sejam seguranças, porteiros, zeladores motoristas e até os jornalistas, que não podem ser insultados em razão do teor das publicações feitas nos órgãos de comunicação, sob pena de responsabilização trabalhista, devendo os ofendidos com tais matérias seguir os ditames da Lei n° 13.188/2015, que trata do direito de resposta, e não ofender profissionais no exercício de seu mister.

Apesar de ainda não ter sido ratificada pelo Brasil, não há vedação ao uso dos conceitos introduzidos pela OIT na referida norma, pois não há conceito legal de assédio moral no ordenamento jurídico brasileiro e a CLT é clara ao dispor em seu artigo 8° que, na falta de disposições legais ou contratuais, a Justiça do Trabalho poderá decidir o caso utilizando o Direito comparado, no qual está incluso o direito transnacional, sendo a Convenção 190 da OIT, a partir de sua edição, a fonte normativa do assédio moral no âmbito das relações de trabalho.

 


[10] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 2019. Pág. 770.

Lucas Silva de Castro é juiz do Trabalho substituto do Tribunal Regional do Trabalho da 16° Região (MA) e mestrando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor).

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Pelo risco ao direito à moradia, TJ-RJ suspende parcelas de imóvel

Crise do coronavírus

Pelo risco ao direito à moradia, TJ-RJ suspende parcelas de compra de imóvel

Por 

Pelo risco ao direito à moradia, o desembargador João Batista Damasceno, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ordenou nesta quinta-feira (28/5) que a construtora MRV suspenda, até o fim do estado de calamidade pública por causa da epidemia do coronavírus, as parcelas de compra de um imóvel financiado por um casal.

Direito à moradia não pode ser ameaçado por crise do coronavírus
Nattawut Thammasak

Os dois firmaram, com a MRV, contrato de promessa de compra e venda do imóvel em que moram, em Parada de Lucas, na zona norte do Rio, pelo valor de R$ 184 mil.

Devido à crise, o casal atrasou a parcela de abril. Para preservar a renda familiar, eles pediram a suspensão das mensalidades enquanto durar a epidemia, mas a construtora negou.

A liminar foi negada em primeira instância, mas o casal recorreu. Damasceno apontou, na decisão, que há probabilidade do direito. Isso porque a epidemia de coronavírus está impactando financeiramente grande parte da população e afetando os contratos.

Além disso, o magistrado disse haver perigo de dano, pois a falta de pagamento pode ferir o direito de moradia do casal. O desembargador ressaltou que eles, como consumidores, têm os direitos de revisão de cláusulas e condições contratuais em razão de fatos que as tornem excessivamente onerosas e de prevenção de danos patrimoniais e morais, como estabelece o artigo 6º, incisos V a VII, do Código de Defesa do Consumidor.

O magistrado também proibiu a MRV de incluir os nomes dos dois em cadastros de proteção ao crédito pela falta de pagamento das parcelas.

Clique aqui para ler a decisão

Processo 0031524-15.2020.8.19.0000

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.

Revista Consultor Jurídico, 28 de maio de 2020, 20h23

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Revogada nomeação de secretário de Witzel para o Carf

Amigo do inimigo

Ministério da Economia revoga nomeação de secretário de Witzel para o Carf

Por 

Nomeação de Lucas Tristão para posto no Carf foi revoga por portaria desta quinta
Divulgação

O Ministério da Economia revogou nesta quinta-feira (7/5), por meio da Portaria 11.498, publicada no Diário Oficial da União, a nomeação do advogado Lucas Tristão para o posto de vice-presidente da 1ª Turma Extraordinária da 3ª Seção de Julgamento do Carf.

O documento é assinado pelo Secretário Executivo do Ministério da Economia, Marcelo Pacheco dos Guaranys. Lucas Tristão é um dos principais nomes do gabinete do governo de Wilson Witzel no Rio de Janeiro e ocupa a pasta de Desenvolvimento Econômico.

O agora ex-vice de turma do Carf é especialista em tributação e recuperação de empresas e foi aluno de Witzel no curso de Direito da Universidade de Vila Velha (ES). Tristão irá acumular os cargos no Carf e no governo do Rio.

A nomeação de Tristão foi criticada por deputados da base do governo do presidente Jair Bolsonaro, que enxergam na proximidade do advogado com Witzel — desafeto declarado de Bolsonaro — um impedimento intransponível. “Isso só pode ser Sacanagem! Apadrinhado de Witzel sendo nomeado vice-presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Lucas Tristão não é qualquer secretário, é braço direito do Governador. Há gente no governo conspirando contra o governo?”, questionou o deputado federal Carlos Jordy (PSL-RJ).

Clique aqui para ler a portaria que revogou a nomeação

 é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 7 de maio de 2020, 18h43

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Roberto Wanderley Nogueira: O “AI-5” judiciário

Eis que se calardes, até as pedras falarão.” (Lucas 19:40)

No último dia 13 de dezembro, o país fez memória do Ato Institucional nº 5 (AI-5), um diploma normativo que data de mais de 45 anos, o qual tinha força de norma constitucional, mas compunha uma topografia legal paralela, metajurídica. Era como que uma constituição à parte da Constituição Federal e que, na prática, valia talvez mais do que a outra, muito em função do autoritarismo à época estabelecido, institucionalmente, no Brasil.

Em verdade, o seu valor atual é menos histórico que arqueológico, motivo pelo qual o título deste artigo é apenas uma alegoria, tanto quanto se tem reverberado nos últimos dias pela crônica política da Nação.

Felizmente, deu-se a redemocratização do país, editou-se a Constituição Federal de 1988 – chamada de “cidadã” por Ulysses Guimarães — e mais não existe o traço formal do autoritarismo do passado, embora nossa democracia insista na incipiência de seus fundamentos e no primitivismo corporativista, patrimonialista e fisiológico de suas relações, decorrentes do “constitucionalismo semântico” referenciado por Karl Loewenstein em sua “Teoria da Constituição”.

Nada obstante, hoje em dia, o papel de editar comandos normativos com aspectos de “AI-5” parece ter se transferido às atribuições dos juízes, sobretudo os das Cortes Superiores. Vez ou outra, num crescendo atitudinal que já se convencionou denominar de “ativismo judicial”, eles adotam decisões inteiramente descoladas do sistema jurídico (normativo), atropelando funções próprias dos demais poderes de Estado e vão muito além dos limites das lides, haja vista motivos conjunturais e até estatísticos dos quais não se costuma fazer cerimônia. É prática arraigada.

Sobre isso, há quem na outra ponta do exercício jurisdicional, locupletando-se dessa estranha atmosfera, proponha demandas ao talante de construções voluntarísticas e estritamente subjetivas (chicanas) que, em vez de refutadas, acabam de algum modo acolhidas para a perplexidade das partes e da Nação impactada. É como se múltiplos subsistemas estivessem ativados e em operação mais eficaz do que o próprio sistema de normas em vigor.

A hermenêutica pode operar milagres, quando arbitrariamente gerenciada, o mesmo que acontecia ao tempo dos Militares. Convém lembrar que isso não é exclusividade de instância judiciária alguma, em particular. Nas instâncias inferiores podem-se considerar dois outros fatores igualmente importantes: 1) o desconhecimendo de causa (despreparo e disfuncionalidade associadas ao processo de seleção e de fiscalização dos Magistrados, tudo associado ao volume da demanda e à escassez de recursos para enfrentá-la); e 2) o carreirismo, que açula o receio de impopularidade e o anseio de promoção com a possibilidade de graves prejuízos à prestação jurisdicional devida aos cidadãos.

De fato, a pretextos diversos, interpretação extensiva, historicista, sociológica, conforme ao que se julga ser ou não ser constitucional, dentre outros truísmos, menos o que se revela juridicamente válido em sua literalidade e no seu sentido próprio, adotam-se decisões inteiramente inusitadas em relação à Ordem Constitucional, retarda-se a eficácia de dispositivos superiores, enquanto outros são substituídos por diversos procedimentos de vernissage, assim encarada, referida Ordem, na literalidade de seus conteúdos normativos quanto no seu sentido. Tudo isso sem risco de controle político, jurídico e social, sobretudo quando os veredictos são de última ou única instância. A Constituição até que preconiza remédios sanadores desses quadros e dessas atitudes, mas, no momento, não há atores dispostos a executarem suas regras. A interdependência entre os poderes do Estado brasileiro cedeu, na prática, ao temor reverencial.

A democracia, desse modo, é, paradoxalmente, o cenário político mais favorável à denominada “Ditadura do Judiciário” na qual o primado da ignorância e da prepotência ressurge com força e esmerada aplicação tática, quer no âmbito da jurisdição, propriamente dita, quer na atividade censória dos Tribunais e do Conselho Nacional de Justiça, que é o órgão que encara um suposto controle externo do Poder Judiciário, criado à luz da Emenda Constitucional nº 45/2004. Esse dispositivo (artigo 103-B, § 4º, da CF/EC 45) não faz acepção de Juiz algum, mas se convencionou que os Ministros do Supremo Tribunal Federal não se submetem a ele.

Pois bem. Sobre a iniciativa regulatória das atividades dos juízes nas redes sociais por parte do CNJ, destaco, em primeiro lugar, que o STF não é instância constituinte e nem o CNJ, legisferante. Tratam-se de órgãos constituídos que devem, por isso mesmo, ater-se ao Ordenamento Jurídico, tal como se encontra positivado (“In claris cessat interpretatio”).

A consciência de limites dos seus agentes é fundamental ao Estado de Direito. Se lhes falta essa virtude, dessume-se ser chegada a hora exata de reciclar atores e procedimentos em razão da necessidade de manutenção da higidez do seu sistema de normas, que não deve sofrer abalos idiopáticos ou voluntarísticos de quaisquer espécies, haja vista tratar-se de uma estrutura lógica com unidade de sentido e autopoiética (que se basta a si mesma).

O esforço de regular o que já se acha regulado traduz uma inutilidade jurídica clarificada, no caso, em função da disciplina judiciária preexistente, nos termos da Constituição e da LOMAN. Se a LOMAN, norma específica, que data dos dias de ferro do militarismo, vem se revelando, todavia, hipossuficiente ou inadequada ao justo, democrático e ponderoso regulamento da ação judicial nos dias que correm e da Magistratura Nacional, seria o caso de se enviar ao Congresso a última das disciplinas para carreira de Estado ainda represada pelo burocratismo judiciário da República: o novo Estatuto da Magistratura, cujo projeto foi o constituinte de 1988 que atribuiu ao STF a responsabilidade de empreendê-lo e encaminhá-lo, mesmo que sem data aprazada. Há 31 anos foi passado esse comando, mas até agora ele não foi obedecido e a Magistratura Nacional segue como a última carreira de Estado ainda não regulada sob o pálio da Constituição Federal de 1988.

Com efeito, o CNJ não substitui o STF nessa dinâmica de obediência jurídica à vontade do legislador constituinte, ainda que por vias transversas ou pretextos de um pseudoadministrativismo expresso em resoluções, provimentos, portarias e demais atos autoconsiderados “interna corporis”, mas que disso não se trata em absoluto. A natureza jurídica de certas resoluções do CNJ tem, sim, caráter de legislação primária e isso lhe é vedado pela Constituição Federal. Corre-se, pois, o risco de autoritarismos. Desse modo é que não pode parecer estranho à Nação, crescentemente impactada, que ainda haja dignitários em atividade que exortem, com toda convicção e nenhuma cerimônia, para um suposto caráter “divinal” dos Magistrados, eis que “julgam pessoas”, não condutas. Só acreditei nessa manifestação porque a fonte da informação era boa, mais tarde comprovada, mas se trata, na realidade, de um nada cognitivo. Tempos estranhos, muito estranhos… O fato é que os juízes são tão mortais quanto a quaisquer outras pessoas e estão do mesmo modo sujeitos às misérias desta vida.

A tal exortação pública, outrossim, evoca uma outra tragédia do Poder Judiciário Nacional: o formato personalista e antirrepublicano de como suas composições são comumente eleitas e as brechas legais que permitem serem elevados aos Tribunais quadros inteiramente inusinados à função jurisdicional e à vida dos pretórios. Ora, não é difícil especular acerca das razões de certos experimentalismos que são comumente observados no sistema de Justiça brasileiro, e pelos quais a imprevisibilidade resulta bem aflorada na vida forense com alguns adminículos corporativos altamente perniciosos à boa imagem da Magistratura Nacional, a exemplo do carreirismo judiciário e de um espectro de emulações na evolução dessas carreiras e até mesmo de seus cargos isolados. O apego ao poder, sobretudo nas esperas mais acima da jurisdição, parece patológico ao ponto de atropelar dispositivos constitucionais muito específicos como os resultantes da Emenda Constitucional nº 88/2015 (“PEC da Bengala”), que obrigou os membros dos Tribunais Superiores a se submeterem a uma sabatina de retenção de seus cargos perante o Senado Federal, ao ensejo de completarem a idade limite de 70 anos para fins de permanência na atividade por mais um lustro. Essa regra, todavia, continua sendo negligenciada por força de decisão liminar adotada, por maioria, pelo próprio STF, que a considerou contrária às garantias da Magistratura, desconsiderando, outrossim, que o tema era outro: Regime Jurídico da Administração Pública Judiciária para o quê não há direito adquirido, inclusive (ADI nº 5.316).

Ao fim, a estrutura das liberdades públicas, mesmo aquelas que dizem respeito aos Juízes, é intocável por meio de medidas administrativas, não previstas em lei. Ainda, aos Juízes é deferida essa pauta de liberdades, nos termos do que a lei e somente a lei delimita. A Magistratura, sobre restringir algumas condutas de seus membros, “ex-vi-legis”, não retira dos Juízes a própria cidadania. Pensar diferente é idiossincrático, quando não traduzir abuso.

O juiz que não se sente livre na sociedade em que atua, simplesmente não decide coisa alguma, guardados os limites que a lei lhe impõe por dever de seu ofício. O valor da liberdade forja os talentos mais necessários à arte de julgar. O juiz que não se sente livre, porém, jamais estará apto a decidir os destinos de seus semelhantes.

Desse modo, a iniciativa do CNJ em regular ou restringir, para além dos limites legais, a liberdade do juiz quanto ao uso das redes sociais, é de fato um monumental contrassenso, para dizer o mínimo. Estamos, pois, diante da possibilidade de cerceamento da liberdade de expressão dos Juízes, predicado da cidadania, para além do que preconizam a Constituição Federal e a Loman. Esse tipo de experimentalismo judiciário diverge do Estado de Direito e conduz o sistema de controle da Magistratura ao arbítrio. Sobre isto, o Poder Judiciário precisa ser revisto nos mecanismos de formação de seus quadros e o controle externo da Magistratura Nacional deve ser social e jamais corporativo.

Nada obstante, cada qual deve fazer a autorregulamentação da própria atividade, justamente à luz da Constituição e da Loman. O CNJ e as Corregedorias de Justiça sempre exercerão o controle censório da disciplina judiciária, fenômeno bem distinto daquele que se intenta agora proceder sem amparo jurídico e por argumento de pura autoridade.

Diante de todo o exposto, pode-se concluir que os Juízes estão fazendo na democracia (“ativismo judicial”) o mesmo papel que os Militares fizeram na ditadura (“AI-5”).

Roberto Wanderley Nogueira

Doutor em Direito

 é juiz federal em Recife e doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).